quinta-feira, 22 de novembro de 2018

PSOE critica presidente eleito - Pedro Luiz Rodrigues

 Brasil e Espanha em rota de colisão?
Irresponsabilidade do PSOE põe em risco 30 anos de excelente relacionamento Brasil-Espanha
PEDRO LUIZ RODRIGUES

Diário do Poder - 21.11.2018

É uma pena, mas o governo da Espanha parece estar decidido a transformar em poeira trinta anos de construção de um excelente relacionamento com o Brasil. Isso porque o governo espanhol parece ter deixado que interesses secundários, meramente partidários, se sobrepusessem aos verdadeiros interesses nacionais.
 Durante a campanha do segundo turno das eleições presidenciais no Brasil, o presidente de governo  da Espanha, Pedro Sánchez Pérez-Castejón – dirigente máximo do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), decidiu tomar partido onde não era chamado, e passou a atacar duramente o então candidato, e hoje presidente-eleito do Brasil, Jair Bolsonaro.
No que constituiu uma inaceitável intromissão de um governo estrangeiro em assuntos  internos brasileiros, Pedro Sánchez explicitou “enorme preocupação” com a agenda de Bolsonaro, considerando que o então candidato nada teria a ver “com os princípios e os valores que compartilhamos (…) que têm a ver com a democracia”. O dirigene espanhol também não desautorizou que seu partido, além de apoiar formalmente o candidato do PT, atacasse Bolsonaro de maneira grosseira.
 Mesmo depois do resultado das eleições, Pedro Sánchez não deu o braço a torcer, preferindo não seguir o ritual que  certamente lhe terá sido recomendado por sua própria diplomacia. Limitou-se a fazer uma mensagem muito rastaquera a Bolsonaro, a quem não parabenizou explicitamente pela vitória, prevendo enormes desafios para o Brasil em sua gestão.
Resta saber como o governo Bolsonaro (já que o governo Temer parece não ter feito nada a respeito) reagirá à indevida e grosseira  intromissão do governo espanhol em questões da política interna brasileira e às ofensas que publicamente seu dirigente dirigiu ao novo presidente brasileiro.
 Verdadeiros estadistas, diferentemente de líderes políticos de segunda classe, têm a obrigação de preocupar mais com os interesses permanentes de seu país do que com quaisquer outros. Nesse sentido, sabem que devem empregar as palavras com precisão e correção.  Aliás, esse tipo de comportamento é o que esperamos os brasileiros de nosso futuro presidente, que foi um tanto prolífico em manifestações pouco refletidas durante sua campanha. Nenhuma, contudo, dirigida à Espanha ou aos espanhóis.
Pedro Sánchez, cujo país tem excelentes relações econômicas, financeiras e comerciais com o Brasil, deveria desculpar-se formalmente com o governo brasileiro, se desejar conosco manter uma relação madura e construtiva. Que guarde o dirigente espanhol seus arrobos para o trato da questão do separatismo catalão, da questão de Gilbratar ou para se dirigir aos envolvidos nos enormes escândalos de corrupção em que nos últimos anos enlamearam a política espanhola.
O PSOE é uma versão espanhola do PT. Ficou absolutamente silencioso quando vieram à tona as notícias sobre os escândalos de corrupção do mensalão e do Lava-Jato, onde dirigentes petistas foram responsáveis por bilionárias falcatruas envolvendo dinheiro público. Não disse nada, também, quando o Santander, então presidido por Emílio Botín, se viu compelido a demitir uma analista brasileira que, com toda propriedade, havia previsto que as irresponsabilidades da ex-presidente Dilma Rousseff acabariam por levar o Brasil ao desastre.
Não é à toa que a Espanha vem perdendo espaço no universo das relações internacionais. Está pisando na bola com o Brasil, seu principal parceiro na América do Sul; tenta uma aproximação com a Argentina, até agora não muito exitosa. A Espanha é, além disso, sub-representada nos organismos de cúpula da União Europeia. 
Relações bilaterais 
Desde a década de 1990 vem se fortalecendo o relacionamento entre o Brasil e a Espanha, com ênfase particular no universo econômico, tendo o país ibérico iniciado um forte programa de investimentos no Brasil. Segundo dados do Itamaraty, a visita do presidente  Mariano Rajoy ao Brasil, em 2017, acompanhado de dirigentes das doze principais empresas espanholas, procurou criar as bases para uma nova “onda” de investimentos.
 O Brasil representa uma das principais fontes de resultados positivos para as grandes empresas espanholas; Somos o segundo principal destino dos investimentos da Espanha no mundo, situados atrás de Singapura. Ao mesmo tempo, a Espanha ocupa também o segundo lugar entre os principais investidores estrangeiros no Brasil, atrás apenas dos Estados Unidos.
O autor é jornalista e diplomata.
DIARIO DO PODER 22.11.2018

PEDRO LUIZ RODRIGUES
¿Por qué no te callas?
Segunda parte do artigo sobre tensões no relacionamento Brasil-Espanha

