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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 7 de janeiro de 2024

Roberto Campos, em 1981, sobre o alegado fim do capitalismo, quando o socialismo já claudicava - Ricardo Bergamini

 Ricardo Bergamini transcreve mais um artigo de Roberto Campos, do início dos anos 1980, quando os profetas da transição para o socialismo tronitoavam sobre as crises do capitalismo, demonstrando mais uma vez que a cegueira trazida pelos escritos de Marx e Lênin eram neles permanente. Cabe ler...

Ricardo Bergamini:

A promessa eterna do fim do capitalismo que nunca chega, ocorre porque o capitalismo é um sistema gerador constante de aparente desordem, procurando sempre o seu ponto de equilíbrio, gerando essa sensação constante do inicio do seu fim, mas após encontrar o equilíbrio, com novas tecnologias, decola para um novo salto para o futuro, e assim sucessivamente, até os dias atuais.

 

O Brasil não serve de referência para as comparações mundiais sobre capitalismo, tendo em vista a afirmação do mestre Roberto Campos abaixo:

 

O capitalismo não fracassou na América Latina. Apenas não deu o ar de sua graça (Roberto Campos).

 

 

O fim sem fim do Capitalismo 

Roberto Campos * 

(Londres 08/12/81)



Poucas coisas têm sido mais profetizadas que o fim do capitalismo. Parafraseando Mark Twain, pode-se dizer que as notícias de sua morte são algo exageradas. Se duas lições a história nos ensina é, primeiro, que a história não é dialética: “o socialismo não sucedeu ao capitalismo”, para usar a expressão de Daniel Bell. E, segundo, que a crise do socialismo parece hoje mais séria que a do capitalismo. As coisas não se passaram exatamente como previa Marx. Não houve a “pauperização” do proletariado. O capitalismo monopolista sobreviveu à perda dos impérios. O socialismo não surgiu do proletariado industrial amadurecido, senão que resultou do comando de intelectuais revolucionários sobre massas primitivas. O Estado não feneceu nos países que supostamente eliminaram o conflito de classes.

 

De um simples dispositivo de espoliação econômico-feudal, burguesa ou industrial, o capitalismo evoluiu para se transformar num sistema trinitário, com três vetores distintos em tensão criadora pontilhada de avanços e retrocessos: o aspecto econômico, o político e o cultural. O socialismo marxista ao invés, partindo de uma ampla análise social, tornou-se um sistema monístico, em que esses diferentes valores se unificam e confundem, em rigidez pragmática. O socialismo, que nascera como ciência, virou religião. O capitalismo, que parecia, simples obsessão econômica, absorveu valores de credo liberal, e se revelou politicamente mais flexível e culturalmente mais diversificado.

 

Nenhum dos dois sistemas hoje existe, obviamente, em sua forma pura, o que torna os termos “capitalismo” e “socialismo” simplificações duvidosas. Mas não se deve exagerar a convergência dos dois sistemas. As “economias de mercado” são perfeitamente diferenciáveis das “economias de comando”, ainda que as primeiras tenham absorvido graus intensos de intervenção governamentais e as segundas comecem a admitir os sinais do mercado no tocante a preços incentivos. Isso é dramaticamente perceptível nas zonas de confrontação: Alemanha Ocidental versus Alemanha Oriental, Coréia do Norte versus Coréia do Sul, China Continental versus Taiwan, e assim por diante.

 

Se quisermos, para simplificar as coisas, especificar as diferenças que permanecem fundamentais, citemos duas. A primeira é que as “Economias de mercado” tendem a ser politicamente pluralistas, enquanto as “economias de comando” são basicamente monistas, isto é, o Partido define os valores econômicos, políticos e sociais. Uma segunda espécie de “marca de berços” é, como disse Irving Kristol, que na postulação socialista, o importante é a distribuição, antes que a produção. Com isso elide, ou pensa elidir, o problema vital dos “incentivos” materiais. Pequenas sociedades, como os kibbutzin de Israel e os mosteiros medievais, podem assim funcionar. As grandes sociedades perdem eficiência sem incentivos materiais e individuais. A preocupação distributiva explica em parte o secreto fascínio que o socialismo exerce sobre muitos cristãos, que assimilam distribuição à caridade. A tal ponto que se esquecem da face inaceitável do socialismo, isto é, seu antiespiritualismo de origem, implícito no materialismo dialético.

 

À busca de raízes éticas

 

Se o capitalismo, ou melhor, as “economias de mercado”, têm sobrevivido às “crises” profetizadas por Marx, assim como às “contradições culturais” denunciadas por Daniel Bell, resta saber a que necessidade básica correspondem. Para Hayek, a explicação é simples. Reside em ser o único sistema compatível com a liberdade do indivíduo. E a liberdade, definível como a “ausência de constrangimento”, é mais fundamental que a justiça, pois que esta depende de uma impraticável avaliação de mérito. Uma sociedade livre pode ser justa, enquanto uma sociedade não-livre nunca é justa, pois nega ao individuo oportunidade de auto-realização.

 

Poucos têm hoje a coragem libertária de Hayek e preferem assim outras justificativas para o “ethos capitalista”, em face da crueldade do mercado. Irving Kristol, por exemplo, lembra, sem endossá-las, três explicações tradicionais:

 

- A ética protestante, ou seja, o conceito weberiano de que o sucesso econômico se justifica em função do exercício de virtudes pessoais, como a inteligência, a sobriedade, a ambição honesta. (Esqueçamos, por inoportuno discuti-las, as teorias antiweberianas de que o capitalismo comercial nasceu nas cidades italianas, e a organização do trabalho horário nos mosteiros medievais, antecedendo assim a ética calvinista).

 

- A ética darwiniana, segundo a qual o sucesso representa uma solução natural, pela sobrevivência dos mais capazes.

 

- A ética tecnocrática, segundo a qual o mercado organiza sua própria meritocracia e premia a liderança em função da performance.

 

Nenhuma dessas explicações chega a constituir uma teologia moralmente tranqüilizadora, comprável ao fervor dogmático do socialismo.

 

O fato é que, seja pelas crueldades do mercado – onde fatores acidentais, como a herança, ou imperfeições políticas, como a discriminação racial, criam desigualdades chocantes – seja pelo contágio de pregação socialista (que melhora a igualdade mas retarda a eliminação da pobreza), o capitalismo moderno desenvolveu sua própria Angst, uma espécie de complexo de culpa. Exemplos desse complexo de culpa são a reação contra o “comunismo” e a “depredação ecológica“.

