O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Preparando o 16 de Agosto: licoes das manifestacoes de 15 de marco - Paulo Roberto de Almeida

Imediatamente após as manifestações do dia 15 de março, que foram um estrondoso sucesso -- inesperado, além de tudo -- eu tirava as lições do dia, e fazia alguns comentários sobre possíveis pontos de consenso naquelas magníficas manifestações do domingo. Não tenho certeza de que o próximo domingo conhecerá sucesso tão notável. Em todo caso, creio que os argumentos que eu levantava permanecem válidos ainda hoje, pois pouca coisa mudou, de fato, na esfera política, a não ser a ameaça sempre pendente de denúncia contra políticos de realce e contra o próprio partido mafioso.
Mas, sempre cético quanto aos caminhos (ou descaminhos) da política no Brasil, tenho minhas desconfianças de que algo muito sórdido se prepara, para manter os criminosos do poder no poder.
Repito, portanto, minhas considerações, que me parecem inteiramente válidas.
Paulo Roberto de Almeida 


O que fazer agora? Minhas constatações

Paulo Roberto de Almeida

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Como é normal nas democracias, não existe um consenso sobre os motivos que levaram tantas pessoas às ruas neste domingo 15 de março de 2015, dia da dignidade nacional. Cada um dos manifestantes deve ter tido motivos específicos para sair de casa neste domingo e manifestar –se contra a situação. Mas, alguns motivos que me parecem comuns à maioria deles emergem das faixas de protestos e das diretivas que circulam nas redes sociais. Por isso, vou tentar alinhar os poucos pontos que me parecem comuns à maior parte dos manifestantes:
1) O governo é inepto;
2) O governo é corrupto;
3) O governo é conivente com os seus corruptos e tenta blindá-los;
4) O Ministério Público eximiu-se de pedir todas as investigações necessárias;
5) A Justiça é lenta e já demonstrou leniência com criminosos políticos;
6) A classe política não está à altura dos desafios do momento;
7) A oposição é inepta, e totalmente desnorteada quanto ao que fazer;
8) A base congressual do governo é oportunista: havendo dinheiro será a favor;
9) Ninguém, salvo poucos malucos, pretende intervenção militar;
10) O consenso é pela mudança de governo;
11) Qualquer mudança de governo implica o afastamento do chefe de governo;
12) Todas as mudanças precisam ser constitucionais;
13) A cidadania deve pressionar políticos e ministério público para que as investigações sejam feitas e para que mudanças ocorram.

Parece-me que estamos no início de um processo. Até aqui, só podemos ficar orgulhosos pelo grau de conscientização e pelo sentido de responsabilidade de que fizeram mostra todos aqueles que participaram das manifestações deste domingo, acima de quaisquer expectativas. Meus parabéns a todos. Estou orgulhoso novamente do meu país. Ele está a caminho de se tornar uma verdadeira nação.

Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 2790: 15 de março de 2015, 1 p.
2790. “O que fazer agora? Minhas constatações”, Hartford, 2790: 15 de março de 2015, 1 p. Comentários sobre os pontos de consenso nas manifestações do domingo 15. Blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2015/03/o-que-fazer-agora-minhas-constatacoes.html).

Keynesianismo e liberalismo nas politicas publicas: um texto didatico - Paulo Roberto de Almeida

Um texto meu, que tinha desaparecido misteriosamente de meu computador -- sabe-se lá por quais artimanhas de pessoas desconhecidas -- e que reencontrei, com uma mensagem de que o texto era didático, e por isso vai postado aqui.
São respostas que fiz a perguntas de um leitor deste blog, provavelmente estudante, e que acho que podem servir a professores igualmente.
Paulo Roberto de Almeida


Keynesianismo e liberalismo nas políticas públicas
  
Paulo Roberto de Almeida
  
Um leitor constante, fiel, atento e comentador, reincidente neste blog, me coloca a seguinte questão, que prefiro responder por inteiro: 

EMB compartilhou a postagem de seu blog no Google+:
Seria correto afirmar que o governo Fernando Henrique aliou aspectos de ortodoxia em política econômica com keynesianismo em matérias sociais e até comerciais?