Os líderes espanhóis parecem incapazes de se desvestir do sentimento de superioridade que mantêm em relação aos povos e aos dirigentes de suas ex-colônias na América Latina.  Esse sentimento, com tinturas de preconceito, se manifesta de tanto em tanto, mesmo quando tratam com os mais altos dirigentes de nossa região, talvez por percebê-los como figuras indignas de respeito e consideração.
Nesse sentido, episódio de grande notoriedade foi protagonizado pelo rei Juan Carlos, que durante a XVII Conferência Ibero-Americana (Santiago do Chile, 2007) encrispou-se com a verborragia do presidente venezuelano Hugo Chávez, e, como se estivesse se dirigindo a um lacaio, mandou-o calar a boca.  Correu o mundo seu ríspido “¿Por qué no te callas?”. Embora Chávez fosse de fato um grande falastrão, não cabia a um chefe de Estado, da ilustre casa de Borbón e das Duas Sicílias, não republicano portanto, dirigir-se dessa maneira a um dirigente legitimamente eleito por seu povo.
Mais recentemente, o presidente de governo da Espanha, Pedro Sánchez Pérez-Castejón, dirigente do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), embora de sangue plebeu, parece ter recebido o espírito de Hernán Cortez, o conquistador do México.  Sem ter sido provocado, atacou de maneira ríspida e grosseira, o então candidato brasileiro à Presidência da República – e hoje Presidente-eleito do Brasil, Jair Bolsonaro. Além da grosseria, o presidente espanhol cometeu algo que não é aceitável nas relações internacionais: a intromissão em assuntos internos de outros países.
Como certamente é do conhecimento de Dom Pedro Sánchez, não fomos colônia espanhola e nem temos por seu país essa veneração toda que exibem alguns tantos países hispano-americanos. Na verdade, questionamos mesmo a conveniência de se manter existindo a Conferência Ibero-Americana, que parece atender com prioridade os interesses do Reino da Espanha mais do que os de Portugal e os das repúblicas americanas.
Dessa maneira, parece que o governo brasileiro já deveria ter convocado o embaixador espanhol em Brasília para exigir um pedido de desculpas oficial,  com retratação do presidente espanhol pelos ataques feitos ao futuro Presidente da República . Caso essa retratação não seja considerada adequada, deveria ser considerada, como primeira medida, reduzir o nível da representação diplomática brasileira em Madri, retirando-se o Embaixador e se mantendo um Encarregado de Negócios.
Pessoalmente, não tenho dúvidas de que o presidente espanhol se retratará das inaceitáveis grosserias que dirigiu, durante a campanha, ao atual Presidente-eleito.   Sabemos que o PSOE, do qual Pedro Sánchez Pérez-Castejón é também dirigente, tem a mesma tendência verborrágica que tinha Hugo Chávez e têm os dirigentes do PT: costumam falar impulsivamente, de maneira impensada, sem levar em consideração as razões de Estado.
Os vínculos econômicos  

Comércio– A Espanha não tem qualquer motivo de buscar conflito com o Brasil. Segundo dados do MDIC, o comércio entre os dois países alcançou US$ 6,67 bilhões em 2017 , o que significou um crescimento de quase 30% em relação ao resultado do ano precedente. O país europeu foi o 12º parceiro comercial do Brasil, com 1,81% do comércio exterior brasileiro em 2017. Já o Brasil foi o 17º exportador (com 0,9%) e o 16º importador de produtos espanhóis, com 1,3% do total.
Após três anos de déficits, o Brasil reverteu a tendência deficitária no comércio bilateral e obteve superávit de US$ 39 milhões em 2016 e de US$ 963 milhões em 2017. Um dado importante para os espanhóis: enquanto exportamos para a Espanha principalmente produtos básicos (79% do total), de lá importamos majoritariamente (94%) produtos industrializados.
No ano passado, as principais aquisições brasileiras de produtos espanhóis foram: óleo refinado de petróleo (18,8% do total ou US$ 537 milhões); inseticidas, fungicidas, herbicidas (3,5% ou US$ 101 milhões); compostos orgânicos de enxofre (2,7% ou US$ 76 milhões); medicamentos em doses (2,6% ou US$ 74 milhões); partes e acessórios de veículos automóveis (2,7% ou US$ 71 milhões) e virabrequins, cambotas, manivelas e rodas de fricção (2,4% ou US$ 68 milhões).

Investimentos –Dados do Itamaraty e do Banco Central demonstram que característica principal dos investimentos espanhóis é a presença de grandes conglomerados multinacionais com atuação destacada na América Latina, os quais funcionam em setores que possuem barreiras de entrada de mercado em função da necessidade de extenso investimento inicial, como os sistemas bancário, de transportes e logística, de telefonia, de engenharia, entre outros.
A Espanha é o segundo maior país investidor no Brasil. Os investimentos espanhóis concentram-se nos setores financeiro, de transportes, telecomunicações e construções. As principais empresas espanholas com presença no Brasil são: ABERTIS (infraestrutura), AERONOVA (aviação e transporte naval), ACCIONA (infraestrutura), COMSA (infraestrutura), CEG (gás natural), FERROVIAL (transportes), IBERDROLA (energia elétrica), INDRA (T.I.), ISOLUX CORSÁN (infraestrutura), Meliá (hoteleiro), REPSOL (óleo e gás), Santander e Telefónica.
O Brasil é o oitavo maior investidor externo da Espanha. Merece destaque, nesse escopo, a compra da siderúrgica SIDENOR pela GERDAU. As principais empresas brasileiras com presença na Espanha são: GERDAU, Andrade Gutierrez, ITAÚ UNIBANCO, TAM, VOTORANTIM e WEG.
Área bancária – O grupo Santander obteve, em 2017, lucro líquido de 6,6 bilhões de euros (aumento de 7% em relação a 2016), o que em boa parte se deveu ao forte crescimento do lucro do Santander Brasil (42%). Graças ao bom desempenho no Brasil, que representou, pelo segundo ano consecutivo, a principal fonte de lucros para o grupo espanhol, o lucro total do Santander em 2017 superou a soma dos lucros dos demais grandes bancos espanhóis. O peso da filial brasileira foi ainda maior em 2017, uma vez que o lucro do Santander no Brasil registrou crescimento de 42% em relação a 2016. O lucro ordinário obtido no Brasil, de 2,54 bilhões de euros, representou 26% do total do grupo. Essa é a maior participação da filial brasileira nos lucros nos últimos cinco anos. 
Telefonia –  A Vivo, subsidiária brasileira do conglomerado espanhol Telefónica, foi apontada em setembro de 2017 como a empresa mais lucrativa do grupo. A Telefônica Brasil encerrou o ano passado como líder do mercado brasileiro de telefonia, com 97,8 milhões de acessos. A Telefónica pretende replicar no Brasil a experiência de expansão da fibra ótica até o lar na Espanha, país com o maior acesso na Europa e o terceiro da OCDE. Em setembro de 2017, as linhas de fibra ótica da Telefónica Brasil cresceram 44% em termos anuais. A empresa lidera o mercado brasileiro de internet de banda larga de alta velocidade com 82% de quota. A empresa anunciou planos de investir R$26,5 bilhões até 2020, dos quais R$ 2,5 bilhões na expansão da fibra ótica até o lar. O presidente da Telefónica Brasil mostrou-se otimista em relação às perspectivas da economia brasileira e à continuidade da rentabilidade por dividendo da empresa, atualmente na faixa de 6%. 

