Vejamos: quando existem fricções comerciais entre os países (não confundir com ficções, que também existem, e é, aliás, o título de uma excelente coleção de ensaios daquele escritor maior que vem da terra que eu quero falar, que é o Borges), quando existem desavenças, enfim, o que fazem os países: apelam para os mecanismos de solução de controvérsias, que existem em todos acordos comerciais.
Existe no Mercosul, existia no Gatt, agora na OMC, inclusive de forma mais elaborada, rápida, completa e eficiente (enfim, pode demorar um ano ou dois, mas um dia vem a solução, embora nunca se saiba se ela vai ser ou não aplicada).
Assim fez o Brasil no passado, com este nosso recalcitrante vizinho: apelou para o sistema do Mercosul e ganhamos a causa. A Argentina não cumpriu? Não tem problema, apelamos para a OMC, e ganhamos novamente e ela finalmente cedeu, embora não inteiramente.
Deve-se considerar, também, o ridículo da situação: dois membros do mesmo bloco, em disputa, que não deveria existir, já que teoricamente partes da mesma zona de livre comércio. O absurdo é ter de chegar na OMC pois o membro, que sequer deveria colocar obstáculos intra-bloco, se recusa a aplicar a decisão do panel arbitral do próprio bloco.
Os outros membros da OMC devem ter achado aquilo muito estranho, muito bizarro, surrealista mesmo, e devem ter pensado: "esses latinos, não conseguem se entender nem dentro do mesmo bloco??!!"
Passons...
Isso, foi no ancien régime tucanês, quando o governo defendia os interesses nacionais e os brios da nossa indústria. No nouveau régime do nunca antes nunca mais se viu a defesa dos nossos interesses, mas complacência e leniência com todos os abusos argentinos.
Abaixo, uma coleção de casos, tirados da imprensa desta terça-feira, 15/05/2012, que eu não hesito em chamar de "machismo comercial", que é o oposto do que deveríamos fazer. O que deveríamos fazer?
Ora, bolas, desde 2003,pelo menos, ter acionado o mecanismo de solução de controvérsias, o que nunca fizemos.
E depois, se a Argentina não cumprisse?
Bem, passar novamente o ridículo de levar o caso para a OMC.
Isso é o que um governo normalmente constituído deveria fazer.
E se a Argentina não cumprisse ainda assim?
Acho que ficaria chato, para ela, passar vergonha aos olhos do mundo...
Mas, será que essas retaliações vão ajudar em algo?
Claro que não: não estamos importando da Argentina para fazer favor aos seus produtores, e sim porque são produtos bons a preços razoáveis.
Essas medidas vão ajudar em algo? Provavelmente não: apenas vão deixar nossos compradores sem produtos...
Enfim, machismo comercial é isso mesmo.
Nunca antes...
Paulo Roberto de Almeida
País
também restringe entrada de trigo, maçã e batata em retaliação a obstáculos que
vizinho impôs a importações
Ingresso
de produtos agora precisa de autorização que pode levar até 60 dias para ser
concedida
MAELI
PRADO, DE BRASÍLIA
Como
retaliação às barreiras comerciais impostas pela Argentina em fevereiro a
importados, o Brasil vem restringindo, há uma semana, a entrada de cerca de dez
produtos perecíveis, entre eles vinhos e farinha de trigo.
A
Folha apurou que a lista, que inclui também maçã, batata e queijos, representa,
ao lado de automóveis, boa parte da pauta de exportações do vizinho para o
Brasil.
Desde
a terça passada, esses produtos entraram em licença não automática -ou seja,
para ingressarem no Brasil, precisam de uma autorização que pode levar até 60
dias para ser concedida.
Essa
espécie de "operação-padrão" das importações vale para todos os
países, mas o foco são produtos que a Argentina tradicionalmente exporta para o
Brasil.
Tanto
que algumas empresas brasileiras, segundo a Folha apurou, já estão tendo
dificuldade de entrar no país com mercadorias compradas da Argentina.
Apesar
de o governo preferir não se manifestar sobre o assunto, a decisão é claramente
uma resposta à queda de quase 30% das vendas de produtos brasileiros para o
país vizinho em abril na comparação com o mesmo período de 2011.
Há
mais de três meses, os importadores argentinos precisam pedir permissão
antecipada, esperar pela aprovação (que pode não ocorrer) e somente então ter
acesso à compra. O objetivo é proteger a produção da indústria local, e, no
caso do Brasil, o impacto se fez sentir com mais força no mês passado.
