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sexta-feira, 30 de outubro de 2009
1458) Ricupero sobre Venezuela no Mercosul: "É UM LAMENTÁVEL FATO CONSUMADO"!
Creio que estamos transformando o Mercosul num organismo político, o que é, a todos os títulos, lamentável.
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Paulo Roberto de Almeida
VENEZUELA NO MERCOSUL: "É UM LAMENTÁVEL FATO CONSUMADO"!
Rubens Ricupero
O Estado de S. Paulo, 30/10/2009
O ingresso da Venezuela no Mercosul é um lamentável fato consumado. Um fato mal conduzido desde suas origens. Ele não deveria ter sido tratado como um caso político, mas sim como um caso de integração comercial, da mesma forma que acontece na Organização Mundial de Comércio (OMC), nos acordos de livre comércio e nas uniões aduaneiras. Em todos esses lugares, antes que o país ingresse é preciso completar as negociações das concessões tarifárias - o que não ocorreu aqui.
Para se ter uma ideia do que estou dizendo, vale recordar que a China demorou 12 anos para concluir o processo de negociações na OMC. O caso da Rússia é muito mais dramático: ela ainda não concluiu as negociações, que já duram 19 anos.
Em qualquer organismo baseado na ideia de concessões comerciais o país interessado em ingressar precisa pagar um preço - e o preço estabelecido é a redução de suas barreiras. São negociações extremamente difíceis, que envolvem, além dos tratados coletivos, acertos bilaterais, com cada um dos membros. No caso da OMC eles chegam a 130.
Quando se trata de uma união aduaneira, como o Mercosul, o processo fica ainda mais complicado. Enquanto num acordo de livre comércio, como o Nafta, que reúne Estados Unidos, México e Canadá, os acordos envolvem o fim das restrições entre eles, no caso da união aduaneira abrangem também as relações comerciais com o resto do mundo - o que significa que nenhum integrante da união pode negociar sozinho acordos bilaterais. O Brasil não pode oferecer aos Estados Unidos a redução de barreiras para determinado produto eletrônico, porque isso violaria seus compromissos no Mercosul.
No caso da Venezuela, o carro foi colocado na frente dos bois. O país assinou um instrumento de adesão antes das negociações de redução tarifária. É algo inédito. Não conheço nada parecido em nenhum acordo comercial.
O extraordinário é que nem o governo nem a oposição souberam debater esse problema fundamental. Os outros temas envolvidos, como democracia e direitos humanos, são importantes, mas não têm a ver diretamente com o Mercosul, que não pretende ser uma união política, como a União Europeia. O Mercosul é uma união aduaneira.
O governo brasileiro não agiu dessa maneira por desconhecimento. O ministro Celso Amorim foi embaixador em Genebra e conhece perfeitamente as regras. Pode-se argumentar que foram razões políticas que levaram a esse desfecho. Essas mesmas razões mostram, no entanto, que aqueles que agem dessa forma estão, no fundo, comprometendo o Mercosul, estão mostrando que eles mesmos não levam a sério o caráter de integração comercial proposto.
Esse debate não é ideológico nem político. Estamos falando de uma questão pragmática. O governo brasileiro cometeu um grave erro.
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Paulo Roberto de Almeida sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul:
O Mercosul possui poucas regras, dotadas de alguma ambiguidade, sobre a adesão ou aceitação de novos membros. O assunto está regulado no Tratado de Assunção e em algumas poucas decisões do Conselho de Mercosul, todas elas requerendo a aceitação plena de seus principais instrumentos e mecanismos constitutivos para que o ingresso de um novo membro se concretize.
O que diz o Tratado de Assunção sobre a adesão de novos membros? O capítulo IV, em seu artigo 20, relativo à adesão é muito simples:
“O presente Tratado estará aberto á adesão, mediante negociação, dos demais países membros da Associação Latino-Americana de Integração, cujas solicitações poderão ser examinadas pelos Estados Partes depois de cinco anos de vigência deste Tratado. Não obstante, poderão ser consideradas antes do referido prazo as solicitações apresentadas por países membros da Associação Latino-Americana de Integração que não façam parte de esquemas de integração subregional ou de uma associação extra-regional. A aprovação das solicitações será objeto de decisão unânime dos Estados Partes.”
Algumas decisões do Conselho condicionam esse ingresso à aceitação de todos os instrumentos constitutivos do Mercosul – inclusive do Protocolo de Ushuaia, relativo à cláusula democrática no Mercosul – e suas principais normas de liberalização e de ordenamento comercial, entre elas a Tarifa Externa Comum, que constitui o dispositivo essencial de uma união aduaneira, o que o Mercosul pretende ser.
As regras são algo vagas, mas existem, e a Venezuela, ou qualquer outro candidato ao ingresso no bloco, deveria fazer o seu dever de casa, antes de poder ingressar no Mercosul.