Respondo (PRA):
Respondo de imediato: sim e não. Por que a contradição? Porque governos, em geral, não fazem NENHUMA distinção entre teorias ou escolas econômicas, pela simples razão de que estão por demais ocupados com problemas reais, concretos, tangíveis, urgentes, preocupantes, talvez até dramáticos – que são, quase sempre, os de desequilíbrios nas contas domésticas e externas, nas insuficiências orçamentárias, nas demandas da sociedade e do parlamento por mais e mais recursos públicos (que são os da coletividade), por ameaças de perdas de receitas, choques externos, e uma infinidade de outros problemas reais – para inquietar-se, além da conta, com meras teorias acadêmicas e escolas de pensamento econômico, que não representam nada, repito NADA, em face da agenda de trabalho que esses governos têm pela frente.
Só acadêmicos, em geral os puramente teóricos – ou alienados, como se dizia antigamente – preocupam-se com a suposta racionalidade econômica das políticas públicas da área econômica. Só jornalistas, mal formados pelos mesmos acadêmicos, se preocupam em catalogar, classificar, atribuir um rótulo ou slogan, a um governo qualquer, como se essas denominações representassem qualquer coisa além de uma mania, uma simplificação, uma distorção da realidade.
Políticos eleitos exibem, é verdade, alguma compreensão do mundo, e esse entendimento se baseia naquilo que eles aprenderam nos bancos escolares e universitários, nos ensinamentos dos familiares, mas sobretudo na experiência da vida, no trato da coisa pública, e o que vem em primeiro lugar não é a teoria aprendida, mas a necessidade prática, o problema concreto. Políticos experientes fazem assim: aprendem algumas coisas nos livros, outras coisas com pessoas mais experientes ou mais espertas, mas geralmente no curso de um vida levada no desempenho de funções públicas, nas quais as mais belas teorias acabam sendo jogadas no lixo em favor de soluções mais práticas, ou de puro expediente emergencial, com os meios e instrumentos à disposição, sem muita coerência teórica ou racionalidade instrumental. Resumindo: eles fazem o que dá para fazer, e o resto vão empurrando com a barriga, até onde for possível. Se der para resolver o problema com o que sabem e com os meios à disposição, muito bem, assim será feito. Se não é possível, vão contornando o problema até onde for impossível evitar as consequências, e aí a solução será aquela que for apresentada por algum assessor mais esperto, ou pelos “meios de bordo” (que geralmente é empurrar para a frente, e deixar o problema para o sucessor).
Políticos inexperientes, ou acadêmicos – ou seja, ideólogos, alienados, lunáticos – chegam ao poder com belas teorias, e tentando cumprir aquilo que proclamaram – geralmente mentindo – na campanha eleitoral, e quando sentam na cadeira descobrem que não vai ser possível atingir aquelas belas metas proclamadas, que é a felicidade para todos, ao menor custo possível (de hábito, sem custo explícito nenhum). Se esse político não for muito estúpido, ele logo vai adaptar o seu discurso pós-posse às condições efetivamente reinantes, ou seja, meios disponíveis e possibilidades legais. Se ele for, ou continuar, alienado, ou seja, ideólogo, vai ser um desastre, pois em nenhum lugar do mundo as soluções acadêmicas cabem num mero orçamento governamental.
O que isso tem a ver com o nosso debate?
Keynesianismo e ortodoxia são apenas dois rótulos, que podem não possuir significado algum no mundo concreto da política, mas que possuem algum significado para acadêmicos e jornalistas, para economistas teóricos que escrevem para jornais e outros representantes da mesma fauna. Políticos – pelo menos os verdadeiros – não são nem keynesianos, nem ortodoxos, eles apenas sobrevivem com o que existe e com o que é possível fazer. Geralmente eles costumam gastar por conta: quando as contas não fecham, aí são obrigados a praticar simples medidas de ajuste, que serão tão mais severas ou duras quanto foi o abuso praticado na fase anterior, e nisso não vai nenhuma coloração ideológica. Keynesianos de carteirinha podem ser gastadores responsáveis, e conservadores históricos podem se comportar de modo totalmente irresponsável, sempre dependendo das circunstâncias e dos meios disponíveis. Sempre acham que o Ronald Reagan era um conservador que abaixou impostos para beneficiar os ricos, quando ele o fez para estimular a economia, na suposição (correta) de que são os ricos que investem, produzem riquezas, criam empregos e pagam novos (ou velhos) impostos. Sempre se esquece também que ele foi um dos mais irresponsáveis presidentes no plano orçamentário, uma vez que na sua obsessão de afastar o perigo soviético conduziu um dos mais perdulários programas de gastos com defesa – entre eles a Iniciativa de Defesa Estratégica, ou Guerra nas Estrelas – que representou, pura e simplesmente, um keynesianismo militar altamente irresponsável, deixando o governo novamente no vermelho. Por isso Bush pai teve um governo de recessão e Bill Clinton, um democrata supostamente distributivista, conduziu um dos governos mais responsáveis no plano fiscal de que se tem notícia desde Truman ou Eisenhower.
Nenhum deles era liberal teórico, ou acadêmico, todos eles eram homens práticos, e fizeram o que lhes parecia adequado fazer, com os dados à disposição, e com os assessores que tinham. Um dos assessores mais liberais de Reagan, David Stockman, se demitiu da chefia do Orçamento, em vista das loucuras que Reagan anda fazendo com as contas públicas, e denunciou isso logo em seguida (ver agora seu livro de história de todo o processo orçamentário e de contas públicas nos EUA, desde a presidência Roosevelt, chamado The Great Deformation). Todos eles fizeram o que achavam que deveriam fazer, com base nas condições do momento.
Da mesma forma, mesmo o mais acadêmico dos ministros de finanças, ou Secretário do Tesouro, quando senta na cadeira de decisor, costuma deixar os livros de lado, e perguntar: “mostre-me o balanço de pagamentos”, ou “mostre-me o orçamento”, ou ainda, “me diga como estão as receitas?”, “como anda a atividade econômica?”, ou “como estão os investimentos?”. Ponto. É com base nisso que eles vão tomar as decisões que se impõem, sem qualquer preocupação em saber se aquilo é liberalismo, se é keynesianismo, ou o raio que o parta. Fazer o que é possível fazer, simples assim.

