O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Intervencao dos governos na economia - Marcos Mendes


Por que o governo deve interferir na economia?

O funcionamento da economia, a princípio, não precisa de intervenções do governo. Por exemplo: quando uma seca destrói a safra de feijão, o preço do feijão sobe. Frente ao preço mais alto, as pessoas passam a comprar menos feijão, e o substituem por outro alimento mais barato. Isso significa que a demanda por feijão cai, diminuindo a pressão sobre seus preços. Por outro lado, comerciantes vão importar feijão, para aproveitar a oportunidade de lucrar com os preços mais altos. Ao colocarem no mercado essa importação, a escassez do produto diminuirá, com novo impulso à queda dos preços.
Há, portanto, um mecanismo de ajuste automático da economia: a escassez eleva os preços e o aumento de preços induz o fim da escassez. Em uma situação como essa, não há necessidade de o governo interferir na economia, pois ela se ajusta sozinha.
Há, porém, situações em que o mercado não se ajusta sozinho, são as chamadas “falhas de mercado”. Quando o mercado falha, a intervenção do governo pode ser importante para colocar a sociedade em um nível mais elevado de bem-estar. Mas existem, também, as “falhas de governo”: os problemas que o governo causa ao intervir na economia.
(...)
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Para ler mais sobre o tema:
Arvate, P., Biderman, C. (2006) Vantagens e desvantagens da intervenção do governo na economia. In: Mendes, M. (Org.) Gasto público eficiente: 91 propostas para o desenvolvimento do Brasil. Instituto Fernand Braudel/Topbooks. São Paulo, p. 45-70.
Andrade, E. (2004) Externalidades. In: Arvate, P., Biderman, C. (Orgs.) Economia do setor público no Brasil.FGV/Campus. São Paulo., p. 16-33
Stiglitz, J. (1999) Economics of the public sector. W.W. Norton & Company, 3rd edition. Capítulos 1 e 4.

Sobre o Autor:

Marcos Mendes
Doutor em economia – USP. Editor do site "Brasil, economia e governo".

Recomendações de artigos:



Produtividade, uma aula - Marcos Mendes (01/10)


O que é produtividade e como conseguir seu incremento?

(O presente texto constitui adaptação de capítulo do livro “Infraestrutura: os caminhos para sair do buraco” de autoria de Raul Velloso, César Mattos, Marcos Mendes e Paulo Springer de Freitas).
A teoria econômica mensura a produtividade de uma economia por meio do conceito de “Produtividade Total dos Fatores” (PTF). Parte-se da ideia de que o produto anual de uma economia (PIB) é criado pela interação entre os estoques de capital físico e de capital humano existentes. O capital físico é constituído por máquinas, equipamentos, edifícios e demais instrumentos utilizados na produção. O capital humano é dado pela capacidade produtiva da força de trabalho e normalmente é representado pela quantidade de pessoas em idade laboral ponderada pelo nível de escolaridade médio dessa força de trabalho (na suposição de que trabalhadores que passaram mais tempo na escola são mais produtivos).
Suponha duas economias hipotéticas que tenham igual dotação de capital físico e de capital humano. Se uma dessas economias tem um PIB maior que o da outra, conclui-se que ela foi mais eficiente no uso de seu estoque de capital. Logo, ela tem maior produtividade. Ser mais produtivo, portanto, significa fazer mais produtos a partir de uma dada disponibilidade de capital humano e físico disponível na economia.aixo]
(...) [ver ab

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  • Marcos Mendes
    Doutor em economia – USP. Editor do site "Brasil, economia e governo".

Governar o mundo?: uma idea liberal-utopista - book review

The Old, New World Order
Yascha Mounk
The Wall Street Journal, October 7, 2012

Over the course of the 19th century, the idea of a global government so powerful that it would make nations all but obsolete took hold of the European mind. Futurist writers like Felix Bodin in France and George Griffith in England popularized the notion that a single world order was "the only possible solution of the human problem," as H.G. Wells later put it. But unrealistic dreams bred exaggerated fears. Soon pessimists were convinced that powerful international institutions would usher in global despotism.
In "Governing the World: The History of an Idea," Mark Mazower gives a splendid account of these and other utopian dreamers and their adversaries. In his telling, the era of international government started after the Napoleonic wars. Prince Metternich, Austria's foreign minister, realized that the victorious forces of the old order needed to band together to contain revolutionary fervor. So he designed the "Concert of Europe," a kind of mutual-aid society for morose monarchies.