O autor é jornalista e diplomata.

Reforma tributaria - Kleber Castro (Poder 360)

Não precisamos de outro manicômio fiscal, diz Kleber Pacheco de Castro

Roberto Campos foi 1 ‘visionário’
O IVA, porém, é muito importante
Marcos Cintra ignora outros países
Leia artigo de Kleber Pacheco de Castro
Um novo imposto sobre transações financeiras traria 1 manicômico fiscal, escreve Kleber Pacheco de Castro Serasa Experian 
22.nov.2018 (quinta-feira) - 5h50
atualizado: 22.nov.2018 (quinta-feira) - 7h26
Em 1999, Roberto Campos, escreveu 1 artigo para a Folha de S.Paulo intitulado “Como sair do manicômio fiscal” no qual, sucintamente, criticava o projeto de reforma tributária do deputado Mussa Demes e enaltecia 1 projeto alternativo, do deputado Marcos Cintra.
Resumidamente, Campos destacava que 1 tributo do tipo IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) –objeto da principal proposta de reforma tributária– estava em desuso frente à realidade da “sociedade eletrônica” e que o melhor caminho seria se fundar em 1 tributo de fácil recolhimento e baixo potencial de arrecadação, como 1 tributo sobre as transações financeiras –objeto da proposta alternativa de reforma tributária.

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Pode-se afirmar que, do ponto de vista tributário, pouca coisa mudou no Brasil nesses quase 20 anos entre o referido artigo e os dias atuais. A despeito de alguns pequenos ajustes, o sistema tributário brasileiro, pouco mudou.
As competências federativas são as mesmas, as bases de incidência dos tributos pouco mudaram, a burocracia tampouco regrediu… e, além disso, mais uma vez “disputam a corrida” da reforma tributária dois modelos: o IVA e o imposto sobre transações financeiras.
Fora alguns deméritos, como classificar o IR (Imposto de Renda) de “safadeza socialista” e afirmar que a cumulatividade da CPMF é uma “cascata benigna”, o artigo de Roberto Campos lança mão de uma ideia importante e que hoje está muito em voga: os sistemas tributários “clássicos” precisam se reinventar frente às transformações (digitais) pelas quais a sociedade e a economia vêm passando. Neste aspecto, Roberto Campos foi 1 visionário.
Entre a visão e a prática, porém, há uma diferença. Tomemos os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) como referência: do fim da década de 1990 até 2015, o IVA não apenas não encolheu sua participação da carga tributária média desses países, como se expandiu ligeiramente (de 18% do total para 20% do total).
Ou seja, a visão de Campos –tomada como certa por grande parte dos analistas de tributação– ainda não se concretizou. Em outras palavras, o IVA, com todos os seus defeitos, continua sendo 1 tributo muito importante para os principais sistemas tributários do mundo.
Por que foi necessária tanta digressão para trazer uma informação tão simples?
Na “guerra” dos modelos de reforma tributária brasileira, há uma celeuma de opiniões, por vezes, sem respaldo técnico, em torno do IVA. Notavelmente, o economista Marcos Cintra – o autor daquele projeto da década de 1990, defendido por Roberto Campos – tem sido o “bastião” de representações contra o IVA.
Para ficar limitado apenas aos últimos meses, cito 3 artigos de ataques diretos ao IVA, sem grandes fundamentos acadêmicos: “O ultrapassado IVA, piora o que é ruim”, “IVA é incompatível com o mundo digital”, “IVA será desastroso”. Para o autor, todos os problemas do IVA seriam solucionados rapidamente substituindo-o por 1 tributo sobre transações financeiras –algo semelhante à antiga CPMF.
Em outro artigo, no qual o IVA não é citado explicitamente, Marcos Cintra chega a apontar uma boa referência para respaldar suas críticas, indicando 1 dos relatórios recentes da OCDE sobre a erosão da base fiscal na era da economia digital. Ele esquece, porém, de dizer que o relatório respalda apenas suas críticas e não a sua solução.
Ao contrário do que faz parecer em seus textos, os países envolvidos nas discussões do BEPS (Base Erosion and Profit Shifting) –das quais mais de 80 têm participado ativamente– não abandonaram o IVA em favor de uma “revolução” via transações financeiras, mas têm buscado soluções para corrigir o próprio IVA, como, por exemplo, a partir da adoção do princípio do destino nas operações internacionais do tipo B2C (business to consumer).
Ainda que os relatórios do BEPS reconheçam que os sistemas tributários têm 1 desafio mais “sistêmico” frente às mudanças da economia digital, não propõem aventuras/experimentos como possível solução.
Podemos ainda identificar outros movimentos internacionais de reação aos novos paradigmas econômicos.
Um bom exemplo foi a proposta de criação de 2 tributos “digitais” pela Comissão Europeia em março desse ano: 1) 1 tributo sobre rendas e lucros de empresas que não estão fisicamente sediadas nos países da União Europeia, mas atuam naquele território de forma virtual; e 2) 1 tributo sobre os serviços digitais, incidente sobre receitas de atividades que atualmente não compõem a legislação tributária europeia (ex: venda de dados de usuários de plataformas digitais e venda de espaço publicitários on-line).
Também nesse caso, não há menções ou movimentos em direção a uma solução mais heterodoxa, como a proposta por Cintra.
Em uma busca rápida pelo Google, verifica-se que nenhum país intenciona apostar na tributação sobre transações financeiras como respostas para o iminente estrangulamento fiscal proporcionado pela economia digital. Isso pode soar pouco relevante para 1 autor que simplesmente ignora o que outros países estão fazendo, como ele mesmo destaca em seu livro de 2009.
Ainda assim, 1 esforço foi empreendido para buscar alguma ideia que se aproxime das ideias de Cintra. Foi identificada uma proposta de reforma tributária feita na Índia no ano passado –não como solução para a economia digital, mas como solução para a complexidade do sistema indiano– mas que foi prontamente descartada.
Um estudo mostrou que, entre outros problemas, o referido tributo: 1) necessitaria de uma alíquota muito elevada para dar o mesmo resultado fiscal; 2) incentivaria a desintermediação financeira; 3) teria incidência em cascata (cumulatividade); e 4) não permitiria ao governo extrair outra finalidade do sistema tributário, que não o aumento da arrecadação.
Em suma, todas as críticas que já foram feitas ao projeto nacional de Marcos Cintra, com o bônus de não descartarem a possibilidade de sonegação fiscal, que é provavelmente a tese mais defendida por Cintra.
Em 1 de seus artigos, Cintra afirma que: “[…] muitos analistas, por desconhecimento ou por preguiçoso apego aos paradigmas convencionais, não reconhecem que os sistemas tributários tradicionais se mostram incapazes de atender às necessidades do mundo virtual e das novas tecnologias de produção, de comercialização e de movimentação de bens e de serviços no mundo digital”.
Muito surpreendente parece, contudo, que o próprio autor, por desconhecimento ou apego a 1 dogma, não reconheça que o imposto sobre transações financeiras não é solução para os problemas do sistema tributário brasileiro (e, aparentemente, para nenhum país do mundo). Corrigir o “IVA brasileiro” não representa o “aperfeiçoamento do obsoleto”.
Se trata, tão somente, de –por mais estranho que isso possa parecer– colocar o país no caminho da obsolescência, haja vista que atualmente sequer temos caminho. Como mostra a Europa, não há solução pronta para os problemas que nos aguardam, sendo o mais prudente, neste caso, se agarrar às melhores práticas convencionais, não tirando do campo de visão as mudanças que serão necessárias no futuro próximo.
Se aventurar na ideia da proposta do imposto sobre transações financeiras seria como entrar em outro manicômio. Sai-se de 1, entra-se em outro. Não precisamos de outro manicômio fiscal.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Historiografia da politica externa brasileira - IRBr, 21/11, 9hs-18hs