Voltando, agora, ao governo de FHC – que, na verdade, começa antes, como ministro da Fazenda de Itamar – o que podemos dizer é o seguinte: num processo de aceleração inflacionária, como o que vivíamos entre 1990 e 1994, não dá para perguntar o que o Keynes ou o Hayek fariam. É preciso simplesmente saber o que é possível fazer nas circunstâncias dadas. Os assessores vêm, obviamente, armados de alguns rudimentos metodológicos, de algumas teorias econômicas, de algumas simpatias por esta ou aquela escola de pensamento econômico, ou até repletos de relatos históricos sobre como a Alemanha, a Hungria, a Bolívia, Israel, ou outros países, superaram os seus respectivos surtos inflacionários, e podem, com base nisso, propor soluções aos problemas encontrados. Alguns proporão congelamento de preços e salários, e só conseguirão recolher mais inflação logo adiante. Outros pretendem trocar de moeda. Os mais sensatos concluirão que o mal radica nos elevados gastos governamentais e no emissionismo irresponsável de moeda, e poderão propor um ajuste com base nessa concepção, o que é sempre recessivo. Se o presidente concordar, se faz a recessão e se tenta reconstruir as bases do crescimento mais adiante. Se o presidente não quiser, então é provável que continuem as pressões fiscais e emissionistas, as loucuras orçamentárias e a continuidade do caos econômico.
Torrar dinheiro é keynesiano, como acusam alguns, e fazer ajustes recessivos é uma maldade conservadora (ou liberal)? Pode ser, mas o fato é que keynesianos ou conservadores precisam enfrentar os problemas reais, que são sempre desequilíbrios nos principais fluxos macroeconômicos. Dependendo do papel do governo na economia, algumas soluções são possíveis, outras não. Governos que trabalham com bancos centrais autônomos geralmente não conseguem sair por aí emitindo irresponsavelmente, outros populistas e delirantes podem fazer como certos distributivistas inconsequentes, de que temos muitos exemplos na América Latina. Cada caso terá uma resposta, em função da correlação de forças, do jogo democrático, das crenças (ou falta de) dos líderes políticos e da qualidade dos gestores econômicos.