Governing the World

By Mark Mazower

(Penguin, 475 pages, $29.95)
Radicals of all stripes loathed the Concert's aims yet were inspired by its internationalism. A nascent peace movement hoped that a better set of institutions might do away with war. In England, Richard Cobden, a Radical member of parliament, argued that free trade would enrich every corner of the globe. Meanwhile, Giuseppe Mazzini, the Italian unifier, dreamed of a "brotherhood" of democratic, independent nations. These were partially competing visions. Even so, they were all important influences on the two most ambitious international institutions mankind has known: the League of Nations and the United Nations.
Mr. Mazower's intellectual history of world government is highly compelling. But his book's greatest merit is the author's treatment of the practical realities of the U.N. He gives clear-minded attention to a crucial, oft-neglected question: What real impact have international organizations had on the world? His answer implicitly challenges both the realist and liberal camps in international relations.
Many realists consider international organizations mere sound and fury. Powerful nations, they say, care about their ability to enforce their interests on the battlefield, not about the deliberations of a feckless body like the U.N.'s General Assembly. But this skepticism, Mr. Mazower argues, is hardly borne out by history. Even at the height of the Cold War, American leaders were loath to be isolated at the U.N. What's more, multilateral institutions have helped the United States influence its own allies: Over the past two decades, the International Monetary Fund and the World Bank have remade the international economic order much more radically than the White House could have done on its own.
In ascribing real importance to the U.N., Mr. Mazower's account dovetails with that of many liberal scholars. Yet, unlike them, he thinks that the U.N.'s influence is rather more sinister than meets the eye. He notes that many of the U.N.'s key features, like the veto held by the five permanent members of the Security Council, were designed to favor the winners of World War II. Going a big step further, he argues that we should see the partisan interests of the West lurking behind the high-minded, seemingly neutral language of documents like the Universal Declaration of Human Rights. Far from constraining the actions of the world's high and mighty, the U.N. has proved to be "a vital instrument for Washington in its pursuit of global power."
If this focus on the dark side of international norms and institutions is another of the book's strengths, it is also responsible for some of its greatest weaknesses. According to Mr. Mazower, for example, the 19th-century origins of international law were deeply influenced by a self-serving, arbitrary distinction between civilized and uncivilized nations—one that had the not-so-subtle aim of justifying Europe's brutal rule over its colonies. This is no doubt right. But to conclude that the fledging discipline of international law "translated into the massacres, aerial bombings, and systematic detentions that characterized European imperialism" is to put the cart before the horse.
Such exaggerations are particularly troubling because they prepare the ground for some contemporary conclusions. After the U.N.'s failure to stop genocides in Yugoslavia and Rwanda, the General Assembly in 2005 adopted the so-called Responsibility to Protect, a resolution that obliges the international community to stop genocide even when it is taking place inside a sovereign state. Most human-rights activists applauded. But Mr. Mazower writes off the Responsibility to Protect as a ploy to erode the sovereignty of weaker nations. So, while U.N. Secretary-General Ban Ki-moon hailed the West's intervention in Libya as the first real-world application of this new norm, Mr. Mazower was reminded of "Fascist Italy's cynical rationalization of its invasion of Ethiopia." The Responsibility to Protect, he concludes, is nothing other than "the old ghost of the standard of civilizations."
Great powers will always be tempted to twist international law to serve their own ends. Even so, Mr. Mazower's extreme comparisons obfuscate as much as they reveal. To equate a norm designed to protect vulnerable populations with a legal standard that was created to exploit them doesn't just play loose with history; it is also a curiously self-satisfied way to shove aside, in the name of anti-colonialist clairvoyance, our moral duty to prevent genocide.
"Universalism," Mr. Mazower concludes, "is in the eye of the beholder." But this is too extreme—and too easy—a lesson to draw. Though supposedly universalist norms have often been invoked in bad faith, it is not always impossible to distinguish just from unjust laws, or to extract colonialism from humanitarian intervention. Unless we resign ourselves to total moral relativism, there is little alternative to striving for relations between states that are governed by universal rules. Early enthusiasm about the emancipatory promise of world government now seems hopelessly naive. But the imperative to build an order capable of safeguarding peace and protecting individual rights has hardly become less urgent.
Mr. Mounk is a doctoral student in political theory at Harvard University and the founding editor of the Utopian.