 

Isso revela no sistema capitalista ao mesmo tempo debilidade ideológica (que o torna menos exportável), e a flexibilidade pragmática (que o torna mais durável). Donde poder-se falar hoje nas “economias de mercado corrigido”, nas quais o mercado sofre intervenções que refletem as contínuas tensões resultantes que se poderia chamar o “triplica compromisso” entre riqueza individual, equidade social e liberdade política. O mercado privado seria o criador de riqueza, o governo, o promotor de equidade, e o sistema democrático, o preservador da liberdade. A sucessão de fases intervencionistas e libertárias na Europa Ocidental, assim como nos Estados Unidos, caracterizadas pela alternância de partidos sociais-democráticos ou conservadores, conforme predominam preocupações produtivistas ou distributivistas, denotam as cambiantes predominâncias dos elementos constitutivos do tríplice compromisso.

 

A superposição de crises

 

Tendo sobrevivido a inúmeras crises no passado, inclusive o vendaval da Grande Depressão dos anos trinta, há poucas dívidas de que as economias de mercado sobrevivam à presente crise de estagflação. Registrem-se entretanto três complicadores. Primeiro, a adaptação ao choque do petróleo requer ajustamentos de estrutura, e não apenas remédios de conjuntura. Segundo, há uma grande perplexidade doutrinária, pelo desaparecimento de antigas certezas sobre métodos de gerenciamento global da economia. Terceiro, as sociedades ocidentais, habituadas a um quarto de século de avanço continuo na renda real, tem percepção mais aguda daquilo que se chama o “índice de desconforto”, medida compósita do grau de inflação e do índice de desemprego, aos quais se agrega o novo conceito de deterioração ambiental. Da mesma maneira que os países em desenvolvimento foram sacudidos pela “revolução das expectativas crescentes”, os países industrializados foram atacados pela presunção de “direitos crescentes” (the “Revolution of rising entitlements”).

 

Limitaremos nossa análise à desordem conceitual que se instalou nas teorias econômicas, onde se podem citar quatro controvérsias intensificadas pela teimosa persistência da estagflação:

 

- a controvérsia entre gradualismo e tratamento de choque;  

                                                                                                          

- o debate entre monetarismo e keynesianismo;

 

- as novas teorias de “administração da oferta” (supply side economics); e

 

- a ressurreição dos ciclos de longo prazo (a teoria da “onda larga” de Kondratieff, economista russo da década dos vinte).

 

A controvérsia do gradualismo versus tratamento de choque tornou-se cada vez menos interessante. O bom senso indica que o tratamento de choque só não transpõe o limite de tolerância política se a inflação é moderada, e se as expectativas não se tornaram cronicamente viciadas, de modo a permitir que o trauma recessivo seja curto. Caso contrário, as sociedades estão condenadas ao gradualismo. O que é importante, como nota o Professor William Fellner, é que seja um “gradualismo a velocidade perceptível”, isto é, suficiente para modificar as expectativas.  

 

A reativação da controvérsia entre monetarismo e keynesianismo foi conseqüência direta da estagflação. Por longo tempo no pós-guerra o Keynesianismo ganhou foros de ortodoxia, principalmente no mundo anglo-saxão (no continente europeu a escola austríaca manteve a tradição monetarista). A renitência da inflação e a incapacidade do keynesianismo de debelá-la provocaram uma ressurreição neomonetarista, com experimentos monetaristas ensaiados na Inglaterra e Estados Unidos, encorajados pela evidência de que os países mais bem-sucedidos na luta contra a inflação – Suíça, Alemanha e Japão - foram os que menos se haviam exposto à contaminação keynesiana.

 

A nouvelle vague nos Estados Unidos é a administração da oferta – “supply side economics”. A ênfase sobre a oferta é válida se interpretada como complemento e não como substitutivo da “administração da procura”. A “supply side economics” é, entretanto mais que simples metodologia. Aspira a ser uma filosofia de reabilitação do ethos capitalista, pela liberação das energias do produtor, restauração de incentivos à poupança e produtividade, estímulo à concorrência, redução de interferência governamental, seja assistencial, seja regulatória. (Os exageros da mania ecológica – a “economia” – nos Estados Unidos encareceram e retardaram investimentos).

 

A intratabilidade da atual fase de estagflação ressuscitou velhas teorias sobre ciclos econômicos, que a contínua prosperidade do pós-guerra parecia haver arquivado. Segundo o Professor Walter Rostow, a explosão dos preços de trigo, petróleo e outras matérias-primas em 1972/1973 prenuncia o advento de uma nova onda larga da conjuntura, o quinto ciclo Kondratieff, marcado pela relativa escassez de matérias-primas, especialmente energia. Como é sabido, o economista russo Kondratieff (que segundo Soljenitzn teria morrido num gulag) escrevendo na década de 20, identificara no exame de sérias estatísticas, relativas à Grão-Bretanha, França e Estados Unidos, a existência de ciclos ascendentes e descendentes de produção e preços num espaço de 40 e 50 anos entre 1790 e 1920.

 

Na extrapolação de Rostow, a Grande Depressão dos anos trinta marcaria a fase descendente do terceiro Kondratieff, enquanto o período recente (1972/79) marcaria o começo do ramo ascendente do quinto Kondrafieff. Nessa visão, as crises não seriam o canto de cisne do capitalismo e sim episódios de uma evidência evolutiva. É interessante anotar os pontos de convergência entre uma interpretação à la Kondratieff e a presente busca de uma teoria de “administração de oferta”. Pois se estamos no limiar de um novo Ciclo Kondratieff, caracterizado pela relativa escassez de produção primária e energia, a política adequada não deveria ser macroeconômica, nem no sentido monetarista de simples administração de procura nem no sentido keynesiano de estímulo global a investimentos, senão que direcionada seletivamente para o aumento da oferta setorial de matérias-primas e energias alternativas. A reorientação seletiva de investimentos, no sentido do rompimento de gargalos, representaria uma conciliação entre a necessidade antiinflacionária de conter a demanda global e a necessidade anti-recessiva de estimular a oferta.