Olhando o Brasil dos últimos 30 anos, o que tivemos? Militares que sonharam demais – planos grandiosos – e levaram o país para um endividamento excessivo. Líderes da redemocratização (Sarney, Ulysses) que esticaram demais a corda das bondades governamentais, e levaram o país para a hiperinflação. Um líder salvacionista (Collor) que pretendeu salvar o país da inflação e, por ser mal assessorado (Zélia), acabou provocando um desastre ainda maior, que tentou remediar (Marcílio) depois, mas já tarde demais, pois a crise política o engolfou. Depois tivemos um presidente honesto (Itamar), mas inepto em economia, que trocou quatro vezes de ministros da Fazenda e de presidentes do Banco Central, antes de acertar com um sociólogo sensato, que convidou uma brilhante equipe de economistas, que acabou consertando todas as bobagens dos economistas keynesianos que tivemos antes. Mas Itamar era um homem que não queria recessão, e que portanto impediu o Plano Real de ir até as suas consequências lógicas, que era acabar com o excesso de despesas públicas de forma efetiva. O resultado foi que tivemos um ajuste sem recessão, o que obrigou a manter altas taxas de juros, o que acabou impactando negativamente em outros setores: deu na crise de 1999, que pela primeira vez realizou os ajustes necessários e preparou o Brasil para crescer. No meio aconteceram as crises financeiras, o apagão elétrico e a crise argentina, o que atrapalhou; logo em seguida a crise das eleições de 2002, mas tudo foi encaminhado para colocar o Brasil de volta nos trilhos, com Armínio Fraga e Pedro Malan.
O governo Lula, sem qualquer teoria – pois ele, pragmaticamente, abandonou as receitas alopradas dos seus economistas unicampistas – levou o Brasil para uma fase positiva, não porque ele fosse um gênio, mas por que as condições externas e as reformas anteriores o permitiram. Mas começou a gastar demais, desde o primeiro mandato, o que se agravou na reeleição e no segundo mandato, mas ainda assim ele se beneficiou com a bonança chinesa (soja a 600 dólares a tonelada, por exemplo). Pronto, foi o suficiente para eleger um poste, como ele mesmo diz, uma pessoa ainda mais inepta do que o mais inepto dos economistas unicampistas, que conseguiu fazer tudo errado o tempo todo, e chegamos onde chegamos: inflação, não crescimento, aumento da dívida doméstica e da dívida externa, déficits contínuos, desequilíbrios nas contas internas e nas contas externas, apagão elétrico, baixo investimento, intervencionismo, protecionismo, enfim, um inferno completo. É preciso ser muito incompetente para construir um desastre dessa magnitude. Tudo isso é keynesianismo, ou é o quê?
Provavelmente não é nada, só incompetência mesmo, pura inépcia e teimosia.
Termino por aqui, pois acho que já respondi fartamente à pergunta colocada.
Mas uma conclusão: acadêmicos são em geral sonhadores, mas alguns são mais preparados do que outros. São eles que assessoram os políticos. Quando temos excesso de ruindade dos dois lados, aí é o desastre. Parece que no governo FHC tivemos uma feliz combinação de acadêmicos realistas e políticos pragmáticos. Do governo Lula em diante, incompetentes em todas as esferas – com raríssimas exceções no primeiro mandato – e ideólogos e mafiosos espalhados por todas as agências públicas. Deu no que deu. Vai ser difícil consertar agora, pois é preciso trocar os políticos e os assessores.
Dá para dormir tranquilo? Acho que não. Sinto muito...

Hartford, 2803: 5 de abril de 2015, 5 p. 
========
Addendum em 6/04/2015.

Uma mensagem deixada por um leitor, o que muito me gratifica.
É exatamente para os jovens estudantes que eu escrevo, e tento ser didático, ou pelo elucidativo.
Paulo Roberto de Almeida 

Willians Franco comentou a postagem de seu blog
Nossa! Extremamente didático esse texto, hein? Normalmente leio textos político-econômicos via leitura dinâmica, mas esse tive que ler pausadamente para captar todos os detalhes. Parabéns!

2803. “Keynesianismo e liberalismo nas políticas públicas”, Hartford, 5 abril 2015, 5 p. Respondo a pergunta de leitor do blog sobre se as políticas do FHC foram liberais ou keynesianas. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2015/04/debate-sobre-escolas-economicas.html).

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Novos livros em Research Gate: zero kms, quem chegara' primeiro? - Paulo Roberto de Almeida

Acabo de uploadar (ugh!) mais dois livros digitais na plataforma Research Gate, que andava um pouco carente e tristonha, coitadinha, tão mal que a tratei, deixando a pobrezinha de lado, enquanto alimentava a plataforma Academia.edu.
Agora são mais dois para deleite dos curiosos, para alimentar os arquivos da CIA, do FSB e do Mossad, sem esquecer a DGI e os nossos arapongas (eles já devem ter se abastecido...).
Em todo caso, aqui vai: 0 views, 0 downloads, 0 citations...
Ou seja, zero quilômetro...
Paulo Roberto de Almeida

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Corrupcao no Brasil: Mensalao, Petrolao, Embromacao, etc... - Ricardo Velez-Rodriguez, Paulo Roberto de Almeida