8 de Outubro: Dia do Guerrilheiro Heroico - Che Guevara

A data vai ser comemorada oficialmente em Cuba, provavelmente se confundirá com a vitória de Hugo Chávez na Venezuela, e será devidamente lembrada por certo número de guevaristas pela América Latina e esquecida por muitos outros, inclusive aqueles que possuem uma camiseta, um objeto qualquer contendo uma foto, uma frase, uma referência mínima que seja ao mais famoso ícone capitalista do mundo socialista. 
Sim, estou falando do maior sucesso de marketing de todos os tempos. Qualquer microempresário esperto sabe que, se imprimir umas quantas camisetas e espalhar por alguns recintos universitários, venderá como pipoca, ou talvez melhor, como água. Finalmente, é a isso que foi reduzida a imagem e a lembrança do outrora guerrilheiro oficial da esquerda latino-americana e mundial, assassinado pelas forças militares bolivianos no povoado de La Higuera, no dia 8 de outubro de 1967, encerrando uma carreira que tinha começado, no seu lado guerrilheiro, dez anos antes no desembarque dos rebeldes cubanos que lutavam contra a ditadura de Fulgencio Batista, o fdp tolerado pelos americanos na ilha do Caribe que abrigava muitos investimentos americanos e permitia à máfia lavar um pouco de dinheiro nos cassinos de Havana.
O lado romântico começou alguns anos antes, e foi devidamente retratado em livros, no cinema, e não preciso retomar aqui sua carreira.
Confesso que fui um guevarista precoce, já que me politizei com a revolução cubana, e emprendi uma carreira de "guerrilheiro aprendiz" encerrada tão pronto cheguei à conclusão que aquele bang-bang perpetrado pelos grupos de resistência armada ao regime militar inaugurado em 1967 não iria dar em nada, dada a total inadequação das suas propostas à realidade política, social, econômica e militar do Brasil em meados daqueles anos. Mas, senti uma ponta de tristeza quando o comandante Guevara morreu nas selvas da Bolívia, pois esperávamos que o movimento pudesse se sustentar, até se transformar em mais um Vietnã, como havia demandado o comandante em uma de suas mensagens enviadas não se sabe de onde, e como tal derrotar o odiado imperialismo ianque em nosso continente.
Estávamos completamente iludidos, como logo vim a descobrir, tratando então de cuidar dos estudos fora do Brasil, onde continuei guevarista por algum tempo ainda, até descobrir que o "homem novo"  preconizado por Guevara, e o socialismo preconizado por todos os marxistas não iria nos trazer exatamente liberdade e abundância. 
Muitos outros continuaram guevaristas, no sentido prático da palavra, mas eles foram sendo reduzidos pela gradual erosão da ideia marxista e pelas derrotas práticas de todos os socialismos, tanto quanto pela miséria de fato da única ditadura marxista ainda em vigor deste lado do mundo.
Mas, os marxistas de camiseta, aqueles que repetem mecanicamente uma única frase do comandante (aliás, frase muito idiota), esses continuam, firmes e fortes, talvez em número até acrescido, pois a legião dos inconscientes, dos ingênuos e dos desinformados sempre cresce, sobretudo em torno de ideias equivocadas. 
Portanto, aqui fica a minha mensagem: se você quiser ganhar uns trocados, copie da internet aquela foto famoso do Ché, de boina e cabelos sujos, e cole em alguma coisa. Depois pode vender por aí, que é sucesso garantido. Você pode não acreditar nas promessas do socialismo, e nem deve conhecer qualquer coisa que o Ché tenha escrito, mas certamente acredita no dinheiro...
Viva Ché Guevara: o maior sucesso de publicidade capitalista de todos os tempos...
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 8 de outubro de 2012

A lógica política do 'mensalão' - Sergio Fausto


A lógica política do 'mensalão'

