Tecnologia brasileira perderá espaço na
exploração do pré-sal
João Villaverde
O Estado de S. Paulo - 13/10/2013
Nos discursos
oficiais, a exploração e produção de petróleo e gás no campo de Libra, no pré-sal,
vai propagar uma nova onda de desenvolvimento da indústria nacional de ponta.
Porém, a Petrobrás trabalhará com critérios menos rígidos de conteúdo
sofisticado "made in Brazil".
Para evitar um recuo
político na estratégia de desenvolvimento das cadeias produtivas brasileiras,
por meio da política de conteúdo local mínimo, o governo mudou a composição dos
contratos que serão celebrados entre a União e os consórcios vencedores do
leilão previsto para o dia 21.
Itens com alto valor
tecnológico agregado perderam força, enquanto a obrigatoriedade mínima de
requisitos mais simples para a operação no pré-sal foram elevados. Ao final
dessa "contabilidade criativa", o governo conseguiu manter no
primeiro contrato de partilha do petróleo (que será firmado após o leilão de
Libra) os mesmos 37% de conteúdo local mínimo na fase de exploração e de 55% na
etapa de produção verificados nos contratos em vigor, feitos sob o regime de
concessão.
Para isso, a exigência
de "engenharia básica" nacional, que nos contratos antigos era de
50%, no pré-sal saltará a 90%. Por outro lado, o uso de "sistema de
controle submarino" nacional na etapa de coleta da produção, altamente
sofisticado, caiu de 50%, nos contratos antigos, para 20% no pré-sal
Ao analisar os dados
reunidos pelo Estado, Adriano Pires, especialista no setor de petróleo e
diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), disse que a mudança na
composição das planilhas demonstra um esforço do governo para não abrir mão da
política de incentivar o conteúdo nacional. "O governo se esforçou para
manter os números idênticos na exigência de conteúdo brasileiro, mas afrouxou
nos detalhes." De acordo com Pires, a decisão faz sentido para a
Petrobrás, que será a operadora única do bloco de Libra. "Ela precisa
explorar e produzir, e sem a obrigação de fazer com produto nacional, ela fica
menos refém de atrasos na entrega ou de itens mais caros", disse Pires.
"A política de conteúdo nacional, inaugurada pelo Lula em 2003, é
importante. Mas o governo sempre confundiu conteúdo nacional com reserva de
mercado."
Mantra. Quando
deu posse a Graça Foster na presidência da Petrobrás, em fevereiro de 2012,
Dilma Rousseff entoou o mantra de se aproveitar grandes contratos para agregar
valor à indústria nacional.
"A decisão do
presidente Lula de que as compras de navios, plataformas, sondas e equipamentos
pela Petrobrás deveriam ser orientadas por um percentual produzido no nosso
mercado interno, gerando empregos e conhecimentos no Brasil, ajudando a
consolidar setores produtivos, mostra que essa estratégia é vencedora. As
compras da Petrobrás preferencialmente no Brasil são, sem dúvida nenhuma,
vantajosas para a empresa e para o País, e traduzem à perfeição o conceito que
defendemos de uma participação das atividades da Petrobrás como indutora do
desenvolvimento de setores industriais no Brasil", disse, na ocasião.
Para Luiz Pinguelli
Rosa, professor da UFRJ e ex-presidente da Eletrobrás, que também trabalhou com
política de absorção de tecnologia para o parque industrial local, a mudança na
composição dos compromissos de conteúdo nacional é "evidente", e pode
ser resultado de um esforço do governo e da Petrobrás para "compatibilizar
as exigências normais com o quadro específico do pré-sal, onde há uma
tecnologia mais complexa envolvida na operação".
De acordo com Pinguelli,
a maior abertura para participação estrangeira no fornecimento à
Petrobrás não é algo necessariamente ruim. "Falamos de exigência mínima,
ou seja, se a cadeia produtiva brasileira for capaz de entregar,- o porcentual
será maior. Além disso, a elevação para 90% de engenharia básica brasileira é
ótima, porque sinaliza que a concepção geral da operação será feita no
País."
Uma fonte graduada do
governo afirmou ao Estado que os patamares de conteúdo local para a operação do
pré-sal foram definidos após 27 reuniões em Brasília entre a Petrobrás, que
elencou a necessidade de equipamentos e serviços que serão usados, e a cadeia
de fornecedores, que levantou a capacidade de produção total.
"O que está no contrato é
consenso entre as partes envolvidas. Quem vai comprar e quem vai vender concorda
com esses números", disse a fonte do governo.
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