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domingo, 17 de março de 2019

Chanceler do Brasil: entrevista (globalismo, nacionalismo, EUA) - Brasil Paralelo

Entrevista concedida ao Brasil Paralelo pelo chanceler atual, com uma transcrição não oficial mais abaixo. Compreende-se certa insegurança no ministro, ao buscar contestar tudo o que se fazia antes – um pouco como o PT fazia, negar qualquer crédito ao passado, e partir do zero, uma espécie de "Nunca Antes" da direita – e procurar palavras que revelem essa "novidade", daí as hesitações e repetições (que eu obviamente suprimi na transcrição abaixo), como já se tinha manifestado na sua "aula" no IRBr de 11/03/2019.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17 de março de 2019

(ENTREVISTA) Min Ernesto Araújo denuncia o GLOBALISMO e defende o resgate do NACIONALISMO


Brasil Paralelo

Publicado em 17 de março de 2019

Nesta sexta-feira entrevistamos o Min. das Relações exteriores: Ernesto Araújo.
O Ministro contou sua posição sobre Estados Unidos, China, Globalismo, Nacionalismo, Identidade Brasileira e muito mais.
Entrevista por Lucas Ferrugem Vídeo por Filipe Valerim
Acesso: https://www.youtube.com/watch?v=2Y1Nn6ZopMQ&feature=em-uploademail 


Destaques:
Pergunta sobre o que é o "ser político brasileiro".
EA: "Durante muito tempo o brasileiro não se sentiu representado pela política. Política foi identificada com coisas ruins. (...) A política andou pouco afeita aos valores dos brasileiros. (...) O ser político brasileiro era um ser alijado de si mesmo. Era uma desidentificação com a política, com o Estado, e sobretudo essa ausência da discussão do seu destino. Hoje uma das coisas positivas que veem acontecendo com a vitória da política é que as pessoas se reconectam com a política, com a discussão sobre os destinos da polis, e isso muito especialmente com a política externa."
"Essa era a área onde esse afastamento mais se manifestava. Durante muito tempo se pensou que o brasileiro não se interessava por política externa. Antes isso não motivava as pessoas. Hoje motiva. Agora voltou-se a falar de política externa. Muitas vezes com críticas, a grande imprensa criticando o que a gente faz, mas falando-se de política externa.
"Estamos voltando a discutir a inserção da nossa comunidade histórica no mundo, isso é uma coisa fundamental, estamos voltando a discutir o futuro da polis.
"Então o ser político brasileiro está voltando a existir. Em política externa isso é muito claro. Claro que eu preferia que alguns comentários fossem mais positivos, mas isso não é o problema. O importante é a discussão."

PRA: Parece-me que foi isso que eu tentei fazer, mas não foi muito bem recebido pelo ministro, que não admite críticas à sua política.

EA: "As pessoas [antes] não se interessavam por política externa porque ela era apresentada como pouco relevante para as pessoas. A política externa entrava assim um pouco pelo lado da política comercial, numa coisa muito imediata, da questão consular, que é importante também, mas muito compartimentada. Agora se está discutindo as grandes questões, as questões de valores, a nossa inserção no mundo, onde fica o Brasil diante desse debate entre nacionalismo e globalismo.
"Então no Brasil a política voltou a ser política e a política externa voltou a ser parte disso."

Pergunta: Isso sempre foi assim, ou a partir de certo momento os brasileiros passaram a se desinteressar pela polis?
EA: "Não, não é desde sempre, não. Eu acho que naquele início de século XIX, até a independência, e um pouco depois, naquela elite letrada, havia uma discussão. Olhando os documentos dessa época, é uma coisa extraordinária, haver um debate, dentro de uma sociedade que era tão precária. Havia um debate muito intenso, e depois no final do Império também, e depois no começo da República. E depois, havia alguns momentos em que era mais intenso de discussão de política nesse sentido.
"O período do Império é um período muito pouco estudado. Eu não sou especialista, mas eu acho que sei o suficiente para ver que há ali muito mais coisas do que normalmente se estuda. Depois no período dos anos 1930, há uma discussão sobre a brasilidade. [corte na gravação]
"Nós nos acostumamos também, nesse período de deserto intelectual [??], a viver só no presente, e isso também é um enorme empobrecimento do ser humano, do ser brasileiro no caso. Nós no Itamaraty precisamos contribuir para abrir esse poço da memória, e contribuir para trazer água do fundo desse poço. Nós fazemos parte desse jogo da memória.
"Hoje é como se nós tivéssemos um romance que começa na página 360, né?; você tem que ver tudo, conhecer os personagens, as coisas ficam mais vivas, ficam mais interessantes quanto teem essa dimensão.
"Então, eu procurei trazer essa ideia da Aletheia para o Itamaraty, e também usando a ideia do Ministério do Tempo, não é?; procurei trazer essa ideia do poço. (..) Sem isso você pode fazer uma certa política externa, fazer um pouco aqui, outro ali, mas é algo muito pobre, muito pobre, e as coisas podem fazer sentido dentre de uma história, de uma certa aventura.
"Quero passar essa ideia aqui no Itamaraty: você passa a ser mais eficiente, a trabalhar com maior prazer ao ver que você faz parte de um romance, de uma grande aventura.
"Outra coisa é tentar pensar a realidade como um todo, e não a compartimentação da realidade, que é uma tendência de toda a pós-modernidade, que no fundo vem desde os anos 1960, que é a compartimentação. Que é dizer: não, isso aqui é comércio, isso aqui é política, isso aqui é tecnologia, isso aqui é direitos humanos, aquilo lá... Isso é útil, mas a realidade é um todo. Acredito muito nisso. Procurar ver as conexões, fazer as analogias, pensar filosoficamente, e sobretudo perguntar, perguntar para a realidade, e saber ouvir as respostas, não achar que a gente já sabe.
"A atitude filosófica é fundamental. Não achar que você já sabe. E se questionar a si mesmo.
E se questionar dentro desse conceito de uma realidade integral. E onde a política externa está dentro disso, e parte da vida social, claro, o Brasil está no mundo e isso é decisivo.
"Uma terceira coisa é não ter medo. Existe muito medo, As pessoas hoje estão nascendo com medo. Medo. Isso é plantado, acho que pela mídia, pela grande mídia, não pela mídia alternativa, que é tão importante por isso. Qualquer coisa que você vai dizer vão te chamar de alguma coisa, que vc está fora do mainstream, que vc é maluco. Claro, isso vai implantando medo na cabeça das pessoas.
"E o medo paralisa, o medo limita. Então eu faço muito esse esforço para que as pessoas não tenham medo de falar e de pensar.""

