Aliado de Lula se reúne com europeus e defende China como mediadora na Ucrânia
Ex-chanceler Celso Amorim falou sobre política externa com diplomatas da UE em evento de missão francesa
11.jul.2022 às 7h00
Bruno Boghossian
Ricardo Della Coletta
BRASÍLIA - Principal conselheiro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assuntos internacionais, o ex-chanceler Celso Amorim se reuniu no último dia 28 com um grupo de diplomatas europeus para apresentar o que seriam as linhas gerais da política externa de um terceiro mandato do petista.
Amorim viajou a Brasília para participar de uma reunião organizada pela representação diplomática da França, comandada pela embaixadora Brigitte Collet. Além dos franceses, participaram o chefe da delegação da União Europeia no Brasil, Ignacio Ibáñez, e representantes das demais missões europeias em Brasília.
A conversa se deu num contexto em que Lula lidera as pesquisas de intenção de voto, com 19 pontos de vantagem sobre Jair Bolsonaro (PL), segundo o último levantamento do Datafolha. Alguns governos europeus —notadamente o de Paris, anfitrião do encontro— têm ainda um histórico de conflitos com o atual presidente.
Procurada, a embaixada da França no Brasil não quis se manifestar.
De acordo com relatos feitos sob reserva, o ex-ministro das Relações Exteriores iniciou sua apresentação ressaltando que não é dirigente do PT e que não participou da elaboração das diretrizes do plano de governo de Lula. Portanto, não falaria em nome do ex-presidente ou da campanha.
A avaliação entre os presentes, no entanto, é que Amorim será uma das vozes mais ouvidas pelo petista em temas internacionais num eventual novo governo —não importa quem esteja no Itamaraty.
Um dos pontos debatidos com os europeus foi a Guerra da Ucrânia, tema central na agenda da União Europeia, que apoia a resistência militar liderada por Volodimir Zelenski contra a Rússia —mesmo em meio a tensões e sinais de cansaço.
Em março, uma entrevista de Lula à revista Time causou mal-estar, depois de o petista dizer que o líder ucraniano era tão responsável pela situação quanto Vladimir Putin e que EUA e UE estimularam o conflito.
Ainda segundo os relatos, na reunião Amorim afirmou que a Rússia precisa ser criticada, por ter cruzado uma linha vermelha ao invadir um território sem autorização das Nações Unidas, mas classificou a estratégia do Ocidente de debilitar Moscou por meio de sanções de "extremamente perigosa" —Bolsonaro já criticou o mecanismo.
Participantes do encontro disseram à Folha que Amorim argumentou que é necessário ter uma dose de "realismo político" e encontrar um mediador com poder de persuasão sobre os dois lados. Papel, segundo ele, que poderia ser desempenhado pela China. Pequim firmou, antes do conflito, uma "parceria sem limites" com a Rússia, em um movimento criticado pelos EUA, que travam com a potência asiática uma Guerra Fria 2.0.
Os presentes também quiseram saber a opinião do ex-chanceler sobre o acordo entre UE e Mercosul. Assinado em 2019, o tratado está bloqueado principalmente por causa das críticas de europeus como a França à agenda de Bolsonaro para o ambiente. Para o governo brasileiro, a posição de Paris é tachada de protecionismo agrícola.
Os europeus estavam apreensivos por declarações recentes de Lula. Numa viagem ao continente em novembro, o petista defendeu a reformulação do acordo comercial.
Segundo pessoas na plateia, Amorim moderou essa fala: defendeu que o tratado precisa passar por "reflexões e ajustes" que preservem condições para o desenvolvimento industrial e tecnológico dos membros do Mercosul.
Ele ainda fez o alerta de que não pode haver pressa, defendendo que o acordo não seja assinado antes do início de um eventual novo governo —o argumento é de que um texto assinado ainda na gestão Bolsonaro teria "vício de origem".
O ex-ministro abordou ainda pleitos históricos do Itamaraty, como o de uma reforma no Conselho de Segurança da ONU. Segundo ele, a estrutura do colegiado não tem sido eficaz para a resolução de desafios globais.
Amorim detalhou sua visão sobre o papel da Europa para o Brasil, afirmando que a UE tem um papel estratégico no cenário global, podendo servir como ponto de equilíbrio num mundo cada vez mais dividido pela disputa EUA-China.
https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/07/aliado-de-lula-se-reune-com-europeus-e-defende-china-como-mediadora-na-ucrania.shtml
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