Apresentação
Da máquina de escrever aos
sistemas online
Meus primeiros trabalhos escolares, entre o
primário e o ginasial, eram feitos cuidadosamente à mão, em papel almaço
pautado, escritos em caneta tinteiro, o que exigia extremo cuidado na
elaboração, para não gastar tempo e materiais preciosos e caros. Só comecei
verdadeiramente a escrever em máquinas de escrever ao ingressar na faculdade,
ou talvez um pouco antes, ainda no colegial, mas basicamente alguns trabalhos
feitos à margem das obrigações escolares, quando eu queria transcrever os
muitos escritos em cadernos pautados, repletos de notas de leituras. Tudo isso
está refletido em minha relação de trabalhos, que pode ser conferida em meu
site pessoal, mas vários trabalhos dessa época – segunda metade dos anos 1960 –
se perderam, tanto quanto os primeiros cadernos, na partida para meu exílio
europeu, que se prolongou por sete anos. Lembro-me, por exemplo de um resumo de
uma versão já resumido do Capital, de Marx, traduzido de uma versão francesa
das Éditions Sociales (a editora oficial do PCF), um longo trabalho de mais de
70 páginas, lentamente e penosamente datilografado durante a hora de almoço na
companhia multinacional em que eu então trabalhava, usando a máquina de
escrever do escritório, papel e duas folhas de papel carbono. Nunca mais
encontrei esse laborioso trabalho, que talvez tenha sido descartado no quadro
da repressão política do final dos anos 1960, antes de eu partir para a Europa.
Na Europa, preenchi igualmente muitos cadernos
de leitura, especializados em áreas de estudo ou temáticas (entre elas o
marxismo, ainda), mas esses eu guardei, e providenciarei um dia transcrição e
digitalização dos textos mais interessantes: resumos de leituras, notas
bibliográficas, trabalhos completos, etc. Alguns desses últimos foram
oportunamente datilografados, em máquinas emprestadas, e cuidadosamente
guardados e se encontram hoje arquivados em meus primeiros maços de originais
(ainda que não em meu computador). Vários deles foram assinados sob pseudônimo,
eventualmente publicados em revistas estrangeiras ou na imprensa de oposição no
Brasil, e caberá algum dia recuperar todos esses textos mantidos sob reserva ou
até hoje inéditos.
Em algum momento de minha estada europeia,
adquiri ou ganhei uma pequena máquina de escrever portátil, com teclado francês
(azerty), o que no retorno ao Brasil, pelo menos no início, me causou inúmeros
erros de digitação, ou de datilografia, como dizíamos então. A máquina portátil
francesa me acompanhou ao voltar da Europa, e me serviu ainda durante longos
meses, inclusive quando já tinha me incorporado à carreira diplomática e
dispunha das velhas Olivetti em serviço nas Divisões, quando já se dispunha,
nos gabinetes das chefias, de cobiçadas máquinas elétricas, algumas até com
esfera (da IBM), o que por acaso simboliza a diferença que havia, no Itamaraty,
entre a Casa Grande (o Palácio) e a Senzala (o anexo, único, então, onde
estavam as divisões de proletários que mourejavam na redação de telegramas e
outros expedientes, disputando as poucas máquinas existentes). As crianças e
jovens da atualidade jamais conheceram máquinas de escrever, como tampouco
mimeógrafos à álcool e outros sistemas rudimentares de reprodução de textos,
que usávamos com alguma dificuldade nos tempos duros da ditadura militar no
Brasil.
Meu primeiro investimento “pesado” nas artes da
escrita mecânica e da reprodução já se deu durante a elaboração da tese de
doutorado, quando servia em meu primeiro posto: na Suíça adquiri uma IBM
elétrica de esfera e uma copiadora Xerox e ambos devem ter custado o
equivalente a um carro usado, mas todo o sacrifício foi feito para ter uma bela
tese de doutorado, elegantemente datilografada, depois de vários rascunhos. Os
cadernos de notas da graduação e do mestrado me serviram brilhantemente nessa
etapa. Essa máquina me acompanhou durante alguns anos, só tendo sido descartada
alguns anos depois, em 1987, quando adquiri meu primeiro computador pessoal, um
MacIntosh Plus, sem disco rígido e tudo (sistema operacional, soft e arquivos)
tinha de caber num disquete de 720 kb.
Nessa época, eu já tinha começado a colaborar
com revistas acadêmicas, mas antes da era do computador, tudo precisava ser
impresso, copiado e remetido por correio para os periódicos dispostos a
publicar essas contribuições. Quando acabou a Idade Média da escrita e ingressei
finalmente na era do computador, tudo ficou mais fácil, mas ainda assim, os
processos eram lentos e sempre sujeitos a pequenas surpresas de revisão.
Praticamente todas as revistas eram impressas e de circulação espaçada,
geralmente semestral. Os progressos, no entanto, foram rápidos, e já nos anos
1990, estamos tendo as enormes facilidades criadas pelos sistemas disponíveis
na Internet, com conexões geralmente estabelecidas por e-mail. Na segunda
metade dessa década, começam a estar mais em voga no Brasil os processos de
editoração eletrônica, importados ou copiados de softs americanos, o que
representou enorme avanço nos esforços de produção e publicação de material
científico.
Um desses sistemas, ao qual agora recorro para
coletar minhas colaborações a alguns dos periódicos acadêmicos que se
associaram ao mundo eletrônico de publicações científicas é o SciELO. O que é o
SciELO? O Scientific Electronic
Library Online é uma
biblioteca eletrônica que abrange
uma coleção selecionada de periódicos científicos brasileiros e que resulta de
um projeto de pesquisa da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo –, com o apoio do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico. Seu objetivo principal é o desenvolvimento de uma
metodologia comum para a preparação, armazenamento, disseminação e avaliação da
produção científica em formato eletrônico. Sua base de dados pode ser
localizada na seguinte URL: http://www.scielo.br, que
permite buscas mediante diferentes entradas.
No meu caso, os
periódicos principais que acolheram minhas colaborações são: Revista
Brasileira de Política Internacional, Sociologia e Política, Contexto
Internacional e algumas outras, mas sua cobertura se dá apenas a partir do
final dos anos 1990, deixando de lado, portanto, inúmeras outras contribuições
feitas em anos anteriores ou a periódicos não inscritos no sistema do SciELO. No
final de 2019, o sistema catalogava, aliás, um número de “colaborações”
superiores às por mim computadas, resultado de autores homônimos em outras
áreas de conhecimento.
Algumas dessas
colaborações são listadas a seguir, no índice deste volume, e coletadas em
seguida no corpo do volume, mas apenas os artigos mais relevantes. Deixei de
fora todo o material relativo à própria RBPI e ao IBRI – já objeto de um
volume desta série dedicado aos meus textos principais na revista –, assim como
todas as resenhas de livros, publicadas na RBPI ou em outros veículos, que
serão objeto de uma edição especial, o que já fiz, igualmente, com minhas
resenhas voltadas precipuamente para livros de diplomatas. Como em diversos
outros casos, o mundo cibernético tem facilitado enormemente a vida dos
trabalhadores intelectuais – os manuais também – o que aliás abre certo campo
para trabalhos ao estilo Lavoisier – na vida, nada se cria, nada se perde, tudo
se transforma – e também para algumas fraudes que se traduzem no plágio ou
autoplágio, com as facilidades do copy&paste.
No meu caso,
algumas repetições existem, entre este volume e o da RBPI, mas aqui também
figuram outros artigos publicados em outras revistas. Boa leitura a todos...
Paulo Roberto de Almeida
Dezembro de 2019
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