 

Mas se o capitalismo hodierno superpõe às perplexidades da estagflação uma desorientação conceitual, o panorama não é nada melhor no campo socialista. O marxismo deixou de ser ciência para transformar-se em dogma. Sua eficiência ficou limitada à quebra de moldes feudais em sociedades primitivas. É uma técnica de conquista do poder mas não de organização do desenvolvimento. O planejamento centralista infirmou a criatividade tecnológica (exceto, no caso soviético, no tocante à tecnologia militar espacial), enquanto que o emudecimento dos sinais do mercado entorpece a agricultura, os serviços e as indústrias de bens de consumo. A falta do elo dos incentivos na corrente produtiva acabou prejudicando a distribuição e tornando as economias socialistas menos desiguais, porém globalmente mais pobres que as economias de mercado. O êxito do desempenho econômico tem estado na razão inversa e não na razão direta da ortodoxia socialista. Uma visão retrospectiva justifica a dúvida se a Revolução Socialista de 1917, pago o pesado preço de sua brutalidade política, conseguiu no fundo acelerar o desenvolvimento russo, comparativamente ao processo evolutivo das democracias ocidentais. Talvez Houphouet-Boigny, o astuto Presidente da Cota do Marfim, tenha feito mais que uma piada ao dizer que há um “r” sobrando na palavra “revolução”.

 

Defensor apaixonado do liberalismo. Economista, diplomata e político também se revelou um intelectual brilhante. De sua intensa produção, resultaram inúmeros artigos e obras como o livro A Lanterna na Popa, uma autobiografia que logo se transformou em best-seller. Foi ministro do Planejamento, senador por Mato Grosso, deputado federal e embaixador em Washington e Londres. Sua carreira começou em 1939, quando prestou concurso para o Itamaraty. Logo foi servir na embaixada brasileira em Washington, e, cinco anos depois, participou da Conferência de Bretton Woods, responsável por desenhar o sistema monetário internacional do pós-guerra.

 


Presidencialismo vs. parlamentarismo: notas impressionistas - Paulo Roberto de Almeida

Presidencialismo vs. parlamentarismo: notas impressionistas 

 

Paulo Roberto de Almeida

 [Considerações contextuais e históricas sobre regimes e sistemas de governo; esclarecimento pessoal em caráter preliminar, sem qualquer base empírica]

 

Introdução

Qualquer debate sobre sistemas de governo necessita começar por uma definição dos termos, tendo em vista a complexidade do debate. Normalmente se considera haver uma oposição entre os sistemas de governo e seus respectivos regimes políticos, embora na realidade diversas combinações sejam possíveis. O presidencialismo, em sua forma moderna, é relativamente recente na história da humanidade, datando, para observar uma regra de quase consenso entre os historiadores políticos, da fundação do regime republicano dos Estados Unidos da América, tendo sido adotado quase unanimemente no resto do hemisfério (com a notável exceção do Brasil, por razões dinásticas). Mas o parlamentarismo tampouco é muito mais antigo, embora o princípio da representação seja mais velho que os regimes parlamentaristas modernos, contemporâneos, grosso modo, dos regimes monárquicos constitucionais. Uma regra simples de definição do presidencialismo é o de colocar a chefia do executivo sob o comando de um político eleito diretamente pelo povo, por regras distintas daquelas sob as quais se elege o parlamento, ao passo que este último detém praticamente o comando dos dois poderes no regime de gabinete parlamentarista, ou seja, de governo congressual. Adotaremos essa distinção básica, sabendo embora que regras eleitorais e modos de escrutínio também desempenham papeis relativamente importantes no que toca a forma de funcionamento de um ou outro regime e sistema de governo.

 

A questão histórica

Regimes de representação sempre existiram no caso de sociedades abertas, ou seja, não despóticas. Regimes com mandatos executivos também, inclusive no caso de formações despóticas, que podem ser equivalentes a monarquias absolutistas, ou ditaduras carismáticas. Ou seja, o presidencialismo não é necessariamente republicano, nem as repúblicas precisam ser todas presidencialistas, bem ao contrário. A democracia ateniense combinava um pouco dos dois regimes e o próprio Aristóteles refletia sobre as diferentes combinações de regimes, tomando inclusive o cuidado de não considerar a democracia de massa, ou seja, aquela derivada exclusivamente da vontade da maioria, como o regime mais adequado. Democracia de massa é uma realidade moderna.

No caso do Brasil, por exemplo, passamos por praticamente todos os regimes políticos e sistemas de governo, a saber: monarquia absoluta, monarquia constitucional com poder moderador (invenção de Benjamin Constant), monarquia parlamentarista com chefe de gabinete, governo republicano provisório de corte jacobino, governo presidencialista oligárquico, presidencialismo provisório seguido de presidencialismo com eleições indiretas e representação classista, ditadura republicana centralizadora, republicanismo federalista com eleições diretas para os executivos e representação proporcional nas assembleias, parlamentarismo improvisado para superar crise política, ditadura republicana com limitações de voto e de representação, retorno a um sistema republicano descentralizado, mas preservando deformações na proporcionalidade da representação e espírito parlamentar das atribuições legislativas, tentação parlamentar a cada crise política ou desarmonia entre os poderes; poder moderador informal exercido pelas forças armadas durante boa parte do regime republicano, substituído por forte preeminência do Judiciário e do Ministério Público na fase contemporânea. Ou seja, o Brasil sempre foi uma espécie de laboratório de arranjos político-eleitorais-partidários os mais diversos, sem que necessariamente eles observem coerência entre si, ou que esta exista entre os regimes políticos e os sistemas de governo sucessivos.

No caso dos Estados Unidos, o primeiro e mais estável sistema presidencialista da história, cabe registrar que a separação e o equilíbrio de poderes é relativamente consolidado, mas com gradações diferentes segundo as épocas. O regime sempre foi bastante descentralizado, com base em poderes locais e um sistema de democracia de base, o chamado grass-roots, mas o governo era basicamente congressual, ou seja, a maioria das atribuições de formulação de políticas tinham de passar pelo Congresso, embora o chefe do executivo as aplicasse depois. Depois da guerra civil, e dos dois grandes engajamentos bélicos externos, e também durante os embates da Guerra Fria, o presidente foi adquirindo (ou usurpando) mais poderes, o que também não deixa de gerar mini-crises entre os poderes (eventualmente resolvidas pelo recurso à punição do impeachment). O respeito ao Estado de direito, à Constituição, é um valor em si.

Na experiência europeia, depois da dissolução do império romano do Ocidente, o caos mais absoluto reinou, com regimes os mais diversos em pequenos e grandes Estados, de caráter republicano oligárquico, de absolutismo monárquico fragmentado, de monarquia absoluta centralizadora, de ampliação das franquias eleitorais no quadro de um parlamentarismo evolutivo, com diferentes sistemas eleitorais, chegando a sistemas parlamentares consolidados no quadro de repúblicas “presidencialistas”, de monarquias constitucionais (inclusive não unitárias, ou seja federalistas) com parlamentarismo estabilizado, o que tampouco impediu a tentação bonapartista ou cesarista, quando não ditaduras despóticas. 