Uma simples observação da realidade, com base em fatos objetivos e em declarações do próprio presidente da Veneuzeula, Hugo Chávez, confirma que a Venezuela não se encontra preparada, nem está sendo preparada, para ingressar no Mercosul, com base unicamente nos dispositivos de caráter econômico-comercial e não necessariamente aplicando o Protocolo de Ushuaia sobre vigência da democracia, que na verdade se aplica apenas às rupturas democráticas – ou seja, golpe de Estado e eventos do gênero – não a derrocadas plebiscitárias do regime democrático no país.
O presidente Chávez declarou publicamente, no momento em que decidia incorporar a Venezuela ao bloco, que achava este muito conservador ou liberal, e que pretendia transformá-lo em algo mais próximo de seus ideais, que como sobejamente conhecido é algo chamado “socialismo do século 21”. Em todo caso, ele não parece comprometido a cumprir os requisitos da liberalização comercial dentro do bloco e o da aceitação da TEC para fora do bloco, o que inviabiliza, ipso facto, o ingresso pleno da Venezuela no Mercosul.
Indo direto ao ponto, se pode dizer que o ingresso da Venezuela, nessas condições – de não cumprimento efetivo de clausulas fundamentais constantes de seus instrumentos constitutivos – pode fragilizar a arquitetura institucional do Mercosul, fazê-lo perder credibilidade política – do ponto do respeito a regras de caráter legal – e inviabilizar o seu funcionamento futuro enquanto união aduaneira e projeto de mercado comum.
É óbvio que um mercado comum, ou mesmo uma simples união aduaneira, requer a plena liberalização interna dos fluxos comerciais de bens e serviços e a aceitação, para fins externos, das regras de política comercial acordadas pelo bloco, das quais a TEC é a mais importante. Se a Venezuela não cumpre esses requisitos mínimos parece evidente que seu ingresso no Mercosul só pode ser feito em detrimento de sua estrutura jurídica, seus compromissos políticos e de sua respeitabilidade internacional.
Em uma palavra: ou a Venezuela aceita o Mercosul como ele é, e cumpre suas normas, ou o Mercosul deixará de funcionar como um bloco homogêneo como pretende ser. O que está em causa, portanto, é a própria sobrevivência do Mercosul.
5 comentários:
Olá gostei muito deste post sobre a Venezuela e o Mercosul, concordo plenamente com o que o senhor escreveu. Gostei muito do blog e até recomendei-o para todos meus amigos.
parabéns!
-A Votação do Protocolo de Adesão da Venezuela ao Mercosul pela CRE do Senado...Stand-up Comedy em 6 (seis)atos...e comentários:
"A tática de isolamento não é correta, pois, se fosse, Cuba não seria uma democracia relativizada (sic) que é- comparou." Senador Mozanildo Cavalcanti (PTB-RR).
Comentário: Gostariamos de saber qual a definição de uma "democracia relativizada"; poderiamos tomar como exemplo países como Burma, Coréia do Norte e Venezuela?! Talvez se pertguntarmos a algun preso político em Cuba...!
"O Senador Eduardo Suplicy (PT-SP) defendeu o protocolo de adesão , mas pediu a Chávez que libertasse todos os presos políticos de seu país até o Natal".
Comentário: Alguém, por favor, avise ao Senador que Papai Noel não existe!
"Rosalba Ciarlini (DEM-RN) manifestou-se a favor da adesão, mas pediu a Chavéz para perceber que sua entrada no bloco 'não será para criar dificuldades'.
Comentário:Nos traz a lembrança a fábula "O Escorpião e a Tartaruga"...ambos morreram afogados!
"Na opinião de Inácio Arruda (PCdoB-CE), ingresso da Venezuela fortalecerá o Brasil, uma vez que possibilitará uma América do Sul mais unida".
Comentário:Esqueçamos a binacional Itaipu, a Petrobas na Bolívia, a Odebrecht no Equador e a CAN como exemplo de "fortalecimento e união" no sub-continente!
"Entre os argumentos de defesa do protocolo, (Romero) Jucá (PMDB-RR)resaltou que a questão 'não se refere a governos, que são passageiros, mas a Estados, que se caracterizam pela permanência".
Comentário:...o Samán de Guere envia a seguinte menssagem ao Senador ...L'État, c'est moi...!
"Quanto às críticas da oposição sobe as ameaças à democracia e aos direitos humanos que seriam oferecidas pelo governo Hugo Chávez, (Romero) Jucá (PMDB-RR) disse 'tal avaliação está equivocada, porque pressupõe que o Mercosul é um clube de países-modelo em termos de democracia e direitos humanos".(sic)
Comentário: O Senado Federal, ao longo de sua história, tem prestado grandes serviços ao país e nos tem brindado com luminares; mas este Senhor é "Hors-concour"...Eis aqui o degas...!