PRA: Pois foi exatamente o que tentei fazer, inclusive fazendo críticas ao seu modo de fazer política externa, mas o ministro não gostou que eu não tivesse medo de pensar e de falar...

Pergunta: Existe algum país que o Sr. gostaria que nós conhecêssemos a história e aprendessemos mais a sua política, a política diplomática?
EA: "Certamente. Um país que tem uma história riquíssima e que a gente conhece pouco são os Estados Unidos. Podemos enriquecer muito a nossa percepção conhecendo a história americana, que tem momentos únicos. como a guerra civil americana, por exemplo. como todo o processo dos anos 1930, e o New Deal, e depois o pós-guerra, enfim, as correntes intelectuais e políticas americanas.
"Os EUA é [sic] um país onde a história está viva. acho que diferente da percepção que se tem da Europa. Acho que na Europa a história está renascendo, mas nesses últimos trinta anos, nos países europeus, centro de civilização, a história meio que morreu. E as pessoas deixaram de pensar, política também, um pouco como no Brasil. deixaram de se conectar com o seu passado. Nos Estados Unidos isso nunca aconteceu. A pessoas vivem a história, as pessoas vivem a sua aventura nacional de uma maneira muito presente, o debate político americano é extremamente vivo e rico, as pessoas estão sempre citando exemplos do século XIX, Roosevelt, etc.
"O Brasil também pode ser isso, esse país de uma história viva, é raro você ouvir aqui [como nos EUA] alguém se referir aos anos 1920, um político do passado, e tem no século XIX um cabedal enorme que poderia ser lembrado.
"Então acho que se poderia comparar os EUA com a Europa. A Europa com toda aquela sensação de superioridade intelectual que eles têm em relação aos EUA, eles durante muito tempo estavam jogando fora todo esse patrimônio histórico e vivendo numa coisa muito encaixotada, no presente, um presente muito limitado.
"Vários países europeus estão tentando recuperar isso. O ser político europeu está renascendo também, como no Brasil. A gente vê isso, vários países europeus estão tentando recupera isso, não só no Brasil; a gente vê isso na Itália, a gente vê isso na Polônia, na Hungria, na Áustria, na Espanha, agora. E em toda a parte tem isso, mas esses são os países onde a coisa se veja mais presente.
"É interessante observar essa reconexão das pessoas com a sua realidade política, que é influenciar no seu destino. Durante muito tempo se discutiam coisas menores – taxa de juros, etc. – mas não é isso só, isso também, mas não é isso só.
"E durante muito tempo: "Não pode discutir nada!". E essa recuperação vem junto com o passado histórico, a recuperação dos heróis, a recuperação... Heróis é um conceito extraordinário que se perdeu, não é?
"Então é importante olhar isso: a Europa era um caso muito interessante de sociedades que estavam completamente adormecidas, e que estão renascendo.
[corte na gravação]
   [Pergunta?: ]
EA: Cada vez mais podem olhar para o Brasil como de certa maneira algo que espelha eles. [?] Mas, no nosso caso certamente. É um espelho que alguém quebrou, alguém resolveu quebrar num certo momento. Nós estamos recompondo esse espelho.
"Então no nosso caso, essa recuperação de uma identidade acontece, em outros países também, mas nos Estados Unidos é uma coisa especial nesse espelhamento. Então, a aproximação com eles, e a aproximação conosco são parte do mesmo fenômeno.

Pergunta: Agora há pouco, o Sr. comentou que o nacionalismo ganhou uma acepção negativa na sociedade, e também comentou que o Bolsonaro seria o primeiro presidente nacionalista nos últimos cem anos. Gostaria que explicasse por que e qual o entendimento que faz da palavra.
EA: EU acho que o nacionalismo é uma concepção de nação no seu sentido etimológico, algo de nascimento. Você tem um corpo de pessoas que estão unidas no tempo também. Tem a questão das gerações. Não são só indivíduos que estão só num espaço físico. São pessoas que estão ali, seus ancestrais viveram ali, claro que você tem migrações e tudo isso, mas você tem de ter um núcleo que faça sentido para que vc possa falar de nação.
"Nacionalismo é reconceber a sociedade como nação, e não só como uma coleção de indivíduos, e também não só como indivíduos conectados simplesmente pelo Estado.
"Porque hoje é muito isso. A concepção de um Estado pós-nacional não deve ser assim. A nacionalidade tem de vir do fundo do tempo.
"A concepção do que deve ser a sociedade, isso é o nacionalismo. As sociedades não deveriam se basear muito nas leis, como dizia o meu pai; elas devem se basear na confiança. As leis são fundamentais, mas você não pode ter lei para tudo, para dizer para as pessoas como elas devem se relacionar.
"E o que acontece com essa fragmentação social dessa pós-modernidade? A sociedade deixa de funcionar baseada na confiança. E aí vc tem de apelar para o Estado.
"As pessoas não deveriam se conectar umas às outras só baseadas na lei; elas tem de se conectar com base na confiança orgânica. Então isso é visão de nacionalismo.
"É o anseio natural das pessoas de viverem numa comunidade orgânica, e não numa coleção de indivíduos.

