domingo, 3 de julho de 2022

Minha homenagem ao Sergio Paulo Rouanet: resenhas de seus livros

Minha homenagem ao Sergio Paulo Rouanet, a primeira resenha foi elaborada antes da minha era do computador, por isso feita em máquina de escrever, e é preciso recuperar o original e copiar. A segunda segue abaixo, mas faltou uma resenha deste livro, que ainda pode aparecer: 

 

079. “Benjamin e Freud”, Berna, fevereiro 1982, 2 p. Nota de apresentação ao livro de Sérgio Paulo Rouanet, Édipo e o Anjo: Itinerários Freudianos em Walter Benjamin (Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1981). Publicado, sob o título de “Walter Benjamin no Divã”, em Leia Livros (São Paulo, Ano IV, n. 44, 15 março a 14 abril 1982, p. 6). Relação de Publicados nº 015.


083. “Freud na Escola de Frankfurt”, Porto Alegre-Atlântida, 19-20 março 1983, 2 p. Resenha do livro de Sérgio Paulo Rouanet, Teoria Crítica e Psicanálise (Rio de Janeiro-Fortaleza: Tempo Brasileiro-Universidade Federal do Ceará, 1983). Publicado, com dois pequenos cortes e sob o título “Freud und Frankfurt”, em Leia Livros (São Paulo, Ano VI, n. 59, 15 julho a 14 agosto 1983, p. 17). Relação de Publicados n. 017.


Resenha do livro de Sergio Paulo Rouanet, Criação no Brasil de uma Escola Superior de Administração Pública (Brasília: ENAP, 2005, 96 p.; relatório de 1982, reeditado). 


Freud na Escola de Frankfurt

 

Sérgio Paulo Rouanet:

Teoria Crítica e Psicanálise

(Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro;

Fortaleza: Edições Universidade Federal do Ceará, 1983)

 

 

Depois de ter operado, em Édipo e o Anjo, uma leitura psicanalítica da obra do crítico alemão Walter Benjamin, o filósofo Sérgio Paulo Rouanet oferece-nos agora uma ampliação substancial de suas reflexões sobre o relacionamento entre a psicanálise e a moderna teoria social. O projeto, desta vez, era nada menos que grandioso: deitar todos os representantes da Escola de Frankfurt no divã de Freud, por um lado, levar o médico vienense aos círculos do Instituto para Pesquisa Social, por outro.

Na verdade, o ensaio de Rouanet não tem o escopo que o resenhista, desejoso de uma frase de efeito, lhe empresta. Trata-se, mais bem, de examinar o estatuto e a contribuição do freudismo na formação e evolução da assim chamada teoria crítica da sociedade. Em vinte cuidadosos capítulos são examinadas as relações entre ambas as teorias através de um meticuloso estudo e discussão aprofundada da produção intelectual dos principais expoentes da Escola de Frankfurt: Adorno e Horkheimer, Marcuse e Habermas, mas também Reich e Fromm.

O freudismo não constitui, como se sabe, um discurso crítico, e menos ainda revolucionário, sobre a sociedade. Ele comporta, no entanto, uma reflexão sobre o indivíduo despida de qualquer ilusão; a prática analítica seria mesmo desmi(s)tificadora, voire emancipadora. Daí as diversas tentativas de aproximá-lo de uma outra teoria da libertação do ser humano e que se pretende, ela, transformadora da sociedade: o marxismo.

Esse amálgama foi inicialmente tentado nos anos vinte e trinta pelos freudo-marxistas, sob o impacto de dois processos políticos de enorme dimensão histórico social: a revolução bolchevista e a ascensão dos fascismos europeus, alemão em particular. Ele assumiria nova forma com a chamada Escola de Frankfurt.

A obra de Rouanet não aspira, contudo, à mera reconstituição da história intelectual dessa última corrente. O presente ensaio é, num certo sentido, uma psicanálise filosófica da teoria crítica, revelando, mais uma vez, o rico manancial analítico e conceitual do freudismo. Mas, o livro é, antes de mais nada, a inserção crítica do dispositivo freudiano no campo teórico dos frankfurteanos, por um eminente conhecedor dessas duas correntes de pensamento. Com efeito, as principais categorias da psicanálise permeiam todo o discurso da escola frankfurteana, influindo decisivamente na formação das teorias da personalidade, do conhecimento e da comunicação, bem como na elaboração de uma reflexão crítica sobre a cultura, a sociedade repressiva, a racionalidade instrumental e as diversas utopias da contemporaneidade capitalista.

Como diz Rouanet, “se a escola de Frankfurt é crítica da cultura e da ideologia, o é, em grande parte, através de Freud, mas também contra Freud” (p.11). Esse pensamento “profundamente impregnado pelas categorias psicanalíticas” (p. 372), que integra o patrimônio intelectual da teoria crítica, realiza, através do freudismo, uma reflexão que se pretende antidesumanizadora e emancipatória. Esse ideal iluminista da teoria crítica permanece provavelmente um projeto utópico, a despeito mesmo de seu forte conteúdo racional e antimítico. 

Rouanet talvez seja excessivamente otimista quanto à possibilidade da psicanálise participar dessa luta pela autonomia do indivíduo através do exercício da razão crítica. Afinal de contas, o freudismo sempre foi tido, pelo marxismo ortodoxo, como uma ideologia burguesa decadente e, mais recentemente, ele vem recebendo os golpes combinados do “feminismo antropológico” e do “antropologismo histórico e social”. 

Sabe-se também, por outro lado, que, contrariamente à mensagem marxista, o conteúdo do discurso freudiano sobre a sociedade é razoavelmente pessimista, pelo menos no que se refere ao desenvolvimento de estruturas não-repressivas da sociabilidade. Entretanto, como sublinha o próprio Rouanet, o pessimismo freudiano também “lembra algumas das formulações mais extremas da escola de Frankfurt, para a qual a teoria crítica não oferece nenhuma promessa nem proporciona nenhuma ponte entre o atual e o possível. O logos da teoria crítica é também um deus impotente, comparado com o panteão da razão oficial” (p. 112).

 

Levando-se em conta a profundidade da análise crítica e a excelência da metodologia comparativa exercitadas por Rouanet, não há exagero em afirmar-se que seu ensaio filosófico constitui um Meisterwerk no gênero: poucas obras, na bibliografia especializada, discutem de forma tão brilhante o papel do freudismo na elaboração do discurso frankfurteano. O autor fica agora nos devendo a operação analítica inversa, isto é uma reflexão sociológica sobre os fundamentos do freudismo e uma leitura dialética do discurso psicanalítico.


 

[Porto Alegre/Atlântida, 19-20.03.83]

[Publicado, com dois pequenos cortes e

 sob o título de “Freud und Frankfurt”, em

 Leia Livros (São Paulo, Ano VI, nº 59,

15 julho a 14 agosto 1983, p. 17)]

[Relação de Trabalhos nº 047]

[Relação de Publicados n° 017]

 

083. “Freud na Escola de Frankfurt”, Porto Alegre-Atlântida, 19-20 março 1983, 2 pp. Resenha do livro de Sérgio Paulo Rouanet, Teoria Crítica e Psicanálise (Rio de Janeiro-Fortaleza: Tempo Brasileiro-Universidade Federal do Ceará, 1983). Publicado, com dois pequenos cortes e sob o título “Freud und Frankfurt”, em Leia Livros (São Paulo, Ano VI, nº 59, 15 julho a 14 agosto 1983, p. 17). Relação de Publicados nº 017.

 

 

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