SERGIO FAUSTO - DIRETOR EXECUTIVO DO iFHC; MEMBRO DO GACINT-USP. E-MAIL: SFAUSTO40@HOTMAIL.COM
O Estado de S.Paulo, 6 de outubro de 2012
É cristalina a lógica política detrás dos crimes descritos na Ação Penal 470, que agora entra em fase decisiva de julgamento no Supremo Tribunal Federal. Só não a vê quem não quer ou não pode, por ingenuidade política ou cegueira ideológica.
A compra de apoio político de pequenos partidos foi a forma encontrada pela cúpula do governo Lula, ao início de seu primeiro mandato, para atingir três objetivos simultâneos: 1) Formar uma maioria parlamentar que a aliança eleitoral vitoriosa não assegurava; 2) formá-la sem uma efetiva partilha do poder político com o PMDB, o maior partido no Congresso; e 3) preservar para o PT o maior espaço possível na ocupação do aparelho do Estado.
Quem acompanha a vida política brasileira há de se lembrar de que José Dirceu havia costurado um acordo preferencial com o PMDB, recusado por Lula, sob o argumento de que ele se tornaria refém do maior partido no Congresso. Há de se lembrar também de que os partidos beneficiados pelo dinheiro do "valerioduto" praticamente dobraram o tamanho de suas bancadas na Câmara. Há de se lembrar ainda que o primeiro Ministério do governo Lula se caracterizava tanto pela sobrerrepresentação do PT quanto pela sub-representação do PMDB, quando comparados os postos ministeriais e cargos de direção em estatais e agências reguladoras ocupados por representantes desses partidos com o tamanho de suas respectivas bancadas no Congresso.
É falso dizer que o "mensalão" faz parte da lógica política do presidencialismo de coalizão no Brasil. O funcionamento "normal" deste supõe que o presidente construa e mantenha a sua maioria parlamentar valendo-se da nomeação de representantes dos partidos aliados para cargos no governo, bem como da liberação preferencial das emendas parlamentares dos membros da base aliada. Coisa bem diferente é a compra de apoio político-parlamentar mediante paga em dinheiro.
A mais importante das diferenças está em que os mecanismos "normais" de formação e manutenção da maioria parlamentar são públicos e, portanto, passíveis de controle e crítica pela sociedade. Basta ler o Diário Oficial e acompanhar as votações no Congresso com atenção. Fazem esse papel as oposições e a imprensa, entre outros. Os atos e contratos que decorrem das nomeações para o Executivo e liberações de emendas parlamentares estão sob o domínio da lei e o crivo dos órgãos de controle interno e externo do Executivo.
Já a compra literal de apoio é, por definição, uma operação subterrânea, que se sabe criminosa e por isso busca evadir-se de qualquer controle público. Ela incha a face oculta do governo e engorda vários negócios ilícitos, uma vez que esquemas de mobilização e distribuição ilegal de recursos acabam por servir, naturalmente, a múltiplos propósitos.
O padrão "normal" de funcionamento do presidencialismo de coalizão no Brasil está longe do "ideal". É possível aperfeiçoar o sistema e necessário insistir em que as coalizões tenham maior consistência programática. As críticas ao padrão "normal" não devem, porém, obscurecer a singular degradação a que a compra de apoio mediante paga representa para o presidencialismo de coalizão, em geral, e para a representação parlamentar, em particular. Com a operação de compra e venda o Executivo sequestra o mandato recebido pelo parlamentar e viola o princípio de que este representa os interesses de seus eleitores. Se no padrão "normal" o apoio vem em troca da construção de uma ponte, por exemplo, na relação de compra e venda os únicos interesses representados são os dos partícipes do intercâmbio político-comercial.
Ao degradar a representação parlamentar, o "mensalão" reflete uma certa concepção sobre o sistema representativo. Segundo essa concepção, a "vontade popular" só encontra expressão verdadeira e genuína no presidente da República. Tal ideia tem larga tradição doutrinária, dentro e fora do Brasil, à esquerda e à direita. Ela encontra eco na célebre afirmação feita por Lula em 1993 de que o Congresso seria composto por uma maioria de "300 picaretas". Dizer que o "mensalão" tem raiz doutrinária seria ridículo. É certo, entretanto, que ele revela o desapreço de seus autores pela instituição da representação parlamentar, como se esta fosse uma parte menor do regime democrático.
Além de crime, o "mensalão" foi um erro. A ideia de que seria possível operar tal esquema sem deixar traços e sem se expor a enorme risco demonstra um misto de amadorismo e arrogância de quem o concebeu e operou. Indica também a resistência a um efetivo compartilhamento do poder por parte de um partido que se havia aberto às alianças eleitorais, mas relutava a ceder espaços na ocupação do aparelho do Estado, uma vez conquistado o governo. Lula aprendeu com o erro, embora continue a reiterar a tese de que não houve crime. E aprendeu rápido.
No calor da hora, ao mesmo tempo que ventilava a tese do "caixa 2" para fazer frente ao escândalo, o então presidente tratou de incorporar o PMDB plenamente ao seu governo e à aliança eleitoral que o levaria à reeleição em 2006. Governou em seu segundo mandato com a mais ampla base de partidos da história do presidencialismo de coalizão no Brasil até aquele momento. Depois do susto, deu-se a exacerbação do "padrão normal".
Não se trata aqui de demonizar o personagem, muito menos de indigitar culpados. Faço apenas um raciocínio político com base nos fatos conhecidos. Nesse passo, chega-se à conclusão de que a compra de apoio derivou de uma escolha política tomada no alto comando do governo para assegurar a "governabilidade" sem impor maior restrição às pretensões hegemônicas do PT.
Ao que tudo indica, com o "mensalão" o chefe da Casa Civil tratou de dar consequência prática às preferências do presidente da República. Resta saber se Lula tinha conhecimento e/ou interveniência de algum tipo no esquema montado para a compra sistemática de apoio político ao seu governo.

