Abaixo, o cartaz com a programação da Mesa redonda "VISCONDE DE MAUÁ: INOVAÇÃO NO BRASIL DO SEGUNDO REINADO", organizada pela entidade que coordena os cursos de Administração na Universidade Federal Fluminense e que anuncia que existem mais informações neste link:
http://abrasuff.blogspot.com.br/ (de fato não, há; o curso de administração ainda não conseguiu administrar o seu próprio site).
Em todo caso, se trata de uma seção em homenagem a um dos grandes empresários, o maior, do Império, o homem que teria colocado o Brasil no caminho da modernidade, se por acaso suas ideias tivessem penetrado mais fundo na consciência dos líderes políticos agraristas e escravocratas que conduziram o Império à sua modorra de estagnação durante quase um século inteiro.
Eu costumo dizer que é mais interessante examinar a trajetória de um país pelos seus fracassos do que pelo seus supostos sucessos. O sucesso tem muitos país, o fracasso não costuma ter nenhuma mãe. Ninguém quer ser responsável pelo fracasso de um país, embora muitos sejam responsáveis, em primeiro lugar, como sempre ocorre, elites incompetentes, desde o Império até hoje, quando temos uma nova elite no poder, na verdade uma nova classe, no sentido da Nomenklatura, que está conseguindo fazer o país recuar.
Podemos facilmente identificar os grandes derrotados da história do Brasil, e Mauá é certamente um deles. Mas a história começa com José Bonifácio, derrotado em seu projeto de libertar imediatamente o Brasil do tráfico e da escravidão em médio prazo, estimulando a imigração europeia e a industrialização do país, com uma consciência muito avançada do que hoje em dia se chama "desenvolvimento sustentável", ou seja, preservação dos recursos naturais e do meio ambiente.
O outro grande derrotado foi justamente Irineu Evangelista de Souza, que queria um Brasil aberto ao comércio internacional, às inovações industriais, a um mercado de capitais ativo, e dominado por interesses privados, enfim, um país capitalista, e liberal em economia, mesmo se ele mesmo se beneficiou de inúmeras concessões públicas e de monopólios oficiais. Mas, criador do segundo Banco do Brasil, ele foi derrotado pelos políticos do Segundo Império nos seus propósitos de ampliar o crédito e abrir o Brasil aos investimentos estrangeiros. Não conseguiu, e a monarquia continuou escravocrata, agrarista, atrasada em tudo.
Outro derrotado foram os primeiros tribunos republicanos, inclusive Rui Barbosa, em seus propósitos de educar a população e fazer do direito uma das bases da política nacional; foi derrotado também pelos agraristas reacionários, e pelos políticos corruptos.
Monteiro Lobato tentou modernizar o país, mas também foi um derrotado, assim como o foram os reformistas da educação brasileira nos anos 1920 e 30, que só conseguiram construir parcialmente uma educação de qualidade para o povo brasileiro, ainda assim limitada às camadas médias urbanas.
Não coloco os nacionalistas dos anos 1950 e 60 entre os derrotados, pois eles foram amplamente vitoriosos, inclusive pela ação dos militares, que foram obtusamente nacionalistas e equivocadamente estatizantes, aliás como são hoje os representantes da elite no poder, sempre atrasados mentalmente.
Espero que alguns aspectos dessas tentativas derrotadas sejam evocadas no colóquio abaixo, para esclarecimento dos presentes, e conscientização dos atuais defensores de um "modelo" brasileiro de desenvolvimento.
Na verdade, não existem modelos, apenas trabalho, em torno de alguns princípios fundamentais, infelizmente sempre derrogados por nossas elites. Listo aqui os elementos de um país bem sucedido:
1) Macroeconomia aberta, estável, com fundamentos sólidos nas boas políticas macroeconômicas e setoriais; 2) Micreconomia competitiva, sem oligopólios, carteis e proteção indevida; 3) Boa governança, instituições sólidas, transparentes, responsáveis, baixa ou nenhuma corrupção, sem privilégios para quaisquer categorias, mas assegurando um bom ambiente de negócios privados; 4) Alta qualidade dos recursos humanos, o que significa boas escolas, abertas a todos; 5) Abertura ao comércio e aos investimentos internacionais, o que infelizmente não é o caso ainda em nosso país.
Com essas considerações em mente, formulo meus votos para um bom colóquio na UFF.