Em resumo, as combinações as mais diversas são encontradas nos regimes presidencialistas ou parlamentaristas oficiais, com sistemas eleitorais e partidários que respondem pela maior ou menor estabilidade desses regimes, o que tampouco impede tentações populistas ocasionais, o que pode representar a preeminência do executivo em determinadas circunstâncias. O que é o Brasil, também em resumo? Um sistema dito presidencialista, por vezes temperado por um parlamento atuante, mas na maior parte do tempo um regime quase imperial na preeminência que o executivo exerce sobre o poder legislativo, este fragmentado por um sistema partidário permissivo e uma legislação eleitoral que redundou num desequilíbrio profundo da proporcionalidade. 

 

Parlamentarismo vs. presidencialismo: o que seria melhor para o Brasil?

Não existe uma resposta simples a esta questão, pois regimes políticos e sistemas de governo não existem no vácuo e não são determinados idealmente, e sim são o resultado de forças sociais e movimentos políticos que evoluem historicamente e podem inclusive acabar sendo estáveis na sua disfuncionalidade. O Brasil, por exemplo, convive com uma tensão constante e com conflitos potenciais entre o poder do chefe de Estado (e de governo), que resulta de uma maioria presidencial eleita diretamente, e o poder do parlamento, que padece de sério desequilíbrio de proporcionalidade, mas cuja fragmentação dificulta a formação de uma maioria legislativa estável. Essas diferenças de maiorias – direta ou representativa – constituem a fonte de tensões políticas e de crises de estabilidade (ou de instabilidade) que são recorrentes em nossa história. 

A trajetória do nosso presidencialismo, relativamente errática, também depende da personalidade do chefe de governo e de Estado eleito diretamente pelo povo. Não surpreende, assim, que depois de uma relativa estabilidade sob o regime parlamentar monárquico (mas com frequentes intervenções do poder moderador para mudar as chefias de gabinete), passamos por não menos de sete constituições republicanas, com intervenções militares no quadro de crises políticas graves a cada vez, e com uma crise política atual na qual avulta um papel “moderador” do judiciário, mas também com um inédito ativismo de um “quarto poder”, o ministério público, um novo ator político. 

Como o presidencialismo é fonte de tensões constantes entre os atores políticos e de conflitos com o poder legislativo, um critério de racionalidade recomendaria a adoção de um regime de tipo parlamentar, com pequena fragmentação partidária e um sistema eleitoral que reduzisse ao mínimo as assimetrias de proporcionalidade entre eleitorado e representação parlamentar. Esse tipo de regime permite acomodar pequenas ou grandes mudanças nos humores do eleitorado – e na eficácia maior ou menor das políticas públicas colocadas em vigor pelo executivo – com um mínimo de desgaste sistêmico, pois que contornadas crises e tensões com um simples voto de desconfiança ou a dissolução do parlamento pelo “poder moderador” de um presidente dotado de poucos poderes executivos, simplesmente pela mudança da chefia (e da maioria) do gabinete de base parlamentar. 

É factível a adoção desse “tipo ideal” de governo no caso do Brasil? Estimo ser muito difícil a passagem a um regime desse tipo, pois teriam de ocorrer mudanças simultâneas nas legislações eleitoral e partidária sem que se constate a existência de qualquer tipo de consenso entre forças políticas dispersas num grande território e numa população também considerável caracterizados por grandes diferenças regionais e muitas desigualdades sociais (ou seja, assimetrias de situação econômica e de renda). Vícios herdados de velhas tradições históricas (o patrimonialismo, por exemplo) e de deformações políticas mais recentes (a hipertrofia do estatismo, o distanciamento do corpo político da base do eleitorado, a extensão e a profundidade do corporatismo, etc.), ademais da promiscuidade quase genética entre poder econômico e poder político tornam muito difícil o estabelecimento de um sistema político representativo mais racional, sujeito a regras de responsabilização (accountability), ou mais simplesmente a observância de regras impessoais, o que é vulgarmente conhecido como rule of Law.

O presidente tomou o lugar do antigo imperador, e reina quase absoluto ao dispor, na verdade, de mais poder do que o velho sistema oligárquico-monárquico, este temperado justamente pelo funcionamento do regime de gabinetes parlamentares que seriam, teoricamente, formado a partir de maiorias eleitorais (mas com escrutínios que podiam ser perfeitamente fraudados pelo velho sistema do coronelismo). Atualmente, o coronelismo tornou-se eletrônico, e pode ser manipulado diretamente a partir do poder executivo, que dispõe de responsabilidade e de recursos de tal monta que lhe permite submeter (ou comprar, literalmente) o parlamento. Este também exerce certo poder de chantagem sobre o executivo, o que se agrega à tensão natural entre as fontes diferenciadas de maioria política dos dois poderes. 

A adoção de um regime parlamentarista mais ou menos funcional passaria pela adoção de um sistema eleitoral distrital, a diminuição da fragmentação partidária – que não precisa necessariamente passar pela adoção de cláusulas de barreira, podendo ser mais rapidamente obtido pela extinção completa de qualquer recurso coletivo para o funcionamento dos partidos e para a realização de campanhas eleitorais – e a contenção do patrimonialismo, que tampouco precisaria passar por maiores poderes de fiscalização ao Estado, podendo ser obtido pela diminuição drástica de responsabilidade por serviços coletivos atribuídos ao Estado, ou seja, diminuindo drasticamente a intermediação estatal no provimento da maior parte de serviços ditos coletivos (que podem ser obtidos vias diferentes esquemas de mercado). 

Esta mudança significativa do regime de governo e do sistema político no Brasil depende, é claro, da pressão da sociedade sobre o corpo legislativo, desde que exista certo consenso na sociedade em favor dessas medidas saneadoras de nosso sistema político. Dadas a atomização congressual atualmente existente – em função justamente do acúmulo de distorções ao longo do tempo – e as desigualdades regionais persistentes é difícil que tal consenso possa emergir rapidamente, pois mudanças de mentalidades são lentas e graduais. O corpo político – que se tornou relativamente independente da sociedade, vivendo em si e para si, numa redoma autista que controla a maior parte das instituições – não parece propenso a adotar mecanismos menos patrimonialistas, menos prebendalistas, nepotistas e fisiológicos de exercício do poder, preferindo continuar com as distorções atuais, o que lhe permite preservar comportamentos rentistas e extratores que garante o acumular de riqueza e de prestígio social de maneira quase indefinida. 