Pergunta: Creio que o receio com o termo [nacionalista], principalmente. veio com a forte aproximação com os regimes totalitários do século XX, Então qual a diferença que o Sr. traça desse nacionalismo para os regimes italiano, alemão e até da Rússia?
EA: Eu acho que esses regimes totalitários eles no fundo apelaram para uma força muito profunda, que é a força do sentimento nacional, para chegarem ao poder, para se manterem no poder, e distorceram esse sentimento; eles de certa forma sequestraram esse sentimento. Coisa que eu falo muito: isso é muito da esquerda, ela pega uma coisa boa, transforma, perverte e transforma numa coisa ruim: por isso que eu digo também que fascismo e nazismo são fenômenos de esquerda. E isso deu um mau nome ao nacionalismo.
E por isso o repúdio a esses regimes, as pessoas jogaram fora o nacionalismo.
Essa é a grande tragédia. Não fazer a desassociação entre a ideia de nação dos totalitarismos tão trágicos da história do século XX.
Então esse é o nosso esforço, o esforço de outros países, é o de ter um nacionalismo que é democrático, estou certo de que se pode ter, porque essa sociedade coesa, orgânica, que o nacionalismo prega, é naturalmente democrática. Porque essa democracia que ele prega não é imposta, ela vem de baixo para cima: um povo que gosta de estar junto, ele vai ser naturalmente democrático.
"Por isso que o conceito de polis, lá atrás, também tem a ver com o nascimento da democracia.
"Então é isso: é preciso recuperar o nacionalismo dessa associação perversa com os regimes totalitários."

Pergunta: Eu queria saber como o Sr. enxerga o Brasil no mundo e como o mundo enxerga o Brasil, o que o Brasil significa no mapa de todo o globo? Qual é a sua visão?
EA: Eu já devia saber, eu já intuia, mas nesse período muito intenso que estamos vivendo, eu estou me dando conta como o Brasil conta no mundo. É impressionante. Abstratamente, a gente podia imaginar, mas que muita gente já não acreditava.
"Nos contatos que eu tenho feito, eu tenho visto como há uma expectativa enorme pelo que o Brasil vai dizer, a partir de agora, pelo que o Brasil vai fazer, uma expectativa enorme de que nós coloquemos o nosso peso, por exemplo, na questão da democracia na Venezuela, em todas as áreas, por exemplo, a favor de uma revisão de uma nova OMC, por exemplo, uma reforma da maneira de atuar da OMC, em todas as áreas; na hora do Brasil, [todos perguntam], o que que o Brasil vai fazer?
"Vivemos um período em que nós não nos dávamos conta do nosso peso. não é, onde achávamos que o Brasil não tinha capacidade de influenciar, que era só copiar, fazer só uma variações nas posições globais, no máximo isso.
"Então, o mundo vê o Brasil com uma importância gigantesca, inclusive isso tem a ver com as críticas que se fazem nos países europeus ao governo Bolsonaro, mas isso tem a ver com uma percepção do peso do Brasil; porque eles estão vendo que o Brasil está colocando o seu peso a favor de coisas que eles não gostam: a favor da nação, a favor de coisas que, no caso, a esquerda europeia detesta.
"Então é por isso que o governo Bolsonaro aparece de forma tão negativa em tantos órgãos da imprensa europeia, porque eles estão assstados, o Brasil assusta, o Brasil chega lá, e fala muito mais grosso do que a gente imagina que fala.
"Ah, mas será que a gente tem condições...?
"Tem, a gente tem condições de influir. Na nossa região evidentemente, mas fora da nossa região também, também, contatos em relação ao Oriente Médio, em relação ao que está acontecendo na própria Europa, na Ásia, em toda a parte...

Pergunta: Um termo que surgiu no debate público a partir de alguns influenciadores americanos, e aqui no Brasil através do professor Olavo de Carvalho, é globalismo, a denúncia do que seria o globalismo; que basicamente se resume em agentes de representação notável, com interesses de organizar órgãos supranacionais, que intentassem um governo global. O que o Sr. entende por isso, e o Sr. concorda com isso e que agentes seriam esses?

