Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
1)“Aula Magna” do ministro de Estado das Relações Exteriores Ernesto
Araújo, para duas turmas de diplomatas do Instituto Rio Branco, em 11 de março
de 2019. Disponível no canal YouTube do MRE (link: https://www.youtube.com/watch?v=0Qt1kCY7D0M) e no canal pessoal (link: https://youtu.be/qXD0khwGdzc).
8)O legado de Roberto Campos –
Livraria Travessa, RJ (17/04/2017). Entrevista concendida a jornalista do
Instituto Millenium no dia do lançamento do livro “O Homem que Pensou o Brasil:
trajetória intellectual de Roberto Campos” (Curitiba: Appris, 2017), na
Livraria Travessa, na noite do dia 17/04/2017. Link no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=6Qm-HjKSGGo). Link para o Canal pessoal no YouTube:
https://youtu.be/U7zSr2TirC0 .
17)“Política
internacional”, mesa redonda organizada pelo Professor de Relações
Internacionais e Ciência Política da Faculdade América Latina, de Caxias do
Sul, RS, Cezar Roedel, com o sociólogo, doutor pela UnB, Roque Callage Neto,
realizada em 15 de janeiro de 2016; disponível no YouTube, no seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=UwUyGwoI9wI&t=200s).
18)“Nunca
Antes na Diplomacia”, Entrevista concedida em 29 de agosto de 2014, a Bruno
Garschagen, do Podcast Mises, sobre o meu livro homônimo de análise crítica da
diplomacia brasileira no âmbito do lulopetismo diplomático; gravação dosponível
(link: https://www.mises.org.br/FileUp.aspx?id=334).
21)2433.
“Brasil: o futuro do país está no passado (de outros países...): proposta para
uma Fronda Empresarial”, Brasília, 13 outubro 2012, 24 p. Texto-base para palestras no ciclo Liberdade na Estrada:
“Brasil, país do futuro: até quando?” (Porto Alegre, FCE/UFRGS, dia 17/10/2012, 19:00hs), no “Papo Amigo” da
Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (Porto Alegre, 18/10/2012,
12:00hs) e no Instituto de Formação de Líderes de Minas Gerais (Belo Horizonte,
24/10/2012, 19:30hs). Postado no blog Diplomatizzando
em 8/07/2015 (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2015/07/brasil-o-futuro-do-pais-esta-no-passado.html). Links para YouTube (http://www.youtube.com/watch?v=Dd1crO4Fa00 ; e para o Canal Pessoal no YouTube: https://youtu.be/RL6ZcpWyAWY).
Livro de Rubens Ricupero: A Diplomacia na Construção do Brasil; Video, com fundo musical das
Bachianas Brasileiras n. 7, de Heitor Villa Lobos, contendo imagens e frases do
livro de Rubens Ricupero: A Diplomacia na Construção do Brasil, 1750-2016 (Rio
de Janeiro: Versal Editores, 2017), elaborado por Maria Luisa dos Anjos (IPRI),
sob a coordenação de Paulo Roberto de Almeida, Diretor do Instituto de Pesquisa
de Relações Internacionais, IPRI-Funag/MRE.Publicado
em 18 de novembro de 2017 e disponível neste link do canal PRA no YouTube (links:https://youtu.be/R3Ijz2KDkEU; Canal do IPRI: https://youtu.be/y3SsC0v_i5Q).
Um grande amigo de Curitiba me escreve em solidariedade:
Afastado há mais de 15 dias de minhas atividades profissionais, (...) e inclusive... fora de Curitiba, só nesta semana tomei conhecimento de truculenta e lamentável demissão que lhe tirou a presidência do IPRI.
Confesso que atualmente tenho procurado me distanciar das discussões em torno do maniqueísmo que tomou conta da política nacional. Longe de mim pactuar com a esquerda lírica, patológica, ensimesmada, irresponsável e corrupta que manejou a direção do país nos últimos anos. De outra parte, não há como concordar com os rumos da atual política externa brasileira, conduzida por um alienado sabujo de plantão, e comandada à distância por alguém totalmente inexperiente, inconsequente e temerário nas suas orientações e indicações, conquanto erigido à condição de conselheiro-mor do Executivo pátrio.
