PEC que amplia indicação política para embaixadores é alvo de crítica unânime em debate no Senado
Políticos e especialistas apontam 'desmonte do Estado' e inconstitucionalidade em projeto de Davi Alcolumbre
5.jul.2022 às 15h02
Cézar Feitoza
A PEC dos embaixadores, como ficou conhecida a proposta de emenda à Constituição que abre caminho para políticos virarem embaixadores sem perderem o mandato, foi alvo unânime de críticas durante audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nesta terça-feira (5).
Para o ex-chanceler Aloysio Nunes, a proposta integra um conjunto de medidas tomadas durante o governo Jair Bolsonaro (PL) que promove o desmonte do Estado brasileiro. "Uma mudança constitucional dessa natureza cria um dano permanente à política externa brasileira e a uma prerrogativa essencial do presidente da República, que é falar com plena autoridade em nome do Brasil [por meio de seus embaixadores]", disse.
Nunes defende que a PEC tem problemas no mérito e na constitucionalidade e causa confusão ao desestimular diplomatas que entram na carreira dispostos a alcançar o posto de embaixador. "[A PEC promove] a diluição de fronteira entre Poderes, o que não deve ser admitido pela Comissão de Constituição e Justiça", concluiu.
A audiência contou ainda com a participação de diplomatas, professores de relações internacionais e pesquisadores, incluindo Mathias Alencastro, colunista da Folha. Todos se manifestaram contra a PEC.
A diretora do Instituto Rio Branco, Gilvania Maria de Oliveira, participou representando o ministro de Relações Exteriores, Carlos França, que está em viagem. Para ela, a possibilidade que a PEC quer abrir já foi enterrada durante a Constituinte de 1988. "Esse assunto foi tema de debate em 1987 e 1988 e consideramos, com todo respeito ao excelentíssimo senador Davi Alcolumbre, que há temas sensíveis e problemáticos em elementos de constitucionalidade", avaliou.
Alcolumbre (União Brasil-AP), não participou do debate, apesar de ser o presidente da CCJ e autor da proposta.
O vice-presidente do Conselho Curador do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), José Alfredo Lima, disse que o embaixador-político pode enfrentar conflitos de interesses, uma vez que terá de prezar pelos interesses da política externa brasileira e atender aos anseios dos eleitores do estado que o elegeu. "Gostaria de recordar o preceito bíblico de que não se deve servir a dois senhores", afirmou.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) disse que a proposta não atende ao interesse público, atenta contra a separação entre os Poderes e pode servir como mais uma moeda de troca para o presidente da República. "O que se comenta é que o objetivo é arrumar mais uma boquinha para o parlamentar", disse.
A discussão sobre a proposta que amplia os poderes de políticos sobre embaixadas tem a simpatia de Bolsonaro, como mostrou o Painel. No início do governo, o presidente tentou escalar o filho Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para chefiar a embaixada do Brasil em Washington. Em 2019, o deputado disse que tinha, entre suas qualificações, a experiência de um intercâmbio nos Estados Unidos e que "fritou hambúrguer no frio do Maine".
Para o professor de relações internacionais Guilherme Casarões, da FGV, as tentativas de nomeação de Eduardo e do ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella para embaixada da África do Sul seriam facilitadas pela PEC discutida pelo Senado. "Em ambos os casos, ficava muito claro o interesse paroquial ali colocado. E isso, do ponto de vista da representação do Brasil no exterior, causa um prejuízo indelével à imagem do país. Tanto os processos quanto as consequências dessa PEC seriam muito prejudiciais", afirmou.
No fim da audiência, a relatora da PEC no Senado, senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), reclamou da falta de empenho do chanceler Carlos França na discussão da proposta. Segundo ela, os dois se falaram uma única vez, por telefone, e a conversa não deixou claro o posicionamento do Itamaraty no debate.
"Desde março, quando fui designada relatora, em nenhum instante fui procurada presencialmente [pelo chanceler]. Faço questão de dizer isso pela falta de empenho do Itamaraty, pela necessidade de fortalecer os argumentos da diplomacia brasileira", disse Ribeiro.
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/07/pec-que-amplia-indicacao-politica-para-embaixadores-e-alvo-de-critica-unanime-em-debate-no-senado.shtml
VIDEO: Senador invoca filosofia de boteco para justificar contrariedade à PEC
Invocando a “filosofia de boteco”, o senador posicionou-se contra a PEC que possibilita a deputados e senadores ocuparem cargo de embaixador sem a perda do mandato.
KARINA MANARIN
05/07/2022 ÀS 15H08 - Atualizado Há 16 minutos
Invocando a “filosofia de boteco”, o senador Esperidião Amin, do PP, posicionou-se contra a PEC, Proposta de Emenda Constitucional, que possibilita a deputados e senadores ocuparem cargo de embaixador sem a perda do mandato. Foi nesta terça-feira, durante audiência pública para tratar do tema na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. A PEC é de autoria do senador Davi Alcolumbre, do União Brasil.
Para Amin, a iniciativa é inadequada do ponto de vista Constitucional. Segundo declarou, não vê interesse público nela, pois entende que não atende a melhoria do serviço que se presta, pelo contrário, tende a comprometer a qualidade.
“Quero acrescentar um terceiro fator pedindo perdão se considerarem ‘xula’ a minha observação. “Boteco”. Eu milito na vida pública sem abrir mão de frequentar boteco. Boteco tem uma sabedoria muito respeitada no Brasil. E nos botecos do Brasil o que se comenta, é que o objetivo desta proposta de emenda à constituição, é arrumar mais uma ‘boquinha’ para o parlamentar. Por isso, sou contrário a esta PEC”, finalizou o senador.
https://ndmais.com.br/politica-sc/video-filosofia-de-boteco-invocada-no-senado-para-contrariar-boquinha-para-parlamentar/
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