Como todos sabem, não faço nenhuma concessão a acadêmicos puros, ou seja, os que vivem num mundo em que ninguém afere custos de manutenção, e todos querem viver às custas do Estado, que é pago sempre pelos mais pobres.
Já de início, percebo que vou discordar da filosofia, ainda que suas análises possam ter consistência em algumas áreas. Por isso faço desde já minhas críticas preventivas com base neste resumo de sua entrevista mais recente.
O aprofundamento do Modelo Liberal Periférico; Governo Temer aproveita “caldo de cultura” criado por FHC, Lula e Dilma
Reinaldo Gonçalves
“A questão central é quem paga os impostos. Penso que a turma da FIESP tem que pagar mais impostos. Ao mesmo tempo, o governo tem que se mostrar capaz de moralizar e racionalizar os gastos públicos”.
PRA: Quanta bobagem. Essa coisa de modelo, de qualquer tipo, é típico de acadêmicos que vivem na estratosfera. Governo NENHUM se pauta por modelos, ainda que seus responsáveis políticos e econômicos possam ter algumas ideias (e preconceitos) na cabeça. Governos, quando assumem as rédeas de um país, quando o ministro da economia senta naquela cadeira, tem primeiro de olhar os números, para saber o que dá para fazer. Se os políticos puderem aumentar os impostos sobre todos, não duvidem que eles vão fazer, pois são pagos para gastar o nosso dinheiro. Olhando os números, e olhando a base de apoio, no parlamento ou na sociedade, os governos, ou seja, os dirigentes eleitos, vão fazer aquilo que é possível fazer, dentro do que cabe fazer, com as forças de que dispõem. Essa coisa de modelo, desenvolvimentista, liberal, periférico ou não, isso é bobagem de acadêmico.
Quanto à receita, o economista delira mais uma vez. O que ele chama de turma da FIESP é apenas a parte superior da economia de mercado, os grandes capitalistas, que não são os que fornecem mais empregos e renda à sociedade, e sim os milhões de pequenos capitalistas e informais que concentram o grosso da força de trabalho, os que são ao mesmo tempo os provedores de emprego e de renda. Os grandes capitalista são inovadores e deveriam, se pudessem, criar mais riqueza, investindo mais e empregando mais. Por que eles não o fazem? Porque deixam um terço, ou mais, do que faturam para o governo, e não empregam mais porque o custo da mão-de-obra é muito elevado, com todos os penduricalhos da CLT, salário mínimo de base, etc. Ou seja, fazê-los pagar mais impostos significa simplesmente expatriar os grandes capitalistas (que são os que podem se mover) para outros lugares, onde o ambiente de negócios é mais favorável, o custo da mão-de-obra mais baixo, etc. Quanto aos demais, eles vão continuar operando como podem, muitos com trabalho informal, elidindo o fisco, etc. Quem não percebe isso só pode ser acadêmico…
Governo não tem de moralizar nenhum imposto. Tem é de cobrar o mínimo de impostos necessários para as tarefas básicas comuns — aquelas coisas clássicas do Estado, e ponto — e deixar o máximo possível com a sociedade, que saberá o que fazer com a riqueza que ela própria criou (e certamente gostaria de ter mais dinheiro, se o governo deixasse). Racionalizar gastos públicos também é a palavra errada: governo tem é de cobrar menos impostos para gastar menos.
Quanto menos dinheiro o governo arrecada, menos ele pode gastar e isso é o ideal, inclusive para não ter tanta corrupção.
Sempre vou me surpreender com a inconsciência dos acadêmicos.
Uma última recomendação: a economia brasileira é muito regulada e dirigida pelo Estado, que se encarrega de dizer quem pode e quem não pode oferecer bens e serviços para consumo privado. Em consequência, a economia é ultra-cartelizada e monopolizada. Concorrência sempre é bom, inclusive nos serviços públicos.
Uma última recomendação: as universidades públicas no Brasil são muito ruins em relação ao dinheiro que recebem do governo justamente porque são públicas, e não prestam conta do dinheiro recebido. Proponho dar-lhes total autonomia, e limitar o seu financiamento a um "mensalão básico". Elas deveriam ter um conselho de gestão independente dos professores, e conseguir dinheiro com projetos, pagando o que desejam aos seus "trabalhadores", segundo o mérito, sem isonomia, sem estabilidade de início, sem penduricalhos negociados por máfias sindicais. Trabalhadores de academia devem ser livres para vender sua força de trabalho: quem merece mais vai ganhar mais. Que tal?
