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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Paulo Hartung: um humanista na política- entrevista Brazil Journal

Leitura absolutamente imperdível: uma grande entrevista, de um grande político (de um pequeno estado), um grande ser humano.
 A Grande Guerra (14-18) arruinou absolutamente a Europa e o mundo: os grandes problemas atuais ainda derivam de seus efeitos deletérios, sobretudo em termos de ideias (fascismo, comunismo, dirigismo, etc.). Ela não teria acontecido se os líderes (imperadores e um presidente) tivessem conversado mais uns com os outros do que terem ouvido seus generais, que prometiam uma guerra curta e vitoriosa.
Pois eu proclamo a necessidade de os quatro ou cinco candidatos de centro de se reunirem numa conferência política pré-guerra (eleições) para decidirem sobre o destino maior do Brasil, que não será resolvido por um dos dois polos.
Leiam a entrevista do Paulo Hartung e tenham esse gesto magnânimo e inteligente. Do contrário teremos uma Grande Guerra no Brasil e todos os seus efeitos devastadores (fascismo, comunismo, dirigismo, etc.).
De um leitor da História.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 25/09/2018


Paulo Hartung: união dos reformistas exige o 'primeiro passo'

Governador fala em 'ambiente péssimo' e defende agenda em torno de ideias


VITÓRIA — Quando assumiu o Governo do Espírito Santo em janeiro de 2015, Paulo Hartung teve que renegociar o orçamento daquele ano com o Legislativo, que o aprovara meses antes. O novo orçamento cortou R$ 1,3 bilhão da receita que estava superestimada.
No fim daquele ano, a receita do Estado bateu exatamente com a receita prevista, e Hartung nunca atrasou pagamentos a servidores ou fornecedores. 
Não só a Assembleia aprovou a alteração, como o Ministério Público, a Justiça estadual e o Tribunal de Contas também aceitaram reduzir seus orçamentos.

Em seguida, o Governador enfrentou o que alguns de seus assessores chamam de ‘as sete pragas do Egito’: a queda no preço do petróleo, o desastre ambiental que levou à paralisação da Samarco, que movimenta 5% do PIB capixaba; a maior seca da história do Estado; uma greve na Polícia Militar, e, para completar, a descoberta de que o Governador estava com um câncer (do qual ele já se curou).

Logo no início do mandato, o governador conseguiu aprovar a 'PEC da Impessoalidade’, removendo logomarcas das propagandas do Estado e acabando com a foto oficial do governador nas repartições públicas.

Hartung é um homem público exemplar numa era de descrédito profundo com a classe política; uma voz de ponderação num ambiente marcado pelo entrincheiramento e tribalização; e um gestor com todas as contas em dia — numa época em que a maioria dos estados está quebrada.  

Por tudo isso, o Brazil Journal procurou o governador para falar sobre a eleição e o futuro do País.

O senhor vê espaço para um acordo que leve a uma candidatura única de centro nos próximos dias, ou o país está condenado a um segundo turno entre dois candidatos cujo maior mérito é ser o anti-outro? 
Espaço nós temos, porque as eleições no mundo inteiro vem sendo decididas em cima da hora. Qual o problema que eu vejo? Quem vai dar o primeiro passo. E todos também acham que a convergência deve ser em torno do seu nome. O fato é que nós temos eleições polarizadas entre os extremos, mas se a gente somar os extremos não chega a 60%. Ou seja, esse campo que eu chamo de reformista, que é onde eu me encontro, estão uns 40% do eleitorado brasileiro. Se este campo sair da fragmentação em que se encontra – uma fragmentação brutal, com cinco candidaturas – e conseguir alguma unidade, ele está disputando o segundo turno, o que seria ideal até para qualificar o debate, que está muito raso. 

Se os candidatos não fizerem isso, é possível que o eleitor faça por eles. Talvez esteja faltando um curto-circuito, uma fagulha que possa provocar isso. Seguramente esse curto-circuito não será uma facada nem tiro, e sim uma percepção da população de que não é com mais populismo e com mais demagogia que vamos enfrentar este momento difícil que o País está vivendo. 

O Brasil está totalmente quebrado, com suas contas desorganizadas. Está perdendo espaço num mundo integrado que – sim, tem problemas – mas também tem enormes oportunidades, e nós estamos perdendo essa janela. Se o eleitor perceber isso, pode ser a fagulha que está faltando. 

Em quem o senhor vai votar?
Eu já decidi. Eu vou votar num candidato que flerte com essa agenda reformista, na qual eu acredito, e que esteja, ali nos últimos três ou quatro dias, em condições de disputar o segundo turno. Eu acho que não está na hora da gente ficar com grupinho, facção, partidarismo. Está na hora da gente tentar dar rumo ao País, porque o povo brasileiro não merece viver esse sofrimento que está vivendo.

Um acordo entre os candidatos nesta reta final seria um fato histórico e, em última análise, daria o status de 'estadistas' aos envolvidos. É muito difícil para um político colocar o País acima da sua ambição pessoal?
Acho que não. O problema é que o sistema político do Brasil fez água. Está literalmente destruído. Um partido é uma parte do pensamento da sociedade, mas o que está aí não tem nada a ver com a busca do pensamento da sociedade, é a busca ao tesouro do fundo partidário e do tempo de televisão para fazer negociação. Os partidos estão no vinagre. A nossa estrutura eleitoral já era ultrapassada desde a Constituição de 1988. 

Falta o sentido do interesse público a esses agentes? Eu não diria isso. Talvez se um dos candidatos tomasse a atitude de desistir da candidatura, poderia ser um dominó. Vários seguiriam o mesmo caminho e eu acho que eles ganhariam muito respeito da sociedade se assim praticassem. Não é falta de espírito público, o que está faltando é o primeiro passo, a primeira atitude a ser tomada nesse processo eleitoral, porque algumas candidaturas não conseguiram decolar. Então, se eles dessem esse passo seria importante. 