FUNAG / CHDD / IPRI
A Historiografia da Política Externa Brasileira
Auditório Araújo Castro, Instituto rio Branco-IRBr, Brasília – DF 
22/11/2018 às 9h00.
9h00min         Abertura: Apresentação 
Embaixador Gelson Fonseca Júnior, Diretor do CHDD;
Embaixador Paulo Roberto de Almeida, Diretor do IPRI;
Embaixador Marcos Bezerra Abbott Galvão, Secretário-Geral do MRE;

9h30min         Painel da Manhã: A historiografia do Império à Primeira República
Moderador: Amado Cervo.
João Daniel de Almeida. “A independência portuguesa: 200 anos de olhar nacionalista sobre o desmembramento de um império global”;
Francisco Doratioto. “O Primeiro Reinado”;
Gabriela Nunes Ferreira. “O Segundo Reinado (1840-1889)”;
Clodoaldo Bueno. “A Primeira República (1889-1930)”.

12:30               Almoço

14h30min       Painel da Tarde: Da Revolução de 1930 à Nova República
Moderador: Matias Spektor.
Fábio Koifman. “Da Revolução de 1930 até o fim de 1945”;
Antônio Carlos Lessa. “A Nova República (1946-1964)”;
Paulo Vizentini. “O Regime Militar (1964-1985)”;
Embaixador Paulo Roberto de Almeida. “Da redemocratização aos nossos dias (1985-2018)”.

17h00min       Encerramento
Embaixador Gelson Fonseca Júnior.
Conferência de encerramento: Amado Cervo.

Augusto Nunes responde a Celso Amorim

O ex-chanceler Celso Amorim volta das trevas para chorar a morte da política externa da canalhice, escreve Augusto Nunes:


A política externa da canalhice nasceu do acasalamento incestuoso de stalinistas farofeiros do PT e nacionalistas de gafieira do Itamaraty, uns e outros sonhando com a Segunda Guerra Fria que destruirá para sempre o imperialismo ianque. Adotada pelo candidato vitorioso na eleição presidencial de 2002, esse aleijão subiu a rampa acampado na cabeça baldia de Lula e ficou aos cuidados da dupla de babás vigaristas formada por Celso Amorim, fantasiado de ministro das Relações Exteriores, e Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência para complicações cucarachas.

Nesta semana, Amorim reapareceu no noticiário jornalístico para louvar a diplomacia da cafajestagem. A política externa de Jair Bolsonaro, concluiu antes mesmo que o novo governo tivesse começado, é mais que um retrocesso. “É um retorno à idade média”, recitou o ex-chanceler que comandou o Itamaraty ajoelhado no altar do chefe que chamava de “Nosso Guia”. Durante oito anos, fantasiado de potência emergente, o governo envilecido pela abolição de valores morais não perderia nenhuma chance de reafirmar a opção preferencial pela infâmia.

O Brasil de Lula ajoelhou-se quando a Bolívia confiscou ativos da Petrobras e rasgou o acordo sobre o fornecimento de gás. Hostilizou a Colômbia democrática para afagar os narcoterroristas das FARC. Confrontado com bifurcações ou encruzilhadas, nunca fez a escolha certa. Quando o Congresso de Honduras, com o aval da Suprema Corte, destituiu legalmente o presidente Manuel Zelaya, o Itamaraty dobrou-se às vontades de Hugo Chávez. Decidido a reinstalar no poder o canastrão convertido ao bolivarianismo graças a doações de petróleo venezuelano, Chávez convenceu Lula a transformar a embaixada brasileira em Tegucigalpa na Pensão do Zelaya.

Obediente a Fidel Castro, Lula aprovou a deportação dos pugilistas Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux, capturados pela Polícia Federal quando tentavam fugir para a Alemanha pela rota do Rio. Entre a civilização e a barbárie, o fundador do Brasil Maravilha invariavelmente cravou a segunda opção. Com derramamentos de galã mexicano, prestou vassalagem a figuras repulsivas como o faraó de opereta Hosni Mubarak, o psicopata líbio Muammar Kadafi, o genocida africano Omar al-Bashir e os aiatolás atômicos do Irã, fora o resto. Coerentemente, o último ato do estadista de galinheiro que se julgava capaz de resolver com conversas de botequim os conflitos do Oriente Médio foi promover a asilado político o assassino italiano Cesare Battisti.