EA: Eu acho que isso é parte do globalismo. Eu acho que essa maneira de ver o globalismo é algo limitado. Apenas a tentativa de criar organizações globais. Eu acho que o mais grave do globalismo é na mente, no pensamento. O globalismo é perigoso porque ele é sobretudo um sistema de pensamento, ou de anti-pensamento. Eu vejo globalismo sobretudo como um processo pelo qual, a ideologia marxista, a partir do começo dos anos 1990, e sobretudo a partir dos anos 2000, penetra na globalização econômica e faz dela o veículo da sua propagação. Então, justamente através da globalização começa a entrar com a sua agenda em temas como ideologia de gênero, o ambientalismo distorcido e outros, e começa sobretudo a controlar o discurso, a controlar o discurso, a dizer o que vc pode dizer e o que vc não pode dizer. E cada vez o que vc pode dizer é menos, ocupa um menor espaço.
"Então, eu vejo mais o globalismo assim, aquela ideia que... o marxismo descobriu que não precisa mais controlar os meios de produção econômica, quando ele pode controlar os meios de produção de ideias, que é o que vinha acontecendo.
"E é através desse controle das ideias que essa corrente começa a capturar instituições, e começa a partir dessas instituições, tentar se, agir para diminuir justamente as identidades nacionais e as identidades pessoais também. Porque, no fundo é isso, parte do problema só é a diminuição das identidades nacionais, o fundamental é a diminuição das identidades pessoais também, o achatamento do ser humano, que a meu ver é o projeto marxista.
"Então não é questão de dominação mundial, quer que a ONU domine, não é isso. É a utilização de todos os instrumentos para a diluição da nação e o achatamento do ser humano. Isso é o que é realmente grave do globalismo.
"Claro que o globalismo remete a esses organismos multilaterais, mas não é só isso. Isso é um instrumento. As pessoas perguntam: "onde está o globalismo?"
"Não está em nenhum lugar. Ele é um sistema de anti-pensamento, que meio que começou a replicar sozinho na cabeça das pessoas. Porque ele é tão difícil de... Se fosse uma instituição, a central mundial do globalismo, então vc vai lá e toma. Mas não é isso.
"É como se fosse um vírus de computador que se espalhou na cabeça das pessoas.
"Como eu digo, então o globalismo, eu enxergo o globalismo como o pensamento marxista capturando a globalização; então a nossa ideia é libertar a globalização dessa captura.
"A globalização é uma coisa extraordinária, que permite tanta coisa, interação super democrática entre as pessoas, isso tem que ser preservado; então o que é preciso é, eu digo assim, o que aconteceu é que o marxismo sentou na cadeira de piloto da globalização, é tirar daí, e nós vamos sentar na cadeira de piloto.
"Nós, eu digo, quem tenta representar essa linha que vê o ser humano com uma dimensão mais rica, a nação como algo que tem de ser uma comunidade orgânica, etc. Nada contra a globalização, ao contrário, é libertar a globalização, para que que ela sirva ao ser humano.
"Isso tem a ver com o Brasil, muito claramente, precisamos de uma economia liberal, precisamos da abertura econômica; a economia fechada, sufocada e sufocante foi parte de um projeto de um país sufocado, de um país que deixava de ser nação.
"Acho que isso é fundamental, a esperança para nós, para o mundo, é a conexão de um pensamento nacionalista, conservador, na base, com uma economia liberal aberta. Essa é a filosofia humanista, liberal, e que tenha lugar também para a fé, que essa filosofia, essa visão do mundo, esteja no comando da globalização, e permita que a globalização seja algo para ampliar os horizontes do ser humano. Nós temos que quebrar o amálgama marxista liberal, que é o globalismo, e transformar isso num amálgama conservador liberal. Essa é a grande tarefa.

Pergunta: É interessante ver na sociedade o desaparecimento e o surgimento de novas palavras. Nos anos 1990 foi sumindo a palavra "moral" e foi surgindo a "ética". O que está por trás dessas palavras?
EA: Essa é a grande distinção que eu faço entre o nominalismo versus realismo. O projeto globalista é um projeto nominalista, pegar as palavras e isolá-las da realidade, e transformá-las em instrumento de dominação.
O que é a tolerância? Posso tolerar alguma coisa em nome de um bem maior. Isso é o realismo. O nominalismo é pegar a palavra e transformar isso em algo absoluto.
"Parte do nosso esforço é trazer as palavras de volta ao realismo. É absolutamente essencial ter uma visão realista, que não é o absolutismo da linguagem. Hoje tem uma série de correntes que vivem num mundo de palavras, como no mundo de Wittgenstein.

(33 minutos e 32 segundos)

Vídeo original neste link:
https://www.youtube.com/watch?v=2Y1Nn6ZopMQ&feature=em-uploademail

segunda-feira, 11 de março de 2019

O Itamaraty, segundo Ernesto - Demetrio Magnoli (O Globo)

Só tomei conhecimento hoje, 11/03, em BH: 