O senhor fez parte de um grupo que defendeu a entrada de 'outsiders' na disputa eleitoral deste ano. Conversou com Luciano Huck, Joaquim Barbosa, sobre isso. Qual era sua visão naquele momento? 
Eu conversei com muita gente, com o Luciano, que é uma agradável surpresa. Eu não conhecia o Luciano. É uma pessoa sensível, preparada, com uma boa reflexão de Brasil. O ministro Joaquim já conhecia e admirava há muito anos. É uma relação mais antiga. Conversei muito com o Bernardinho, outra figura que trabalha o conceito de liderança. Citei três nomes, mas podia citar 30. Eles tiveram muito entusiasmo para entrar na vida pública, foram para perto, conhecer essa bagunça da estrutura política e partidária do País e acabaram recuando. E tem razões de sobra para recuar, porque o sistema que está aí é avesso à inovação, ele bloqueia a inovação. É um muro de contenção para não deixar o processo de alternância de lideranças ser processado no nosso país. 
Na minha visão, esta era uma eleição boa para um outsider disputar. Um outsider que tenha uma visão da economia, que tenha uma boa sensibilidade social… Nosso país é muito desigual, não dá para você ter uma visão apenas da economia, você tem que ter uma visão de como você cria e estrutura o reino da oportunidade para todos. Eu acho que era um momento interessante para um outsider porque quebraria o monopólio desses extremos. 

Desde o início eu achava que viriam os extremos. Só os extremos conseguem falar a uma nação desesperançosa. No mundo inteiro foi assim. Na hora que colapsa, são os extremos que conseguem dialogar com a sociedade colapsada – e a sociedade brasileira está literalmente colapsada. E eu achava que entrando ali uma pessoa fora do jogo da política não viria com esse desgaste das estruturas políticas e teria a capacidade de falar e ser ouvido.

Se os candidatos de centro não se unirem ou nenhum deles passar para o segundo turno, ainda assim o centro político vai ter que conversar com os dois extremos que passarem. O senhor acha que essa conversa tem que ser ao redor de quê? 
Eu acho que o que deve presidir a nossa ação no primeiro ou no segundo turno, der o que der – e eu estou torcendo para que algum candidato com a agenda correta vá para o segundo turno – é programa. Toda vez que as forças políticas – até as forças razoáveis do nosso país – flertaram com esse negócio de cargo, de ocupação em governo, fizeram bobagem. Agora, recentemente, fizeram mais uma. Não é isso que tem que estar em disputa. 

O que tem que estar em disputa é o programa que nós vamos implementar. Como a gente tira esse país da crise fiscal, como reorganiza a Previdência, quando a gente sabe que estamos vivendo mais e não pode ter um país com idade mínima? Como a gente tira os privilégios da área previdenciária? Vamos ser o país dos privilégios e dos privilegiados a vida inteira? Temos que quebrar isso. Como faz? Como é que a gente conserta as contas públicas? Como é que a gente dá competitividade à nossa economia frente a um mundo que tem a economia globalizada? Como a gente integra a economia brasileira nas grandes cadeias internacionais de produção, de consumo e assim por diante? Esse é o nosso desafio. Eu estou focado nisso. Se a gente tomar o caminho certo, a gente dá jeito no país. Se a gente continuar flertando com o caminho fácil, que é o caminho da demagogia, do populismo, vamos continuar vendo nosso país perdendo espaço no mundo e nossa população vivendo cada vez pior. 

O senhor disse que vai votar no candidato reformista que estiver mais bem colocado às vésperas da eleição. Hoje, no debate político, mesmo as pessoas que votam em candidatos reformistas tem muitas reservas quanto aos outros candidatos. O senhor diria que este é o momento de focar no que é comum, em vez de focar nas diferenças?
Acho que sim, até porque essas diferenças são minúsculas quando comparadas com as posições que estão no extremo da política brasileira e liderando as pesquisas. Aí é meu sentido prático – e eu sou uma pessoa muito prática. Eu acho que a gente precisa ter uma noção do quadro que nós estamos vivendo e do perigo que nós temos, que é um perigo objetivo. Não é criar pânico nas pessoas. 

O país nesses últimos anos fez tudo errado. Queimou o que tinha, queimou o que não tinha. Se o País não acerta o passo, ele não suporta mais quatro anos de aventura, de inexperiência administrativa, de testar coisas que já deram errado no mundo inteiro e repete aqui no Brasil de novo. Não tem espaço para uma 'nova matriz econômica'. Não adianta ir para o governo com a cabeça de que governo pode tudo, faz e acontece. Não é isso. Nós sabemos que não é isso. Precisamos sair do caminho fácil da demagogia e seguir o caminho certo das reformas que precisamos enfrentar. 

Vai ter sacrifício. Tem que falar abertamente para a população. A vida é assim. Você planta, você cuida e daqui a pouco está colhendo. Neste mandato, estou colhendo resultados na educação. As pessoas falavam: "educação, fazendo tudo certo, em 10 anos você começa a colher resultado". Não é verdade. Fizemos o certo, buscamos as boas experiências educacionais no Brasil: de Pernambuco, de Sobral, implantamos o 'Pacto pela Aprendizagem' aqui para cuidar do ensino infantil e fundamental, pegamos uma experiência do Instituto Unibanco, que também é uma intervenção importante na escola de ensino médio, de tempo parcial… e agora colhemos aí a melhor nota do Ideb… E o que é mais importante que a nota: uma evolução positiva dentro de toda a rede capixaba. 

Você tem que plantar, cuidar para poder colher. 

O que o senhor diria para as pessoas que estão desanimadas com a perspectiva de um segundo turno Bolsonaro X Haddad?
Escolha um candidato com a boa agenda, com bons propósitos, vota nesse candidato, e arranja mais uns 10 votos, para ver se tem algum bom candidato lá no segundo turno criando opção [risos]. Eu estou brincando aqui, mas vou falar sério: eu acredito na política. As pessoas falam assim: "com esse Congresso não se governa o País". Não é verdade! Governa. Tem que ir lá. Esse é o Congresso que o povo brasileiro colocou? Quem vai interagir com o Congresso tem que ir lá conversar, dialogar, explicar porque nós precisamos mudar uma lei. Por que essa lei do jeito que está escrita está prejudicando a competitividade das empresas brasileiras. 