Oyez Citoyens, oyez: a despeito deste artigo bastante otimista de Ricardo Vélez-Rodríguez, minha percepção do atual processo de investigação e de criminalização (até o momento apenas de alguns personagens secundários e de empresários venais), é que está em curso uma gigantesca operação subterrânea, por definição clandestina e chantagista, para tentar salvar os "donos do poder", não obstante eventual denúncia junto ao STF (que como sempre levará anos para investigar e processar). Sinais de fumaça cada vez mais carregados indicam um cenário de composição entre as principais figuras políticas, inclusive da soi-disant "oposição", para escapar das garras da lei. E a despeito do que diz o mesmo articulista, de que as instituições estão funcionando a contento e de que ninguém está acima da lei, o fato é que alguns ainda se julgam mais iguais que os outros, os comuns, e agem nesse sentido. Ou seja, apesar de que, 800 anos depois da Magna Carta o Brasil se aproximou desse instrumento fundamental do Estado de Direito, o fato é que ainda não chegamos efetivamente na Magna Carta, apenas a tangenciamos. Aliás, nem na própria Ingaterra: tiveram de decapitar um rei, e expulsar um outro para tornar efetivas as disposições da Magna Carta. O Brasil ainda precisa decapitar algumas cabeças coroadas...
Paulo Roberto de Almeida

O Brasil vive - a Operação Lava Jato continua
Ricardo Vélez Rodríguez
O Estado de S.Paulo, 10 Agosto 2015

As investigações da Operação Lava Jato, em que pese o esforço do PT para atrapalhá-las, continuam a todo vapor. Ponto para o juiz Sérgio Moro, para a Procuradoria-Geral da República e para o Ministério Público, bem como para a Polícia Federal. As CPIs da Câmara dos Deputados que investigam os desmandos do governo nas estatais e no BNDES também deslancharam a contento, para desgosto do governo e do PT, que ficaram praticamente do lado de fora das diversas comissões. E vêm aí, de novo, as multitudinárias manifestações de cidadãos descontentes com a administração petralha, no próximo dia 16. Ponto para todos nós, brasileiros, que vemos o Poder Legislativo e a imprensa comprar a nossa insatisfação e a briga com a corrupção instalada no governo pelo PT e a sua base aliada.

Outro fato positivo: José Dirceu voltou ao xilindró, por causa de sua comprovada participação no crime do petrolão, tendo sido observados todos os ritos processuais pela Justiça e pela Polícia Federal. Tudo sem estardalhaço e tendo sido garantidos ao réu todos os seus direitos. As instituições brasileiras funcionam. Palmas para a nossa República! Mais uma vez fica claro que, hoje, no Brasil ninguém está acima da lei.

Os desmandos de corrupção praticados pelo lulopetismo ao longo dos últimos 13 anos tiveram o mérito de fazer acordar a sociedade brasileira, que passou a cobrar dos poderes públicos uma resposta firme em defesa das instituições republicanas. No mesmo sentido têm-se posicionado, por diversas vezes, tanto os Clubes Militares quanto oficiais graduados das Três Armas, cumprindo com a sua missão constitucional de “garantia da lei e da ordem”. E os cidadãos têm externado a sua posição contrária ao patrimonialismo rasteiro que tomou conta do governo. Jovens estudantes, donas de casa, funcionários públicos, políticos da oposição, profissionais liberais, produtores rurais, pastores evangélicos, operários, padres, etc., têm externado pela imprensa, em pregações e em manifestações espontâneas (nos panelaços, nas marchas de rua, nas cartas dos leitores, nas redes sociais, etc.), a sua rejeição à atitude de arrogância do governo e das lideranças petistas e dos seus aliados, em face da corrupção comprovada.

O Brasil não tolera mais a existência dos “donos do poder”. O único depositário deste é o povo brasileiro e, por delegação dele, os seus representantes eleitos para zelar pela Constituição e o cumprimento das leis. Quando os eleitos e os funcionários nomeados por eles se afastam da busca do bem comum, para garantir única e exclusivamente o bem deles próprios e do seu partido, abre-se o caminho para a perda de legitimidade. É a corrupção da política de que já falava Aristóteles. Se a prática desse crime for comprovada em relação à atual presidente, que se cumpra a lei no processo de impeachment. Não vejo como isso possa afetar as instituições republicanas. Muito pelo contrário: se, provada a culpa, não forem tomadas as providências legais, disso advirá sério atentado contra a ordem legal. Esperemos, portanto, com tranquilidade a decisão final do Tribunal de Contas da União (TCU) em face das contas da gestão de Dilma Rousseff, bem como as providências que, em caso de crime de responsabilidade comprovado, deverão ser tomadas pelo Poder Legislativo.