Dito isto, venho solidarizar-me com o amigo, renomado diplomata e brilhante intelectual brasileiro, louvado dentro e fora do território nacional, em face do subjetivo, indecoroso e imerecido ato que o removeu de posto dos mais importantes aos rumos da diplomacia nacional.
Vivemos, lamentavelmente, tempos da autoafirmação do pensamento único, que se compraz e necessita, para prevalecimento, de impor o “fechamento do universo do discurso”, e por decorrência, retalhando todos os que ousam discordar ou opinar contrariamente às decisões e ideias do novel governo, tanto em público quanto no privado.
Tenha a certeza, caríssimo Paulo Roberto, de que você não está só em suas manifestações, tampouco sua exoneração foi aceita passivamente pela crítica e/ou pela opinião pública. Aqui em Curitiba, mais que um amigo, tenha em mim, em comunhão, a “pièce de résistence” local contra os ortodoxos e levianos rumos conferidos às relações externas brasileiras.
Receba meu fraterno abraço e minhas melhores homenagens.
Como o filósofo Olavo de Carvalho ascendeu no bolsonarismo, a ponto de, em meio a xingamentos nas redes sociais, exercer tamanha influência sobre o governo
TIROS A ESMODa Virgínia (EUA) onde mora, Olavo de Carvalho “atira” em todo mundo, até mesmo nos apadrinhados (Crédito: Vivi Zanatta/Folhapress)
O presidente Jair Bolsonaro e o autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho não são de frequentar a casa um do outro. Nunca sequer almoçaram juntos ou tomaram um cafezinho, prática comum entre os políticos de Brasília. Os dois jamais se viram pessoalmente e nem celebraram o clássico aperto de mãos. Bolsonaro e Olavo só se falam por telefone ou através de mensagens, já que o ideólogo permanece em seu período sabático em Richmond, no estado de Virgínia (EUA). O que uniu esses dois mundos aparentemente tão distintos – já que um tem as raízes no militarismo enquanto o outro é dado a digressões intelectuais – foi a causa em que ambos militam: o combate incessante à esquerda. A relação se intensificou durante as eleições. A aproximação de Olavo fez com que Bolsonaro conquistasse o voto dos milhares de seguidores do filósofo.
Inicialmente, o papel do escritor no governo limitava-se aos bastidores. Sem muito alarde, ele indicou nomes para o primeiro escalão. Nos últimos tempos, passou a dar conselhos ao presidente e a integrantes do governo sobre qual direção levar o País. Embora rejeite a pecha de guru e se autodenomine apenas um mero “observador científico” da realidade, Olavo encarna uma espécie de “feiticeiro” do bolsonarismo, tal qual o Rasputin que pautou o comportamento dos czares russos, tamanha a influência que exerce sobre o governo. Lembra também, guardadas as proporções, a ascensão do general Golbery do Couto e Silva sobre o presidente Ernesto Geisel, mas com uma diferença abissal entre os dois: o lendário chefe de gabinete do presidente militar foi fundamental para que o nome de Geisel entrasse para história, sendo dele o pontapé inicial para a transição à democracia. Olavo, por sua vez, age perigosamente no fio da navalha e parece querer levar o presidente ao isolamento político.