Eu acredito na política como ferramenta civilizatória. Eu acho que nós humanos quando descobrimos a política ficamos mais humanos. Esse é o sentido. A política – estou falando da política com P maiúsculo – pega uma situação de conflito paralisante e transforma aquilo ali numa ação renovadora. Esse é o papel da política. Quando eu falo que a política brasileira precisa ser transformada, estou falando das instituições que o homem criou e precisam ser atualizadas. Mas a política como ferramenta tem uma potência enorme. 

O que vier aí, no primeiro e no segundo, dá para tratar com a política. Com o diálogo, procurando caminho e assim por diante. A minha palavra não é de desespero, não. Eu estou operando nessa realidade. É uma realidade adversa? É claro que é. O solo que nós estamos pisando nessa eleição é movediço, fruto de tudo o que o país viveu, somado ao que a democracia está vivendo de problemas. 

Quem está botando esses dois candidatos na frente? Qual o sentimento? 
Tem de tudo. Tem um sentimento de decepção, misturado com raiva de tudo que vem acontecendo no Brasil. O sentimento da população é de chutar o pau da barraca, não tendo a paciência de pensar na cabeça de quem vai cair a danada dessa barraca. 

Eu não vou tirar a razão da população. Passar por tudo isso aí que nós passamos e continuamos passando, assistir o que a gente assiste na televisão toda noite – desvios, maus feitos – a reação da população é natural. Agora, nós, que temos um papel de liderança, temos que saber direcionar essa energia para um caminho que seja positivo para o Brasil.

Momentos como esse produziram, na caminhada civilizatória, resultados muito ruins. Eu sou um leitor inveterado de história e sei que ambientes péssimos como esse muitas vezes produziram caminhos políticos que são verdadeiros descaminhos. A gente precisa estar atento, dialogando muito, conversando muito. E volto a dizer: acho que a gente tem que fazer um esforço final de colocar o nosso pensamento no segundo turno ou dar um tamanho a ele para que, em qualquer circunstância, ele possa sentar à mesa para dialogar o futuro do país. E dialogar não em termos de pessoas e funções, mas dialogar em termos de ideias. É um diálogo programático para o País, coisa que nós ainda não estamos acostumados a fazer.
O que motivou a sua decisão de não buscar a reeleição este ano?
Primeiro, uma carreira muito longa. Foram oito eleições que eu disputei: já fui deputado estadual, federal, senador, prefeito da capital, três vezes governador, três vezes eleito em primeiro turno, sempre com muito apoio e carinho da população. Eu confesso aqui, pela primeira vez, que eu já vinha pensando que eu tinha que parar em algum momento. Essa coisa tem que saber a hora de entrar e a hora de parar. Muito mais bonito que o milésimo gol do Pelé foi ele saber a hora de parar. Precisa ficar um gostinho de 'quero mais', de saudade. Não pode esperar que você chegue a um final ruim, melancólico; sempre tentei desviar disso, vou ser muito franco. 

Evidente que o ambiente da política também não é o melhor, nem no mundo, muito menos no Brasil, que eu acho que é o pior ambiente que eu acompanho mundo afora: soma a crise da democracia representativa, o sombreamento que está vivendo a política, com os problemas de recessão econômica, as famílias empobrecendo e a crise ética. 

Eu sempre pensei que tinha uma hora para parar e soma-se a isso essa crise da política. Eu tomo muito cuidado para falar disso porque eu fico preocupado em não passar uma mensagem errada para os jovens, que eu quero que entrem na política. Eu sou um formador de quadros, em todo lugar que eu fui eu tive a preocupação de formar quadros. Mas isso pesou também na minha decisão. 

Mas não vou deixar de fazer política. Aqui eu dou um recado bom para a juventude: eu vou morrer militando na política. Eu vou morrer escrevendo artigos, dando palestras, defendendo boas teses, boas ideias. Eu vou lutar a vida inteira para melhorar nosso País, para que ele deixe de ser o eterno país do futuro que não se realiza. Se a gente realizar o potencial do Brasil, nós vamos devolver a esperança aos nossos jovens, que é uma coisa que me preocupa muito. A juventude brasileira está descrente de tudo, e com razão. Nós precisamos injetar esperança nos jovens. 
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Mini-reflexao as vesperas do desastre - Paulo Roberto de Almeida

Minha declaração preventiva em tempo hábil:

O candidato que for eleito em um dos polos, não o será com unanimidade, isso é evidente, mas o mais relevante é que será imediatamente contestado na outra ponta como não legítimo, pela intolerância já demonstrada por ambos os lados. Ou seja, temos uma receita para animosidades, para manifestações, para uma crise permanente. Precisamos de uma pacificação para poder administrar a crise, que é real e pode se agravar. Algum candidato teria essa fórmula? Conheço um ou dois que podem ter esse papel, mas são não competitivos pelas pesquisas. Em resumo: a sociedade brasileira resolveu se situar nos extremos e isso é muito triste; não apenas isso, não ajuda em nada na superação da crise. Temo que passaremos mais 4 anos no pântano. 
Não é inédito na história: países, nações, sociedades já enfrentaram longos períodos de retrocessos, decadência ou estagnação e isso se deve fundamentalmente por inépcia, inconsciência, incompetência e corrupção das suas ELITES (ou o que passa por tal), pois o “popolo minuto” (como diria Maquiavel nas suas Storie Fiorentine) não é responsável pela sua própria deseducação.
Minha mensagem aqui é muito clara: responsabilizo as elites brasileiras, ineptas, corruptas e inconscientes, pela atual decadência brasileira.