A herdeira Dilma Rousseff ampliou esse acervo de opções e parcerias abjetas. Entre o governo constitucional paraguaio e o presidente deposto Fernando Lugo, ficou com o reprodutor de batina. Juntou-se com muita animação à conspiração tramada para afastar o Paraguai do Mercosul e permitir a entrada da Venezuela. Caprichou no papel de mucama de Chávez até a morte do bolívar-de-hospício que virou passarinho. Para adiar a derrocada de Nicolás Maduro, arranjou-lhe até papel higiênico vendido a preço de ocasião.

Enquanto Lula prosperava como camelô de empreiteiras que colidiriam com a Lava Jato, Dilma transformou a Granja do Torto na casa de campo de Raúl Castro e presenteou a ditadura cubana com o superporto que o Brasil não tem. Avançava no flerte com os companheiros degoladores do Estado Islâmico quando o impeachment chegou. Potencializada pela crise econômica, a maior roubalheira da história apressou a demissão da mais bisonha governante do mundo. Os crápulas que gerenciavam o Itamaraty acompanharam a chefe no caminho do esquecimento.

Celso Amorim voltou das trevas para chorar o enterro desse capítulo vergonhoso da nossa história. “Com Bolsonaro, o Brasil perderá o protagonismo no cenário mundial”, lamentou o farsante que ainda no berçário perdeu a vergonha na cara. Entrevistar Amorim é perda de tempo. Melhor devolvê-lo imediatamente à lata de lixo da História.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Deirdre McCloskey: Brasil tem chance de implementar o liberalismo (Gazeta do Povo)

Grato ao amigo Orlando Tambosi pela transcrição desta matéria em seu blog.

Brasil tem a chance de colocar ideias liberais em prática de forma democrática, diz historiadora do liberalismo.


Em entrevista à Gazeta do Povo, que visitou em Curitiba, a historiadora e economista Deirdre McCloskey (que, infelizmente, não tem nenhuma de suas obras fundamentais sobre a burguesia traduzidas por aqui) fala sobre as perspectivas do Brasil com a ascensão de um governo liberal-conservador:


Nos Estados Unidos, Deirdre Nansen McCloskey, 76, uma dos maiores expoentes vivas do pensamento liberal, é quase sempre apresentada como uma economista “libertária”. Por lá, o termo liberal tornou-se quase um sinônimo das causas da esquerda. Mas McCloskey está em uma cruzada contra esse sequestro. No prefácio do novo livro que prepara, a economista anuncia fazer uma defesa do verdadeiro liberalismo da linhagem de Adam Smith: “igualdade [social], liberdade [econômica] e justiça [legal], com um governo pequeno e moderado ajudando de verdade os pobres”. 

Crítica de autoritários e populistas à esquerda e à direita, McCloskey tem uma carreira pouco óbvia. Formada em Harvard, pupila de Milton Friedman, quando ainda era Donald, antes de mudar de gênero no final dos anos 1990, McCloskey deu aula na Universidade de Chicago, celeiro liberal de Prêmios Nobel, entre 1968 e 1980. “Dei aula para todos os ‘Chicago Boys’, brasileiros e chilenos”, comenta quando perguntada sobre as perspectivas do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, que fez seu Ph.D. na universidade entre 1974 e 1978.

Guedes passou dois anos no Chile no início da década de 1980. “Os liberais chilenos ainda são assombrados pelo fato de que o liberalismo no Chile foi posto em prática à força e com base na violência. Agora, vocês têm uma oportunidade no Brasil de pô-lo em prática democraticamente”, diz. 

Desde a década de 1980, McCloskey foi se aproximando cada vez mais da História, da Poesia, da Retórica e da Filosofia, sem nunca se esquecer da Economia. Essa erudição levou-a a escrever sua obra prima, a “Trilogia Burguesa”. Em 1800 páginas, a intelectual procura explicar o milagre do “grande enriquecimento” que o capitalismo trouxe ao mundo desde o século 18 e, ao mesmo tempo, formular uma ética das virtudes para um mundo de comércio. 

Sobre esses temas, McCloskey conversou com a Gazeta do Povo um ano atrás. Nesta semana, a economista esteve novamente no Brasil, visitou a Gazeta do Povo e falou sobre sobre os desafios do liberalismo no país, as eleições nos Estados Unidos, as políticas de Donald Trump e a emergência de movimentos autoritários ao redor do mundo. 

Confira a íntegra da entrevista abaixo:

Gazeta do Povo: Seu novo livro se chamará “Por um Novo Liberalismo: Ensaios sobre Persuasão” (no prelo; tradução livre). Nas últimas eleições aqui no Brasil, as ideias liberais parecem ter ficado mais populares: tivemos candidatos eleitos que defenderam ideias claramente liberais. Mas muitas pessoas acham que o Brasil ainda precisa ser convencido a ser realmente liberal. Como você poderia nos persuadir? 

Deirdre McCloskey: Eu posso usar uma analogia. Um dia já fomos crianças, tínhamos uma mãe e um pai, e isso era muito bom: é ótimo ter uma família. Mas agora somos adultos e não deveríamos ter mães e pais “governamentais”. Quando somos crianças, é bom que nossas mães e pais nos digam o que fazer, mas não acho que esse seja um papel apropriado para o governo, por uma série de razões. Por um lado, diferentemente dos nossos pais, o governo não sabe o que é realmente bom para nós. Eles estão lá longe em Brasília, e a informação que naturalmente está disponível no âmbito de uma família não está disponível em uma grande sociedade. Então, é muito melhor que você deixe isso para o que podemos chamar de “conversa” entre os comerciantes e os consumidores.