Hoje,
o chanceler argentino, Héctor Timerman, estará no Itamaraty para conversa com o ministro das Relações Exteriores
brasileiro, Antonio Patriota.
A
reunião acontecerá "no contexto de encontros periódicos entre altas
autoridades dos dois países", segundo a assessoria de imprensa do
ministério, mas o conflito comercial deve entrar na pauta.
CRÉDITO
No
início deste mês, durante a divulgação dos números da balança comercial de
abril, o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Comércio e
Indústria, Alessandro Teixeira, afirmou que o Brasil estuda financiar os
importadores argentinos de produtos brasileiros.
O
montante que pode ser oferecido como crédito chegaria a US$ 5,8 bilhões, que é
o valor do saldo positivo do Brasil com o vizinho em 2011.
Segundo
disse Teixeira na ocasião, a possibilidade deveria ser debatida em reunião em
Brasília neste mês.
"A
Argentina tem uma situação econômica difícil, e não os vemos como inimigos, e
sim como parceiros. Em vez de medidas punitivas, vamos sentar para ver no que
podemos auxiliar. A economia argentina pode estar tendo dificuldade para
financiar suas compras."
Em reação a
protecionismo do país vizinho, governo dificulta entrada de alimentos, para
forçar revisão de medidas
Martha Beck / Eliane
Oliveira - BRASÍLIA
Sem alarde, o
Brasil começou a retaliar a Argentina e, desde terça-feira, está aplicando o
chamado licenciamento não automático na entrada de pelo menos uma dezena de
alimentos importados por empresas brasileiras do país vizinho. Entre os
produtos parados na fronteira estão maçã, uva- passa, batata, farinha de trigo
e vinho. Segundo técnicos do governo, a ideia de barrar produtos perecíveis faz
parte da estratégia para forçar os argentinos a reverem as ações protecionistas
que vêm sendo adotadas contra o Brasil.
- Produtos
duráveis podem aguardar a liberação por dias ou meses. Já alimentos provocam
mais reclamação - admitiu um técnico.
Somados esses
produtos a outros que já estavam sob esse regime, como automóveis, o peso dos
itens com licenciamento não automático na pauta de exportações da Argentina
para o Brasil passa a ser significativo. Técnicos do governo estimam que as
restrições poderão atingir de 60% a 70% da pauta. Há, ainda, um aspecto
simbólico, que é a restrição a produtos como a maçã argentina, que tem grande
aceitação no Brasil.
Desde o início do
ano, o governo argentino tem fechado seu mercado e exigido que empresários
daquele país apresentem uma declaração antecipada de importação (que torna o
processo mais burocrático) ao comprarem bens de consumo. Na prática, isso
dificulta a entrada das mercadorias brasileiras em seu território. Embora o
Brasil venha tentando negociar a suspensão dessas medidas, a avaliação é que
houve pouco avanço.
- A maior
evidência é que nossas vendas para o mercado argentino têm caído fortemente -
destacou o técnico.
Além dos
problemas que atingem os bens industrializados produzidos no Brasil, devido à
imposição de barreiras protecionistas, questões específicas ligadas a produtos
primários ou básicos irritam o governo brasileiro. Uma delas diz respeito à
carne suína. Os argentinos impuseram cotas de importação, e nem os apelos do
ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, que chegou a viajar a Buenos Aires
tentar resolver o problema, sensibilizaram as autoridades argentinas.
Chanceleres
tentam costurar acordo
Para se ter ideia
de quão fechado está o mercado argentino, as exportações para o país vizinho
subiram 5,04% em fevereiro; em março, o quadro mudou e foi registrada uma queda
de 18,8%; já em abril, as vendas despencaram 27,1%.
- A situação é
grave e requer uma atitude mais enérgica. Não dá para continuar relevando -
disse uma fonte do governo.
Ao longo do fim
de semana, técnicos do governo brasileiro tentaram negociar com a Argentina um
acordo para acabar com as resistências de ambos os lados no comércio bilateral,
mas nenhum avanço foi obtido. O assunto voltará a ser debatido hoje, quando o
ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota,
se reúne com o chanceler argentino, Hector Timmermann, no Palácio do Itamaraty.
Embora o
Ministério das Relações Exteriores tente separar as relações comerciais das
diplomáticas, é inegável que o crescimento do protecionismo por parte da
Argentina prejudica o diálogo.
