Eles vinham do leste da Europa Central, da região da Polônia denominada Galícia, de Bucovina (entre a Ucrânia e a Romênia), da Áustria-Hungria, bem como da Península Ibérica e do então "Reich alemão": esses judeus de idioma alemão ou ídiche, de países que hoje se chamam Ucrânia, Romênia, Rússia, Polônia e Alemanha, emigraram para todas as partes do mundo. Entre eles, encontravam-se médicos, artesãos, livreiros, advogados ou pequenos comerciantes. E nem todos partiam por livre e espontânea vontade.
Os judeus fugiam de discriminações e pogroms motivados pelo antissemitismo, mas também em consequência da situação econômica difícil e da falta de perspectivas naquele momento, em busca de uma vida mais segura e na esperança de um futuro melhor. Entre os destinos mais frequentes da emigração judaica estavam as Américas do Norte e do Sul, China, Palestina e República Dominicana, para mencionar apenas alguns.
Em seus novos países, eles fundaram cooperativas agrícolas e jornais, ergueram assentamentos e sinagogas, hospitais, escolas e bancos. E trabalharam também como atores, músicos, cientistas, tendo enfrentado, também nos países para os quais migravam, um antissemitismo incipiente.
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Tesouros nos porões
A historiadora Elke Kotowski, lembra que essas pessoas não levavam de seus países de origemapenas uma mala com pertences pessoais. "Eles levaram da Alemanha também suas tradições: suas habilidades artesanais, indumentárias e receitas", relata Kotowski. Essas tradições foram mantidas pelas famílias e passadas de geração a geração.
Muitas vezes, seus descendentes nem sabem dizer exatamente de onde vêm determinados costumes, aponta a historiadora que se propõe pesquisar o que restou dessas "culturas migradas" e de que forma os judeus se conectavam à cultura de seus novos países. Come este fim, ela coordena um amplo projeto do Centro Moses Mendelssohn, em Potsdam, voltado para a pesquisa da herança cultural judaico-alemã em todo o mundo.
Mas ainda há mais coisas a serem descobertas. Nos sótãos, porões, caixas e armários desses migrantes escondem-se até hoje verdadeiros tesouros, diz a historiadora. Os acervos, fotos, cartas e diários dos imigrantes precisam ser avaliados para que se possa registrar como era, de fato, a vida dos judeus antes e depois da migração. "Seria simplesmente uma pena se essas coisas fossem todas parar na lata de lixo", comenta Kotowski.
Neste processo de registro, surgem ocasionalmente também alguns dados curiosos. "Alemães da região da Suábia, por exemplo, migraram para um kibutz israelense. Consta que eles cuidavam notoriamente bem de suas casas e quintais, mantendo-os muito limpos, tendo levado diversos tipos de vassouras de seu povoado de origem". A quais, segundo consta, ainda se encontram nesse kibutz, décadas mais tarde.
Pesquisas em todo o mundo
O projeto de pesquisa pretende evitar que a herança cultura judaico-alemã dispersa por todo o mundo seja esquecida. Para que isso não ocorra, os pesquisadores tentam avaliar e arquivar o material encontrado, diz Kotowski. As próprias biografias individuais são uma fonte preciosa.
"Pesquisamos em todo o mundo", afirma a pesquisadora. Para isso, os historiadores do projeto sediado em Potsdam estabeleceram contatos com as embaixadas alemãs em 60 países, que repassam nomes, indicações de iniciativas e meios de chegar até os imigrantes judeus de então.
Além disso, estão envolvidas no projeto outras instituições, de pequeno e grande porte, como museus, casas da história, associações culturais, empresas de mídia e universidades. "Tenho certeza de que vamos encontrar alguma coisa em todos os lugares", acredita Kotowski. O foco da pesquisa é amplo. Julius Schoeps, diretor do Centro Moses Mendelssohn, diz que o projeto não está somente centrado na emigração judaica durante o período nazista, mas em todos os movimentos migratórios dos judeus de língua alemã desde o século 18.
Atrair atenção
O projeto deverá ser desenvolvido, a princípio, durante dois anos, com financiamento do Ministério alemão da Cultura e da Mídia. Em fins de outubro, realiza-se em Berlim uma conferência internacional sobre o assunto, que deverá reunir especialistas da Alemanha, EUA, Israel, América Latina e Áustria.
A meta é estabelecer um intercâmbio entre os estudiosos acerca da literatura judaico-alemã, tradições musicais, cultura da memória; assim como sobre o papel dos empresários judeus emigrados, e questões ligadas à identidade e à postura dos judeus frente à própria imagem.
Através dessa conferência, os responsáveis pelo projeto querem projetar seu trabalho e divulgar suas ideias perante especialistas de todo o mundo – inclusive de países como Polônia, Ucrânia e Rússia, onde as pesquisas sobre a herança cultural judaica nem mesmo começaram.
Autora: Cornelia Rabitz (sv)
Revisão: Augusto Valente