Por outro lado, como vocês no Brasil aprenderam bem nos últimos dez anos, quando há um governo grande forçando as pessoas, essa é a oportunidade para a corrupção. O que as pessoas querem dizer com “corrupção” é que um agente privado vai até o governo e paga o governo para forçar uma medida. Agora, eu sou uma liberal cristã, anglicana, e acredito que nós temos obrigações para com os pobres. A obrigação principal é deixar que os pobres tenham um trabalho digno, mas, em casos de emergência, de necessidade premente, eu deveria ser taxada para ajudá-los. Mas o imposto seria pequeno. Veja: com 10% da renda sendo taxada no Brasil, já não haveria mais pobres – você não precisa de 40% de taxação para ajudar os pobres. 

Aqui no Brasil, depois de uma longa crise econômica e com uma bomba fiscal armada, nós elegemos um presidente com um passado estatista e corporativista. Apesar disso, ele diz que, junto com o economista Paulo Guedes, que promete ser um tipo de superministro, quer tornar o Brasil mais liberal. Paulo Guedes fez o Ph.D. em Chicago, onde você deu aula. Se ele foi um bom aluno, que tipo de reformas deveria buscar? 

Elas são bem óbvias: permitir que as pessoas comprem onde queiram comprar e vendam onde queiram vender. Permitir que as pessoas façam as coisas que querem. Comecem os negócios que queiram e se ocupem do que queiram – e comprar onde se queira comprar inclui o comércio exterior. Essa deveria ser a regra de uma economia, porque é assim que conseguimos inovar, e é o livre comércio que melhora a qualidade dos produtos. Nesse caso, você não pode vender uma câmera ruim feita no Brasil – e o Brasil é bom em muitas coisas. Em fazer aviões pequenos, por exemplo, e açúcar. Nós pagamos, nos Estados Unidos, o dobro do preço mundial do açúcar, quando deveríamos estar comprando açúcar do Brasil. Mas nossos fazendeiros são protegidos. Então, eu espero que ele faça este tipo de coisa, como simplificar as tarifas. 

Paulo Guedes passou dois anos no Chile, no começo dos anos 1980, e o Chile é visto como um exemplo por muitos liberais no Brasil... 

Eu dei aula para eles, tanto para os brasileiros quanto para os chilenos. Dei aula em Chicago entre 1968 e 1980. Lecionava o grande curso de microeconomia na pós-graduação. Ensinei todos eles. 

Sim, e como você avalia agora a experiência dos “Chicago Boys” no Chile, com um pouco de distanciamento histórico? 

Eu não os ensinei a colocar as pessoas em estádios de futebol e atirar nelas [referência ao Estádio Nacional do Chile, onde militares chilenos prenderam, torturam e mataram opositores durante a ditadura do general Augusto Pinochet]. Os liberais chilenos ainda são assombrados pelo fato de que o liberalismo no Chile foi posto em prática à força e com base na violência. Agora, vocês têm uma oportunidade no Brasil de pô-lo em prática democraticamente. Elogio vocês por isso. É muito sábio e mostra certa maturidade política.

Mas acho que o liberalismo na economia funcionou [no Chile] – e um caso ainda mais espetacular é a China, que é uma autocracia terrível, um país terrivelmente iliberal na política, mas muito liberal em grande parte da economia, o que lhes trouxe um crescimento econômico fantástico. Um caso muito melhor é a Índia, que é uma democracia vibrante, embora um pouco maluca, e que também adotou o tipo de liberalismo que o Brasil deveria ter. Eu não conheço o Brasil tão bem, mas conheço bem a África do Sul e eles têm as mesmas políticas que o Brasil. É muito difícil começar um negócio por lá, há tarifas protegendo vários setores, e regulações no mercado de trabalho que geram – veja bem – 50% de desemprego entre os jovens negros sul-africanos. É uma catástrofe. 

Você mencionou a China: economia liberal e política iliberal. Há um ano, quando conversamos, você disse que o Partido Comunista Chinês está montado em um tigre, como na velha fábula: se você cai, você é comido pelo tigre. Mas Xi Jinping, o presidente chinês, parece estar segurando bem esse tigre no laço, então eu pergunto novamente: a China inventou uma alternativa às democracias liberais? 

Não. O inventor dessa versão foi Singapura. Se você chupa chicletes em Singapura, eles te batem [risos]. A imprensa não é livre como aqui no Brasil, nos Estados Unidos, na África do Sul e na Índia. Não é uma alternativa, não é algo que o Brasil deveria pensar em pôr em prática, e eu acho que esse modelo não vai durar na China. Veja, eu entendo ainda menos da China do que do Brasil, embora esteja muito empenhada em oferecer conselhos a todos vocês [risos], mas realmente acho que um país rico – o que a China vai se tornar em mais uma ou duas gerações – não vai tolerar esse tipo de controle. 

Lembra a minha metáfora da mãe e do pai? Estive em uma universidade de tecnologia no meio da China uns meses atrás, e eles me mostraram o programa de reconhecimento facial que estão desenvolvendo e que vai permitir vigiar e guardar registros de todo mundo. Um país rico não vai tolerar esse tipo de coisa, e há muitos exemplos disso. A Coreia do Sul era uma ditadura, Taiwan era uma ditadura, e no fim das contas se tornaram democracias. 

Mas não ainda Singapura... 

Não ainda Singapura, e me pergunto por quê. Mas estão fazendo muito dinheiro em Singapura, então talvez continue assim por mais um tempo mesmo. Mas sou otimista em relação ao futuro, tanto na política quanto na economia. 

Então vamos para os Estados Unidos. Os democratas, em geral, eram os entusiastas do protecionismo e do déficit fiscal, mas agora Donald Trump apoio esse tipo de política e se gaba de criar empregos com base nelas, e ainda investe em uma “guerra comercial” com a China. Ao mesmo tempo, assistimos à emergência de movimentos iliberais ao redor do mundo, como na Hungria, na Polônia, nas Filipinas. A ideia do livre comércio e do liberalismo está arrefecendo no mundo e, em particular, nos Estados Unidos? 

