Eu suspeito que os brasileiros, cidadãos em geral, burocratas e homens públicos em particular, amam o capital estrangeiro, precisam do capital estrangeiro, valorizam o capital estrangeiro, mas odeiam, detestam, abominam os capitalistas estrangeiros, ou seja, as pessoas que costumam vir juntas com o capital estrangeiro.
Estranho não é?
Mas é assim.
A matéria abaixo é um perfeito retrato disso.
Não se trata apenas dos companheiros, mas de simples procuradores, funcionários de agências públicas e outros mandarins da República: o capital estrangeiro pode até vir, mas o capitalista será odiado e penalizado até onde isso for possível.
Contraditório, não é?
Pois o Brasil é assim...
Paulo Roberto de Almeida
A guerra contra o Brasil
Sérgio Malbergier
Tribuna da Bahia, 21/05/2012
A importante revista de negócios americana “Bloomberg Businessweek” estampou em letras garrafais na sua capa da semana passada a manchete: “A guerra do Brasil contra as grandes petroleiras”.
A extensa reportagem relata os desdobramentos do vazamento de petróleo de um campo operado pela Chevron na Bacia de Campos, em novembro passado.
“Não houve feridos, peixes contaminados, tartarugas mortas ou petróleo na costa”, diz a reportagem, mostrando o estupor do setor com a reação do Ministério Público, das autoridades brasileiras e da imprensa ao caso: o procurador pede na Justiça mais de R$ 20 bilhões de indenização.
A capa da “Bloomberg Businessweek” é mais um claro alerta de como a visão do Brasil de queridinho do mercado global está ameaçada. Grandes investidores e analistas começam a ter restrições ao país sob a bota do neodesenvolvimentismo ou, no jargão mais internacional, do capitalismo de Estado.
Eles olham para a Petrobras, o maior cartão postal brasileiro nos mercados mundiais, mais negociada em Nova York do que em São Paulo, e veem que a prioridade da empresa é remunerar o Estado (seu controlador), e não o restante dos acionistas, e que há muitos outros fatores além da racionalidade econômica operando ali. A política industrial para o setor se mostra não só onerosa como inoperante ou retardada, basta ver a Transpetro.
E é tudo assumido. Menos culpa, que é dos outros, de preferência estrangeiros. Qual a utilidade dos recorrentes e deselegantes ataques contra a política econômica de países aliados, consumidores de nossas exportações, ou contra o mercado em geral, sem distinguir investidores e especuladores?
Mas mesmo assim ainda somos queridinhos. O Brasil foi redescoberto pelo mundo na onda emergente. O mundo começou a olhar para o Brasil e gostou do que viu.
Um país democrático, ocidental, capitalista, com enormes capacidades agrominerais e um mercado interno grande e em expansão. Nenhum dos outros emergidos tem esse mix na escala brasileira.
Essa visão benigna é um óbvio ativo, apesar da insistência de nossa diplomacia econômica de atacar aliados. É um bode irracional do capitalismo e do mercado já que foi o PT quem mais se beneficiou politicamente do avanço do capitalismo brasileiro.
Ao contrário do que os militantes de esquerda previam, o Brasil foi um dos países ganhadores do aumento da globalização. Nossas commodities são consumidas vorazmente pelo mundo, e nosso mercado e nossas empresas atraem investimentos bilionários. Até nossa moeda ficou sexy (mas isto pode estar mudando).
Há de fato tendências fantásticas no Brasil hoje —quem tem mais de 40 anos como eu entende melhor isso. Livre finalmente da ditadura, minha geração viveu a frustração econômica dos anos 1980 (PIB de 3,0% na média 1980-89), 1990 (PIB de 1,7%! na média 1990-99) e mesmo 2000 (3,3% 2000-2009). Neste século 21 fomos melhorando e culminamos no PIB de 7,5% de 2010, fechando com chave de ouro a Era Lula.
Mas desde então, as coisas acalmaram, e já há quem veja limites no crescimento do país, que não consegue fazer reformas óbvias como a tributária e reduzir o custo mais vexatório de todos, o custo que leva o nome do país, o custo Brasil.
O governo, curiosamente, prefere operar no câmbio e nos juros do que na economia real. Uma siderúrgica instalada no Rio nesta semana sinalizou que quer vender a planta por causa dos altos custos de operação no país. Uma fabricante de alumínio também pensa do mesmo jeito.
Em relação a Lula, Dilma é mais nacionalista, mais intervencionista e mais estatista. Onde Lula era sabidamente flexível e pluralista, Dilma é monolítica. Sua guerra às petroleiras estrangeiras se soma à guerra aos bancos e à guerra às políticas econômicas dos países mais desenvolvidos.
No momento em que o inevitável, incontornável, incontrolável mercado fica arisco, como hoje, é muito bom ser queridinho do mercado. O Brasil às vezes faz de tudo para perder essa boa fama. Não dá para entender. É como o Brasil ir à guerra contra o Brasil.
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