A despeito disso, continuarei trabalhando em prol da melhoria material e MENTAL do Brasil.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 25 de setembro de 2018


Complementos à mini-reflexão: 

1) Quem fará o gesto não apenas magnânimo, mas simplesmente inteligente, e absolutamente necessário, de tomar a iniciativa de sentar, conversar e se dispor ao sacrifício absolutamente imprescindível de renunciar às suas ambições pessoais, mesquinhas, de pequena política, para pensar no destino do Brasil e dos brasileiros?
A incapacidade de esses quatro ou cinco candidatos centristas de se concertarem entre si para formar uma coalizão dos “bons”, nos deixará, e ao Brasil, entregues a um dos polos, ambos inadequados e indesejados na situação atual do país.
Se tal conferência dos “razoáveis” não for conduzida rapidamente, os brasileiros se dividirão nos dois polos atualmente melhor posicionados. Isto será um desastre para o país, com toda a ênfase que eu posso emprestar à palavra DESASTRE.
Será a confirmação definitiva de que nossas pretensas “elites” são efetivamente ineptas, inconscientes e declaradamente estúpidas. Elas próprias estarão decretando a falência da construção de uma nação razoável, e estarão convidando outras elites, os quadros de classe média bem formados, a deixarem definitivamente o Brasil, como muitos já estão fazendo.
Quando um país perde os seus melhores quadros, como já aconteceu na Venezuela, ela já está convidando oportunistas criminosos a tomarem conta do Estado.
Não terá sido por falta de aviso de minha parte.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 25/09/2018


2) Leitura absolutamente imperdível: uma grande entrevista, de um grande político (de um pequeno estado), um grande ser humano.
A Grande Guerra (14-18) arruinou absolutamente a Europa e o mundo: os grandes problemas atuais ainda derivam de seus efeitos deletérios, sobretudo em termos de ideias (fascismo, comunismo, dirigismo, etc.). Ela não teria acontecido se os líderes (imperadores e um presidente) tivessem conversado mais uns com os outros do que terem ouvido seus generais, que prometiam uma guerra curta e vitoriosa.
Pois eu proclamo a necessidade de os quatro ou cinco candidatos de centro de se reunirem numa conferência política pré-guerra (eleições) para decidirem sobre o destino maior do Brasil, que não será resolvido por um dos dois polos.
Leiam a entrevista do Paulo Hartung e tenham esse gesto magnânimo e inteligente. Do contrário teremos uma Grande Guerra no Brasil e todos os seus efeitos devastadores (fascismo, comunismo, dirigismo, etc.).
De um leitor da História.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 25/09/2018

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Boatos, desinformações, e alusões envolvendo minha pessoinha - Paulo Roberto de Almeida

Notícia desta data no Valor Econômico, com destaque para o final. Volto, também ao final para reproduzir o que já escrevi, desmentindo, portanto, por uma quarta vez, o que andam dizendo por aí...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 24 de setembro de 2018


Por Daniel Rittner | De Brasília, 

Bolsonaro e filhos em Taiwan: aparente desconhecimento sobre temas-chave das relações internacionais preocupa

Indesejado pela União Europeia, admirado por Israel, visto com cautela pela China. Nos últimos meses, o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) tem despertado impressões difusas na comunidade de diplomatas estrangeiros em Brasília, que ainda tenta decifrá-lo em relatórios confidenciais encaminhados para seus países.

Em um meio regido por protocolos e códigos de etiqueta, algumas cenas causaram surpresa, como a das cozinheiras e dos garçons na Embaixada da Espanha, que largaram suas atividades para fazer um pedido ao fim do almoço de embaixadores europeus com Bolsonaro. O espanhol Fernando Villalonga, anfitrião do encontro, jamais havia presenciado algo semelhante: funcionários não deixaram o capitão da reserva ir embora sem antes tirarem um punhado de "selfies" com ele.

O mesmo frisson foi visto na chegada de Bolsonaro à comemoração dos 70 anos do Estado de Israel, quando integrantes da Polícia do Exército fizeram rodinhas em torno dele e sacaram seus celulares para um registro.

A falta de um assessor específico para política externa e o aparente desconhecimento de Bolsonaro sobre temas-chave das relações internacionais dificultam a vida dos representantes diplomáticos. Para levá-lo à embaixada, Villalonga precisou recorrer a antigos contatos dos espanhóis nas Forças Armadas. O deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), um de seus principais articuladores na campanha, costuma acompanhá-lo nas reuniões. Uma crítica frequente entre os estrangeiros, no entanto, é que a linha de ação externa não ficou clara até agora.

O israelense Yossi Shelley tornou-se um dos embaixadores mais próximos de Bolsonaro, que já prometeu mudar a representação brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, mesma medida tomada recentemente pelo americano Donald Trump. Ele disse que, caso eleito, fará a Israel sua primeira viagem ao exterior. O candidato do PSL também pretende expulsar do país a embaixada da Palestina, vizinha ao Palácio do Planalto e inaugurada em 2016, após seu reconhecimento como um Estado independente pelo Brasil.

Na UE, não existe consenso em torno do tratamento a Bolsonaro. Enquanto alguns países buscaram uma aproximação para ouvi-lo melhor, como Itália e Reino Unido, outros optaram pelo distanciamento. A Alemanha preferiu ignorá-lo em convites para encontro com os presidenciáveis em sua embaixada. Fontes em Bruxelas acreditam que uma vitória do ex-capitão faria a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, suspender sua visita prevista para o Brasil em 2019.

Reservadamente, um alto funcionário da Comissão Europeia diz que não há preferências políticas para a sucessão presidencial, mas que um governo Bolsonaro poderia representar o fim de uma parceria calcada em "valores compartilhados" e "defesa conjunta do multilateralismo". O deputado já manifestou sua intenção, por exemplo, de retirar o Brasil do Acordo de Paris contra as mudanças climáticas e do conselho de direitos humanos da ONU.

Essa mesma fonte, que exerce um papel de destaque no diálogo entre UE e Brasil, faz a seguinte comparação: "Ninguém gosta do governo Trump em Bruxelas, mas a densidade das relações transatlânticas impede que haja maior deterioração. Não estou seguro de que as nossas relações têm semelhante grau de maturidade".
Um tom parecido de dúvida sobre o futuro do relacionamento bilateral se vê entre diplomatas chineses. Logo após visita de Bolsonaro a Taiwan em março, acompanhado por seus três filhos e Lorenzoni, os representantes de Pequim enviaram carta à Câmara dos Deputados para lembrar que isso representava "violação do Princípio de Uma Só China" - um dos pilares na política externa do gigante asiático.