“O Velez se vendeu ou se deu? Não tenho a menor idéia” Olavo de Carvalho, filósofo, sobre o ministro da Educação
“O que acontece, agora, com o ministro da Educação, Ricardo Vélez, está destinado a todos aqueles que ainda pagam pedágio intelectual, moral e ideológico a Olavo de Carvalho: são uns gênios. Depois, se tornam bodes-expiatórios”. A frase é do escritor conservador Martim Vasques, um dos inúmeros alvos, nos últimos dias, do ideólogo da direita bolsonarista, quando ele em desabalada carreira se ocupou de acionar sua metralhadora giratória contra desafetos, inimigos e até mesmo integrantes do governo Bolsonaro os quais ele apadrinhou. Se Olavo não tem método para ensinar, reconhecem até mesmo seus alunos, o mesmo não se pode dizer do procedimento na hora de agir. Contraditório na essência, como quem veio para confundir, mas firme em seus propósitos, Olavo dispara contra quem se opõe a ele e ao governo que ajudou a eleger. Preferencialmente, perpetra ataques diários contra a mídia, o ensino nas universidades e tudo o que deriva do pensamento de esquerda, da política partidária à agenda cultural. Cria inimigos imaginários – em geral “todos comunistas”. As diatribes do astrólogo passariam despercebidas como chuvisco de verão não fosse ele uma pessoa que exercesse tanto fascínio sobre o governo e sobre a figura do próprio presidente da República, que gasta tempo e energia para, em geral, reverberar suas sandices e, não raro, arbitrar em favor do séquito do guru.
Crise no MEC
Além de frequente interlocutor de um dos filhos do presidente, Eduardo Bolsonaro, e alguém que faz igualmente a cabeça do “01” e do “02”, Olavo chancelou a indicação de integrantes no mais alto escalão governamental. Entre eles Filipe G. Martins, assessor do presidente para assuntos internacionais e mais notadamente os ministros Eduardo Araújo, de Relações Exteriores e Ricardo Vélez, contra o qual Olavo lançou petardos nos últimos dias. No início da semana, para surpresa geral, Olavo vociferou contra a presença dos próprios alunos no Ministério da Educação, a quem pediu que entregassem os cargos. Puro teatro. Na realidade, Olavo estava enfurecido por saber que alguns de seus apóstolos haviam perdido posições na escala hierárquica do MEC. “O Velez se vendeu ou se deu? Não tenho a menor ideia”, chegou a escrever. O recado surtiu efeito. Na terça-feira 12, a mando de Bolsonaro, Vélez teve de demitir três militares que se opunham aos olavistas no ministério. Entre eles o coronel da Aeronáutica Ricardo Roquetti, a quem Olavo e cia acusavam de servir de obstáculo ao processo conhecido como “Lava Jato da Educação” – uma auditoria em contratos antigos da pasta anunciada por Vélez. O desfecho do episódio, em que bovinamente o ministro parece ter agido em sintonia com os desígnios do astrólogo, escancara como a gestão de Bolsonaro nutre uma relação de vassalagem com o autoproclamado filósofo da Virgínia. Em meio à crise, o número dois do ministério foi demitido. Já o número dois do País é indemissível. Ainda bem, porque Olavo parece dispor de carta branca para atacar como um pitbull feroz até mesmo o vice-presidente a República. No fim de janeiro, classificou o general de “vergonha para as Forças Armadas”.
“Quanto mais a esquerda mente contra o Bolsonaro e seu governo, mais o Mourão abana o rabinho para ela”, tuitou. “O Mourão é obviamente um inimigo do presidente e de seus eleitores”, acrescentou. “O Olavo de Carvalho agora acha que sou comunista. Paciência…”, reagiu Mourão com bom humor. Na verdade, há tempos o mestre dos magos do bolsonarismo vem direcionando seus rifles lá da Virgínia para a cabeça de Mourão. Mas, como o vice ficará mesmo onde está, o ideólogo assestou suas baterias para outros alvos. Como o embaixador Paulo Roberto de Almeida. O diplomata havia chamado Olavo de “debiloide” e acabou por experimentar o mesmo infortúnio de Roquetti: foi exonerado do Itamaraty.
Palavrões
Olavo tempera os argumentos com palavrões dos mais diversos. Mas demonstra proverbial predileção pela palavra que descreve a extremidade do aparelho excretor. “Atenção, ô chefe da fôia: Ideólogo é o cu da sua mãe”, reagiu ele a uma reportagem da Folha de S.Paulo. Recentemente, no Facebook, ao lado de uma imagem de um animal abatido, Olavo sapecou: “Fui buscar hoje a minha Henry Big Boy (rifle) cal. 45-70. Pau no cu dos ursos”. A maneira repetitiva com que ele pronuncia incessantemente o substantivo parece mesmo uma obsessão. “Em breve só restarão duas religiões no mundo: maconha e cu”.
