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terça-feira, 20 de outubro de 2009
1434) A vida como ela é: mas nao exatamente na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa
Zelaya é “hóspede”. E os 36 demais, o que são?
Fabiano Maisonnave
Blog da Folha de S. Paulo, 19/10/2009
Tenho evitado descrever episódios pessoais, mas o incidente da tarde de ontem é mais um exemplo de que a embaixada brasileira em Tegucigalpa, há quatro semanas abrigando Manuel Zelaya e seus “acompanhantes”, se encontra em uma situação administrativa pra lá de anômala e não deveria permanecer como está por mais tempo.
Como é de praxe, aos domingos familiares de Zelaya (e apenas dele) visitam a embaixada. Na saída, também como é de praxe, fui até o portão para ver se haveria constrangimentos na hora da sempre rigorosa revista. Estavam de saída a mãe de Zelaya, a sogra, a filha e uma neta de 4 anos.
A revista geralmente é feita bem diante do portão da embaixada. Nessas situações, os jornalistas ficamos acompanhando da calçada _pela regra dada pela polícia, ainda é “território brasileiro”. Desta vez, no entanto, o ponto era uns poucos metros mais para baixo, no meio da rua, bloqueada para veículos.
No mesmo instante, a cerca de 20 metros do portão, o padre Andrés Tamayo celebrava, na garagem, uma missa com a presença de Zelaya.
Como os leitores têm acompanhado aqui, há um crescente cerco policial-militar à embaixada, e a saída dos familiares era, a meu ver, jornalisticamente relevante.
O problema é que o “porteiro” da embaixada, Mario Irias, um ex-militar que trabalha para Zelaya, queria trancar a porta, mas eu disse para esperar até que a revista terminasse. Ele não me fez caso: simplesmente fechou a porta da embaixada comigo do lado de fora, a passos de alguns policias e militares que assistiam à cena.
Foi preciso que eu forcejasse até reabrir a porta, que é de correr. Na discussão, eu disse a ele que não poderia fechar a porta da embaixada brasileira a um cidadão do país sendo que nem sequer é funcionário.
“Estou cumprindo ordens”, disse. “Ordens de quem?”, perguntei a ele, três vezes, sem ouvir resposta.
As ordens, claro, não vieram do diplomata Lineu de Paula, o enviado do Celso Amorim. São de Zelaya e de seus “assessores de segurança”.
Obviamente, De Paula discordou e foi pedir explicações a Irias, que se justificou afirmando que Zelaya estava perto da entrada _argumento razoável, mas que ele não usou comigo, apenas me deixou do lado de fora.
Irias sabe que me colocou em situação de risco: poderia facilmente ter sido preso por um dos policiais e militares a poucos metros de mim. As pessoas que a conta-gotas deixam a embaixada só o fazem na presença de um promotor do Ministério Público, que vem com hora marcada.
O problema de fundo de tudo isso é que, embora De Paula tenha a palavra final sobre o que ocorre na embaixada, seu subordinado se resume a um guarda de uma empresa privada de segurança. Já o “batalhão” de Zelaya tem 36 pessoas. São eles, e não o pessoal da embaixada, os encarregados da limpeza, da distribuição dos quartos e dos banheiros e, principalmente, da segurança (os guarda-costas de Zelaya entregaram um pequeno arsenal de 17 armas à embaixada, que as mantém numa sala fechada).
É gente demais por tempo demais _ são 28 dias hoje que Zelaya e seus seguidores tomaram a embaixada.
Amorim já disse e redisse que o “hóspede” Zelaya pode ficar por tempo indeterminado. Mas, e os demais 36, são o quê? E por quanto tempo?
Não tem havido relatos de perseguição do lado de fora para quem já saiu _esta embaixada já suportou 313 pessoas dormindo aqui, nos primeiros dias. Conversei com duas pessoas que deixaram a casa há semanas, e ambas estão bem.
A embaixada precisa voltar a funcionar e precisa de seus funcionários. Há uma comunidade de cerca de 500 brasileiros aqui, e uma desnecessária decisão do governo brasileiro agora obriga os hondurenhos a tirar visto para viajar ao Brasil.
Se o acordo não sair hoje, já passou da hora de repensar essa hospedagem.
PS: na foto acima, um cartaz colocado pela segurança de Zelaya na entrada de metade do andar de cima da embaixada.
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