No último
relatório divulgado pelo Global Trade Alert (GTA), coordenado pelo Centro de
Pesquisa em Política Econômica (CEPR, na sigla em inglês), o país vizinho
aparece no topo de um ranking de nações que estão impondo barreiras aos
produtos estrangeiros para proteger o mercado interno. O relatório alerta que o
grande desafio para o comércio mundial em 2012 é administrar esse cenário, após
um aumento expressivo de iniciativas protecionistas em várias partes do mundo,
em 2011.
De acordo com o
documento do GTA, a União Europeia se mantém como a região que mais aplica
medidas restritivas (242), seguida por Rússia (112) e Argentina (111). O Brasil
aparece em 9º lugar, com 49 registros.
Para pressionar o
governo argentino a reduzir barreiras, alfândega passou a exigir licença para
vinho, farinha de trigo, maçã e batata, entre outros
Raquel Landim
O Brasil está
dificultando a entrada de alguns tipos de alimentos e bebidas vindos da
Argentina. É uma tentativa de pressionar o governo do país vizinho e sócio do
Mercosul a reduzir as barreiras sofridas pelos produtos brasileiros no mercado
argentino. Na terça-feira da semana pas- sada, a aduana brasileira passou a
exigir licença de importação para pelo menos dez novos produtos, como vinho,
farinha de trigo, maçã, batata e uva-passa. Esse tipo de medida é conhecida
como licenciamento não automático de importação. A medida vale para mercadorias
vindas de qualquer lugar do mundo, mas os produtos foram escolhidos a dedo para
incomodar os produtores argentinos. Procurado pelo Estado, o Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior não comentou o assunto.
As barreiras
argentinas estão provocando prejuízo expressivo para os exportadores
brasileiros. Em abril, as vendas do Brasil para a Argentina caíram 27% em
relação ao mesmo mês de 2011. O resultado aborreceu o governo brasileiro,
porque ajudou a piorar o desempenho das exportações, que já sofrem com a queda
do preço das commodities, a crise na Europa e a desaceleração na China. Além
das licenças não automáticas, que vêm sendo largamente utilizadas, a Argentina
passou a exigir no início de fevereiro que as empresas entreguem uma
“declaração juramentada antecipada de importação”. Depois de entregar o
documento, os importadores devem aguardar uma autorização para trazer o
produto. A medida provocou desabastecimento de alguns produtos, como
eletrodomésticos, nas cidades argentinas. A maior preocupação do governo da
presidente Cristina Kirchner, no entanto, é com a saída de dólares do país e o
rombo na conta-corrente.
Reação. Não é a
primeira vez que o Brasil tenta reagir às barreiras argentinas burocratizando a
entrada de produtos. Em maio de 2011, o País colocou os carros em licenciamento
não automático e chegou a barrar veículos argentinos na fronteira entre os dois
países. Como os carros representam a maior parte do comércio entre Brasil e
Argentina, a medida quase provocou uma crise diplomática e foi resolvida após a
interferência das chancelarias dos dois países. Desde então, o Brasil tem evitado
um confronto direto com a Argentina. Os veículos continuam em licenciamento não
automático, mas o Brasil respeita o prazo de 60 dias estabelecido pela
Organização Mundial de Comércio (OMC) e os empresários dos dois lados da
fronteira já se acostumaram com os novos prazos.
Em outubro do ano
passado, foi a vez de chocolates, balas e confeitos entrarem em licenciamento
não automático na aduana brasileira. A medida prejudicou grandes fabricantes
argentinos, mas não chegou a mobilizar o governo Kirchner. O governo brasileiro
também não comentou oficialmente a barreira Agora os produtos afetados mais
importantes são o vinho e a farinha de trigo. Segundo Ciro Lilla,
vice-presidente de vinhos da Associação Brasileira de Bebidas, que representa
os importadores, os vinhos têm entrado e
saído de licenciamento não automático desde o ano passado. “Ninguém sabe qual é
o critério para colocar ou tirar o vinho do licenciamento. Estamos escaldados e
os importadores fazem algum estoque para momentos como esse”, disse Lilla. Em
2011, a Argentina exportou US$ 63,4 milhões em vinhos ao Brasil, 18% mais que
em 2010 e o equivalente a 1,94 milhão de caixas. No caso da farinha de trigo, a
maior parte dos embarques é feita no primeiro trimestre, após a colheita do
produto na Argentina. / COLABOROU ARIEL PALACIOS
Encontro
O secretário de Comércio
Interno da Argentina, Guilhermo Moreno, e o chanceler Héctor Pimerman estarão
em Brasília no Itamaraty. Moreno
esteve em São Paulo na semana passada.
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