IN:"Senadores aprovam adesão da Venezuela, mas fazem ressalva a Chávez" (http://www.senado.gov.br/agencia/verNOTICIA.aspx?NOTICIA=96905&codAplicativo=2); "Jucá:questão se refere ao Estado da venezuela, não a governos, que são 'passageiros'".(http://www.senadofederal.gov.br/agencia/verNOTICIA.aspx?codNOTICIA=96893&codAplicativo=2)
Vale!
Fonte:
Concordamos com o honorável Embaixador Ricupero. No entanto, discordamos do título do artigo não trata-se de um "Lamentável fato consumado (fait accompli...)"; mas de um "grotesco faux pas..."!
Vale!
Não sei, professor...a discussão me parece bem-intencionada mas equivocada, ou seja, fora do ponto. Até entendo a necessidade de pessoas públicas se manifestarem públicamente contra ou a favor de determinados posicionamentos do governo brasileiro. Mas já que estamos no plano dos fatos - como quer o Embaixador Ricupero - vamos aos fatos, nos termos colocados pela Folha de São Paulo do dia 27 de outubro:
Decisão deve demorar mais alguns anos
RODRIGO RÖTZSCH
EDITOR DE MUNDO
A acalorada discussão no Congresso brasileiro em torno da aprovação ou não da entrada da Venezuela no Mercosul esbarra no bizantinismo, pois ignora um dado prático no qual o Brasil não tem como influir: a paralisia total no trâmite da questão no Paraguai, indispensável para a ratificação do ingresso, que deve ser unânime.
O acordo para a adesão foi assinado em julho de 2006. Já em novembro daquele ano, foi ratificado pelo Congresso uruguaio. No mês seguinte, a Argentina fez o mesmo. Desde então, Caracas aguarda o aval de Brasília e de Assunção.
Se no Brasil a discussão é difícil, no Paraguai é pior: ela inexiste. Há alguns meses, constatando não ter os votos para que a iniciativa fosse aprovada, o governo Fernando Lugo retirou o projeto da pauta do Congresso. Além de reconhecer a falta de apoio parlamentar ao projeto, o chanceler paraguaio apontou o dedo para o Brasil ao explicar a desistência: "Neste ano já não vale a pena insistir no tema porque o Congresso brasileiro não está aprovando a inclusão da Venezuela no bloco, e é preciso consenso".
Mesmo se o Brasil aprovar o ingresso venezuelano, a situação no Paraguai não deve mudar tão cedo. Aliado de Hugo Chávez, Lugo tem o apoio de só 14 dos 45 senadores e de 29 dos 80 deputados; as próximas eleições legislativas só acontecem em 2013, concomitantemente com as presidenciais.
Até lá, já terão mudado os presidentes e os Congressos de Argentina, Uruguai e do Brasil. Talvez até na Venezuela -Chávez buscará sua terceira reeleição em 2012. Todas essas mudanças podem levar as partes a mudar de ideia sobre a adesão venezuelana ao bloco. Luis Alberto Lacalle, por exemplo, que estava no poder no Uruguai quando o Mercosul foi criado e tenta voltar à Presidência no mês que vem em segundo turno contra José Mujica, é contra o ingresso venezuelano. No Brasil e na Argentina, pode acontecer coisa parecida.
Uruguai e Paraguai, aliás, com ou sem Venezuela, já se consideram prejudicados no Mercosul pelos sócios maiores. A economia venezuelana, de pouco mais de US$ 300 bilhões no ano passado, não se compara à do Brasil, mas faz do país um gigante na comparação com o Paraguai, que mal passa dos US$ 15 bilhões. As famosas assimetrias que Assunção denuncia no bloco só aumentariam com o ingresso do novo membro. Que por esses e outros motivos ainda deve passar mais alguns anos no papel.
Glaucia,
Confesso não saber, em detalhes, dos motivos que paralisaram o processo paraguaio de apreciação do Protocolo de Adesão da Venezuela ao Mercosul no Senado daquele país. Pode ser briga interna, partidária (ao que tudo indica), ou podem ser relevantes considerações de ordem política sobre a (in)adequação da Venezuela da Chávez (cabe frisar) aos requisitos fundamentais de uma união aduaneira, ainda que tão esquizofrênica quanto o Mercosul (o que não acredito que seja).
Independentemente, porém, dos reais motivos PROCESSUAIS do Paraguai, cabe refletir sobre as questões de FUNDO, que inviabilizam o ingresso da Venezuela (de Chávez, ou como Estado, não importa agora) a essa UA periclitante. A questão é tão simples quanto perguntar: a Venezuela preencheu os requisitos?
Se sim, cabe acolhê-la, se não, cabe aguardar.
As simple as that.
Parece que a aceitação foi política, o que por si já constitui um problema grave na arquitetura institucional do Mercosul, por definição um bloco comercial.
Parece que passaram o carro na frente dos bois, no caso um touro desembestado.
Quem segura, não a Venezuela, mas Chávez?
Paulo Roberto de Almeida
1.11.2009
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