Eric Hobsbawm: uma palavra (ou duas) sobre ele... - Paulo Roberto de Almeida


Eric Hobsbawm: um depoimento acadêmico

Paulo Roberto de Almeida


Como qualquer acadêmico bem informado, eu conhecia a obra de Hobsbawm, obviamente, inclusive porque, em um dado momento de minha vida, eu também partilhei das mesmas crenças no "poder liberador" do socialismo, a partir da justeza das teses marxistas sobre a perversidade natural do capitalismo e a inevitável sucessão dos modos de produção, que deveria jogar na lata de lixo da história o modo fundado na extração de mais valia e na exploração dos trabalhadores.
Bem, confesso que fui marxista, mas nunca fui religioso, ou seja: nunca me deixei engabelar pelos "livros sagrados". Assim, fui buscar na realidade, em outros livros, na observação honesta dos modos existentes de produção a comprovação, ou não, dos argumentos originais marxianos e suas derivações leninistas, stalinistas, gramscianas, fidelistas, guevaristas e outras (bem, acho que nunca fui stalinista, mas pratiquei um pouco todos os outros pecados). O que eu vi, visitando todos os socialismos reais, surreais e esquizofrênicos, foi um sistema de penúria, caracterizado por muita miséria material, mas ainda mais miséria moral, um sistema baseado em fraude, mentiras, violência, desonestidade, ou simplesmente na escravidão humana.
Enfim, o que tem isso a ver com Eric Hobsbawm?
Li seus livros de história, um pouco em várias edições: inglês, espanhol, francês, italiano e, também em português. Aqueles que tem como partida épocas pregressas, ou seja séculos 15 a 19, confirmaram bastante a visão marxista do mundo, que é a usual no meio acadêmico: exploração capitalista, miséria dos trabalhadores, crises, colonialismo, imperialismo,  isto é, nosso menu habitual de condenação do capitalismo e da burguesia. Normal, não é? 
A coisa se complica um pouco quando chegamos no século 20, o século por excelência do capitalismo triunfante, logo depois em crise, e o da ascensão do socialismo e seu desafio ao primeiro, quase vitorioso, mas finalmente derrotado, para desgosto de Hobsbawm (e de todos os órfãos e viúvas do socialismo). 