Se ninguém está acima da lei, não há razão para temer eventuais investigações das autoridades competentes em relação aos presidentes da Câmara e do Senado, caso fique comprovada a suspeita da prática de algum crime por eles. O que vale para José Dirceu vale para qualquer outro cidadão, seja ele o ex-presidente Lula, os presidentes da Câmara e do Senado ou qualquer um de nós: em caso de crime comprovado, a aplicação da lei é o único caminho possível. Escrevia Tocqueville em A democracia na América (1835) que a República era, nos Estados Unidos, “o reino pacífico da maioria”. Ora, esse “reino pacífico”, no Brasil de hoje, pressupõe a submissão de todos à lei, sem exceções nem favorecimentos ilícitos.

Quando o ex-presidente Lula, do alto do seu eterno palanque, brada que os petistas estão sendo hoje caçados como os judeus pelos nazistas, simplesmente está tergiversando as coisas. Ora, o Ministério Público, a Polícia Federal e o juiz Sérgio Moro não são administradores de campos de concentração. São honrados funcionários públicos que tentam enquadrar aqueles que, eleitos para governar o Brasil, aproveitaram o poder que lhes foi emprestado pela sociedade para favorecer ilegitimamente a si próprios e ao próprio partido, num esforço por torná-lo hegemônico e se perpetuar no poder. A opinião pública brasileira já matou a charada lulista: distorcer as palavras para, sempre, se colocar como vítima. Esse expediente não funciona mais e o ex-presidente Lula deveria saber disso.

As investigações da Operação Lava Jato vão continuar e os seus executores não se intimidarão pelas bravatas populistas do líder petista. Que ele e o seu partido prestem contas à sociedade pelo descalabro financeiro que fez quebrar a maior empresa pública brasileira, pôs em risco a saúde financeira de outras empresas públicas, como a Eletrobrás, descapitalizou perigosamente bancos oficiais e pôs o maior banco de investimentos do Brasil, o BNDES, a serviço de um projeto personalista de poder, agradando a regimes corruptos pelo mundo afora, a fim de ver acrescidos os seus lucros pessoais com palestras fictícias e outras artimanhas. A engenharia da corrupção lulopetista engendrou a corrupção da engenharia nacional, fazendo mergulhar em águas turvas várias das nossas maiores empreiteiras. Os atuais ciclos de baixa da economia, da autoestima dos brasileiros e das perspectivas de desenvolvimento provêm daí. Esses crimes ainda vão ser postos à luz na sua totalidade, a fim de que, punidos os seus responsáveis, recuperemos o orgulho de ser brasileiros.

RICARDO VÉLEZ RODRÍGUEZ É MEMBRO DO CENTRO DE PESQUISAS ESTRATÉGICAS DA UFJF, É PROFESSOR EMÉRITO DA ECEME E DOCENTE DA FACULDADE ARTHUR THOMAS, LONDRINA

Academia.edu: top paper recém-lançado: RI do Brasil, padroes e tendências


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Florestan Fernandes homenageado pela USP: pelas aulas ou pelas ideias?- O Antagonista, Paulo Roberto de Almeida

Pequena nota no site O Antagonista desta noite, 10/08/2015:

Florestan Fernandes

A USP lembra os 20 anos da morte do sociólogo Florestan Fernandes, cujas ideias morreram antes do homem que as pegou emprestadas.