Paulo Roberto de Almeida
Mauá
Kenneth Maxwell
Folha de S.Paulo, 7/12/2013
Este mês marca o bicentenário do nascimento de Irineu Evangelista de Sousa, em 28 de dezembro de 1813, em Arroio Grande, na fronteira sul do território que se tornaria o Rio Grande do Sul. Ele morreu em 1889, em Petrópolis, no Rio de Janeiro, como visconde de Mauá, pouco antes da queda do Império brasileiro.
Mauá foi industrial, banqueiro e empresário. Homem de origens modestas, perdeu o pai, morto por ladrões de gado, aos cinco anos de idade. O tio, capitão de navio, o levou ao Rio de Janeiro quando ele tinha nove anos de idade. Aos 15, Irineu começou a trabalhar para Richard Carruthers, um comerciante escocês radicado no Rio de Janeiro que se tornou seu mentor e seu amigo pelo resto da vida. Carruthers ensinou inglês e contabilidade a Mauá, e o iniciou na ordem maçônica. Depois que Carruthers retornou à Escócia, em 1829, Irineu assumiu o comando de seus negócios.
Ele se opunha ao comércio negreiro e à escravatura. Foi um pioneiro da metalurgia, da iluminação a gás, dos estaleiros, dos motores a vapor, dos navios a vapor para o rio Amazonas e das ferrovias.
No auge de sua carreira, em 1860, controlava 17 em- presas no Brasil, Uruguai, Argentina, Reino Unido, França e Estados Unidos. Em 1867, o valor de suas propriedades foi estimado em 155 milhões de libras. A renda do império brasileiro naquela época era de 97 milhões de libras.
O imperador dom Pedro 2º compareceu à inauguração do trecho inicial de sua ferrovia até Petrópolis, em 1854, no dia em que Mauá recebeu o título de barão de Mauá. O emblema heráldico do novo nobre exibia um motor a vapor no topo de seu brasão, com um navio a vapor abaixo. O lema que ele adotou foi "Labor Improbus Omnia Vincit": o trabalho árduo tudo vence.
O Barão de Mauá conseguia levantar capital em Londres em seu nome pessoal. Em 1860, obteve o apoio do barão Lionel de Rothschild, que adquiriu mil ações de sua "São Paulo Railway Company". Mas Carruthers aconselhou cautela. Em tempos de prosperidade, "os bancos são só sorrisos e empréstimos fáceis, mas não conte com o dinheiro deles nos momentos difíceis".
Mauá lutou contra a falência, na velhice. Mas pagou suas dívidas. Em 1889, seu corpo foi transportado de Petrópolis ao Rio pela ferrovia que ele construiu sobre a Serra do Mar. Sua vida é uma lição sobre o que um homem vindo de baixo pode realizar no Brasil. E sobre os riscos que ele corre.
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Addendum em 09/12/2013, a partir de comentário recebido neste post, já inserido, mas aqui tornado explícito, sob a forma de uma indicação de artigo publicado na
Revista de Administração e Inovação (RAI):
PROCESSO DE INOVAÇÃO E O EMPREENDEDORISMO NO BRASIL: O CASO MAUÁ
DOI: 10.5585/rai.v6i1.313
Moacir Bispo Santos, Camila Papa Lopes, José Alberto Carvalho dos Santos Claro
Resumo
Este artigo apresenta um exemplo de empreendedorismo que alia conhecimento e inovação, ao relacionar a vida de Irineu Evangelista de Sousa (Barão de Mauá) com o tema do empreendedorismo, passando pelas leituras de McClelland, Schumpeter, Vries, Thimmmons, Say, Dornellas, Empretec pelo Sebrae, que tratam do comportamento empreendedor, e Caldeira, que aborda especificamente a história de Mauá, utilizando-se para tal a análise comparativa entre esses autores para mostrar a contribuição do Barão de Mauá para o desenvolvimento do Brasil, por meio dos negócios por ele estabelecidos no século XIX, identificando a capacidade administrativa e o pioneirismo no processo de industrialização brasileira. Questiona-se se o processo de inovação no Brasil deve sua história ao empreendedorismo a partir de pioneiros que alavancaram nossa economia e administração. Adotou-se o exemplo de Irineu Evangelista de Sousa, o empreendedor da inovação a partir de um estudo qualitativo descritivo, de forma a contextualizar a realidade do empreendedorismo no Brasil e de que forma foi consolidada sua estrutura. A pesquisa entre o que a literatura estabelece de comportamento empreendedor e a postura do Barão de Mauá mostra quais características são consideradas no empreendedor para definir a competência para o sucesso nos negócios, como um exemplo de que a inovação é perpetuada pelas características empreendedoras.