Sim, estão sob ataque. O nacionalismo está vindo à tona, temporariamente. Eu, assim como muitas pessoas, acho que é só um movimento pendular. Donald Trump não tem convicções – seu homem [Jair Bolsonaro] é mais perigoso nisso, ele é autoritário e isso me preocupa um pouco. Mas Trump está no negócio Trump. Ponto. Ele só diz as coisas sobre as pessoas trans, essas coisas malucas sobre comércio exterior, porque a base política dele acredita nisso. Não acho que essas coisas vão ter muito efeito.

De fato, o que acho que vai acontecer nos próximos dois anos é que haverá uma recessão econômica [nos Estados Unidos], não necessariamente causada pelas políticas econômicas estúpidas de Trump, mas ele será culpado por ela. Equivocadamente até, porque o presidente não tem muito a fazer sobre as oscilações dos ciclos econômicos. Então, isso talvez marque o fim do populismo. Não me entenda mal: é ruim para o país erigir barreiras tarifárias, tentar conter a imigração, etc., mas o enredo vai se desenvolver assim, com Trump acabando culpado pelos resultados econômicos ruins. 

E você acha que, se isso acontecer nos Estados Unidos, o populismo vai arrefecer no restante do mundo? 

Sim, porque acho que a vitória do Trump foi uma grande inspiração para o populismo. Ele ganhou por muito pouco e, se eleição fosse hoje, ele perderia. De fato, ele perdeu as eleições para o Congresso. 

Os democratas recuperaram a Câmara nas eleições de meio de mandato, mas muitos “socialistas democráticos” foram eleitos, muitos progressistas que investem na política identitária e, ao mesmo tempo, Trump está reinando no Partido Republicano. Ainda existe espaço para o liberalismo de verdade nos Estados Unidos? A esquerda não está respondendo também de forma iliberal? 

Sim, está. Ambos os lados são iliberais, o socialismo e o fascismo são iliberais. Mas há muitos políticos, que se chamam mais de “pragmáticos” do que de “liberais”, que estão dispostos a ouvir. Não acho que o Partido Democrata seja estúpido o suficiente para apoiar uma figura realmente de esquerda, como Elizabeth Warren [senadora democrata reeleita por Massachusetts, às vezes cotada para concorrer à Presidência em 2020] – isso seria um erro terrível, acho que eles não o cometeriam. Eles vão apoiar um moderado e as coisas vão terminar bem. A política americana é importante para vocês. Se houver uma Terceira Guerra Mundial, vocês estarão nela [risos]. Minha solução para isso é permitir que o mundo todo vote para escolher o presidente americano [risos]. 

Sei que você está brincando sobre a Terceira Guerra Mundial, mas você acha que estamos de volta aos anos 1930, em termos de protecionismo e disputas comerciais, etc.? 

Essa é, obviamente, a analogia assustadora, mas os anos 1930 foram muito piores do que agora, em todos os aspectos imagináveis. Um quarto da força de trabalho estava desempregada nos Estados Unidos e na Alemanha. Note: desde o início do século 19, houve cerca de 40 recessões – elas chegam mais ou menos a cada cinco anos –, mas a tendência de longo prazo foi de crescimento. Houve 6 recessões mais graves, a pior das quais a da década de 1930, mas a tendência é sempre de crescimento. 

Mesmo a reação populista de agora é menos violenta do que a dos anos 1930, quando houve o regime do [Getúlio] Vargas, os fascistas na Espanha e na Hungria, os comunistas na Rússia. Havia comunistas e fascistas armados. Agora são só pessoas fazendo barulho. Trump é um exemplo disso, recuou na questão das pessoas trans no Exército e mesmo a tal “guerra comercial” ainda não aconteceu. Quando há fascistas e comunistas armados brigando nas ruas, como era o caso na década de 1930, aí você deve ficar preocupado mesmo. 

Conhecendo a sua trajetória, não poderia deixar de perguntar isto. Talvez por causa das sucessivas crises econômicas pelas quais o Brasil passou, os economistas se tornaram gurus do debate público há muitas décadas, mas me parece que muitos deles só conseguem falar de gráficos e números e se esquecem de falar com a população em geral. O que você diria para as pessoas que acreditam que a economia é tudo que importa? 

A propósito, essa proeminência dos economistas é muito característica dos países da América Latina, onde os economistas se tornaram muito importantes, às vezes trazendo resultados terríveis. Quem acha que só a economia importa está terrivelmente enganado. Defendo o que chamo de “Humanomia”: Economia com os humanos dentro. Isso significa, por exemplo, que temos de conceber a Economia como um campo da linguagem. Nos negócios, falar é crucial. No espírito de uma empresa, no exercício da liderança. Um quarto dos empregados em economias como o Brasil e os Estados Unidos ganha a vida na base do convencimento. Você e eu, por exemplo, trabalhamos com as palavras. Supervisores também, e há muitos deles na força de trabalho. 

Não estamos mais na época da escravidão: você não pode convencer os trabalhadores a fazer as coisas pela ameaça de violência. Na verdade, você mal pode demiti-los, não por causa das leis – embora isso possa ser um problema –, mas porque você quer ensiná-los a fazer o trabalho corretamente, a crescer. Então, é necessária uma Economia mais ampla, que inclua as Humanidades. Uma economia da inovação, que aliás é melhor para os pobres, é uma economia em que a criatividade humana é plenamente empregada. Isso não é, para usar a linguagem técnica, uma questão de “função produção”. Enfim, ainda precisamos de uma Economia bem mais ampla. 

Além de você, tem alguém pensando nisso? 

Umas seis pessoas [risos]. Uma delas é o Vernon Smith, ganhador do Prêmio Nobel, e seu colega Bart Wilson, da Universidade Chapman. Algumas pessoas antes deles, uma das quais bastante conhecida na América Latina, o grande economista Albert Hirschman. Veja: isso não é um pedido para abandonar a matemática. Eu quero mais matemática, mais números, mas quero números inteligentes. Não sou contra os estudos quantitativos, sou contrária a uma maneira desumana de olhar o mundo, e essa é uma tentação na economia, seja na esquerda ou na direita. A economia marxista é tão bárbara e limitada quanto a economia burguesa, e ambas precisam se tornar uma economia verdadeiramente humana.