O Itamaraty, segundo Ernesto

Demetrio Magnoli
O Globo, 9/03/2019

Durante quase 14 anos, nos governos lulopetistas, o diplomata Paulo Roberto de Almeida experimentou o que chama de “exílio involuntário”. Excluído pela chefia de qualquer atividade, instalou seu “escritório de trabalho” numa mesa da biblioteca do Itamaraty. O intervalo entre um “exílio” e outro durou menos de dois anos. Exonerado da direção do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), ele se prepara para seguir rumo à Sibéria: “Vou ter de voltar à biblioteca para poder trabalhar”. O bolsonarista Ernesto Araújo imita Celso Amorim, chanceler lulista, rebaixando o Itamaraty ao estatuto de ferramenta de uma facção.
“Personalidades autoritárias não apreciam espíritos libertários como o meu”. O diagnóstico aplica-se tanto a Araújo como a Amorim. Nos tempos do segundo, ondas de expurgos afastaram dezenas de diplomatas experientes que não aceitavam a condição de sabujos do ministro de turno. Hoje, a pretexto de promover jovens diplomatas, o primeiro cerca-se de bajuladores dispostos a aplaudir com igual fervor suas asneiras retóricas e suas insanas iniciativas de política externa. A corrupção moral não figura no Código Penal, mas suas consequências são tão danosas quanto a corrupção política.
Na democracia, uma fronteira nítida separa a conquista do governo da colonização partidária do Estado. O bolsonarismo aprendeu com o lulopetismo a ultrapassar a linha divisória, excluindo os “espíritos libertários” para não ouvir vozes dissonantes. Daí, nasce o governo de facção, isolado numa concha de certezas ideológicas, protegido da crítica por espessos cordões de puxa-sacos. A demissão de Almeida é mais um sintoma de que a eleição presidencial produziu um giro de 360 graus, colocando-nos de volta no ponto de partida.
Araújo plagia Amorim. O chanceler lulista anunciou um novo começo para nossa política externa, que se tornaria “ativa e altiva”, substituindo a orientação supostamente subserviente de seus antecessores. O chanceler bolsonarista promete “libertar a política externa” dos grilhões do “globalismo” para que ela represente o “Brasil verdadeiro”. A ideia de inaugurar a História, enterrando um passado de impurezas e escrevendo capítulos imaculados no mármore branco, é marca invariável das “personalidades autoritárias”. Mas o paralelo entre os dois chanceleres tem limites —e as circunstâncias da demissão de Almeida lançam luz sobre uma diferença fundamental.
O ato de exoneração — comunicado depois que o diplomata publicou, em seu blog pessoal, as críticas formuladas por FH e Rubens Ricupero à atuação de Araújo na crise venezuelana — derivou efetivamente das críticas de Almeida a Olavo de Carvalho. A polêmica emergiu no 23 de fevereiro, dia do “cerco humanitário” a Maduro, quando Araújo sugeriu a abertura de um corredor de invasão em Roraima, a ser utilizado por forças dos EUA. A ideia evidenciou que o chanceler despreza as leis brasileiras e nossa tradição de política externa. Ao mesmo tempo, revelou que ele comprara, pelo valor de face, o blefe vazio da Casa Branca.
O desatino de Araújo provocou uma intervenção branca no Itamaraty. Um cordão sanitário formado pelo vice, Hamilton Mourão, e pelos generais Augusto Heleno (GSI) e Villas Bôas, ex-comandante do Exército, rodeou silenciosamente o ministro de Relações Exteriores. Então, na impossibilidade de demitir os generais que o sitiaram, o “Zeus de subúrbio” (apud Almeida) direcionou seu raio contra um espírito livre situado no interior de sua casamata.
Todo o episódio distingue, sob um aspecto crucial, o chanceler bolsonarista de seu predecessor lulista. A política externa de Amorim obedecia a centros de comando claros: Lula e o PT. Já a política externa de Araújo emana de um centro de comando clandestino, constituído por Olavo de Carvalho, Eduardo Bolsonaro e Steve Bannon, o ex-assessor de Trump que tenta construir uma “Internacional dos nacionalistas”.
No fim, a sorte sorriu para Almeida: as amplas vidraças da biblioteca Azeredo da Silveira são o melhor ponto de observação do incêndio que devasta o Itamaraty.

terça-feira, 5 de março de 2019

“Ernesto Araújo enganou o presidente”, diz embaixador demitido - Paulo Roberto de Almeida, Caio Junqueira (Crusoe)


“Ernesto Araújo enganou o presidente”, diz embaixador demitido

Paulo Roberto de Almeida
Entrevista com o jornalista Caio Junqueira, da revista Crusoé (5/03/2019)

O embaixador Paulo Roberto de Almeida (foto) recebeu na manhã de segunda-feira, 4, um telefonema de Pedro Wollny, chefe de gabinete do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. A ligação era para demiti-lo do cargo de presidente do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais, órgão acadêmico ligado ao Itamaraty. O motivo: uma postagem em seu blog pessoal na noite anterior com artigos críticos à política externa atual.
A demissão chamou a atenção de diplomatas. Muito mais pelo histórico do demitido do que pelos artigos em si. Almeida é um antigo opositor do petismo, que caíra no ostracismo por reprovações feitas à diplomacia dos governos Lula e Dilma Rousseff. Em entrevista a Crusoé nesta terça-feira, 5, ele diz que Araújo só passou a defender teses da direita por oportunismo, e critica os padrinhos do chanceler: o deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, e o escritor Olavo de Carvalho.
Diplomata de carreira desde 1977, Almeida foi ministro-conselheiro na Embaixada do Brasil em Washington e trabalhou entre 2003 e 2007 como Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Ele afirma que quem está mandando mesmo nas questões envolvendo o Brasil com outros países são os militares. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como foi sua demissão?
Eu publiquei no domingo uma postagem no meu blog remetendo a um PDF que montei com base em três documentos sobre política externa do Brasil: uma palestra do Rubens Ricupero, um artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a Venezuela e um artigo do chanceler Ernesto Araújo. Juntei os três e convidei os leitores a fazer um debate sobre política externa. Isso foi usado na segunda-feira pela manhã para me exonerar. O chefe de gabinete (Pedro Wollny) me ligou e disse que eu tinha demonstrado inconveniência ao postar os documentos no meu blog pessoal. Ora, fiz isso ao longo de todo o lulopetismo e talvez para o meu próprio prejuízo, porque fiquei no ostracismo completo. Durante os dois anos do governo Michel Temer, quando fui finalmente chamado para exercer um cargo no Itamaraty, postei constantemente. Coloquei no blog tudo o que achava relevante sobre política externa. Fui tomado de surpresa agora, por ter sido dispensado a mim o mesmo tipo de tratamento que tive no passado, de censura, isolamento e, de certa forma, punição.