Na semana passada, em meio ao surto da contenda no MEC, não poderia faltar a palavra mágica. “Não quero derrubar ministro nenhum. Apenas apresentei pessoas, sem a menor pretensão de influenciá-las. O ministério é do Vélez. Que o enfie no cu”.
Mas de onde emana esse magnetismo que o filósofo usa para inebriar o clã Bolsonaro? Olavo é basicamente catalisador de críticas à esquerda. O astrólogo perambulava entre um ou outro artigo na imprensa até seu nome ganhar força em 2009, com a criação do COF – Curso Online de Filosofia, classificado pelo escritor Martim Vasques de “teia hierárquica”, cuja meta seria influenciar espiritualmente os eventos políticos de uma nação, igual a uma casta. “E agora passa a ter o senso de missão de que é uma espécie de corpus mysticum, no qual cada participante será análogo a um fiel que pode finalmente perceber a realidade em toda a sua nudez”. E quem seria o intermediário de tudo isso? Olavo de Carvalho. Inspirado em Sócrates, ele afirma logo no início do curso que, “mesmo quando o aluno supera o mestre, ele sabe de onde veio e a quem tudo deve”, e, ao tentar “cortar o cordão umbilical”, na hora de “confrontá-lo”, é igual ao “adolescente” que não superou os desafios desta idade e “depois tenta lançá-los no lugar errado”, escreveu Vasques em alentado ensaio.
Aclamado por personalidades da TV, como o apresentador Danilo Gentili, o filósofo atraiu a atenção e admiração de políticos ligados a Bolsonaro. Quem apresentou as ideias de Olavo para o então pré-candidato à Presidência da República foi a deputada Bia Kicis (PSL-DF). A deputada é hoje a principal interlocutora de Olavo com o presidente. A parlamentar é oriunda do Ministério Público do Distrito Federal e leitora assídua dos livros do guru. “Antigamente, as pessoas tinham vergonha de dizerem que eram de direita. Ele despertou gerações”, ressalta ela com brilho nos olhos.
Em 2017, Olavo declarou que votaria em Bolsonaro por ser o único candidato “desvinculado do capital internacional”. Decidiu, então, moldar sua linguagem para um tom mais popular e ampliar o espectro do bolsonarismo. Uma vez tendo ajudado a eleger Bolsonaro presidente, o filósofo, pelo visto, abriu mão do papel de um simples “observador científico” e passou a “agente político”. Olavo sabe do poder de influência que possui sobre seus seguidores e do uso dela para desconstruir a imagem de eventuais desafetos. Num post no Twitter de 20 de fevereiro, ele fez uma ameaça clara às possíveis dissidências: “Todos que subiram ao poder na esteira do Bolsonaro aprendam enquanto é tempo: fiquem do lado dele ou serão odiados pelo povo tanto quanto o são os comunopetistas”. Hoje, o tom é favorável a Bolsonaro. Permanecerá até o fim do mandato? Por mais que ideais em comum os unam, há uma diferença óbvia: Bolsonaro tem a responsabilidade moral e política de governar um País. Olavo de Carvalho nem parece saber o que é responsabilidade.
Se persistir a política anti-China do chanceler, ou mesmo se, por milagre, nossa política externa for totalmente pró-China, ainda assim poderemos ter consequências nefastas de um acordo de conveniência entre a China e o governo Trump. Nós sofreremos as consequências, como alerta Marcos Jank... Transcrevo o trecho final: "Enfim, se esse acordo se concretizar, poderemos estar entrando numa era de “comércio administrado” caso a caso, sob a égide de interesses geopolíticos, que pode reduzir o nosso acesso à China, ao Brics e a outros mercados emergentes. Aí sim,estaríamos entregando a nossa alma." Paulo Roberto de Almeida
Impacto do Acordo EUA-China no agro brasileiro
Jornal “Folha de São Paulo”, Caderno Mercado, 16/03/2019
O encontro entre Jair Bolsonaro e Donald Trump no dia 19 se dará às vésperas da conclusão de um acordo histórico entre EUA e China que pode ser altamente disruptivo para o agronegócio mundial, afetando principalmente o Brasil.