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Paulo Roberto de Almeida
O aprofundamento do Modelo Liberal Periférico; Governo Temer aproveita “caldo de cultura” criado por FHC, Lula e Dilma
Entrevista especial com Reinaldo Gonçalves
Por Patricia Fachin
Instituto Humanitas Unisinos, Segunda, 06 de junho de 2016
http://ihu.unisinos.br/entrevistas/555950-o-aprofundamento-do-modelo-liberal-periferico-governo-temer-aproveita-caldo-de-cultura-criado-por-fhc-lula-e-dilma
"Calculo que o custo econômico acumulado no período 2011-18 é de 4 trilhões de dólares caso não haja o impedimento de Dilma Rousseff. O custo econômico é medido como a diferença entre a renda potencial e a renda efetiva. Nunca antes na história do país houve custo econômico tão elevado em termos absolutos e relativos.
O pacote econômico anunciado pelo governo interino de Michel Temer indica que “na essência” se trata de uma continuidade do Modelo Liberal Periférico - MLP, que vinha sendo adotado nos governos anteriores. A diferença é que “nosgovernos Lula e Dilma o MLP aparecia disfarçado de um social-liberalismo frágil, enquanto no governo Temer o MLP arreganha sua cara conservadora e liberal”, afirma Reinaldo Gonçalves em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.
Na avaliação do economista, a tentativa de reversão da crise econômica deveria de ter três focos centrais, a começar com “a contenção do aumento dodesemprego”. A prioridade número 2, afirma, “deve ser a geração de emprego. A prioridade número 3 é combater a paranoia fiscal”. Este último ponto, esclarece, “é fundamental, visto que o crescimento das exportações, a redução das importações e a substituição de importações não são capazes de recolocar a economia brasileira de volta aos trilhos do crescimento”.
Crítico das sucessivas políticas econômicas desde o governo Lula, Gonçalves pontua que “é fundamental que haja ‘emagrecimento’ do BNDES, assim como da Petrobras”, porque “a política dos campeões nacionais foi um fracasso caro e patético”. E pergunta: “Quem é campeão nacional? O grupo de mineração da megalomania empresarial? O grupo do agronegócio envolvido em dumping social e dumping ambiental? O produtor de picanha? Ou a empreiteira que só consegue operar no Brasil, Angola, Venezuela, Cuba e afins?”. Para ele, “os formuladores da estratégia dos campeões nacionais esqueceram-se de uma lição básica: para que essa estratégia dê certo é fundamental que o Estado não seja capturado pelos grupos e setores dominantes (candidatos a campeões). O problema é que houve aprofundamento e ampliação do secular sistema patrimonialista, clientelista e corrupto brasileiro nos governos do PT”.
Gonçalves também comenta as críticas feitas ao ajuste fiscal que desvincula recursos da saúde e da educação do orçamento da União, mas apesar disso, menciona, tal crítica “implica ‘murro em ponta de faca’”. E explica: “Esses analistas bem intencionados se esquecem de umas das características mais óbvias do MLP, que é a dominação financeira. Quem são as novas autoridades econômicas? Nada além de representantes, despachantes, dos grandes bancos brasileiros e internacionais. Administradores de banco e macroeconomistas criados pelos banqueiros têm, geralmente, déficit de conhecimento a respeito de questões estruturais e estratégias de desenvolvimento de longo prazo. Vale notar que a dominação financeira aumentou nos governos Lula e Dilma”.
Para, de fato, haver uma mudança, defende, “a reforma tributária é a prioridade número 1 quando se trata de instrumentos. Os focos são: moralização, racionalização e distribuição. A carga tributária brasileira é compatível com as necessidades de intervenção estatal. Não há por que diminuí-la. É preciso fazer com que os setores dominantes e os ricos paguem a conta do ajuste fiscal”.
Reinaldo Gonçalves é formado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestre em Economia pela Fundação Getulio Vargas – FGV-RJ e doutor em Letters and Social Sciences pela University of Reading, na Inglaterra. Atualmente leciona Economia Internacional na UFRJ. É autor de, entre outras obras, Economia internacional. Teoria e experiência brasileira (Rio de Janeiro: Elsevier, 2004), Economia política internacional. Fundamentos teóricos e as relações internacionais do Brasil (Rio de Janeiro: Elsevier, 2005) e Economia Política Internacional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016, edição revista e atualizada).
Confira a entrevista.