O que eu teria a criticar em Hobsbawm?
Primeiro, deixe-me dizer o que eu achei correto, em sua análise da Revolução francesa. Ele disse que ela atrasou o capitalismo na França, pois impediu o imediato triunfo do capitalismo no campo, como ocorreu na Inglaterra, com a concentração de terras e a expulsão dos camponeses para as cidades, onde foram obrigados a trabalhar para os capitalistas fabris. Acho isso basicamente correto, e não tenho objeções a sua tese.
Do que discordo, em sua análise?
Na monumental coleção "História do Marxismo", que ele dirigiu, editada originalmente em italiano pela Einaudi (que eu tenho), ele convidou basicamente marxistas; enfim, um pouco como pedir a cardeais da Igreja Católica para escrever a história do cristianismo. Alguns italianos, já aderindo ao chamado eurocomunismo, foram bastante independentes, como Massimo Salvadori, por exemplo, mas o tom geral era de "ode ao marxismo", como aliás convinha no período que antecedeu à derrocada completa do sistema que se buscava "elucidar". 
De sua obra histórica cobrindo o período anterior ao século 20, se destaca uma importância exagerada ao marxismo, como sistema filosófico capaz de fundar uma nova era. De fato, o marxismo cresceu muito acima de suas possibilidades teóricas e de sua capacidade prática de resolver os problemas detectados por Marx no capitalismo. Ele foi oversold, de certa forma, e Hobsbawm foi um dos que participaram dessa operação de legitimação de um sistema que sempre apresentou falhas estruturais, ademais de uma monumental inconsistência intrínseca, para não falar de seu profetismo indiferente aos dados da realidade.
Quanto ao século 20, ele também deu uma importância exagerada ao socialismo, e quero me expressar muito bem quanto a isso.
A Rússia era um grande país, que conduziu guerras contra o Império Otomano, contra outros reinos na Ásia central e meridional, contra a China, a Polônia, a Áustria e a Alemanha, confirmando sua vocação ao imperialismo. Não se tratava obviamente de socialismo, mas o socialismo bolchevique continuou essa tradição, e o fez com um sentido internacionalista que ultrapassava barreiras nacionais, as fronteiras jurídicas dos Estados burgueses, para se exercer, depois, como força material e política importante em várias democracias burguesas da Europa ocidental e do resto do mundo. Isso não tem nada a ver com o socialismo, e sim com uma política de poder, com a razão de Estado, no caso, o Estado stalinista. 
Hobsbawm confundiu esse poder do Estado soviético com o triunfo do socialismo, ainda que a ideia socialista tenha conseguido conquistar corações e mentes de intelectuais dos países capitalistas, além de muitas forças sindicais. Mas ele confundiu os processos históricos e equiparou o triunfo intelectual do marxismo com o triunfo estrutural do socialismo, no processo mais vasto dos "modos de produção" em vigor durante o século 20. Bem, a CIA também considerava que o socialismo crescia mais do que o capitalismo, e que a União Soviética seria um formidável oponente, militar, econômico, tecnológico, cultural e político.
Todos erraram, mas Hobsbawm errou muito mais, pois ele mesmo, ainda que reconhecendo que o socialismo representava uma parte pequena do PIB mundial (mesmo com grandes recursos naturais), uma parte ainda menor do comércio internacional, uma parte ínfima dos fluxos de capitais, e uma parte ainda menos expressiva das inovações tecnológicas, ainda assim ele continuou a atribuir ao socialismo um poder transformador que ele de fato não tinha.
Hobsbawm também errou ao preservar o limitado molde marxista em suas análises do sistema econômico dos países, e, portanto, em crer que o capitalismo estava condenado a crises irremediáveis, condutoras a seu fracasso enquanto sistema.
Ele pelo menos tinha alguma sofisticação em suas análises, ao passo que os marxistas vulgares se agitavam alegremente cada vez que ocorria uma crise setorial nos sistemas capitalistas.
Em resumo, Hobsbawm foi um bom historiador "pré-capitalista", mas um péssimo historiador "socialista", e deixou sua fé no marxismo embotar suas análises dos processos econômicos e políticos dos séculos 19 e 20. 
Deixo de lado sua condescendência com os crimes dos socialismos reais do século 20, o stalinista e o maoísta, pois nesse quesito ele teria de ser condenado pelo lado moral, algo relativo nos marxistas. 
Eu estava apenas considerando seu trabalho como historiador. Ele falhou, como falharam muitos outros intelectuais. Que tenha demorado tanto tempo em reconhecer seus erros, conta em seu desfavor, mas de fato ele nunca renunciou a seu anticapitalismo visceral e a seu socialismo ingênuo.
Descanse em paz, é o que lhe desejo.
O problema, para nós acadêmicos, é que suas análises vão continuar contaminando com seus equívocos os trabalhos nas nossas universidades por muito tempo ainda, pois seus livros são cultuados e seguidos nas Humanidades. A cegueira voluntária demora muito para se dissipar, se é que isso ocorre: muitos são infensos aos dados da realidade, e preferem continuar se alimentando de ilusões.
Eric Hobsbawm foi um dos grandes ilusionistas do século 20. 
Não será certamente o último, mas ele era um dos mais importantes.
Talvez voltemos agora a explicações mais razoáveis, como as de um Paul Johnson, de um Niall Ferguson, de um David Landes. Pelo menos, são os que me ocorrem de sugerir a alunos em busca de historiadores mais razoáveis (e honestos).

Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 8 de outubro de 2012

domingo, 7 de outubro de 2012

Crise economica internacional: uma explicacao espanhola

Enviado por um leitor amigo, habitual deste blog: 


Fraude - por que houve esta grande recessão
"O Instituto Mises Brasil, em parceria com a empresa espanhola Amagifilms — fundada pelos libertários espanhóis Juan José Mercado, Daniel García e Bárbara Sokol — tem o orgulho e a honra de apresentar aquele que, até o momento, é o documentário mais completo sobre a crise financeira mundial. 
Embora vários documentários já houvessem sido produzidos sobre a crise econômica que hoje assola o mundo, nenhum deles de fato se propunha a expor uma teoria econômica que de fato explicasse as minúcias econômicas que provocaram o descalabro." Equipe IMB

Fraude - por que houve esta grande recessão
por , sexta-feira, 5 de outubro de 2012


