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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 27 de maio de 2012

A Grande Divergencia: debate sobre as novas desigualdades sociais

A "grande divergência" é o termo usado pelos historiadores econômicos para referir-se ao distanciamento crescente de renda entre os países que empreenderam a revolução industrial e os que ficaram para trás, colônias, dependentes, periféricos em geral. Enfim, entre a Europa ocidental e a América do Norte (e mais os offshots ocidentais em alguns pontos do sul) e o resto do mundo, numa conjuntura histórica que se estende de meados do século XVIII ao último quinto do século XX, quando essa divergência começa a diminuir em função do crescimento mais rápido da periferia.
Este é também o título do livro comentado abaixo de um jornalista americano sobre a crescente divergência de renda pessoal entre os muitos ricos dos países já avançados e o resto da sociedade, processo que discrepa da "convergência" observada no curso do século XX, que havia visto a formação de uma vasta classe média e um estreitamento das disparidades de renda. Esse é o quadro da discussão.
Permito-me, antes de postar a matéria, comentar de minha parte.


É costume dos contemporâneos, em QUALQUER ÉPOCA, tomar os fatos e processos de seu universo de observação, como dados imutáveis, permanentes ou absolutamente incontornáveis, e a partir daí formular previsões quanto ao futuro, e até construir teorias em torno disso. 
É comum, também, que uma ou duas gerações mais adiante, essas previsões e teorias sejam desmentidas pelos fatos, processos, tendências que CORRIGIRAM o curso anterior, e resultaram, portanto, em situações e realidades bem diversas daquelas antes antevistas ou determinadas.
Todos caem nessa armadilha do "presentismo", inclusive os mais finos observadores da realidade, que não são exatamente os jornalistas, mas os acadêmicos, que costumam fundamentar suas previsões com base em análises extensas do passado, séries estatísticas, e o que mais...
Em outros termos, o que esse jornalista diz pode não se revelar verdade dentro de mais algum tempo, ou seja, as desigualdades crescentes HOJE podem ser eliminadas ou revertidas em algum momento do FUTURO.
Tomar, inclusive, o que disseram Marx e Kuznets como a verdade absoluta pode ser um erro, mesmo na perspectiva deles, naquele momento.
A sociedade anterior, eminentemente agrícola, era muito mais desigual do que a sociedade capitalista, mesmo a da exploração desavergonhada de operários nas fábricas inglesas do século XIX. Esses operários dispunham, provavelmente, de uma situação de vida prospectivamente melhor do que a dos camponeses que eles eram, anteriormente, ou seus antecessores e contemporâneos que permaneceram no campo.
Ou seja, afirmar que o capitalismo, em seu início provocou mais desigualdade é algo arriscado, dada a precariedade de informações e dados fiáveis para comparar situações de bem-estar.
Por outro lado, é um fato que a sociedade se tornou mais equitativa, no século XX, tanto pela ação do mercado -- ou seja, educação e qualificação profissional mais aperfeiçoadas, o que melhora a renda -- como pela ação do Estado, com a tributação progressiva (e o redistribuvismo que isso permite, geralmente pela via dos serviços públicos que diminuem as desigualdades de oportunidade).
É também um fato que a desigualdade entre pessoas está aumentando na fase atual, devido à maior remuneração do capital e à transmissão de heranças e patrimônios entre familiares já no topo da escala: as rendas do capital tendem a ser maiores do que os ganhos do trabalho.
