Oito anos atrás, a diplomacia brasileira empenhou-se ativamente na implosão da Alca, segundo reconheceram, diversas vezes, o presidente e seu chanceler, além, obviamente, do então Secretário-Geral do Itamaraty.
As alegações para recusar a Alca eram muitas, mas basicamente as seguintes.
O chefe de Estado repetia sempre uma bobagem do PT, segundo o qual o tratado da Alca não seria de integração -- e não seria mesmo, pois os EUA estavam propondo apenas livre-comércio -- mas sim um tratado de "anexação" da América Latina pelos EUA.
Vejam vocês, o maior país da América Latina, o Brasil, tinha medo de sua anexação pelo império, junto com todos os demais, e portanto recusava a Alca. Ponto, parágrafo.
O chanceler não se cansava de repetir a cantilena de uma tal "nova geografia do comércio internacional". Segundo ele, e nisso era replicado pelo presidente, o Brasil não podia ficar "dependente" do comércio com os EUA, e tinham de diversificar suas parcerias externas, de preferência com os países em desenvolvimento, a tal de "diplomacia Sul-Sul" e também a "diplomacia da generosidade", como nossos irmãos menos desenvolvidos. Em relação a estes, o presidente recomendava que os importadores brasileiros comprassem mais deles, mesmo que seus produtos fossem mais caros e de menor qualidade. Desconheço se algum importador cometeu essa loucura.
O chanceler, numa surpreendente demonstração de lógica ex-post, disse que se o Brasil tivesse aceito a Alca o Brasil teria tido uma crise como a do México, quando os EUA ingressaram em sua crise financeira. Textualmente teria ocorrido o seguinte: em lugar de uma mini-recessão, teríamos tido uma mega-recessão, o que revela desconhecidos dotes de profeta do apocalipse, para um país, o Brasil, que jamais teria tido a dependência (80% do seu comércio exterior) que o México exibe em relação aos EUA. Ou seja, uma desonestidade intelectual ex-post.
Quanto ao SG-MRE, ainda mais apocalíptico, ele dizia que se o Brasil aceitasse a Alca nossa indústria seria destruída pela indústria americana, mais forte e mais competitiva que a nossa. Ele preferia ampliar os laços econômicos e comerciais com a China, um país não-hegemônico, não-imperialista, em desenvolvimento como o Brasil, e interessado, como o Brasil, em desmantelar a arrogância imperial e criar uma "ordem internacional mais democrática".
Pois é, deu no que deu: os empresários brasileiros reclamam hoje que os competidores chineses estão desmantelando a indústria nacional. Que coisa triste!
Em lugar de reclamar com a "presidenta", eles deviam reclamar com o ex-presidente, com o ex-chanceler, com o ex-SG-MRE. Foram eles que permitiram isso...
Bem, essas eram apenas reflexões ao léu.
Paulo Roberto de Almeida
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