O sr. acredita que foi essa postagem que gerou sua demissão?
Na verdade, o que foi levado em conta foram comentários anteriores que fiz no blog e no Twitter sobre o Olavo de Carvalho, que acho um personagem nefasto para a política externa brasileira. É um inepto em relações políticas internacionais e vem se pronunciando sobre essa fantasmagoria do globalismo, que parece que contaminou o nosso chanceler.

Qual sua avaliação sobre o chanceler?
O Ernesto nunca, jamais, em nenhum momento da história anterior e do regime lulopetista, se manifestou contra o marxismo cultural, contra o apoio a governos esquerdistas. Ele se aproveitou dessa onda antipetista e contra a esquerda para ascender. Como fez o Samuel Pinheiro Guimarães (secretário-geral do Itamaraty e depois secretário de Assuntos Estratégicos no governo Lula), que no final do governo FHC começou a falar contra a Alca (Área de Livre Comércio das Américas idealizada pelos Estados Unidos e cuja participação brasileira Lula barrou), contra o Mercosul neoliberal, e se tornou um dos principais gurus do lulopetismo. O Ernesto farejou essa ascensão da direita. E sendo ou não conservador, religioso ou direitista, aderiu completamente a ela. Criou um blog em que apoiava abertamente Bolsonaro e se pronunciava em tons ásperos contra os marxistas e contra os esquerdistas. Contra a China maoísta, algo que não existe há mais ou menos 40 anos. E contra o climatismo. Tem muito de construído aí. Eu o considerava um diplomata normal. Competente, como são os diplomatas em geral. Essa transformação de burocrata normal da diplomacia para arauto da luta contra o globalismo é uma construção artificial e feita de forma um pouco oportunista para entrar nessa onda bolsonarista e da direita. Ele enganou os olavistas verdadeiros e o próprio presidente para conquistar esse cargo.

Então, no fundo, foram suas críticas a Olavo de Carvalho que causaram a sua demissão?
Olavo é um guru distante que pode ter sido influente politicamente, mas não determinante nas medidas que são adotadas pelo chanceler em relação à Venezuela, ao Pacto das Migrações, à mudança da embaixada brasileira em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém. Ele defende a luta contra o globalismo e nosso chanceler encampa isso. Como eu me pronunciei contra o que eu chamo de “sofista de Virginia”, isso deve ter chocado muito o chanceler.

Eduardo Bolsonaro também tem influência sobre o chanceler?
O Eduardo Bolsonaro também é um personagem nefasto para a política externa brasileira, porque vive pregando não uma adesão aos Estados Unidos, mas ao governo Trump, o que é de uma inconveniência total. Ele certamente é o grande responsável pela aceitação do Ernesto como chanceler, juntamente com o Filipe Martins, que era assessor de assuntos internacionais do PSL (e atual assessor especial da Presidência da República).

Filipe é outra eminência parda na política externa brasileira? 
Ele é um desses verdadeiros crentes que ascenderam na onda da direita e foi guindado a essa posição por influência dos chamados bolsokids (os filhos do presidente). Não acho que tenha muita influência, não. O vice-presidente, general Hamilton Mourão, já mostrou que não dá muita importância a um garoto que já foi chamado de Robespirralho ou Sorocabannon (termo que une Sorocaba, cidade natal de Filipe, a Steve Bannon, um dos estrategistas do presidente americano Donald Trump). Tem lá sua influência porque foi quem fez o desastroso discurso de Jair Bolsonaro em Davos, de seis minutos, em que o presidente não disse absolutamente nada. Tem uma influência marginal. Reúne-se sempre com o Ernesto. Faz parte daquilo que o Ricupero denominou como lunatic fringe: a franja lunática do governo Trump. É um verdadeiro crente nessa coisa de olavismo. Uma ideologia muito difusa e confusa, à qual aderem os jovens carentes de formação mais completa.

Como avalia a política externa atual conduzida pelo ministro Ernesto Araújo?
Gostaria de responder positivamente, se houvesse uma política externa do Ernesto Araújo. Não vejo nenhuma. Não tenho nenhuma exposição clara, abrangente, completa e sistemática de todos os pontos do que pudesse ser chamado de política externa do Ernesto Araújo. Se você descobrir e me enviar, agradeço e vou me pronunciar sobre ela. O que você tem são esses artigos no blog dele e declarações no discurso de posse que não têm quase nada de política externa. São chamamentos a uma missão salvadora, de resgatar o nosso Itamaraty do marxismo. Isso é uma ofensa aos diplomatas, que, na maior parte das vezes, são profissionais dedicados a questões técnicas da política externa e não a causas salvacionistas.

Por que é uma ofensa?
Se tiver petistas no Itamaraty, são dois ou três. O resto é oportunista, porque quer promoção, posto, remoção. Se o presidente fosse o Paulo Maluf, eles seriam malufistas. Com Lula, houve no Itamaraty uma grande adesão às causas lulopetistas, ao desenvolvimentismo, à política Sul-Sul. Mas diplomatas são burocratas bem-comportados, no mais das vezes.

Então pode haver também uma adesão à política externa bolsonarista, não?
Não sei. Essa adesão à luta contra o marxismo cultural, contra o globalismo… Não sei o que os diplomatas teriam a fazer porque tudo isso é muito confuso.

Como está o Itamaraty hoje?
Está parado. Há uma grande paralisia quanto a definições para saber o que se deve fazer.