O imperio romano de Washington - Giselle Donnelly (Strategika)

Describing the balance of power by way of “poles,” the analytical framework so favored in recent decades by professional political scientists, is no longer that useful. The polar concept earned undue acclaim through the writings of the late Charles Krauthammer, whose 1990 Foreign Affairs article, “The Unipolar Moment,” was a succinct way to capture the extent of American geopolitical influence at the end of the Cold War, but is an inadequate yardstick for understanding the present moment or the future of—wait for it—“the American-led liberal international order.”
To be sure, these organizing principles of global life have their discontents. But no one has done better than Walter Russell Mead in describing Iran, Russia, and China as an “Axis of Weevils,” capable only of undermining the world the United States has made, not bringing forth a new one. To begin with, the Weevils lack the same ex nihilo opportunity that presented itself to America in the wake of World War II (and, in fact, World War I before it); absent a similar catastrophe that so inflates and deflates the relative power of nations, constructing a new—even regional—“pole” of power will be the work of decades, if not centuries. Before any fall would come much more decline.
In imagining the fate of the Pax Americana, Rome might well provide a better model than the European empires of the modern age. Like Rome, the United States is a pervasive linguistic, cultural, and economic as well as military influence, and America’s “provinces” enjoy a good deal of autonomy. The number and power of “contented” allies far outstrips the extent of adversarial discontents. Moreover, the Weevils have little to offer by way of ideological attraction. At their cores, China and Russia are animated by a blood-and-soil kind of nationalism, while Iran pairs that with Shi’a sectarianism. There’s not much there if you remain among the “nonaligned” or considering your own long-term interests.
But if the barbarians outside the gates pose a manageable challenge, those within are of greater concern. While much ink and many electrons are spent bewailing the divisions and partisanship of our current politics, it is the increasing agreement over the role of America in the world that is more worrisome. From the Rand Paul Right to the Kamala Harris Left, there is a rising consensus that American power is both waning and illegitimate. President Trump’s “American First” rhetoric is a manifestation of this impulse—though his policies, which have included maintaining the American position in Afghanistan and, reportedly, in Syria as well, do not. Both parties have developed deep phobias about the use of military power, but when a Democrat next occupies the White House, there is likely to be a yearning for the “internationalism” of the Trump years.
Rome survived multiple sackings but not its internal divisions—the one pole became two and then the many squabbling polities of the last millennium. The long decline came before the fall, but the subsequent age was indeed a dark one.

Percival Puggina examina o cenário atual e as tarefas a fazer

"Obtida a vitória nas urnas, o sucesso passa a depender da combinação de duas receitas. De um lado, os princípios e valores que inspiram condutas civilizadas; de outro, as ações de Estado com vistas às liberdades econômicas e ao equilíbrio das contas públicas. Ainda é mais viável do que uma mudança para Portugal". Do blog de Percival Puggina:


Com tantos amigos querendo ir morar em Portugal para viver em ambiente civilizado, pus-me a pensar que isso representava uma espécie de regressão à vida intrauterina. Afinal, foi de lá que nos veio a civilização com os valores e os padrões de relação que lhe são inerentes. Nas últimas décadas, na cidade e no campo, o ambiente social brasileiro foi se decompondo, brutalizando. A mobília urbana é civilizada. Temos hospitais, escolas, e tudo mais, mas os usuários, em número crescente, foram deixando de lado referenciais e limites indispensáveis a um convívio social que se identifique com civilização. Então, além-mar; então, Portugal.

Não éramos assim. Nos anos 60, cantamos com Vinícius de Moraes e Tom Jobim que “quando derem vez ao morro, toda cidade vai cantar!”. Hoje, quem canta no morro são fuzis e metralhadoras. Chegamos a um ponto em que o país se tornava tão insuportável quanto insanável, pois a hegemonia do pensamento esquerdista preservava o caos em todas as suas vertentes. Por isso, a rejeição à ordem, à segurança pública, às várias formas de autoridade, à instituição familiar; por isso, também, a defesa da liberação das drogas, do aborto, da ideologia de gênero nas escolas, do ativismo pedagógico e da militância política no Poder Judiciário.

Então, neste abençoado ano da graça de 2018, a democratização do direito de opinião emergiu poderosa nas redes sociais. Vieram as eleições e as vitórias de outubro. Interrompeu-se o predomínio da esquerda, que se dizendo “progressista” estava retirando o Brasil do mundo civilizado. Não há bem possível quando o mal é insistentemente buscado, louvado e praticado. Ademais, a Venezuela estava logo ali, suscitando reverências e apontando descaminhos.

Para escândalo dos tradicionais fazedores de cabeça, monitores habituais da opinião pública, após 30 anos de um ruinoso roteiro sinalizado pela Constituição de 1988, a maioria da opinião pública deu um solene “Basta!” aos “progressistas”. Literalmente, a maioria saiu do armário onde, constrangida, remoía as próprias convicções conservadoras, patrulhadas pelo politicamente correto e pela única ideologia que se fazia ouvir no tom alto e glamoroso dos grandes meios de comunicação.

Contudo, é bom que eleitores e eleitos saibamos: não salvaremos o Brasil do caos apenas com os valiosos e imprescindíveis princípios do conservadorismo. Nossos problemas não são apenas de conduta e regras de convivência. Precisaremos das reformas usualmente identificadas com o rótulo de “liberais”, voltadas à redução do tamanho e peso do Estado, ajuste fiscal e reforma tributária, desregulamentação, desburocratização, desaparelhamento da máquina pública, extinção de mordomias e privilégios. Sem a reforma da previdência social, o país afundará em nova recessão. Ela levará à instabilidade política e ao caos – caldo de cultura dos que hoje juntam forças para, na oposição, jogar como sabem: à base de tranco, empurrão, puxão de camiseta, cama-de-gato e carrinho por trás. É sua receita para o ameaçador retorno.

Obtida a vitória nas urnas, o sucesso passa a depender da combinação das duas receitas. De um lado, os princípios e valores que inspiram condutas civilizadas; de outro, as ações de Estado com vistas às liberdades econômicas e ao equilíbrio das contas públicas. Ainda é mais viável do que uma mudança para Portugal.

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...