Que tal, agora, olharmos a realidade?
Paulo Roberto de Almeida
Algumas constatações simplórias, apenas com base em evidências superficiais, sem qualquer metodologia científica.
Estamos cansados de saber que o personagem principal no cenário nacional nos últimos 24 meses — até bem mais do que isso — tem todas essas características negativas já destacadas inúmeras vezes por comentaristas das diversas mídias: é tosco e grosseiro, é machista, misógino e homofóbico, preconceituoso ao estilo popularesco-ignorante, é politicamente incorreto e faz questão de demonstrar isso, não se importa minimamente em ser brega, não tem nenhuma restrição mental em falar mentiras (aliás, não se preocupa em distinguir entre mentiras e verdades), segue apenas seus instintos naturais (que não são exatamente refinados), tem prazer em contrariar padrões mais sofisticados de conduta (pois considera que assim estaria mais próximo do povão, e de fato está), faz questão de contrariar normas consagradas de conduta, para demonstrar amplamente que é contrário à faixa educada e rica da população, para estar mais próximo das pessoas simples (e confirmar seu status de antissistema e anti-política), utiliza-se de todos os meios admissíveis e até mesmo desonestos para diminuir seus possíveis competidores e/ou adversários, enfim, tem todas as piores qualidades que seriam, em condições normais, não aceitáveis por quem disputa cargos públicos, visando sempre o maior benefício para sí próprio e para os seus (que colaboraram totalmente e sempre com o conjunto de falcatruas que pautaram sua vida pública e suas condutas no plano privado), e ainda assim continua a desfrutar de razoável apoio (até considerável em certas faixas) junto ao seu “povo” e no eleitorado em geral, com destaque para alguns estratos específicos (como os evangélicos, e por isso faz questão de explorar espertamente, e de maneira totalmente hipócrita, tal apoio), e acha (contrariando a maior parte dos analistas políticos) que dessa forma vai garantir sua presença no segundo turno de 2022 e, com isso, uma possível nova vitória eleitoral.
Sim, ainda que muito disso possa ser pura fabricação e encenação deliberada para fins diretamente políticos, ainda que estes sejam os piores possíveis, parece acreditar que está fazendo, e trazendo, o bem para o Brasil e os brasileiros, pois na sua imensa ignorância natural considera que os perigos maiores do Brasil sejam, ou seriam, o esquerdismo e o progressismo, mas também agita espertamente a ameaça de um “comunismo” que sabe não existir, mas que é conveniente para seus fins explorar como espantalho adequado para certa faixa do eleitorado (os saudosistas da ditadura militar, que também existem aos montões, inclusive entre os militares que precisam se escudar de acusações de condutas impróprias durante aquele período).
No total, e desculpando-me junto a meus leitores pela prolixidade desta exposição, acredito que estejamos, no Brasil em face de um fenômeno — não um movimento, ou de uma doutrina — que dispõe de razoável aceitação popular, mas que corresponde a uma conjuntura específica de nossa história recente: a tremenda decepção da classe média com a corrupção do PT e dos políticos em geral, e o choque real, junto a largas faixas do eleitorado não instruído e de renda mais baixa, com uma enorme reversão de expectativas quanto ao aumento de renda — estimulada de forma artificial e não sustentada — que existia até a grande crise de 2015-16, deterioração não revertida até aqui.
Termino, dizendo simplesmente o seguinte: nós, cidadãos de classe média (que somos os incluídos neste tipo de reflexão e de debate), acadêmicos em geral, jornalistas e fazedores de opinião em particular, estamos singularmente DISTANTES e não compreendemos as angústias e preocupações da massa da população.
Não cabem surpresas, portanto, quando se toma conhecimento das pesquisas de popularidade: estamos num universo muito diferente do da maioria do povo.
Desculpem decepcionar alguns...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3/01/2021
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