Compreendo a natureza da crítica.
FF foi um grande professor de ciências sociais -- antropologia, sociologia, desenvolvimento político, análise comparativa das sociedades latino-americanas, pensamento marxista, etc. -- que, depois do golpe de 1964, enveredou por um caminho do leninismo tardio, o que o fez deformar suas aulas e escritos por uma postura soi-disant revolucionária que expressava, basicamente, sua frustração com os caminhos tomados pelo regime político e econômico no Brasil.
Funcionalista no início de sua carreira, culturalista no bom sentido da palavra, ele se radicalizou a partir da redação daquela que é considerada sua magnum opus, A Revolução Burguesa no Brasil, objeto de leitura atenta de minha parte e que consistiu no foco de minha tese de doutoramento.
Ao examinar, contudo, com a minha lupa desprovida dos a-prioris que ele vinha justamente adquirindo no decorrer dos anos 1960 e 70, passei de uma postura "florestânica" na elaboração do meu projeto de tese, para uma "anti-florestânica" em sua redação final e defesa em banca.
O que me trouxe vários problemas: diretamente e imediatamente com a banca de defesa, em 1984, já que meu orientador era um velho historiador marxista, que não aceitava as críticas que eu tinha a fazer no qu se refere à interpretação marxista tradicional, congelada, das revoluções burguesas, e mais tarde, na academia brasileira, ao apresentar minha visão crítica sobre essa obra do mestre, em face da atitude beata da maior parte dos convertidos, dos discípulos, dos condescendentes com a postura leninista de FF, que me parecia totalmente distante da realidade brasileira, e apenas uma expressão de suas angústias mentais, psicológicas e, também, políticas.
Em todo caso, num colóquio da Unesp de Marília, em homenagem a ele, em 1986, eu fui o único apresentador a ser vaiado pelo público de professores que assistia ao painel sobre sua obra máxima, o que me fez ver que eu tinha razão, e que a academia tinha renunciado a pensar, contentando-se em reverenciar acriticamente o velho mestre.
Depois FF enveredou por um panfletarismo lamentável, visível nos seus artigos semanais na Folha de S. Paulo, e mais tarde na sua participação, como deputado pelo PT, na Constituinte.

Em todo caso, quem tiver interesse em conhecer o que eu escrevi sobre ele, pode recorrer a meus trabalhos a seguir:

Minha tese de doutoramento: 

Classes Sociales et Pouvoir Politique au Brésil: une étude sur les fondements méthodologiques et empiriques de la Révolution Bourgeoise (Bruxelles: Université Libre de Bruxelles, 1984, Tomes I et II, 503 pp.). Relação de Trabalhos nº 084.
Ver o sumário aqui: 


 A apresentação que fiz das conclusões de minha tese no colóquio sobre FF, onde fui vaiado: 

O Paradigma Perdido: a Revolução Burguesa de Florestan Fernandes”, in Maria Angela d’Incao (org.), O Saber Militante: Ensaios sobre Florestan Fernandes (São Paulo-Rio de Janeiro: UNESP-Paz e Terra, 1987, p. 209-229; ISBN: 85-7139-000-5). Relação de Publicados n. 42; Originais n. 124.
Ver os links aqui:

Um artigo derivado dos mesmos argumentos expostos na tese e no capítulo do livro:
Brasília, 1 set. 2005, 19 p. Reelaboração do trabalho sobre FF, Caio Prado Jr. e Nelson Werneck Sodré (Trabalho n. 630). Publicado na revista Espaço Acadêmico (a. V, n. 52, set. 2005).  Relação de... more; More Info: In: Espaço Acadêmico (a. V, n. 52, set. 2005); Publication Date: Sep 2005
link: https://www.academia.edu/5885281/1465_Florestan_Fernandes_e_a_ideia_de_revolu%C3%A7%C3%A3o_burguesa_no_marxismo_brasileiro_2005_

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

"A crise da educacao e' mais grave do que a da pobreza" - Ricardo Paes de Barros

Fazem anos que insisto em que as cinco primeiras prioridades do Brasil devem ser estas:

1) Educação
2) Educação
3) Educação
4) Educação
5) Educação

Perdão, corrijo: não qualquer educação. Apenas a primária, a secundária e a técnico-profissional. No que se refere ao ciclo superior, e outras afins, são importantes, mas não prioritárias, pelo menos não com a urgência dos problemas da educação fundamental e do ensino profissionalizante.
Paulo Roberto de Almeida 

"A crise da educação é mais grave do que a da pobreza"
Entrevista/ Ricardo Paes de Barros
Flávia Yuri Oshima e Guilherme Evelin
Época, 8/08/2015

O economista liberal, um dos pais do Bolsa Família, diz que o Plano Nacional de Educação é pouco ambicioso e critica o preconceito no governo contra o setor privado.

Um dos maiores especialistas do mundo em pobreza e desigualdade abraçou outra causa. Um dos formuladores dos programas de combate à pobreza, ainda nos tempos do governo Fernando Henrique, Ricardo Paes de Barros deixou o governo Dilma neste ano e agora se debruça sobre políticas públicas para a educação, como economista-chefe do Instituto Ayrton Senna. PB, como é chamado, é engenheiro do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), tem mestrado em estatística, doutorado e pós-doutorado em economia pela Universidade de Chicago — templo do pensamento liberal - e pela Universidade Yale, ambas nos Estados Unidos. Hoje usa suas habilidades com números e õ conhecimento que adquiriu ao longo de 40 anos de estudos sobre a sociedade brasileira para avaliar as políticas de maior alcance, com menor custo, na educação brasileira. Na entrevista a seguir, fala sobre o Plano Nacional de Educação, o impacto da desigualdade no aprendizado e sobre quanto a ideologia atrapalha o país.

