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quarta-feira, 21 de março de 2012

Enterrando a ciencia e a reputacao junto: Unesco Equatorial...

A Unesco nunca foi conhecida como paradigma de eficiência. A começar que -- como outros paquidermes intergovernamentais, aliás -- ela gasta mais dinheiro com as atividades-meio, do que com as atividades-fim, ou seja, bem mais com seus próprios burocratas do que com educação, ciência e cultura, como ela é suposta fazer (mas só de araque). Em segundo lugar, porque ela gasta a maior parte do seu dinheiro em Paris mesmo, não na outra ponta do mundo. Em terceiro lugar, porque ela se mete em cada confusão desnecessária. No passado, uma tentantiva de controlar a informação -- o que contrário do que seus estatutos dizem -- talvez a serviço das muitas ditaduras que frequentam seus corredores acarpetados, foi recebida muito mal por diversos países, o que motivou inclusive a retirada dos EUA desse organismo passavelmente inútil.
Agora ela se meteu em outra confusão: um "prêmio para a ciência" com uma dotação milionária vinda de um dos países mais miseráveis do planeta, e jamais exemplo de democracia ou de defesa dos direitos humanos.
Abaixo a matéria da Economist sobre esse lamentável assunto.
Apenas para informação dos pouco informados (mas eu apenas li sobre isso em outra matéria no International Herald Tribune, de 9/03/2012): vários países recusaram, com razão, a institucionalização desse prêmio, entre eles a Áustria, a Bélgica, Dinamarca, França, Espanha e diversos outros países europeus, mais os EUA.
Quem apoiou? Adivinhem:
Países árabes, China, Índia, Rússia e... Brasil!
Pois é, a gente sempre do lado das boas causas...
Paulo Roberto de Almeida

UNESCO's dodgy prize

Prize fools

Mar 20th 2012, 14:55 by The Economist online
HOW best does an oil-rich dictator, who rigs elections at home and locks away those who dare to grumble, try to burnish his international reputation? That question puzzles one of Africa's oldest and least pleasant incumbents, Obiang Nguema of Equatorial Guinea. Along with Zimbabwe's Robert Mugabe he has enjoyed well over three uninterrupted decades in power. Now the kleptocrat—once famously dubbed a "tropical gangster"—is eager to be looked upon more kindly by outsiders. Yet diverting millions of dollars to pay lobbyists and PR firms to come up with bright ideas has not exactly brought good results. For example a trip last year for British parliamentarians to Equatorial Guinea proved a public-relations disaster. Perhaps that was to be expected—it was organised by an individual whose only other engagement with the country was his association with a bungled 2004 "wonga coup" by half-witted British mercenaries.
Another PR effort has fared little better. Two years ago a proposal was raised to divert official funds to endow a prize in the life sciences to be named after Mr Nguema and dished out by UNESCO, the Paris-based bit of the United Nations concerned with education and culture. That the $3m or so involved could have been used on hospitals or schools in Equatorial Guinea seemed not to trouble the UN, the PR firms or Mr Nguema. Nor did UNESCO's spectacularly dozy officials at first grasp that taking money from a grubby dictator might cast their own organisation in a dim light. UNESCO initially insisted it would push on with the prize. But after pressure from human-rights groups, activists from Equatorial Guinea and newspapers (including The Economist) the UN rethought and sought ways to postpone or cancel the prize.
This month, however, the board of the UN body appeared to hand Mr Nguema a success, voting on March 8th to rename the prize and to push on with it. That looks a dismal decision. A plea from human-rights groups fell on deaf ears. Similarly ignored was a letter smuggled from a jailed opposition activist, Dr Wenceslao Mansogo, in Bata, Equatorial Guinea, imploring UNESCO not to endow the prize but instead to demand that Mr Nguema release political prisoners. The director of UNESCO, Irina Bokova, who belatedly realized the damage the prize is doing to the UN body, even spoke against it. She pointed to international criticism of the prize, lamented that it has already served to "divide" countries, cited attacks by Nobel Laureates on the process and the refusal of experts to sit on the jury for offering the prize. All to no avail. The member states on the board pressed on.
But Mr Nguema's success is more limited than he might imagine. An official response from Malabo, the capital, indicated that celebrations followed the recent announcement. But with luck the prize will never be handed out. Ms Bokova should be able to ensure her bureaucracy does what it is very best at: masterful inactivity. Legal wranglings could bog down the prize for another year or two. Some suggest that by taking funds from Equatorial Guinea the UN body might be charged with money laundering, under French law. All the UN needs to do, suggests a person who has followed the sorry saga for years, is to drag on the whole affair and prevent the prize being issued before the end of 2013, when a "sunset clause" would kill it off in any case. Mr Nguema and his PR companies, however, will sadly almost certainly be around for many more years yet, with plenty more such schemes to try.


terça-feira, 14 de junho de 2011

A agenda internacional do Brasil - Marcelo de Paiva Abreu

Desafios da agenda econômica internacional
Marcelo de Paiva Abreu*
O Estado de São Paulo, segunda-feira, 13.6.2011