Com isso tudo acontecendo, os militares estão assumindo a política externa?
Eles têm uma determinação maior que a do próprio chanceler. Isso se revelou desde o início, em temas como a instalação de uma base americana no Brasil, China, embaixada em Jerusalém e outros elementos da política externa que ficaram sob controle estrito da ala militar do governo. Há uma espécie de comitê de tutela da ala militar sobre o chanceler. Isso está muito claro e se revelou agora de novo na reunião do grupo de Lima (reunião de países formada para debater a crise na Venezuela), quando o vice-presidente foi o chefe da delegação e expressou claramente posições dos militares brasileiros contra o chanceler. Há uma liderança diplomática exercida por militares.

Eles que mandam de fato?
Não diria que eles mandam porque tem aí, digamos, um conselho de defesa que se reúne com militares e o chanceler. O conselho toma posições de substância. Eu imagino que essas duas próximas visitas do presidente a Israel e aos Estados Unidos estejam sendo planejadas por um conselho que extravase o Itamaraty. Imagino que a opinião dos militares será mais determinante do que a do chanceler nessas questões de acordos, anúncios e declarações.

O Itamaraty vê com bons olhos a influência militar sobre seu trabalho?
Soldados e diplomatas sempre se entenderam muito bem em todos os países. São dois grandes esteios do estado nacional e da defesa e segurança do país. Atuam conjuntamente. Mas no Brasil está havendo uma inversão. Atualmente, são os soldados que estão defendendo posições mais diplomáticas, e o chanceler, uma posição mais dura e de intervenção em assuntos internos dos outros países. Há uma indefinição quanto às grandes linhas da política externa. Não se sabe o que vamos fazer, por exemplo, com China, Estados Unidos e Venezuela. E os militares entram nesse vácuo. São um corpo bem preparado, democrático e consciente dos grandes desafios do país, ao passo que no Itamaraty há indefinição sobre tudo isso.

Já há exemplos da supremacia militar sobre o Itamaraty neste governo?
Sim. Você começou o ano com o anúncio de uma grande base americana no Brasil, que foi rechaçada pelos militares. Teve anúncio da mudança da embaixada de Israel de Tel-Aviv para Jerusalém, descartada por pressão dos agricultores e dos militares. Teve a demonstração de animosidade em relação à China, tanto do presidente quanto do chanceler, minimizada pelos militares. Teve anúncio de retirada do Acordo de Paris, que não se consagrou por ser uma medida inócua, por ignorância do que representa o acordo sobre mudanças climáticas, algo até benéfico as políticas do Brasil.

É possível comparar sua demissão à perseguição que  sofreu na era petista?
Pela motivações autoritárias e censuradoras, sim. Na substância, não. Na era petista, eu já tinha um passado de comentários sobre a política externa do PT, sobre as posições do Lula em matéria de política agrícola, de subsídio, ou sobre a aliança com pobres e oprimidos para enfrentar os vilões hegemônicos. Eles sabiam bem quem eu era e fui vetado logo no início, até mesmo para exercer um cargo que não tinha nada a ver com diplomacia: ia assumir o mestrado do Instituto Rio Branco e fui impedido. E depois fui vetado pelo Celso Amorim em diferentes cargos no Itamaraty. Ele acabou me oferecendo uma embaixada na Ásia, que não aceitei. E aí fiquei anos nos corredores sem função, trabalhando na biblioteca. Hoje é diferente. Você tem uma pessoa insegura (Ernesto Araújo). Vamos falar claramente: o ministro é uma pessoa insegura, que precisa firmar sua autoridade, e até para uma perspectiva geracional, ele está trocando todas as chefias mais antigas por pessoas mais jovens. Precisava se livrar dos mais velhos. Em algum momento, eu seria substituído. Mas,na verdade, fui defenestrado por suposta insubordinação ou inconveniência de postar coisas no meu blog. Acho que o espírito é o mesmo, mas as motivações talvez sejam diferentes. O petismo sabia bem o que queria fazer, e portanto eu era um opositor ideológico identificado desde o início. Agora, eles não sabem bem o que fazer, mas se revoltam contra todos os supostos opositores.

Para onde o senhor vai agora? 
Não espero nada agora. Vou ficar nos corredores e vou para a biblioteca como sempre fiz.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 5 de março de 2019

segunda-feira, 4 de março de 2019

Ernesto Araujo ataca FHC e diz que Brasil guiou EUA na crise da Venezuela - FSP

Mais um episódio de um "não-debate" sobre a diplomacia brasileira e a sua política externa.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4/03/2019

Ernesto Araújo ataca FHC e diz que Brasil guiou EUA na crise da Venezuela

Em blog, chanceler diz que ex-presidente desprezava povo brasileiro e critica tradição diplomática