Existe solução para um impasse que prolonga a anomia do sistema político e que preserva a maior parte da disfuncionalidade sistêmica já examinada neste texto? Não a curto prazo, pois a adoção de um sistema de governança mais racional depende de uma maior educação política por parte do eleitorado, ou simplesmente de uma melhor qualidade da educação tout court da população. A fração da cidadania consciente deve, portanto, continuar com um trabalho didático de educação e de convencimento da população de que muita coisa precisa mudar para que o Brasil seja um país “normal” do ponto de vista político, menos estatizante e mais livre economicamente. Oxalá...

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3136: 7 de julho de 2017; Divulgado na plataforma Academia.edu (7/01/2024; link: https://www.academia.edu/113074838/3136_Presidencialismo_vs_parlamentarismo_notas_impressionistas_2017_).

sábado, 6 de janeiro de 2024

O PT QUER FATURAR COM O 8 DE JANEIRO - Augusto de Franco

 O PT QUER FATURAR COM O 8 DE JANEIRO

Augusto de Franco

6/01/2024

O ato para explorar politicamente o 8 de janeiro de 2023 tem uma clara motivação partidária com objetivos eleitorais. O PT quer faturar com o 8 de janeiro dizendo que só ele pode defender a democracia e que, portanto, deve continuar no poder para evitar que aconteça um golpe semelhante no futuro.

1 - Criar uma narrativa de que houve alguma coisa tão grave como o holocausto em 8 de janeiro de 2023 não concorre para a pacificação da sociedade e a diminuição da polarização. Antes, investe na política como continuação da guerra por outros meios e acirra a polarização.

2 - O governo populista-autoritário de Jair Bolsonaro contribuiu para erodir a democracia brasileira (sem, entretanto, conseguir abolí-la), mas isso não aconteceu em 8 de janeiro e sim ao longo do seu infeliz mandato: ao deslegitimar as instituições mantendo uma retórica golpista, ao aparelhar o governo com militares, ao tentar aliciar as forças armadas e policiais para seus propósitos golpistas, ao se aproximar de milícias e protegê-las da lei, ao querer armar a população para resistir pela força ao Estado democrático de direito quando avaliasse que seus interesses seriam contrariados, ao violar diariamente as regras não-escritas da democracia transformando a política numa guerra contra um suposto inimigo interno (comunista) instalando uma guerra das pessoas de bem contra as pessoas do mal.

3 - O que houve realmente em 8 de janeiro? Houve uma horrível manifestação golpista de vândalos que depredaram propriedades públicas. Em termos simbólicos foi um ataque às instituições do Estado democrático de direito. Mas só em termos simbólicos, porque as instituições não são as suas sedes físicas, seus prédios, seus móveis, seus objetos, sua papelada. Mesmo que os manifestantes ocupassem as sedes dos três poderes e lá ficassem sem ser expulsos, as instituições executivas, judiciárias e parlamentares continuariam funcionando em outros lugares (inclusive virtualmente).

4 - Só teria havido uma ruptura com a ordem democrática se as instituições fossem impedidas de funcionar autonomamente, de qualquer lugar (inclusive no ciberespaço). Ou se suas decisões deixassem de ser acatadas - sobretudo pelas forças armadas e policiais e pelos demais órgãos de controle. Para isso seria preciso que a Constituição e as leis (não os papeis onde estão escritas) fossem rasgadas.

5 - Houve golpe de Estado? Não houve. Houve tentativa de golpe. Mas essa tentativa de golpe não era crível. E não era crível porque não havia, por parte dos manifestantes e de seus orientadores e instigadores, força político-militar para tanto. Se houvesse, teria havido um golpe (bem ou mal-sucedido).

6 - Houve insurreição popular generalizada contra os poderes democráticos? Não houve. A mobilização envolveu não mais do que 4 mil pessoas periféricas, das quais 1/4 acabaram presas sem oferecer resistência. Não houve caos nas cidades, nas zonas rurais, nas estradas, nos portos e aeroportos, nem pane na oferta de água, energia, alimentos e medicamentos.

7 - Por isso o 8 de janeiro foi um ato simbólico, demonstrativo de inconformidade de uma parcela do eleitorado com as instituições da democracia tal como estavam funcionando. Mas foi mais um cosplay do 6 de janeiro de 2021 no Capitólio. Porque em Brasília: os manifestantes estavam desarmados; invadiram sedes dos poderes vazias, num domingo; não agrediram fisicamente nenhuma autoridade; não houve feridos, nem mortos (ao contrário do que ocorreu no original americano); não havia gancho institucional para impedir o chefe de governo eleito de governar: ao contrário do ato americano, em que o presidente Biden ainda não havia sido certificado pelo parlamento, Lula já estava empossado e governando.

8 - Foi crime? Foi. Os responsáveis diretos e indiretos devem ser processados de acordo com a lei (como estão sendo, ao menos a ralé teleguiada).

9 - Foi terrorismo? Não foi. Por qualquer lei vigente em uma democracia, inclusive pela lei brasileira. E por isso as acusações contra os manifestantes nunca incluem terrorismo.

10 - Querer esticar o 8 de janeiro como uma ameaça permanente à democracia brasileira é um truque solerte para manter o PT no poder indefinidamente e evitar que surja uma oposição democrática no Brasil (que passará a ser acusada de golpismo, mesmo que nada tenha a ver com bolsonarismo). Bolsonaro não governa mais e está inelegível. Não há qualquer risco de golpe de Estado por parte dos bolsonaristas. Não há ameaças vindas das forças armadas e policiais. As ruas não estão conflagradas e assim permanecerão por muito tempo. Não há grupos significativos planejando ou executando ações ilegais contra o regime democrático; ou seja, não há ações subversivas da ordem democrática em curso.


O maldito legado econômico do governo Bolsonaro - Ricardo Bergamini

 O maldito legado econômico do governo Bolsonaro

Ricardo Bergamini

1 - Aumento criminoso do patrimônio líquido negativo da União

Sem considerar números, gráficos e tabelas divulgados pelo governo, a estupidez coletiva brasileira comemora um governo que, em apenas quatro anos, aumentou o nosso buraco (patrimônio líquido negativo, ou passivo a descoberto) em R$ 2,8 trilhões, ou seja: 116,67% maior do que o ano de 2018. 

Estudo completo clique abaixo:

 

https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:46468

 

2 - Aumento criminoso da renúncia fiscal para os amigos e aliados

Em 2018, a união teve um gasto tributário (renúncia fiscal) da ordem R$ 333,0 bilhões (4,75% do PIB). Em 2022 para alimentar as propinas para a eleição atinge R$ 581,5 bilhões (5,86% o PIB). Crescimento criminoso de 23,37% em termos reais em relação ao PIB.