O embaixador Li Jinzhang manifestou a colegas em Brasília especial preocupação com discurso recorrente de Bolsonaro de que "a China está comprando o Brasil", referindo-se sobretudo a investimentos no setor elétrico e no interesse pela aquisição de terras agricultáveis. Nos bastidores, disse temer que o nível de hostilidade tenha reflexos efetivos na presença chinesa no país.

O clima de apreensão e desconfiança se espalha na ausência de um interlocutor da campanha com as embaixadas - função desempenhada por Celso Amorim no PT e por Rubens Barbosa no PSDB. A incerteza alimenta especulações em torno de quem poderia assumir o Itamaraty em uma eventual gestão Bolsonaro.

Além do "príncipe" Luiz Philippe de Orléans e Bragança, que foi cotado para vice na chapa e acabou perdendo lugar para o general Hamilton Mourão, outros nomes no Ministério das Relações Exteriores foram ventilados porque Bolsonaro disse ter preferência por alguém da casa.

Nos últimos dias, o diplomata Paulo Roberto de Almeida se viu obrigado a desmentir três vezes, em seu blog, que ganharia cargo de relevo em um governo do ex-capitão. Ex-ministro-conselheiro em Washington e atual chefe do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), ele declarou voto em João Amoêdo (Novo) e postou a seguinte mensagem: "Pela terceira vez em menos de dois meses, sou surpreendido com boatos, circulado entre amigos e colegas, de que eu teria sido escolhido como chanceler do candidato Bolsonaro. Não sou eleitor de Bolsonaro, nem vou integrar seu governo".

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Não foram exatamente nos últimos dias, mas eis o que escrevi nesta data (24/09/2018): 

Como continuam a ser disseminadas informações ou boatos desencontrados sobre minhas posições a respeito do presente (2018) processo eleitoral presidencial, eu poderia, neste momento, agregar uma firme declaração de princípios sobre o que eu considero aceitável e não aceitável nesse terreno pantanoso das opções políticas e preferências eleitorais.
Sou terminantemente contrário a quaisquer movimentos antidemocráticos, autoritários, totalitários, populistas, demagógicos, salvacionistas, excludentes, intolerantes, fascistas, comunistas, maoistas, cubanistas, stalinistas, militaristas e outros "istas" e "ismos".
Por isso mesmo, consideraria uma terrível tragédia política para o Brasil a vitória de qualquer um dos polos que se apresentam atualmente no processo eleitoral que vai desembocar em outubro próximo. Recuso, em primeiro lugar, a volta dos companheiros ao poder, pois conheço a natureza da organização criminosa que está por trás do candidato dito "poste", pela imprensa, assim apelidado por ter se prestado ao indigno papel de representante de um chefão mafioso, justamente condenado e encarcerado por crimes comuns (corrupção passiva e lavagem de dinheiro). Espero a condenação do dito cujo por muitos outros crimes mais, a pelo menos 300 anos de cadeia firme. Creio ser patética a postura do poste, ao servir a tão indigno projeto.
Recuso, em segundo lugar, a postura de um candidato despreparado, defensor da ditadura militar, admirador de um torturador, e defensor de medidas extra-legais para a resolução de determinados problemas sociais. Acredito que seria um convite a uma crise política permanente e a uma formidável confusão nas políticas econômicas e setoriais, pelo comportamento intempestivo e autoritário do candidato em questão, podendo nos precipitar em nova agonia política por mais alguns anos.
Considero a vitória de qualquer um dos dois nefasta para a democracia no Brasil, e por isso declaro desde já minha abstenção preventiva, caso estas sejam as opções.
Dito isto, considerarei legítima a eleição, por se tratar da escolha livre dos cidadãos eleitores, ainda que eu possa declarar minha desconformidade, por s
er fruto da ignorância, da inconsciência, dos instintos mais baixos em matéria política.

A postagem total figura neste link: 

Princípios, valores e causas: manifesto renovado - Paulo Roberto de Almeida (2006 e 2018)

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/principios-valores-e-causas-manifesto.html

Princípios, valores e causas: manifesto renovado - Paulo Roberto de Almeida (2006 e 2018)

Estava revisando alguns trabalhos anteriores, e acabei caindo num velho blog abandonado desde muito, que deveria ocupar-se tão somente de livros, resenhas de livros, sugestões de leituras e propósitos semelhantes, como eu declarava no cabeçalho do blog
Vivendo Com Livros (http://vivendocomlivros.blogspot.com/)

Vivendo com Livros

Um blog voltado especificamente para os livros, meus e de outros autores. Nele pretendo colocar materiais relativos a meus livros, resenhas de livros publicados, notas de leitura e informações gerais relativas ao mundo dos livros. Podem também figurar aqui reflexões pessoais sobre esses transparentes objetos de prazer intelectual.

Ao dar início, em junho de 2006, a um blog especializado nessa matéria – abandonado depois de menos de 50 postagens, mas apenas definitivamente em janeiro de 2013 – eu postava em primeiro lugar não uma resenha ou informação sobre livros, mas uma "declaração de princípios", reproduzida abaixo.
Como continuam a ser disseminadas informações ou boatos desencontrados sobre minhas posições a respeito do presente (2018) processo eleitoral presidencial, eu poderia, neste momento, agregar uma firme declaração de princípios sobre o que eu considero aceitável e não aceitável nesse terreno pantanoso das opções políticas e preferências eleitorais.
Sou terminantemente contrário a quaisquer movimentos antidemocráticos, autoritários, totalitários, populistas, demagógicos, salvacionistas, excludentes, intolerantes, fascistas, comunistas, maoistas, cubanistas, stalinistas, militaristas e outros "istas" e "ismos".
Por isso mesmo, consideraria uma terrível tragédia política para o Brasil a vitória de qualquer um dos polos que se apresentam atualmente no processo eleitoral que vai desembocar em outubro próximo. Recuso, em primeiro lugar, a volta dos companheiros ao poder, pois conheço a natureza da organização criminosa que está por trás do candidato dito "poste", pela imprensa, assim apelidado por ter se prestado ao indigno papel de representante de um chefão mafioso, justamente condenado e encarcerado por crimes comuns (corrupção passiva e lavagem de dinheiro). Espero a condenação do dito cujo por muitos outros crimes mais, a pelo menos 300 anos de cadeia firme. Creio ser patética a postura do poste, ao servir a tão indigno projeto.
Recuso, em segundo lugar, a postura de um candidato despreparado, defensor da ditadura militar, admirador de um torturador, e defensor de medidas extra-legais para a resolução de determinados problemas sociais. Acredito que seria um convite a uma crise política permanente e a uma formidável confusão nas políticas econômicas e setoriais, pelo comportamento intempestivo e autoritário do candidato em questão, podendo nos precipitar em nova agonia política por mais alguns anos.
Considero a vitória de qualquer um dos dois nefasta para a democracia no Brasil, e por isso declaro desde já minha abstenção preventiva, caso estas sejam as opções.
Dito isto, considerarei legítima a eleição, por se tratar da escolha livre dos cidadãos eleitores, ainda que eu possa declarar minha desconformidade, por ser fruto da ignorância, da inconsciência, dos instintos mais baixos em matéria política.
Creio que a declaração de princípios abaixo reproduzida está agora completa.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 24 de setembro de 2018