Mas, é também um fato que o capitalismo, sendo um mecanismo remunerador de mercado, favorece a emergência de novas riquezas, desde que apoiadas em boa educação e capacidade de inovação, como nos demonstram as dezenas, talvez centenas de "dot.com" surgidas com estudantes e imigrantes empreendedores, que se tornam bilionários em poucos anos. 
Será, então, que a relativa estagnação da classe média nas últimas décadas não é o resultado de um comportamento atentista, tendente a esperar que o Estado faça, por ela e para ela, a redistribuição de renda que uma mentalidade socialdemocrata se acostumou a pregar desde a Segunda Guerra (e conseguiu impor na maior parte dos países)?
Pode ser: eu pessoalmente tendo a atribuir responsabilidade aos próprios indivíduos pelos seus destinos e itinerários de vida. Nunca esperaria que o Estado me "dê" alguma coisa. Se eu quisesse ficar rico, sei que nunca poderia sê-lo como funcionário público -- embora alguns "conseguem", mas não creio que seja pelas boas vias -- e sim empreendendo meus próprios negócios em nichos de mercado remuneradores (no caso do Brasil atual, o agronegócio, por exemplo).
E quem pode dizer que a tendência atual ao aumento das desigualdades vai se manter indefinidamente, ou até levar, como dramatiza o autor, a uma possível "quebra da democracia" nos EUA? Acho isso totalmente incerto.
Podem ocorrer duas coisas: novas tendências de mercado e de formação profissional (educação especializada) ou de novas políticas públicas que levem, conjuntamente, separadamente, concorrentemente, ou até de forma não convergente, a essa mesma redução.
Não considero dramático esse aumento atual das desigualdades, nos EUA, na China, ou até na Europa (onde só a França escapou das tendências inegualitárias das últimas décadas, e por isso mesmo pode estar sendo levado a menor dinamismo social), inclusive porque os ricos, os bilionários e os extremamente ricos não vão fugir para outro planeta e sempre vão torrar o seu dinheiro aqui mesmo. Seja que eles vão usar esse dinheiro para investir e ficar ainda mais ricos -- e portanto produzir emprego e renda a sua volta -- seja que eles vão usar para consumo conspícuo -- chateaux, iates, festas, etc. -- e ainda assim vão consumir serviços do que lhes servirão essas amenidades.
Por acaso a classe média "empobrecida" (apenas relativamente, deve-se dizer, pois vive melhor, mais longamente e com mais serviços e produtos do que a classe média dos seus pais e avós) vai desaparecer ou ser condenada a diminuir seus padrões? Duvido; só ficarão em má postura os muito preguiçosos, ou seja, aqueles que acham que só podem trabalhar na mesma profissão a vida inteira, e que o Estado deve prover-lhes emprego e renda, se por acaso a fatalidade do emprego eterno não acontece...
Resumindo: o mais importante que o Estado pode fazer, agora e sempre, é preocupar-se com as melhores condições para que as pessoas possam trabalhar, investir, ganhar, ficar ricas, ou seja, dar oportunidades mais ou menos iguais a todos, pela educação de base, universal (não a especializada que acho deve ficar sob responsabilidade e A CARGO de cada um); não acho que o Estado deva ficar descobrindo novas maneiras de tirar dos ricos para "dar" aos "pobres" (com os seus mandarins ficando com uma boa parte no caminho...). Essa é a pior maneira de construir uma sociedade próspera.
Como já disse alguém, o socialismo dura enquanto durar o dinheiro dos outros. Acho que já somos grandes para viver de ilusões.
À leitura, agora...
Paulo Roberto de Almeida 


