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quarta-feira, 5 de julho de 2006

563) Para os tributaristas e advogados comerciais: uma dúvida séria sobre o tratado e a norma da Receita...

Decisão põe acordo bilateral em xeque
Marta Watanabe
Jornal Valor Econômico, 05/07/2006

Uma decisão recente do Conselho de Contribuintes colocou em xeque a estrutura societária adotada recentemente por algumas empresas e que leva em conta a substituição de tradicionais paraísos fiscais por holdings européias. O conselho analisou a regra que deve prevalecer sobre os lucros obtidos por controladas no exterior: a norma brasileira - que desde 2001 manda as empresas pagarem Imposto de Renda (IR) mesmo que os lucros ainda não tenham sido distribuídos ao controlador brasileiro - ou os tratados internacionais para evitar dupla tributação. E a decisão indica que a empresa deve pagar IR, o que coloca a lei local acima do tratado internacional.

O Conselho analisou o caso da Refratec, empresa do grupo da mineradora Magnesita, e concluiu que a empresa deve pagar o IR. Para o conselho, o tratado assinado entre Brasil e Espanha não protege as empresas brasileiras da tributação determinada a partir de 2001 pela MP 2.158. O tratado entre Brasil e Espanha é considerado um dos mais vantajosos para as empresas porque prevê que os lucros e dividendos só devem ser tributados no país de origem. Essa previsão só existe em cinco dos 24 tratados assinados pelo Brasil. Na maior parte dos tratados, só existe a previsão para lucros e não para dividendos.

A Refratec não foi a única empresa que se fiou no tratado com a Espanha. A Embraer, por exemplo, tem em território espanhol uma holding sob a forma de Entidad de Tenencia de Valores Extranjeros (ETVE). A legislação espanhola dá às empresas instaladas como ETVEs uma redução de carga tributária. O envio de dividendos, por exemplo, tem alíquota zero de IR, enquanto nos demais países europeus ou para as demais empresas espanholas o imposto é de 15%. A alíquota vale para os dividendos destinados a países fora da Comunidade Européia.

Na prática, a holding espanhola da fabricante de aeronaves poderia mandar os dividendos à Embraer, no Brasil, sem pagar IR ao Fisco da Espanha em função do benefício previsto às ETVEs. No Brasil, os valores distribuídos não seriam tributados porque, pelo tratado entre os dois países, os dividendos tributáveis na Espanha não pagam IR ao Fisco brasileiro.

A empresa, porém, foi pega de surpresa porque uma norma da Receita Federal restringiu a aplicação do tratado com a Espanha para as ETVEs. A norma é considerada ilegal por tributaristas. "Um ato da Receita não pode restringir um acordo assinado por duas nações", diz o tributarista Maurício Barros, do Zilveti e Sanden Advogados. A Embraer está em compasso de espera para saber a evolução dessa discussão, informa Rodrigo Almeida Rosa, gerente da área financeira da empresa. Ele conta que a fabricante de aeronaves ainda não repatriou recursos da ETVE espanhola e anda estuda se deverá adotar medidas mais drásticas para garantir o que considera seu direito.

A subsidiária espanhola, explica Rosa, tem funcionado, por enquanto, na estrutura montada pela Embraer, como uma holding para reunir empresas que têm lucros e prejuízos. "É uma forma muito usada para garantir a compensação automática de prejuízos com lucros porque a legislação brasileira não permite isso", diz Rodrigo Maitto, da Maitto, Vieira, Silva e Vasconcellos Advogados.

O caso da Refratec, julgado no Conselho, reflete como o tratado hispano-brasileiro é considerado um acordo vantajoso. No início de 2001, a Refratec tinha pelo menos duas controladas no exterior: a Iliama Investimentos e Serviços Limitada, na Ilha da Madeira, Portugal, e a Iliama Participações Sociedad Limitada, em Barcelona, Espanha. Foi em 2001 que a MP 2.158 determinou que as empresas reconhecessem os lucros apurados por controladas e coligadas no exterior. Mesmo que não tivessem se convertido em dividendos para o controlador brasileiro. Até então a Receita só tributava o lucro efetivamente distribuído ao controlador. Os lucros deveriam ser tributados, segundo a MP, a partir de 31 de dezembro de 2001.

Vinte dias antes dessa data, a Refratec vendeu a participação na Iliama da Ilha da Madeira. Dessa forma, evitaria que os lucros da empresa portuguesa entrassem no cálculo do IR devido pela mineradora no Brasil. A Iliama espanhola foi mantida no organograma da Refratec. A empresa alegou que o acordo entre Brasil e Espanha protegia os lucros da Iliama espanhola gerados a partir de 2001. Em 2003, porém, a Receita autuou a empresa por não ter pago IR sobre os lucros da Iliama da Espanha. O Conselho manteve a autuação.

Até agora o tratado Brasil-Espanha têm prevalecido em algumas questões pontuais. A espanhola Sainco foi ao Judiciário para pleitear a redução de 15% para 12,5% do IR cobrado sobre a remessa de royalties pela Light Serviços e Eletricidade. Ela alegou que o tratado entre os dois países prevê a mesma alíquota estabelecida pela lei brasileira: 15%. Mas o acordo também diz que, caso o Brasil assine tratado com outro país prevendo um IR mais benéfico para a remessa de royalties, a alíquota mais baixa deve ser estendida aos pagamentos feitos às empresas espanholas. A Sainco alegou que o acordo Brasil-Japão prevê alíquota de 12,5%. Conseguiu decisão favorável da Justiça Federal no Rio de Janeiro.

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