TERÇA-FEIRA, JUNHO 20, 2006

01) Declaracao de principios: sou um homem de causas...

1) Declaração de princípios

Sou um homem de causas. Vivi sempre pregando, lutando como um cruzado, pelas causas que me comovem. [...] Na verdade, somei mais fracassos que vitórias em minhas lutas, mas isso não importa. Horrível seria ter ficado ao lado dos que venceram nessas batalhas.
Darcy Ribeiro

Como Darcy Ribeiro, a quem conheci na sua volta ao Brasil, ainda antes da redemocratização, sou um homem de causas.

As minhas são as da inteligência, da racionalidade, da cultura, da educação, da tolerância, da democracia e do comprometimento com o bem-estar e a justiça.
Encontro muitas das causas que procuro nos livros, bem menos do que na vida real, o que seria obviamente preferível.

Também tenho algumas causas "contra": sou contra a ignorância, a irracionalidade (sobretudo em matéria de políticas públicas), o mau-uso do dinheiro público e a malversação das instituições estatais por gente descomprometida com os princípios da democracia e do bem-estar social. Sou contra a intolerância em matérias de opinião e de religião, contra todos os fundamentalismos e integrismos existentes (nem todos são necessariamente de natureza religiosa), e sou contra, de maneira geral, as crenças irracionais.

Creio na capacidade da humanidade em elevar-se continuamenta na escala da civilização, na defesa dos direitos do homem, de valores morais que transcendem os relativismos culturais. Sou pela universalização da democracia, mesmo contra a razão de Estado.

Sou, em princípio, a favor da igualdade, mas contra o mero igualitarismo: ou seja, sou pelo reconhecimento dos méritos individuais e do esforço próprio na conquista de objetivos de vida, mas acredito que os desprovidos da vida devam ser ajudados, sobretudo intelectualmente, menos do que materialmente. A educação deve ser repartida entre todos, como forma de capacitar o maior número possível na busca do sucesso individual, com base no desempenho próprio, não em assistência pública.

O crescimento da ignorância e dos irracionalismos contemporâneos assusta-me, tanto quanto a desonestidade na vida pública, tendência lamentável que se observa no Brasil e em muitos outros países.

Sobretudo, sou um defensor da integridade do trabalho intelectual e posiciono-me profundamente contra a desonestidade acadêmica. Acredito que todos devemos nos esforçar para construir um mundo melhor do que aquele que recebemos de nossos antecessores. Nossa responsabilidade individual é a de deixar um mundo melhor para os que nos sucederão.

Como professor eventual, o que exerço de forma irregular, acredito ser minha obrigação transmitir o máximo de conhecimentos aos aprendizes, mas essencialmente provê-los de métodos de aprendizado auto-sustentado, defensor acirrado que sou do auto-didatismo. Considero-me um pesquisador livre, sem qualquer subordinação a instituições ou corporações.

Acredito poder repetir como Popper:
A tarefa mais importante de um cientista é certamente contribuir para o avanço de sua área de conhecimento. A segunda tarefa mais importante é escapar da visão estreita de uma especialização excessiva, interessando-se ativamente por outros campos em busca do aperfeiçoamento pelo saber que é a missão cultural da ciência. A terceira tarefa é estender aos demais a compreensão de seus conhecimentos, reduzindo ao mínimo o jargão científico.
Karl Popper, em "Ciência: problemas, objetivos e responsabilidades" (1963)

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 20 de junho de 2006.

domingo, 23 de setembro de 2018

Na oportunidade do meu trabalho 3333 - Paulo Roberto de Almeida

Da quantidade à qualidade: o significado dos números coincidentes

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: puramente comemorativo; finalidade: balanço da produção]