Estudo completo clique abaixo

 

https://www.gov.br/planejamento/pt-br/assuntos/avaliacao-de-politicas-publicas-1/arquivos/orcamento-de-subsidios-da-uniao/orcamento-de-subsidios-da-uniao-7a-edicao.pdf

 

3 - Aumento criminoso da carga tributária 

 

A carga tributária de 2022 é a maior desde 2010, ou seja: 33,71% do PIB. 

Estudo completo clique abaixo:

 

https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:46589

 

4 – Movimentação de capitais estrangeiros do Brasil

 

De 1995 até 2002 (FHC) o Brasil gerou uma saída líquida (fuga) de US$ 22,2 bilhões; de 2003 até 2010 (Lula) o Brasil gerou uma entrada líquida (captação) de US$ 210,5 bilhões; de 2011 até 2018 (Dilma/Temer) o Brasil gerou uma entrada líquida (captação) de US$ 65,7 bilhões; de 2019 até 2022 (Bolsonaro) o Brasil gerou uma saída líquida (fuga) de US$ 71,4 bilhões. Até novembro de 2023 (Lula) houve entrada líquida (captação) de US$ 24,5 bilhões.

 

Estudo completo clique abaixo (Anexo 16)

 

https://www.bcb.gov.br/estatisticas/estatisticassetorexterno -  

 

 

Ricardo Bergamini

www.ricardobergamini.com.br


New Yorker: the enduring effects of the January 6th attack against democracy in America

 A New Yorker dedica seu número do dia 6 de janeiro aos 3 anos do ataque ao Capitólio em 2021:


Biblioteca Oliveira Lima de Washington comemora cem anos em fevereiro de 2024


100 anos da instalação da Biblioteca Oliveira Lima na Universidade Católica da América, em Washington, coletando todos os seus livros espalhados em quatro ou cinco cidades diferentes, entre Europa e Brasil.



On Tiranny : Twenty lessons from the Twentieth Century - Timothy Snyder

 On Tiranny: Twenty lessons from the Twentieth Century

Timothy Snyder

January, 6, 3024

https://open.substack.com/pub/snyder/p/on-tyranny?r=8ma92&utm_medium=ios&utm_campaign=post 

These are twenty lessons from the twentieth century I published seven years ago, first as a kind of online declaration, and then, with historical examples, in a pamphlet called On Tyranny.

They were written in advance of the first Trump presidency, and have been used since in the U.S. and around the world. 

For those who want democracy and the rule of law in the United States after 2024, I would only add: now is the time to organize, to prepare to win locally and nationally, and to talk not only about what is to be lost but what can be gained. 

I wrote On Tyranny in a defensive mode; but freedom is something not only to be defended but to be defined and to be celebrated. As for me, I believe that if we can get through the next year, things could get better. Much better.

For now, three years after Trump’s attempt to end democracy and the rule of law in the United States, a reminder of the lessons. I recall them now in then hope that I won’t have to do so again a year from now.

1. Do not obey in advance.  Most of the power of authoritarianism is freely given. In times like these, individuals think ahead about what a more repressive government will want, and then offer themselves without being asked.  A citizen who adapts in this way is teaching power what it can do. 

2.  Defend institutions.  It is institutions that help us to preserve decency.  They need our help as well.  Do not speak of "our institutions" unless you make them yours by acting on their behalf.  Institutions do not protect themselves.  They fall one after the other unless each is defended from the beginning.  So choose an institution you care about -- a court, a newspaper, a law, a labor union -- and take its side.

3. Beware the one-party state.  The parties that remade states and suppressed rivals were not omnipotent from the start.  They exploited a historic moment to make political life impossible for their opponents.  So support the multiple-party system and defend the rules of democratic elections.  Vote in local and state elections while you can.  Consider running for office.

4. Take responsibility for the face of the world.  The symbols of today enable the reality of tomorrow.  Notice the swastikas and the other signs of hate.  Do not look away, and do not get used to them.  Remove them yourself and set an example for others to do so.

5. Remember professional ethics.  When political leaders set a negative example, professional commitments to just practice become more important. It is hard to subvert a rule-of-law state without lawyers, or to hold show trials without judges.  Authoritarians need obedient civil servants, and concentration camp directors seek businessmen interested in cheap labor.

6. Be wary of paramilitaries.  When the men with guns who have always claimed to be against the system start wearing uniforms and marching with torches and pictures of a leader, the end is nigh.  When the pro-leader paramilitary and the official police and military intermingle, the end has come.

7. Be reflective if you must be armed.  If you carry a weapon in public service, may God bless you and keep you.  But know that evils of the past involved policemen and soldiers finding themselves, one day, doing irregular things.  Be ready to say no.

8. Stand out.  Someone has to.  It is easy to follow along.  It can feel strange to do or say something different.  But without that unease, there is no freedom.  Remember Rosa Parks.  The moment you set an example, the spell of the status quo is broken, and others will follow.

9. Be kind to our language.  Avoid pronouncing the phrases everyone else does.  Think up your own way of speaking, even if only to convey that thing you think everyone is saying.  Make an effort to separate yourself from the internet.  Read books.

10. Believe in truth.  To abandon facts is to abandon freedom.  If nothing is true, then no one can criticize power, because there is no basis upon which to do so.  If nothing is true, then all is spectacle.  The biggest wallet pays for the most blinding lights.

11. Investigate.  Figure things out for yourself.  Spend more time with long articles. Subsidize investigative journalism by subscribing to print media.  Realize that some of what is on the internet is there to harm you.  Learn about sites that investigate propaganda campaigns (some of which come from abroad).  Take responsibility for what you communicate with others.

12. Make eye contact and small talk.  This is not just polite.  It is part of being a citizen and a responsible member of society.  It is also a way to stay in touch with your surroundings, break down social barriers, and understand whom you should and should not trust.  If we enter a culture of denunciation, you will want to know the psychological landscape of your daily life.

13. Practice corporeal politics.  Power wants your body softening in your chair and your emotions dissipating on the screen.  Get outside.  Put your body in unfamiliar places with unfamiliar people.  Make new friends and march with them.

14. Establish a private life.  Nastier rulers will use what they know about you to push you around.  Scrub your computer of malware on a regular basis.  Remember that email is skywriting.  Consider using alternative forms of the internet, or simply using it less.  Have personal exchanges in person.  For the same reason, resolve any legal trouble.  Tyrants seek the hook on which to hang you.  Try not to have hooks.