fraude_recessão.jpgO Instituto Mises Brasil, em parceria com a empresa espanhola Amagifilms — fundada pelos libertários espanhóis Juan José Mercado, Daniel García e Bárbara Sokol — tem o orgulho e a honra de apresentar aquele que, até o momento, é o documentário mais completo sobre a crise financeira mundial. 
Embora vários documentários já houvessem sido produzidos sobre a crise econômica que hoje assola o mundo, nenhum deles de fato se propunha a expor uma teoria econômica que de fato explicasse as minúcias econômicas que provocaram o descalabro.  Para preencher este vazio, empreendedores espanhóis buscaram a ajuda dos professores Jesús Huerta de Soto e Juan Ramón Rallo para elaborar uma explicação completa que, utilizando a teoria econômica que mais uma vez demonstrou ser a única correta (a teoria austríaca dos ciclos econômicos), fizesse uma cronologia histórica da grande recessão vista à luz desta teoria e denunciasse todos os desastres econômicos que a humanidade vem sofrendo há séculos em decorrência de políticas monetárias estatais, as quais foram rotuladas de "fraude legal".  Por último e não menos importante, foi pedido aos professores que apontassem soluções concretas e factíveis para se colocar um fim a este recorrente ciclo de descalabros.
O resultado deste trabalho pode ser conferido abaixo.  Todos os detalhes sobre as causas da crise e sobre as medidas governamentais tomadas para tentar combater a crise, bem como todas as reais consequências destas medidas, são minuciosamente explicitados neste esplêndido documentário.
A grande recessão não foi causada pelo livre mercado, mas poderia ter sido solucionada por ele se ao menos os governos permitissem.  As intervenções do estado na economia, principalmente por meio de seus bancos centrais e seus mecanismos fraudulentos de criar dinheiro e expandir artificialmente o crédito, tornando-o farto e barato, não apenas foram as causas desta grande recessão, como também estão nas raízes de todos os recorrentes ciclos de expansão econômica seguida de recessão que assolam a humanidade.  Políticas monetárias expansionistas e as contínuas manipulações de juros feitas pelos bancos centrais criam fases de exuberância irracional e bolhas que inevitavelmente terminam em dolorosas recessões econômicas que impõem penosos sofrimentos a todos os cidadãos, principalmente aos mais financeiramente desprotegidos.
Denunciar as fraudes que provocam estas opressivas recessões, bem como fazer advertências sobre os prováveis erros futuros que os governos voltarão a cometer, é a principal intenção deste trabalho.
Aproveitem.
(Para ver em tela expandida, clique em "vimeo" no canto inferior direito da tela abaixo ou acesse diretamente pelo link http://www.fraudedocumental.com/#!_brazil)

Dialogo entre militares e academicos: um bom comeco


Rio de Janeiro, 05 de outubro de 2012.

ABED e ECEME: diálogo aberto

Na quinta-feira, dia 4 de outubro, o presidente da ABED, Manuel Domingos Neto, visitou a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), onde foi recebido pelo comandante da instituição, general-de-brigada Sérgio José Pereira, e pelo diretor do Instituto Meira Mattos, coronel Richard Fernandez Nunes. A visita foi organizada pela professora Adriana Marques, da ECEME.

No encontro foi debatida a inserção dos Estudos de Defesa e das Ciências Militares no mundo acadêmico brasileiro. O diretor do recém-criado Instituto Meira Mattos apresentou de forma entusiasmada os principais aspectos desta entidade de pesquisa, cuja existência se entrelaça com as preocupações da ECEME relativas à oferta de ensino de pós-graduação devidamente validado pela CAPES. Dentre diversas personalidades civis de destaque que colaboram com este empreendimento está o vice-presidente da ABED, professor Eliezer Rizzo de Oliveira. A secretária-adjunta da ABED, professora Adriana Marques, teve ativo papel na articulação do referido programa de pós-graduação.

O Comandante da ECEME revelou novidades da maior relevância não apenas para os alunos desta entidade de altos estudos militares, mas também para o conjunto de pesquisadores da ABED:  a desclassificação de centenas de monografias defendidas na Escola e a reorganização da Biblioteca da ECEME, que dispõe de acervo de obras raras formado por doações de antigos oficiais do Exército.

O general Sérgio, reconhecendo o papel da ABED quanto ao desenvolvimento dos estudos estratégicos para o país, assegurou ao professor Manuel Domingos que a ECEME estimulará a participação de seus alunos e professores no VII ENABED, que será realizado em Belém-PA, em 2013. O Comandante manifestou ainda desejo de discutir promoções conjuntas, obtendo resposta positiva e entusiástica do presidente da ABED

Falacias economicas: o mito do 13-salario - Klauber C. Pires

Um texto absolutamente indispensável a todos aqueles que pretendem confirmar, uma vez mais, como a nossa Constituição, como as nossas leis estão repletas de absurdos econômicos. 
Concordo inteiramente com os argumentos de meu amigo Klauber Pires, que mantém um dos blogs mais lúcidos no plano econômico. 
Transcrevo apenas o início de seu longo artigo, e remeto a outro link onde ele se encontra por inteiro.
Paulo Roberto de Almeida 

Klauber Cristofen Pires
Libertatum, 04 Oct 2012

Como ponto de partida, imaginemos um bolo que tenha sido fatiado em 12 partes. Caso decidíssemos dividi-lo em 13 partes, ficaria ele maior?