Em uma obra inacabada, elaborada por Friedrich Engels em 1883, A Dialética da Natureza, o amigo de Marx, recentemente falecido, propunha três leis gerais que, em contraste com a metafísica, comandariam ao movimento geral da natureza e da história humana. A primeira era a lei da transformação da quantidade em qualidade (e vice-versa); a segunda, a lei da interpenetração das oposições, e a terceira, a lei da negação da negação. Todas as três derivariam, segundo Engels, da obra de Hegel, mas nela essas leis existiam apenas em sua forma idealista, como pura abstração, ou como leis do pensamento. Apenas na dialética materialista, desenvolvida por seu amigo autor do Capital(1867), e proponente da “lei da mais-valia” – que explicaria o modo de reprodução ampliada do capital –, essas leis se tinham convertido em ferramentas para explicar o desenvolvimento da natureza, e portanto, também, para ajudar a construir o pensamento científico sobre ela e sobre a história humana. 
Engels explicava a sua primeira lei argumentando que, na natureza, de uma maneira exatamente fixada em cada caso individual, mudanças qualitativas podem ocorrer apenas pela adição ou subtração quantitativa da matéria ou do movimento, também chamado de energia. (Para maiores desenvolvimento sobre o pensamento engelsiano expresso na sua Dialética da Natureza, os interessados podem buscar a obra original neste link: https://www.marxists.org/archive/marx/works/1883/don/ch02.htm). De minha parte não pretendo confrontar a dialética materialista de 140 anos atrás com os desenvolvimentos do pensamento científico contemporâneo. Minha única intenção foi a de oferecer um começo bem humorado a um outro exemplo de transformação da quantidade em qualidade (ou assim pelo menos espero), no momento em que escrevo este trabalho que está destinado a receber o número 3333.
Existe alguma magia nos números repetidos? Provavelmente não, embora muitos queiram ver significados especiais em determinada combinação de números coincidentes; o 666, por exemplo (mas eu não sou absolutamente adepto de qualquer significado metafórico ou religioso para essa centena cabalística). O fato é que ao deparar-me com a numeração repetida neste domingo 23 de setembro de 2018, resolvi verificar o que poderia haver de especial na repetição de números similares para fazer a lista de meus trabalhos. O que descobri? Nada, ou seja, nenhum significado numa simples coincidência que surge totalmente ao acaso, uma vez que tenho dezenas de trabalhos em preparação, e eles só recebem um número definitivo depois que eu coloco um ponto final, e os considero terminados. Em outros termos, a minha listagem serial, ou quantitativa, de trabalhos acabados, não adquire nenhuma qualidade especial apenas pelo fato desses trabalhos se verem atribuídos esse tipo de numeração repetitiva, que não expressam em absoluto quantidade intrínseca, tão somente um lugar numa longa fila de trabalhos originais (existe uma outra lista para os trabalhos publicados). 
Apenas por curiosidade, fui verificar o que era feito dos trabalhos anteriores, que também receberam números similares, ou coincidentes. Começo pelo anterior, nesta sequência, com um dígito a menos: 333. Encontro este trabalho em minha lista consolidada:
333. “O Mercosul no contexto regional e internacional”, Brasília: 5 abril 1993, 26 p. Texto-guia para palestra no Seminário “Mercosul e Comunidade Europeia: Os Trabalhadores no Processo de Integração” (IRES-DESEP-CESIT, Campinas, 5-6 de abril de 1993). Revisto em 14 de abril de 1993 e apresentado no Seminário Latino-Americano de Planejamento Urbano, promovido pelo Programa de Estudos Latino-Americanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, UFMS e realizado em Campo Grande/MS, de 4 a 8 de maio de 1993. Publicado nos Anais do seminário: O Desafio do Desenvolvimento(Campo Grande, UFMS, maio de 1993, p. 191-203). Publicado na revista Política Externa(São Paulo: vol. 2, n. 2, setembro-outubro-novembro 1993, p. 86-103). Relação de Publicados n. 127 e 147. 

Ou seja, não havia nada de especial no trabalho 333. E o que dizer de outras combinações? Vamos partir da combinação inicial, a 111: 
111. “Uma Política Externa Sem Resultados”, Brasília, 31 janeiro 1986, 2 p. Visão crítica, de cunho jornalístico, da gestão do Chanceler Olavo Setúbal no Itamaraty. Trechos aproveitados em matéria assinada por William Waack, no Jornal do Brasilde 9 fevereiro 1986. 

Ou seja, nada de especial, tampouco, mas eu ainda estava no início de minha produção intelectual, e àquela altura, meados dos anos 1980, não podia imaginar que ela chegaria aos três dígitos. O mesmo ocorre ao agregarmos o mesmo número à série do 1:
1111. “OTAN e o fim da Guerra Fria”, Washington, 14 setembro 2003, 5 p. Revisão completa e atualização do verbete sobre a OTAN. Publicado in: Francisco Carlos Teixeira da Silva (org.), Enciclopédia de Guerras e Revoluções do Século XX - As Grandes Transformações do Mundo Contemporâneo: Conflitos, Cultura e Comportamento(Rio de Janeiro: Campus, 2004, v. 1, p. 650-652). 

Mais uma vez, nenhuma comemoração especial pela repetição de números, mas não cabalísticos, pelo menos. Mas se quisermos conferir esse número especial: 666?
666. “Dimensão social da integração: orelhas e capa”, Brasília, 27 fevereiro 1999, 2 p. Apresentação do livro sobre Mercosul, Nafta e Alca. In: Yves Chaloult e Paulo Roberto de Almeida (coords.), Mercosul, Nafta e Alca: a dimensão social(São Paulo: LTr, 1999). Relação de publicados n. 236.

Um simples trabalho editorial, como se pode constatar. Mas, passemos aos trabalhos que poderiam ser considerados “comemorativos”. O que eu andei fazendo quando, ao ultrapassar o cabo do trabalho n. 999, cheguei ao número 1000? Este aqui: 
1000. “O Brasil e o FMI: meio século de idas e vindas”, Washington, 22 janeiro 2003, 3 p. Resumo do capítulo preparado para o livro O Brasil e os acordos econômicos internacionais. Publicado no Jornal do Brasil(Rio de Janeiro: 27 jan. 2003, seção Opinião); no Colunas de RelNet(n. 7, jan./jun. 2003); e no Meridiano 47(Brasília: IBRI, n. 32-33, março-abril 2003, p. 17-18; link: http://periodicos.unb.br/index.php/MED/article/view/4373/3672). Relação de Publicados n. 395, 399 e 402. 

E se passarmos ao número 2000? Alguma elaboração especial? Uau! Desta vez encontro um trabalho preparado especialmente para a ocasião; este aqui: 
2000. “Um balanço da produção e seu sentido...: reflexões livres por ocasião do trabalho n. 2000”, New York, 28 abril 2009, 9 p. Comentários a propósito de minha produção intelectual, na passagem do trabalho (devidamente identificado) número 2000; dispensando o balanço contábil (com estatísticas a respeito), efetuei uma avaliação qualitativa e uma reflexão livre sobre meus textos como complemento às atividades didáticas. Publicado no blog Diplomatizzando(em 28.04.09; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2009/04/1086-por-ocasiao-do-trabalho-nr-2000.html#links). Republicado novamente no blog Diplomatizzando(23/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/meu-trabalho-n-2000-2009-paulo-roberto.html).