Foto: Fundação Lauro Campos |
Reinaldo Gonçalves - Pois é, já desde o governo Lula tenho alertado que o Brasil estava em uma trajetória de instabilidade que desembocaria em crise sistêmica. Lula deixou uma herança negativa para Dilma que, por seu turno, deixou uma herança calamitosa para o Brasil. Por exemplo, nos meus livros A Economia Política do Governo Lula (coautoria com Luiz Filgueiras, de 2007) e Desenvolvimento às Avessas (2013), são destacadas as questões econômicas, sociais, política, éticas e institucionais dessas heranças. O primeiro argumentava que a reversão do ciclo internacional(que, de fato, ocorreu em 2008) pegaria o Brasil com “blindagem de papel crepom” e o livro de 2013 termina prevendo crise institucional. O argumento era e continua sendo de crise sistêmica.
Esse tipo de crise envolve as dimensões acima, bem como falhas de modelo, de governo e de mercado. O Modelo Liberal Periférico introduzido no governo FHC foi aprofundado e ampliado nos governos do PT, inclusive, com as práticas clientelistas, patrimonialistas e corruptas. Falhas de governo envolvem não somente inépcia como corrupção. Falhas de mercado abarcam a dinâmica de acumulação, concentração de capital e abuso de poder econômico pelos setores dominantes (bancos, empreiteiras, mineração e agronegócio).
IHU On-Line - O Brasil dá sinais de que irá romper com o Modelo Liberal Periférico – MLP ou irá aprofundá-lo? Por quê?
Reinaldo Gonçalves - Negativo. Como parte das heranças desastrosas de Lula e Dilma há a criação do “caldo de cultura” para o maior aprofundamento do Modelo Liberal Periférico no governo Temer, cujas diretrizes são claramenteliberais e conservadoras: privatização, concessão e desregulamentação, bem como recuo da intervenção estatal nas esferas reguladora, alocativa, distributiva e estabilizadora. O governo Temer está aproveitando o calamitoso passivo fiscal criado pelos governos do PT para justificar o aprofundamento do MLP.
"Calculo que o custo econômico acumulado no período 2011-18 é de 4 trilhões de dólares caso não haja o impedimento de Dilma Rousseff. O custo econômico é medido como a diferença entre a renda potencial e a renda efetiva. Nunca antes na história do país houvecusto econômico tão elevado em termos absolutos e relativos. " |
IHU On-Line - Na atual situação de crise econômica, que medidas urgentes deveriam ser consideradas para conter a crise?
Reinaldo Gonçalves - O foco número 1 deve ser a contenção do aumento do desemprego. A prioridade número 2 deve ser a geração de emprego. A prioridade número 3 é combater a paranoia fiscal. Isso implica, naturalmente, reverter o processo de depressão que atinge a economia brasileira. Os outros desequilíbrios macroeconômicos são secundários, inclusive, no âmbito das finanças públicas, contas externas e inflação. Combater a paranoia fiscal é fundamental visto que o crescimento das exportações, a redução das importações e a substituição de importações não são capazes de recolocar a economia brasileira de volta aos trilhos do crescimento.
IHU On-Line - Como avalia o pacote de medidas econômicas anunciadas pelo governo interino? Elas indicam alguma alternativa ou apenas agravarão a crise?
Reinaldo Gonçalves - No curto prazo o pacote é inócuo. Há somente uma medida de curto prazo (extinção do fundo soberano e venda das ações do Banco do Brasil que lastreavam o fundo) que é totalmente desprezível em termos de impacto sobre as finanças públicas. A proposta de emenda constitucional que limita os gastos públicos, inclusive saúde e educação, só deve ter impacto no longo prazo. O mesmo acontece com a maior regulamentação dos fundos de pensão e das estatais e o “emagrecimento” da Petrobras (exploração do pré-sal). Talvez seja mesmo difícil recuperar recursos emprestados pelo Tesouro ao BNDES no curto prazo. Impacto mais significativo no curto e médio prazos é a redução dos subsídios e incentivos fiscais. Na medida em que o governo Temer “samba em gelo fino” e procura governabilidade, é provável que essa redução não seja significativa no curto prazo.
IHU On-Line - Esse governo parece uma continuidade do anterior ou é radicalmente diferente?
Reinaldo Gonçalves - Na essência é a mesma coisa já que continua adotando o Modelo Liberal Periférico. Entretanto, há diferenças. Nos governos Lula e Dilma o MLP aparecia disfarçado de um social-liberalismo frágil. No governoTemer o MLP arreganha sua cara conservadora e liberal. A intensidade da farsa deve diminuir no governo Temer. Há, também, a expectativa de redução da inépcia e da corrupção em relação aos governos do PT. Assim, espera-se uma redução do déficit de governança e uma interrupção dos processos de perda de governabilidade e legitimidade do Estado que foram as marcas ou cicatrizes do governo Dilma.