De tempos em tempos, e especialmente em época de eleições, flutuam na rede e-mails e tópicos de redes sociais que alardeiam, falsamente, que estaria em andamento no Congresso Nacional um projeto de lei com a proposta da extinção do décimo-terceiro salário.
Certamente, tal hipótese não se configuraria plausível nos dias de hoje, em uma casa intensamente ocupada por partidos de índole marxista. A certeza da intocabilidade deste instituto é dogma absoluto de que a existência do mesmo representa uma "conquista do trabalhador", e que, além disto, é, por todas as formas, um benefício à sociedade. Há quem defenda, no plano jurídico, tratar-se de uma inafastável cláusula pétrea constitucional.
Tendo-se consciência deste fato, aceitar debater sobre a validade dos argumentos que o sustentam é entrar descalço e sem camisa em um formigueiro. Poucos são os que aceitam verificar as exposições com ânimo de racionalidade. A paixão domina a mente dos defensores de tal forma que mal acreditam que alguém - justamente um assalariado - venha a apresentar uma análise em contrário.
Ainda assim, aceitei o desafio, e aqui proponho expor os meus argumentos que demonstram que o décimo-terceiro, ao contrário do que se imagina, apenas traz prejuízo aos trabalhadores, aos empresários e consumidores.
Como ponto de partida, imaginemos um bolo que tenha sido fatiado em 12 partes. Caso decidíssemos dividi-lo em 13 partes, ficaria ele maior?
Tomemos como base um trabalhador, recém-contratado no início do mês de janeiro, por um salário de R$ 1.200,00 mensais. A seguir será feita uma comparação da situação vigente, confrontada com um cenário em que o trabalhador receberia o décimo-terceiro salário diluído entre os doze pagamentos mensais.


Ler a íntegra aqui: 
http://textospra.blogspot.com.br/2012/10/decimo-terceiro-salario-uma-grande.html
ou aqui: 
http://libertatum.blogspot.com.br/2012/10/como-o-decimo-terceiro-salario.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed:+Libertatum+(LIBERTATUM)

A maquiagem contabil do governo - Editorial Estadao

O governo pensa que todos somos idiotas...
Paulo Roberto de Almeida

Editorial O Estado de S.Paulo, 04 de outubro de 2012

O Tesouro Nacional deverá liberar entre R$ 20 bilhões e R$ 25 bilhões nos próximos dias para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a fim de que este possa prosseguir nas suas operações com empresas, inclusive do governo.

É um expediente que já foi denunciado, no passado, pela economista do Fundo Monetário Internacional (FMI) que acompanhava a economia brasileira. No entanto, é apresentado pelas autoridades monetárias brasileiras como "contabilidade criativa".
No fundo, trata-se de uma operação de triangulação em que o Tesouro empresta recursos ao BNDES sem que, pelas normas contábeis, isso represente aumento da dívida líquida, pois são recursos repassados pelo banco de desenvolvimento a empresas controladas direta ou indiretamente pelo governo, que pagam dividendos ao Tesouro e, portanto, ajudam a elevar de modo sensível o superávit primário.
Fugindo das normas da transparência, nunca se explicou com clareza o custo dessas operações para o Tesouro. Na realidade, este paga juros mais elevados pela dívida que contrai do que os praticados pelo BNDES, e os dividendos que recebe parecem inferiores aos juros que paga. Os repasses ao BNDES não aparecem como despesas do governo, enquanto os dividendos que o Tesouro recolhe são incluídos nas receitas - um dos pontos altamente criticados.
Num momento em que o governo reconhece que não poderá alcançar a meta cheia de superávit primário do governo central - e terá de emitir mais títulos da dívida pública, sobre os quais incidirão mais juros -, essa "contabilidade criativa" apresenta graves inconvenientes.
É somente por causa de convenções contábeis que a dívida pública não está aumentando. Na realidade, ela cresce e exige o pagamento de juros, que é feito com emissão de novos papéis da dívida. Serão juros sobre os quais incidirão mais juros.
Por outro lado, desde que começou a campanha eleitoral, os governos estaduais foram autorizados a aumentar seus empréstimos, o que representa nova fonte de juros a pagar.
Por enquanto, a dívida pública está num nível administrável, mas poderá chegar a um ponto em que o País será forçado a pagar juros mais altos por sua rolagem, especialmente se a liquidez internacional - que vem sendo objeto de alertas pela presidente Dilma Rousseff - voltar a se estreitar.
De qualquer maneira, o fato de a equipe econômica estar anunciando que o superávit primário não será atingido já deve levar a um aumento dos juros que o Brasil está pagando.