Mas já não é o caso do trabalho n. 3000, imerso em diversas ocupações, dois anos atrás, e que resultou apenas no planejamento feito para um curso, a partir de um livro anterior e possível base de um livro futuro, como registrei aqui: 
3000. “Relações Institucionais Internacionais”, Brasília, 23 junho 2016, 3 p. Ementa de curso de curta duração, a ser dado no quadro do programa de MBA de Relações Institucionais do Ibmec Business School, nos dias 25/06/, 9/07 e 6/08, a ser desenvolvido com base no trabalho 585 (Estrutura institucional das relações econômicas internacionais do Brasil: acordos e organizações multilaterais de 1815 a 1997), atualizado no livro Relações Internacionais e Política Externa do Brasil(2012). Feito como trabalho n. 3005, possível base de um pequeno livro nessa área.

E quanto aos trabalhos publicados, então? Eles correspondem a uma segunda lista, pois é evidente que nem tudo o que escreve está destinado à publicação ou serve para tal finalidade. Escrevo muito, mas sobretudo para mim mesmo, raramente para outros ou sob encomenda, e só aceito elaborar algum trabalho a pedido de alguém ou de alguma instituição (editora ou revista, por exemplo), quando o tema, o assunto, o enfoque e o tipo de divulgação estão de conformidade com o que eu mesmo penso, desejo, gosto de fazer. Meus trabalhos, originais, pertencem ao terreno que se poderia definir, em termos goethianos, de “afinidades intelectuais”, assim como aqueles que se destinam a publicação. Por isso mesmo, fiquei “devendo” vários trabalhos solicitados ou sugeridos por editores, geralmente na área de “relações internacionais”, que não é exatamente o meu terreno, a não ser que se insira o “econômicas” entre os dois termos.
Vejamos, antes de mais nada, meu primeiro trabalho publicado, que, como no caso da famosa moedinha do Tio Patinhas, guardada enquadrada em seu cofre forte, pode representar uma espécie de objeto raro, mas que na verdade não é o trabalho primordial (que se perdeu nas publicações juvenis de grêmios estudantis). Ele é este: 
001. “L’Etat Brésilien”, La Revue Nouvelle  (Bruxelles: 29ème année, Tome LVIII, numéro 11, spécial “Amériques Latines”, Novembre1973, p. 426-432). Postado na plataforma Academia.edu (link: http://www.academia.edu/35833013/13EtatBresilienRevueNouvellePubl.pdf) e no blog Diplomatizzando(4/02/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/02/letat-bresilien-1973-meu-primeiro.html). Relação de Trabalhos n. 013.

Passemos, então, ao meu trabalho publicado número 100, um texto tipicamente acadêmico, sobre minha área de atividades nessa época, sendo que eu fui um dos negociadores do Protocolo de Brasília: 
100. “Solução de Controvérsias no Mercosul: Comentários ao Protocolo de Brasília”, Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional(vol. XLV, nºs 81/83, Julho/Novembro 1992, pp. 93-105). Relação de Trabalhos nº 221.

Novecentos trabalhos publicados depois, o trabalho número 1.000 é igualmente integrante dessa lista serial aleatória, que vai alinhando a produção no exato momento em que um trabalho original é concluído ou um outro é publicado. Aqui está: 
1000. Guia dos Arquivos Americanos sobre o Brasil: coleções documentais sobre o Brasil nos Estados Unidos(Brasília: Funag, 2010, 244 p.; ISBN: 978-85-7631-274-1; com Rubens Antônio Barbosa e Francisco Rogido Fins, orgs.). Disponível no site da Funag, link:http://funag.gov.br/loja/download/753-guia_dos_arquivos_americanos.pdf). Relação de Originais n. 2200.

Encontro-me, atualmente, no trabalho publicado n. 1287, mas com alguns já enviados a publicação, e aguardando divulgação. Só incluo um original na lista dos publicados quanto o trabalho se encontra efetivamente disponível, como é o caso, por exemplo, do meu próximo livro: A Constituição Contra o Brasil: ensaios de Roberto Campos sobre a Constituinte e a Constituição de 1988(São Paulo: LVM, 2018; mas o índice já foi divulgado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/37324704/A_Constituicao_Contra_o_Brasil_Ensaios_de_Roberto_Campos_sobre_a_Constituinte_e_a_Constituicao_de_1988).

O que toda essa quantidade teria a ver com a qualidade dos meus trabalhos, para retomar a equação “dialética” de Friedrich Engels? Provavelmente muito pouco, pois tanto os originais produzidos, quanto os textos publicados vão seguindo uma numeração absolutamente sequencial, ao puro acaso do ponto final colocado no caso dos primeiros e da divulgação pública no dos segundos. Não estou fazendo concurso, nem disputando maratona produtiva com ninguém, e só decidi adotar essa metodologia serial porque do contrário eu me perderia na infinidade algo confusa da produção intelectual. As listas de originais e publicados me permitem organizar (um pouco, não totalmente) uma falta de método na produção, pois vou acumulando textos incompletos em dezenas de pastas em meus arquivos digitais. Provavelmente, os “working files” são ainda mais numerosos do que os terminados, e certamente bem mais do que os efetivamente publicados, que na verdade representam menos da metade da produção primária. 
Existe algo a comemorar nessa numeração incessante? Provavelmente não, pois de verdade não considero que quantidade equivale a qualidade. Na vida intelectual, existem autores de uma única grande obra, assim como existem produtores em série, estilo Balzac, Dumas, Simenon, Asimov e autores de novelas curtas. Não estou nesse mercado, tanto porque não me dedico a literatura, e só produzo aquilo que corresponde a meus “instintos” pessoais, ou minhas “afinidades eletivas” com determinados temas e assuntos. O que, sim, exige atenção, para não ocorrer dispersão numa miríade de pequenos trabalhos desimportantes, deixando de lado aquelas “grandes obras” que pretendemos terminar “um dia”. Para não deixar esses objetivos de lado, sempre coloco ao início de cada nova lista anual os títulos dos trabalhos que pretendo concluir ou empreender nas semanas e meses seguintes: tem alguns que passam de um ano a outro, como por exemplo o segundo e o terceiro volumes de minha história da diplomacia econômica, há muitos anos no “pipeline”, e com diversas pastas de material acumulado. 
Um dia virão, mas não ouso fixar um número em antecipação. Deveria...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 23 de setembro de 2018