Minding the Gap

‘The Great Divergence,’ by Timothy Noah


Writing in the middle of the 19th century, Karl Marx predicted that the gulf between the newly rich and the miserable urban poor, made much worse by the Industrial Revolution, would continue to widen indefinitely. This ever greater disparity, he thought, would ultimately undermine capitalism. Marx turned out to be wrong. Income inequality in Britain (and, from what we can tell, elsewhere in Europe too) began to narrow after the 1860s, and inequality in wealth peaked by the time of World War I. In America, inequality in both incomes and wealth began to lessen after the 1920s. The rich continued to live far better than the poor, but over the next 50 years the gap between them narrowed ­substantially.
Illustration by Thomas Porostocky

THE GREAT DIVERGENCE

America’s Growing Inequality Crisis and What We Can Do About It
By Timothy Noah
Illustrated. 264 pp. Bloomsbury Press. $25.
Writing in the middle of the 20th century, the American economist (and future Nobel laureate) Simon Kuznets extrapolated into the indefinite future this newer trend toward more equal incomes and living standards — at least for the advanced economies. He theorized that while the initial ­stages of industrialization caused inequality to increase, and would do so whenever new economies industrialized, further economic development would foster ever greater equality. Alas, Kuznets turned out to be wrong too. The gap between rich and poor has been growing for the past 30 years in most of the world’s advanced economies, and especially in the United States.
Modern economists have learned from Marx’s and Kuznets’s mistakes. Like Kuznets, they see widening or narrowing inequality as the cumulative outcome of several different influences, some pushing the rich and the poor apart and some drawing them closer together. But instead of assuming that the tug of war between those opposing forces is automatically decided by an economy’s stage of development, today’s thinking seeks to understand what makes each influence stronger or weaker. And part of the object is to search out ways for public policy to affect the balance, instead of viewing the overall outcome as predetermined.
In “The Great Divergence,” the journalist Timothy Noah gives us as fair and comprehensive a summary as we are likely to get of what economists have learned about our growing inequality. Noah is concerned about why inequality has widened so markedly over the last three to four decades, what it means for American society and what the country can — and, he argues, urgently should — do about it. As he makes clear, what has mostly grown is the gap between those at the top and those in the middle. As a result, his book resonates more with the recent focus on “the 1 percent” than with more traditional concerns about poverty.
The principal influences on inequality that Noah examines include the failure of America’s schools to keep pace with the step-up in skills that advancing technology demands from our labor force; America’s skewed immigration policy, which inadvertently brings in more unskilled than skilled immigrants and thereby subjects already lower-income workers to greater competition for jobs; rising competition with China, India and other low-wage countries, as changing technology enables Americans to buy ever more goods and even services produced overseas; the failure of the federally mandated minimum wage to keep up with inflation; the decline of labor unions, especially among employees of private-sector firms; and what he sees as an anti-worker and anti-poor attitude among American politicians in general and Republicans in particular. Along the way, he enlivens what might otherwise be a dry recounting of research findings with fast-paced historical vignettes featuring colorful characters like the novelist Horatio Alger, the labor leader Walter Reuther and the business lobbyist Bryce Harlow.
What’s to blame, then, for America’s widening inequality? Leaving aside the politicians, Noah reviews economic research supporting the familiar hypotheses. Indeed, each of them is probably part of the explanation. But the goal of research in a policy-oriented inquiry like this one is quantitative — establishing just how much of the explanation to assign to separate influences one by one, even if all of them contribute to the story. We want not merely to portion out the blame but to know what to do, and different explanations call for different remedies. It would make little sense, for example, to invest huge sums in reforming K-12 education and reducing the cost of college if the mismatch between graduates’ skills and what the economy requires accounts for only a small part of the problem. By contrast, if my Harvard colleagues Claudia Goldin and Lawrence Katz are right that education is the core of the issue (Noah draws extensively on their recent research, especially their aptly titled book “The Race Between Education and Technology”), then what and how we teach young Americans should be at the top of the agenda.

It is not Noah’s fault that economic research has yet to reach consensus on how much of the blame for inequality to place on which explanation, and it is to his credit that he does not try to portray a consensus that is not there. His summary of what we know from the relevant research is faithful to what the researchers have found. Part of the problem here, which “The Great Divergence” also ­accurately conveys, is the tension inherent in concentrating on the American facet of a worldwide phenomenon. As Noah makes clear, inequality is increasing almost everywhere in the industrialized and postindustrial world, even if the increase has been much greater in the United States. We need to know how much weight to give to America-centric explanations like the shortcomings of our schools or our immigration system or the demise of unions. But to understand a global trend, we would like a more ­universal explanation.

THE GREAT DIVERGENCE

America’s Growing Inequality Crisis and What We Can Do About It
By Timothy Noah
Illustrated. 264 pp. Bloomsbury Press. $25.
Noah’s own explanation is, in effect, “all of the above,” and his policy recommendation is therefore to take action on all fronts. His chief concern is the fear that ever widening inequality will undermine our democracy: “Americans believe fervently in the value of social equality, and social equality is at risk when incomes become too dramatically unequal. . . . Growing income inequality makes it especially difficult to maintain any spirit of e pluribus unum.” He rightly emphasizes that while the potential for individuals to move up is essential to what makes inequality acceptable, at least to most Americans, economic mobility in the United States is now more limited than it appears to have been in earlier times and — contrary to the popular image — more limited than in many other countries. (It also matters that in America today incomes are becoming more unequal at the same time that most families’ incomes have been stagnant for more than a decade after allowing for inflation — a point that Noah notes but does not emphasize.)
How much inequality can the Republic stand before the social and political fabric frays? Noah does not answer the question, in part because he doesn’t know, but mostly because he feels he doesn’t need to. “You’d have to be blind,” he writes, “not to see that we are headed in the wrong direction, and we’ve been heading that way for too long. . . . The worst thing we could do to the Great Divergence is get used to it.”

Benjamin M. Friedman is an economics professor at Harvard. His most recent book is “The Moral Consequences of Economic Growth.”
A version of this review appeared in print on May 27, 2012, on page BR1 of the Sunday Book Review with the headline: Market Values.

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