A expectativa é que também haja significativa redução do custo do “mau governo Dilma”. Em trabalho recente (Custo econômico do Mau Governo Dilma Rousseff), calculo que o custo econômico acumulado no período 2011-18 é de 4 trilhões de dólares caso não haja o impedimento de Dilma Rousseff. O custo econômico é medido como a diferença entre a renda potencial e a renda efetiva. Nunca antes na história do país houve custo econômico tão elevado em termos absolutos e relativos. Dilma Rousseff tem um desempenho inferior, inclusive, em relação aos casos críticos da história política brasileira. Talvez Temer faça um mau governo, porém dificilmente superará o recorde histórico de Dilma Rousseff.
"A reforma tributária é a prioridade número 1 quando se trata de instrumentos" |
IHU On-Line - Numa situação de crise econômica como a que vivemos hoje, como deveria ser elaborado o orçamento do Estado? Muitos economistas estão criticando possíveis cortes em programas sociais ou benefícios à saúde e à educação, porque o ajuste não parece levar em conta a queda da taxa de juros para diminuir o valor do déficit público. Como o senhor vê esse debate e que aspectos deveriam ser considerados no orçamento?
Reinaldo Gonçalves - Essa crítica é correta, porém implica “murro em ponta de faca”. Esses analistas bem intencionados se esquecem de umas das características mais óbvias do MLP, que é a dominação financeira. Quem são as novas autoridades econômicas? Nada além de representantes, despachantes, dos grandes bancos brasileiros e internacionais. Administradores de banco e macroeconomistas criados pelos banqueiros têm, geralmente, déficit de conhecimento a respeito de questões estruturais e estratégias de desenvolvimento de longo prazo. Vale notar que adominação financeira aumentou nos governos Lula e Dilma. A evidência empírica é conclusiva quando são analisadas variáveis como o diferencial de taxas de lucros dos bancos e das empresas em outros setores e o diferencial de crescimento dos ativos e do patrimônio dos grandes bancos privados em relação às grandes empresas do país.
IHU On-Line - Ainda no sentido da questão anterior, que medidas o governo interino poderia ter adotado e não adotou neste momento? Seria possível adotar outra medida, dado o déficit de 170 bilhões?
Reinaldo Gonçalves - A reforma tributária é a prioridade número 1 quando se trata de instrumentos. Os focos são: moralização, racionalização e distribuição. A carga tributária brasileira é compatível com as necessidades de intervenção estatal. Não há por que diminuí-la. É preciso fazer com que os setores dominantes e os ricos paguem a conta do ajuste fiscal. A má alocação dos recursos públicos beneficiou, principalmente, os setores dominantes e seus associados que foram gestores públicos. Para ilustrar, o superfaturamento da refinaria pernambucana da Petrobrascobre vários anos de Bolsa Família. O mesmo acontece com os subsídios dados aos grandes grupos econômicos, principalmente no setor primário-exportador.
IHU On-Line - Os aportes do Tesouro ao BNDES nos últimos anos foram criticados por aqueles que viam nisso uma tentativa de financiar grandes campeões, a exemplo da Friboi e da JBS. Vislumbra alguma mudança na atuação do BNDES nesta nova gestão? Em que sentido?
Reinaldo Gonçalves - É fundamental que haja o “emagrecimento” do BNDES, assim como da Petrobras. A política doscampeões nacionais foi um fracasso caro e patético. Quem é campeão nacional? O grupo de mineração da megalomania empresarial? O grupo do agronegócio envolvido em dumping social e dumping ambiental? O produtor de picanha? Ou a empreiteira que só consegue operar no Brasil, Angola, Venezuela, Cuba e afins? Os formuladores da estratégia dos campeões nacionais esqueceram-se de uma lição básica: para que essa estratégia dê certo é fundamental que o Estado não seja capturado pelos grupos e setores dominantes (candidatos a campeões).
O problema é que houve aprofundamento e ampliação do secular sistema patrimonialista, clientelista e corrupto brasileiro nos governos do PT. Isso, inevitavelmente, leva ao fracasso da estratégia dos campeões nacionais com a seleção adversa já que os “escolhidos” são, geralmente, grandes operadores desse sistema. O novo presidente da Petrobras, no discurso de posse, resume com perfeição a realidade brasileira: “crimes foram praticados por pessoas que se valeram de seus cargos para sustentar seus projetos pessoais de riqueza e de poder”, mascarados por triunfalismo e hipocrisia.
IHU On-Line - Vê possibilidade de a taxa de juros começar a cair nos próximos meses?