O acordo pode representar o fim de uma era em que o comércio se expandia baseado essencialmente na competitividade dos países, sem grande esforço.
Ele traz novos elementos para a equação: pressionados por imenso déficit comercial de US$ 420 bilhões, os EUA deram início a uma guerra mercantilista com a China impondo elevadas tarifas sobre US$ 250 bilhões em importações. O gigante asiático retrucou impondo tarifas sobre US$ 110 bilhões dos EUA, o que atingiu em cheio a soja americana. A disputa trouxe US$ 8 bilhões adicionais às nossas exportações de soja para a China, levando os incautos a inclusive “comemorar” a guerra comercial.
Tudo indica que os EUA vão forçar a China a ampliar as suas compras de produtos agropecuários americanos em absurdos US$ 30 bilhões anuais, que, na melhor das hipóteses, se somariam aos US$ 14 bilhões que foram adquiridos em 2018. Previsões mais sombrias dizem que as importações chinesas vindas dos EUA poderiam ultrapassar US$ 50 bilhões anuais, se somadas ao valor de 2017, que foi de US$ 22 bilhões.
Acreditamos que as exportações mundiais de soja voltarão ao seu curso normal pré-2017, com os chineses se beneficiando plenamente da alternância das safras americana (EUA) e sul-americana (Brasil e Argentina), que ocorrem em diferentes momentos do ano. Essa complementariedade garante estabilidade de oferta e menor risco para a China.
Ocorre, porém, que, para chegar aos US$ 30 bilhões adicionais, a China teria de oferecer acesso privilegiado aos EUA em outros produtos.
Dois casos com forte impacto sobre o Brasil são o milho e o algodão. O consumo de milho da China é gigante (280 milhões de toneladas), porém as suas importações têm sido muito reduzidas —apenas 3,5 milhões de toneladas em 2018. Os EUA pressionarão a China a importar muito mais milho, flexibilizando o seu regime restritivo de cotas de importação e facilitando o ingresso de milho transgênico.
Outros produtos americanos que seriam beneficiados pelo acordo são o etanol de milho, o DDG (subproduto da produção de etanol usado em alimentação animal) e as carnes. No caso do etanol, a importação viria da obrigatoriedade de mistura de 10% de etanol na gasolina da China (E10), que foi mandatada no passado, mas jamais cumprida.
Estimamos que, entre produtos e subprodutos de milho, etanol e algodão, a China poderia ampliar suas importações dos EUA em mais de US$ 10 bilhões adicionais por ano.
Nas carnes, se a China retirar as restrições técnicas e sanitárias que foram impostas aos americanos nos últimos anos, certamente seremos prejudicados em todas as proteínas animais —aves, suínos e bovinos—, com destaque para as perdas de mercado em pés e coxas de frango.
A China certamente tem meios para atender à forte pressão dos EUA, ampliando o acesso de soja e de outros produtos agropecuários. Resta saber se isso será feito à luz das regras da OMC, se ela vai “forçar a barra” na flexibilização das barreiras técnicas e sanitárias e se usará a sua estrutura estatal (estoques estratégicos e empresas públicas) para operacionalizar o acordo.
Enfim, se esse acordo se concretizar, poderemos estar entrando numa era de “comércio administrado” caso a caso, sob a égide de interesses geopolíticos, que pode reduzir o nosso acesso à China, ao Brics e a outros mercados emergentes. Aí sim,estaríamos entregando a nossa alma.
(*) Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio. Escreve aos sábados, a cada duas semanas.
(**) André Soares é Senior Fellow do CEBRI (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
Os riscos que a política externa corre neste momento são concretos. A bancada do agronegócio teme perder mercado na China, nosso maior parceiro. A ida do presidente Bolsonaro a Washington será boa por um lado, mas o perigo é o país tomar partido na guerra comercial e tecnológica com a China. O deputado Eduardo Bolsonaro representa no Brasil um movimento que se propõe a lutar contra a União Europeia, outro grande mercado brasileiro. A política externa está virando uma coleção de fios desencapados.