Em artigo publicado em seu blog, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ataca Fernando Henrique Cardoso por suas declarações sobre a crise na Venezuela, dizendo que o ex-presidente defende “tradições inúteis de retórica vazia” e que ele “abertamente desprezava” o povo brasileiro e os eleitores de direita.
No texto, intitulado Contra o consenso da inação, Araújo também afirma que foi o Brasil que guiou os EUA nas decisões tomadas recentemente em relação ao país vizinho, e não o contrário.
Na última quinta-feira (28), FHC havia postado em seu Twitter que “novas eleições livres são o caminho para o futuro democrático na Venezuela” e que “intervenções militares não conduzem à democracia”.
Araújo criticou FHC, dizendo que ele usa “o mais surrado dos artifícios retóricos” ao criar “uma falsa dicotomia” entre consenso e intervenção armada no país vizinho. “Ao contrário de FHC, eu acredito na diplomacia, porque acredito na força da palavra e do espírito humano para mudar a realidade, porque não sou cínico nem materialista, porque acredito no povo brasileiro, esse povo dos “grotões” que FHC abertamente desprezava (assim como desprezava e despreza os eleitores de direita que o fizeram presidente duas vezes)”, escreveu.
No texto, o chanceler Araújo critica a tradição da política externa brasileira nos últimos 25 anos, baseada no “consenso” —que ele qualifica de “infame”—  e dizendo que ela permitiu a consolidação de Hugo Chávez e de Nicolás Maduro no poder na Venezuela, a entrada do país no Mercosul e o “predomínio crescente do bolivarianismo na América do Sul concebida como um bloco socialista”.
“Insistir agora em que esse consenso continue a prevalecer na esfera da política externa, por temor e preguiça, sob o pretexto de ‘manter as tradições’, seria trair o povo brasileiro”, escreveu.
Segundo o chanceler, “uma grande liderança democrática venezuelana” disse a ele que foram as iniciativas do Brasil que “mobilizaram os próprios Estados Unidos a romperem a inércia em que se encontravam até o início de janeiro e a virem colocar seu peso político em favor da transição democrática”. “Não foi o Brasil que seguiu os EUA, mas antes o contrário.”
Araújo também teceu críticas ao ex-ministro Rubens Ricupero, ao afirmar que recebeu o agradecimento dos venezuelanos quando visitou as fronteiras do país com a Colômbia e o Brasil e abraçou o autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, “enquanto Rubens Ricupero e Fernando Henrique Cardoso escreviam seus artigos espezinhando aquilo que não conhecem, defendendo suas tradições inúteis de retórica vazia e desídia cúmplice”.

A politica externa brasileira em debate: Ricupero, FHC e Araujo


A política externa brasileira em debate: Ricupero, FHC e Araujo

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: textos para debate; finalidade: discutir as orientações da diplomacia]


Sumário
1) Introdução: Paulo Roberto de Almeida, 4 de março de 2019                1
2) Rubens Ricupero, 25 de fevereiro de 2019                                                2
3) Fernando Henrique Cardoso, 3 de março de 2019                                  13
4) Ernesto Araujo, 3 de março de 2019                                                          15


1) Introdução: Paulo Roberto de Almeida, 4 de março de 2019
Em toda a minha carreira diplomática, sempre defendi ideias próprias sobre as orientações de nossa política externa, o que aliás foi objeto de algumas controvérsias e uma tantas advertências de superiores quanto a certas posturas que mantive e mantenho em discordância eventual com as orientações oficiais. Nunca me abstive de expressar minhas opiniões a esse respeito, inclusive por escrito, o que aliás suscitou uma ou outra “punição” em certas ocasiões, e um longo ostracismo sob o lulopetismo, que sempre considerei a deformação maior de nossa política, não apenas pela sua extraordinária inépcia administrativa e formidável corrupção, mas também pelos equívocos de política econômica, que nos levaram ao que já chamei de “Grande Destruição”, a inédita recessão que ainda penaliza o povo brasileiro até muitos anos à frente.
Na área da política externa – justamente a que motivou a minha longa travessia do deserto durante toda a duração do criminoso regime –, minhas discordâncias eram conceituais, operacionais, metodológicas, substantivas e de estilo, ou seja, em toda a linha. Em qualquer hipótese, numa me eximi de manifestar essas discordâncias, de forma mais discreta ao início, de maneira aberta ao final, e atualmente. Mas, já estamos em outro regime, supostamente oposto em toda a linha ao regime lulopetista anterior.
Isso não me exime, no entanto, de continuar seguindo a política externa do atual governo, e de formular eventualmente a minha opinião sobre as orientações em curso. No momento, não disponho de nenhum texto estruturado sobre a atual diplomacia, inclusive porque não tivemos, até o presente momento, nenhuma exposição abrangente, sistemática e completa sobre os fundamentos políticos, as orientações conceituais, as prioridades e as preferências táticas da política externa do governo Bolsonaro, a não ser a emissão de alguns grandes slogans, que não constituem um documento de política, mas apenas conceitos gerais, que revelam intenções, mais do que uma estratégia precisa.
Mas, o debate já está aberto, aliás desde antes das eleições, e desde antes da posse do novo governo, em função de declarações do chanceler designado, o que suscitou uma série de reações, favoráveis e contrárias, na comunidade interessada em política externa. De minha parte não me pronunciei a respeito, mas venho seguindo atentamente essas manifestações, e postando no meu blog Diplomatizzando os textos mais relevantes. É o caso agora, com três exposições razoavelmente abrangentes sobre essas orientações gerais em política externa, e mais especificamente sobre a Venezuela, possivelmente o caso que servirá de teste para a diplomacia brasileira na presente conjuntura. Além desse test-case, permanecem questões de fundo que ainda serão mais debatidas. Transcrevo aqui os três textos mais significativos do debate atual, os dois primeiros nominalmente mencionados no terceiro, do próprio chanceler, que os acusa, de forma direta e nominal, de serem parte de uma diplomacia que ele rejeita e abomina.
O debate está aberto, e certamente teremos outros textos e outras polêmicas.
Minha função é esta: abrir meu espaço público a ideias inteligentes para o debate de pessoas inteligentes.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de março de 2019

Ler os três textos no seguinte link: 

https://www.academia.edu/s/70710c9869/a-politica-externa-brasileira-em-debate-ricupero-fhc-e-araujo