Reinaldo Gonçalves - Dificilmente. Há o cenário de aumento da taxa de juro norte-americana. Há, também, a resiliência da queda da inflação. Ademais, não se esqueçam de que os despachantes dos bancos ocupam cargos-chaves na área econômica. A queda do lucro das atividades reais deve ser compensada pelos lucros financeiros para que os ricos fiquem tranquilos em uma conjuntura de recessão profunda.
IHU On-Line - Como interpreta a notícia divulgada de que a Câmara aprovou 58 bilhões de reajustes para funcionários públicos? Como analisa essa decisão em meio à crise econômica?
Reinaldo Gonçalves - Essa é uma notícia positiva, pois significa que a paranoia fiscal não contaminou totalmente ogoverno Temer. Ajuste fiscal não pode significar cortes drásticos de despesas. A FIESP e seus associados estão equivocados quando se posicionam contrariamente ao aumento dos impostos. A questão central é quem paga os impostos. Penso que a turma da FIESP tem que pagar mais impostos. Ao mesmo tempo, o governo tem que se mostrar capaz de moralizar e racionalizar os gastos públicos.
Aumentar o salário nominal de funcionários públicos contribui para a maior eficácia do Estado e, ao mesmo tempo, é fonte de expansão da demanda agregada e, portanto, de aumento do investimento e do emprego. Aqui não se trata de subsídios fiscais para empresários incompetentes, corruptos, corruptores e financiadores de campanha de políticos igualmente incompetentes, corruptos e corruptores. Trata-se, sim, do reajuste salarial de funcionários de órgãos públicos com filtros meritocráticos.
"Quem são as novas autoridades econômicas? Nada além de representantes, despachantes, dos grandes bancos brasileiros e internacionais" |
IHU On-Line - Que mudanças percebe na política econômica externa? O novo governo dá indicativos de mudanças em termos de relações econômicas? O que se pode esperar de parcerias com o Mercosul, com os BRICs e outros mercados?
Reinaldo Gonçalves - Essa é uma orientação estratégica relevante, mas que só tende a ter efeitos de longo prazo. Apolítica externa do governo Lula e Dilma foi um fracasso quando se considera a sua prioridade número 1: aCooperação Sul-Sul, a integração com a América do Sul e o aprofundamento do Mercosul.
Houve retrocesso da integração comercial de bens com os principais parceiros comerciais do Brasil no mundo em desenvolvimento. As exceções (Bolívia, Nigéria e Índia) são parceiros secundários. Escrevi um texto recente sobre isso (Cooperação Sul-Sul e as relações comerciais bilaterais. Fracasso da política externa dos governos do PT). É preciso reverter a política de dispersão e desperdício de escassos recursos diplomáticos, econômicos etc. com a “diplomacia presidencial de palanque” criada por Lula.
Os discursos grandiloquentes de Lula mascaravam, de fato, uma nanodiplomacia, já que o país tem perdido poder efetivo na arena internacional desde os anos 1990 (ver meu livro mais recente: Economia Política Internacional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016, edição revista e atualizada). Há anos analistas independentes recomendam foco da política externa em arranjos bilaterais com agendas específicas.
IHU On-Line - Que perspectivas podemos esperar em relação ao futuro da economia brasileira?
Reinaldo Gonçalves - Em estudo recente (Interrupção de presidências, reequilíbrio e bônus macroeconômico. Lições da América Latina para o impedimento de Dilma Rousseff) apresento evidência de que em 60% dos casos de interrupção de presidências na América Latina no passado recente houve recuperação e estabilização econômica. De modo geral, constatam-se melhoras de indicadores de crescimento econômico, emprego, finanças públicas e contas externas. O investimento e a inflação foram mais resilientes. Se o governo Temer abandonar a paranoia fiscal e focar na geração de emprego, o Brasil tem 60% de probabilidade de realizar ajuste econômico razoável a partir de 2017-18. Isso pressupõe também o defenestramento definitivo de Dilma Rousseff o mais rápido possível.
A punição efetiva de Lula também deve contribuir positivamente para melhorar expectativas, governabilidade e governança e, portanto, para a interrupção do acelerado processo de perda de legitimidade do Estado brasileiro que começou lá atrás, no início do governo Lula. Em resumo, mesmo que haja redução das falhas de governo, o defenestramento de Dilma e a punição de Lula, a manutenção das falhas de modelo (Modelo Liberal Periférico) e das falhas de mercado, a economia brasileira tem uma recuperação (um tanto anêmica) somente até a próxima crise internacional.
Por Patricia Fachin
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