O embaixador Roberto Abdenur disse que a decisão de Bolsonaro de demitir 15 embaixadores para melhorar a imagem dele no exterior é uma intervenção sem precedentes:
— O presidente tem o direito de nomear ou demitir funcionários, mas, de uma vez só, decapitar 15 chefes de embaixada é um gesto muito radical. E o presidente se equivoca, porque a imagem dele não é feita no exterior, é feita no Brasil.
O embaixador Paulo Roberto de Almeida, que acaba de ser demitido do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais por ter postado em seu blog pessoal artigos dos quais o chanceler Ernesto Araújo não gostou, lembra outro problema:
— No caso da Venezuela, desde o começo, o chanceler demonstrou uma adesão ao aventureirismo trumpista. O chanceler foi contido e diretamente tutelado pelos militares, que fizeram um cordão sanitário, uma contenção de políticas indevidas. O general Mourão assumiu a chefia da delegação e disse claramente que não haveria intervenção. Os militares estão assumindo uma posição diplomática de respeito à Constituição e ao direito internacional.
Entrevistei os dois diplomatas na Globonews. Abdenur, enquanto esteve na ativa, assumiu postos importantes como as embaixadas da China, Alemanha, Áustria e dos Estados Unidos. Tanto ele quanto o embaixador Paulo Roberto de Almeida foram críticos de posições tomadas na política externa dos governos do PT. Divergem agora dos caminhos adotados no governo Bolsonaro. A crítica é a mesma: a interferência da ideologia — antes de esquerda e agora de extrema-direita — nas relações externas.
O ministro Ernesto Araújo, em aula aos alunos do Instituto Rio Branco, fez uma relação entre os problemas que o Brasil enfrenta em várias áreas com o aumento do comércio com a China.
— A China se tornou o maior parceiro porque é o maior demandante de produtos brasileiros e a maior consumidora desses produtos. O estranho é o chanceler correlacionar o aumento do comércio com a China a uma suposta decadência social, política e cultural. Não faz sentido nenhum — disse Paulo Roberto.
Abdenur faz um alerta sobre a visita que Bolsonaro fará aos EUA no próximo domingo:
— Me preocupa muito o que vai acontecer na semana que vem na visita do presidente a Washington, porque os Estados Unidos estão levando adiante uma confrontação estratégica dura com a China, pela supremacia tecnológica na introdução de 5G na internet — disse Abdenur, lembrando que o Brasil nada tem a ganhar ao tomar posição nessa briga.
Abdenur prevê que a visita terá resultados positivos com progressos na área de comércio, investimentos, de cooperação militar. O Brasil deve ser proclamado aliado estratégico extraOtan e os Estados Unidos podem suspender o veto à entrada do Brasil na OCDE. O temor é que o país assuma uma posição de alinhamento automático aos Estados Unidos.
Há outros riscos. Na reforma imposta ao Itamaraty, a Europa deixou de ter um departamento exclusivo, para ser misturada à África e ao Oriente Médio. O ministro Araújo, em seus discursos, chama a Europa de “vazio cultural”.
O filho do presidente Eduardo Bolsonaro tem agido como um chanceler paralelo. Ele foi nomeado pelo ex-estrategista de Trump Steve Bannon como representante na América Latina do The movement, que, instalado em Bruxelas, se propõe a lutar contra a União Europeia. Ao assumir a Comissão de Relações Exteriores, o deputado disse que Venezuela e Cuba são a escória da humanidade, ou seja, ele confunde países com governos. Pensa estar criticando o chavismo e está ofendendo o país, nosso vizinho de fronteira.
Este governo, através de atos e palavras do presidente e do chanceler, da atuação do filho do presidente, e de um assessor internacional na Presidência sem qualificação para o cargo, tem espalhado ofensas contra diversos países. Isso em diplomacia tem consequência. A de encolher o Brasil.