15. Contribute to good causes.  Be active in organizations, political or not, that express your own view of life.  Pick a charity or two and set up autopay.  Then you will have made a free choice that supports civil society and helps others to do good.

16. Learn from peers in other countries.  Keep up your friendships abroad, or make new friends in other countries.  The present difficulties in the United States are an element of a larger trend.  And no country is going to find a solution by itself.  Make sure you and your family have passports.

17. Listen for dangerous words.  Be alert to use of the words "extremism" and "terrorism."  Be alive to the fatal notions of "emergency" and "exception."  Be angry about the treacherous use of patriotic vocabulary.

18. Be calm when the unthinkable arrives.  Modern tyranny is terror management.  When the terrorist attack comes, remember that authoritarians exploit such events in order to consolidate power.  The sudden disaster that requires the end of checks and balances, the dissolution of opposition parties, the suspension of freedom of expression, the right to a fair trial, and so on, is the oldest trick in the Hitlerian book.  Do not fall for it.

19. Be a patriot.  Set a good example of what America means for the generations to come.  They will need it.

20. Be as courageous as you can.  If none of us is prepared to die for freedom, then all of us will die under tyranny.

These lessons are the openings of the twenty chapters of On Tyranny, which has been updated to account for the Big Lie, the coup attempt, the war in Ukraine, and the risks we face in 2024.  On Tyranny has also been published in a beautiful graphic edition, illustrated by Nora Krug.


Os desafios para o Brasil concretizar reaproximação da África em 2024 - Vinicius Assis (RFI Brasil )

BRASIL-ÁFRICA

Os desafios para o Brasil concretizar reaproximação da África em 2024

FRI, 

Vinicius Assis, do Cairo (Egito) para RFI Brasil 

https://www.rfi.fr/br/podcasts/brasil-%C3%A1frica/20240106-os-desafios-para-o-brasil-concretizar-reaproxima%C3%A7%C3%A3o-da-%C3%A1frica-em-2024

Moçambique, Etiópia e Egito devem estar no roteiro da primeira viagem internacional que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer fazer este ano. A visita está sendo organizada para a segunda quinzena de fevereiro. Mas além da retomada das viagens, outros desafios deverão ser superados para efetivar a reaproximação entre o Brasil e o continente africano, apontam especialistas.

A maior expectativa é sobre a passagem do presidente pela capital etíope, onde Lula deve participar da abertura da cúpula da União Africana. Ele fará um discurso não só como chefe de Estado, mas como líder do país que ocupa a presidência rotativa do G20.

A última parada da viagem deve ser no Cairo, mas tudo sobre esta visita ao continente africano ainda está em processo de confirmação, inclusive a logística e as agendas bilaterais. A RFI conversou nas últimas semanas com diversas pessoas que acompanham o assunto e são entusiastas da reaproximação do Brasil com a África, prometida pelo presidente Lula depois do distanciamento, diplomático e comercial, causado pelo governo de Jair Bolsonaro, que não fez sequer uma visita oficial a um país africano.

“O que se espera é que o Brasil possa apresentar uma agenda concreta de iniciativas e ações, não apenas do ponto de vista governamental, mas também como incentivar a participação do setor privado” disse João Bosco Monte, fundador e presidente do Instituto Brasil África (Ibraf).

O presidente global da Fairfax Africa Fund, LLC (U.S), Zemedeneh Negatu, recomenda que o presidente priorize o continente africano em seu governo, em particular grandes países que são geopolítica e economicamente influentes, para além das suas fronteiras – com destaque para os três membros africanos do novo Brics, África do Sul, Etiópia e Egito, e a Nigéria, apontada como “a futura membro” do bloco de emergentes.

O investidor etíope-estadunidense também ressaltou que o Brasil deveria fortalecer o seu relacionamento com instituições pan-africanas, como a União Africana e o Banco Africano de Desenvolvimento. “Recentemente conheci muitas empresas brasileiras que estão interessadas em fazer negócios na África, mas que precisarão do apoio financeiro e diplomático do governo brasileiro para investir com sucesso ou mesmo para exportar os seus produtos”, disse.

Falta de estratégia

Mas nem todos os diplomatas e embaixadores que atuam em países africanos com os quais a reportagem conversou estão muito otimistas. Fala-se em falta de planejamento no Itamaraty para a África e a necessidade de mudança do discurso do presidente sobre o continente. “Essa mensagem de que ‘temos uma dívida histórica’ é ultrapassada, com todo o meu respeito às vítimas dos fatos históricos e seus descendentes, mas a África do século 21 quer ser vista de outra forma, como a China, Índia e Turquia estão olhando para ela, por exemplo”, disse um diplomata sob condição de anonimato.

O presidente do Ibraf destaca a importância de se falar em reparação, mas lembra que o momento agora é de ir além do discurso. “Precisamos apresentar um projeto mais ousado, trazer uma agenda de ideias e ações. Como empresas africanas podem se aproximar de parceiros brasileiros? Diversas nações já se aproximaram da África e muitas vezes sem qualquer ligação, como o Brasil tem, só que eles trazem uma agenda bem pragmática e o Brasil precisa apresentar isso para se reaproximar da África”, completou.

Estima-se que até 2050, um quarto da população mundial seja africana. A região é rica em minerais como coltan, que é fundamental para a produção de baterias de celulares, carros elétricos e outros equipamentos eletrônicos. A África tem hoje a população mais jovem do planeta e possui, principalmente, duas agendas em comum com o Brasil: mineração e agricultura.

O investidor Zemedeneh Negatu reforçou que o governo Lula deveria ampliar o apoio às empresas brasileiras. “A China – um membro fundador do Brics, como o Brasil – tem apoiado com sucesso empresas chinesas ao investir e comercializar na África. As principais economias europeias, como o Reino Unido e a França, também apoiaram as suas empresas para se expandirem na África. E ainda assim, o Brasil, a nona maior economia do mundo, tem uma presença muito pequena na África”, comparou.

O leste do gigantesco continente africano tem sido o foco do empresário Paulo Pan, à frente do grupo Beyond Africa, em especial por conta da importância regional crescente de Adis Abeba. “Justamente para trazer o benefício que a Etiópia tem hoje de ter uma companhia aérea fazendo voo direto, com uma infraestrutura aeroportuária importante e que sirva de conexão para levar os passageiros para Quênia, Tanzânia, Uganda”, sinalizou.

