Este é também o título do livro comentado abaixo de um jornalista americano sobre a crescente divergência de renda pessoal entre os muitos ricos dos países já avançados e o resto da sociedade, processo que discrepa da "convergência" observada no curso do século XX, que havia visto a formação de uma vasta classe média e um estreitamento das disparidades de renda. Esse é o quadro da discussão.
Permito-me, antes de postar a matéria, comentar de minha parte.
É costume dos contemporâneos, em QUALQUER ÉPOCA, tomar os fatos e processos de seu universo de observação, como dados imutáveis, permanentes ou absolutamente incontornáveis, e a partir daí formular previsões quanto ao futuro, e até construir teorias em torno disso.
É comum, também, que uma ou duas gerações mais adiante, essas previsões e teorias sejam desmentidas pelos fatos, processos, tendências que CORRIGIRAM o curso anterior, e resultaram, portanto, em situações e realidades bem diversas daquelas antes antevistas ou determinadas.
Todos caem nessa armadilha do "presentismo", inclusive os mais finos observadores da realidade, que não são exatamente os jornalistas, mas os acadêmicos, que costumam fundamentar suas previsões com base em análises extensas do passado, séries estatísticas, e o que mais...
Em outros termos, o que esse jornalista diz pode não se revelar verdade dentro de mais algum tempo, ou seja, as desigualdades crescentes HOJE podem ser eliminadas ou revertidas em algum momento do FUTURO.
Tomar, inclusive, o que disseram Marx e Kuznets como a verdade absoluta pode ser um erro, mesmo na perspectiva deles, naquele momento.
A sociedade anterior, eminentemente agrícola, era muito mais desigual do que a sociedade capitalista, mesmo a da exploração desavergonhada de operários nas fábricas inglesas do século XIX. Esses operários dispunham, provavelmente, de uma situação de vida prospectivamente melhor do que a dos camponeses que eles eram, anteriormente, ou seus antecessores e contemporâneos que permaneceram no campo.
Ou seja, afirmar que o capitalismo, em seu início provocou mais desigualdade é algo arriscado, dada a precariedade de informações e dados fiáveis para comparar situações de bem-estar.
Por outro lado, é um fato que a sociedade se tornou mais equitativa, no século XX, tanto pela ação do mercado -- ou seja, educação e qualificação profissional mais aperfeiçoadas, o que melhora a renda -- como pela ação do Estado, com a tributação progressiva (e o redistribuvismo que isso permite, geralmente pela via dos serviços públicos que diminuem as desigualdades de oportunidade).
É também um fato que a desigualdade entre pessoas está aumentando na fase atual, devido à maior remuneração do capital e à transmissão de heranças e patrimônios entre familiares já no topo da escala: as rendas do capital tendem a ser maiores do que os ganhos do trabalho.
Mas, é também um fato que o capitalismo, sendo um mecanismo remunerador de mercado, favorece a emergência de novas riquezas, desde que apoiadas em boa educação e capacidade de inovação, como nos demonstram as dezenas, talvez centenas de "dot.com" surgidas com estudantes e imigrantes empreendedores, que se tornam bilionários em poucos anos.
Será, então, que a relativa estagnação da classe média nas últimas décadas não é o resultado de um comportamento atentista, tendente a esperar que o Estado faça, por ela e para ela, a redistribuição de renda que uma mentalidade socialdemocrata se acostumou a pregar desde a Segunda Guerra (e conseguiu impor na maior parte dos países)?
Pode ser: eu pessoalmente tendo a atribuir responsabilidade aos próprios indivíduos pelos seus destinos e itinerários de vida. Nunca esperaria que o Estado me "dê" alguma coisa. Se eu quisesse ficar rico, sei que nunca poderia sê-lo como funcionário público -- embora alguns "conseguem", mas não creio que seja pelas boas vias -- e sim empreendendo meus próprios negócios em nichos de mercado remuneradores (no caso do Brasil atual, o agronegócio, por exemplo).
E quem pode dizer que a tendência atual ao aumento das desigualdades vai se manter indefinidamente, ou até levar, como dramatiza o autor, a uma possível "quebra da democracia" nos EUA? Acho isso totalmente incerto.
Podem ocorrer duas coisas: novas tendências de mercado e de formação profissional (educação especializada) ou de novas políticas públicas que levem, conjuntamente, separadamente, concorrentemente, ou até de forma não convergente, a essa mesma redução.
Não considero dramático esse aumento atual das desigualdades, nos EUA, na China, ou até na Europa (onde só a França escapou das tendências inegualitárias das últimas décadas, e por isso mesmo pode estar sendo levado a menor dinamismo social), inclusive porque os ricos, os bilionários e os extremamente ricos não vão fugir para outro planeta e sempre vão torrar o seu dinheiro aqui mesmo. Seja que eles vão usar esse dinheiro para investir e ficar ainda mais ricos -- e portanto produzir emprego e renda a sua volta -- seja que eles vão usar para consumo conspícuo -- chateaux, iates, festas, etc. -- e ainda assim vão consumir serviços do que lhes servirão essas amenidades.
Por acaso a classe média "empobrecida" (apenas relativamente, deve-se dizer, pois vive melhor, mais longamente e com mais serviços e produtos do que a classe média dos seus pais e avós) vai desaparecer ou ser condenada a diminuir seus padrões? Duvido; só ficarão em má postura os muito preguiçosos, ou seja, aqueles que acham que só podem trabalhar na mesma profissão a vida inteira, e que o Estado deve prover-lhes emprego e renda, se por acaso a fatalidade do emprego eterno não acontece...
Resumindo: o mais importante que o Estado pode fazer, agora e sempre, é preocupar-se com as melhores condições para que as pessoas possam trabalhar, investir, ganhar, ficar ricas, ou seja, dar oportunidades mais ou menos iguais a todos, pela educação de base, universal (não a especializada que acho deve ficar sob responsabilidade e A CARGO de cada um); não acho que o Estado deva ficar descobrindo novas maneiras de tirar dos ricos para "dar" aos "pobres" (com os seus mandarins ficando com uma boa parte no caminho...). Essa é a pior maneira de construir uma sociedade próspera.
Como já disse alguém, o socialismo dura enquanto durar o dinheiro dos outros. Acho que já somos grandes para viver de ilusões.
À leitura, agora...
Paulo Roberto de Almeida
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