Qual é a atual agenda econômica internacional do Brasil? E em que medida se ajusta aos "interesses nacionais", isto é, a interesses que não sejam estritamente associados a determinados grupos econômicos ou classes sociais? No jargão dos economistas, que não reflitam meros "interesses especiais". É claro que sempre existirão interesses especiais beneficiados quando se trata de defender interesses nacionais. Mas o que deve ser encarado criticamente é o triste espetáculo de defesa de "interesses especiais" por representantes das "classes produtoras" enrolados na bandeira nacional e invocando "interesses nacionais". Seria salutar que o chororô cambial fosse pelo menos acompanhado da denúncia de suas causas principais: um governo que insiste em gastar muito e mal.

Não é simples separar a agenda econômica da agenda política. Alguns objetivos de natureza política são justificados, ao menos parcialmente, por suas implicações sobre o poder de barganha do Brasil em foros estritamente econômico-financeiros. Esse é o caso do velho anseio brasileiro por um lugar no Conselho de Segurança (CS) da ONU. No passado recente, a ênfase nesse objetivo foi certamente excessiva, configurando "postulação" do Brasil que, caso rejeitada, poderia levar facilmente à perda de face. Especialmente quando é altamente improvável que os cinco atuais membros permanentes do CS estejam dispostos a compartilhar o seu poder de veto com novos membros. O objetivo do Brasil quanto ao assunto deveria ser envidar esforços para tornar improvável que, no caso de expansão do Conselho de Segurança em termos aceitáveis - algo a definir -, o Brasil seja preterido. Mas a principal justificativa para a prioridade do tema é o fortalecimento da posição negociadora brasileira na Organização Mundial do Comércio (OMC) e no eixo G-20/FMI, pois, em matérias estritamente relacionadas ao tema segurança, o interesse brasileiro é secundário.

No terreno comercial, os interesses brasileiros continuam focados na redução do protecionismo nas negociações da Rodada Doha, a despeito do notável desinteresse dos EUA e da União Europeia e de diversas declarações contritas do G-20. Esse tem sido, de longe, o tema em que a diplomacia brasileira se tem revelado persistentemente mais coerente. A importância do Brasil na OMC é muito maior do que seria justificado pelo peso do Brasil no comércio mundial. Isso é fruto de muitas décadas de envolvimento sério da diplomacia comercial brasileira no assunto, só ocasionalmente marcado por posturas de baixa credibilidade, como foi o caso em meados da década de 1980.

No quadro regional, o governo deverá avaliar se há condições políticas para ou um avanço significativo na consolidação do Mercosul ou um recuo para uma zona de livre comércio, que devolverá preciosos graus de liberdade à formulação da política comercial brasileira, independentemente da Argentina. A situação atual do Brasil é similar à do asno de Buridan, que, faminto e sedento, equidistante do balde d"água e do monte de feno, acabou morrendo de fome e de sede. O custo de estar obrigado a negociar uma tarifa externa comum compatível com as restrições argentinas está ficando proibitivo.

No terreno financeiro, a estratégia cautelosa seria a gradual construção de good will no G-20/FMI, tomando como exemplo o que foi possível fazer em Genebra. A dificuldade aí é que, para isso, seria preciso que de forma persistente e crível as autoridades econômicas demonstrassem efetivo compromisso com políticas macroeconômicas responsáveis. Não há espaço para a construção de credibilidade num ambiente onde predomina a macroeconomia de fundo de quintal. Aquela que não crê, por exemplo, que investimento pressiona preços ou que não há relação entre política de juros e nível de inflação. Nessa área há muito dever de casa interno a fazer.

Finalmente, seria altamente recomendável a redução da notória propensão da diplomacia brasileira recente a considerar "estratégicas" relações com países cuja pauta prioritária pouco tem que ver com os efetivos interesses estratégicos brasileiros. Talvez a França seja o melhor exemplo de "parceiro estratégico" mal escolhido. A cooperação militar bilateral, em amplitude ainda a ser definida, não parece ser compensação suficiente para as notórias diferenças de posições quanto a diversos temas da agenda econômica, especialmente os agrícolas. Mesmo os Brics, com a possível exceção da África do Sul, têm interesses estratégicos bem diferentes dos do Brasil. A parceria estratégica com a China, em particular, que despertou tantas ilusões no passado, se tem revelado de digestão bastante difícil, com a consolidação da posição do Brasil, de um lado, como supridor de matérias-primas à China e, de outro, crescentemente deslocado como exportador de manufaturas pela China tanto em terceiros mercados quanto no mercado brasileiro.

A escolha de parceiros estratégicos que não sejam de mera conveniência passageira deveria ser alicerçada pela análise de quais são os interesses estratégicos do Brasil. E essa não parece ser a vantagem comparativa do atual governo.

*Marcelo de Paiva Abreu, doutor em economia pela Universidade de Cambridge, é professor titular no Departamento de Economia da PUC-Rio.