Uma das áreas de interesse do empresário é o esporte. “O Brasil e o continente africano, quase que como um todo, desfrutam da mesma paixão, que é o futebol. É a primeira base de movimento diplomático para aproximar qualquer um dos países africanos”, afirmou Paulo Pan, que já conduz um projeto com a Unesco no Camarões e pretende levá-lo para outros países africanos, aumentando, também, o intercâmbio esportivo com o Brasil.

Qualidade x quantidade de embaixadas

No fim do ano passado, o Itamaraty anunciou que o Brasil abrirá mais duas embaixadas no continente, em Serra Leoa e Ruanda, além do novo consulado-geral em Luanda. A notícia não foi muito bem recebida por todos no Itamaraty, que sabem da precariedade de alguns postos no continente africano onde os respectivos embaixadores trabalham sozinhos, como em Burkina Faso, Camarões e Togo.

Para o embaixador aposentado Paulo Roberto de Almeida, que atualmente é diretor de Relações Internacionais do Instituto Histórico e Geográfico de Brasília, o Brasil realmente “voltou”, como prega Lula, e haverá novas iniciativas em diferentes países. Mas ele acredita que não é certo que isso passe pelo número de embaixadas na região.

“Lula está trocando a qualidade pela quantidade. Existem muitas embaixadas em diferentes países africanos que estão efetivamente sublotadas, sem condições, portanto, de desenvolver um trabalho diplomático de maior escopo e amplitude cultural, econômica e comercial”, ponderou.

O Ministério das Relações Exteriores (MRE) usa as letras A, B, C e D para classificar a importância dos postos nos países com os quais o Brasil se relaciona. Quase todos na África recebem as letras C ou D, o que significa que ainda são consideradas menos importantes para a política externa brasileira.

Com base da Lei da Acesso à informação, a reportagem pediu ao MRE as comunicações telegráficas das representações diplomáticas do Brasil no exterior referentes a sublotação, falta de recursos humanos, pedidos de contratação e condições dos posts C e D em 2022 e 2023. Alegando se tratar de uma solicitação muito ampla, o ministério pediu que a demanda fosse detalhada para não sobrecarregar o setor, com 8 servidores, destinado a este atendimento. Em uma pesquisa preliminar, 742 correspondências que poderiam se enquadrar no pedido foram encontradas.

A reportagem não recorreu por entender que a resposta já era suficiente para se ter uma noção sobre um problema que tem sobrecarregado alguns diplomatas que atuam na África.

Aberturas e fechamentos de representações diplomáticas

Entre 2002 e 2020, o Brasil abriu 18 embaixadas no continente africano, além do consulado-geral de Lagos, que sucedeu a embaixada brasileira na Nigéria quando esta foi transferida para Abuja. Jair Bolsonaro fechou três embaixadas na África (no Maláui, na Libéria e em Serra Leoa, que será reaberta pelo atual governo). Atualmente o Brasil tem 33 embaixadas e dois consulados-gerais em países africanos.

Ainda na opinião de Paulo Roberto de Almeida, é preciso pensar na relação custo-benefício e no quanto a abertura de novos postos custaria para o Itamaraty em termos de manutenção. “Uma embaixada não sai por menos de meio milhão de dólares por ano e o retorno às vezes não justifica”, disse.

No corpo diplomático há quem defenda que o MRE deveria designar um embaixador a mais para a Etiópia, trabalhando exclusivamente com a União Africana, função que hoje é acumulada pelo embaixador que também cuida da relação entre os governos brasileiro e etíope.

No ano passado, Lula esteve na África do Sul para a cúpula do Brics. Em seguida visitou Angola e São Tomé e Príncipe, onde participou da cúpula da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).

Em Luanda, chegou a falar sobre empresas brasileiras voltarem a investir no continente africano, mas não apresentou qualquer projeto de incentivo.

“O Brasil, durante algum tempo, teve uma agenda de financiamento de projetos para empresas brasileiras em ambientes africanos. Eu me lembro da inauguração do escritório do BNDES em Joanesburgo, que foi muito bem recebido pela comunidade africana, pelos empresários do continente”, mencionou João Bosco Monte.

Este escritório, porém, foi fechado no governo de Michel Temer. “É importante que isso volte. Sem financiamento é muito difícil que empresas africanas e brasileiras possam dialogar”, ressaltou o presidente do Ibraf.

Este ano, Lula pretende fazer duas viagens para o continente africano. A segunda visita deve ser no segundo semestre, com Nigéria e Senegal provavelmente no roteiro. Ainda em 2024 o Brasil receberá representantes da União Africana e da África do Sul, membros do G20, no contexto da cúpula do bloco que este ano acontece no Brasil. Outros três países da África foram convidados pelo governo brasileiro para o evento: Angola, Nigéria e Egito.

Os primeiros concursos públicos para cargos na burocracia estatal - Gunter Axt Revista Estudos Institucionais

Ensaio seminal de Gunter Axt sobre a progressão da construção da burocracia racional-legal no Brasil, com destaque para o recrutamento via concursos públicos nas carreiras jurídicas do RS pré-moderno:

Estudos de Caso comparados sobre primeiros concursos para ingresso nas carreiras da Justiça e do Ministério Público no Brasil, entre a Primeira República e os anos 1950.

2024, Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 1, p. 87 - 116, jan./abr. 2024

O artigo procura comparar dados históricos sobre os primeiros concursos públicos para a magistratura no Rio Grande do Sul, ainda na Primeira República, ou seja, antes de 1930; para ingresso na carreira do Ministério Público do Rio Grande do Sul, realizado em 1941; do Ministério Público de Santa Catarina, realizados nos anos 1950, e do Ministério Público Militar, realizado entre 1956 e 1959. O texto baseia-se em um conjunto de fontes primárias, como entrevistas, matérias jornalísticas de época, correspondências e livros de registros dos primeiros concursos. Os eventos são analisados no contexto da inovação gerencial da modernidade, no sentido da construção burocrática racional-legal. O Brasil conheceu experiências pioneiras na realização de concursos públicos, os quais, inicialmente, ainda se viam expostos à clássica indistinção entre espaço público e privado, que caracterizou a formação social brasileira. 

Acesso:

https://www.academia.edu/113020252/Estudos_de_Caso_comparados_sobre_primeiros_concursos_para_ingresso_nas_carreiras_da_Justi%C3%A7a_e_do_Minist%C3%A9rio_P%C3%BAblico_no_Brasil_entre_a_Primeira_Rep%C3%BAblica_e_os_anos_1950 


Bibliografia primorosa; fontes primárias.

Recomendo enfaticamente aos que se interessam por estudos institucionais. (PRA)