ÉPOCA - O problema da educação é falta de dinheiro ou de gestão?

Ricardo Paes de Barros - A meta é investir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação até 2024. Nenhum outro país coloca tanto dinheiro na área. Mas o Brasil tem a educação típica de um país que tem metade da renda per capita brasileira; está 25 anos atrás do Chile e tem apenas metade dos jovens cursando o ensino médio na idade certa. São problemas graves. Então, se pedirem 10% do PIB para mexer na educação, acho que a sociedade brasileira deve dar. Mas deve dar sob a condição de garantir que a situação mudará, com um plano sério, bem explicado, com metas.

ÉPOCA - Esse seria o objetivo do Plano Nacional de Educação (PNE), que passou a vigorar neste ano. Qual sua opinião sobre ele?

Paes de Barros - As metas do PNE são muito pouco ambiciosas para quem quer realmente dar um salto na área. Elas não botam o Brasil no mapa do mundo da educação mesmo que consigamos cumprir todas. Faltam no PNE evidências sobre a eficácia das ações que mudarão para melhor o cenário do país. O MEC tem de dizer: "Pegaremos esse dinheiro, faremos isso com ele e entregaremos este resultado. E se, no meio do caminho, não chegarmos lá, acionaremos uma outra coisa, que funcionará assim, custará tanto e produzirá tal efeito".

ÉPOCA - No ponto em que o Brasil está hoje, cuidar da educação é mais importante que cuidar da pobreza?

Paes de Barros - Em 2000, a gente tinha 15% da população extremamente pobre e 12% de analfabetos. Todo mundo acreditava que reduziríamos os analfabetos rapidamente porque o problema era focalizado e todos sabiam como fazer. Acreditavam que seria complexo reduzir a pobreza. No fim, a gente pegou aqueles 15% de pobres e rapidamente os levamos a 3%. E o analfabetismo ainda está em 9%. Hoje nossa revelada incompetência em melhorar em educação torna o problema mais desafiante e mais importante. Já temos uma política social supercapaz de atacar a miséria, mas os problemas da educação atingem muito mais gente do que a pobreza.

ÉPOCA - O que o senhor faria se estivesse no Ministério da Educação?

Paes de Barros- Cuidaria da difusão de melhores práticas. Num mesmo bairro temos escolas com nota 6 do índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que é uma boa nota, e outras com Ideb 3, que é péssima. Isso não faz sentido. Se uma empresa inventar uma coisa bacana, o que a concorrência fará? Copiará. Por que a escola de Ideb 3 não copia a vizinha de Ideb 6? A questão é que criamos um sistema de educação que não é público, é estatal, e não tem nenhuma dinâmica. O sucesso do Bolsa Família tem muito a ver com isso. No fundo, quem faz todo o trabalho do Bolsa Família ser um negócio localizado é o município, porque quem escolhe quem será cadastrado é ele. Vários municípios copiam as experiências dos outros, e o Bolsa Família funciona bem em todo o país.

ÉP - Essas boas práticas em educação não se disseminam por causa das desigualdades regionais?

Paes de Barros - Acho que não c esse o problema. O desempenho agregado de Pernambuco, Goiás e Rio de Janeiro em educação, na última década, é muito melhor que do resto do país. São Estados completamente diferentes. Agora, me diga por que o Espírito Santo não é igual ao Rio de Janeiro? Se Goiás fez, por que Tocantins e Mato Grosso não fizeram? Por que os municípios vizinhos a Sobral, no Ceará (outro caso de sucesso em educação), não vão lá entender o que eles fizeram para ter as melhores notas do Estado no ensino público?

EPOCA - E quanto a condição social influencia nessas disparidades na educação?

Paes de Barros - Muito mais do que deveria. Essa é uma das coisas que a gente deveria cobrar do governo. Esse é um ponto que está muito pouco contemplado no Plano Nacional da Educação. É absurdo que o aprendizado de uma criança esteja condicionado ao lugar em que ela vive, ao fato de ela ser pobre ou rica, branca ou negra. O sistema educacional brasileiro permite que essas características tenham um impacto gigantesco no aprendizado do aluno. Isso é uma fonte de desigualdade de oportunidade absurda, que alimentará uma desigualdade ainda maior no futuro.

ÉPOCA -O que pode ser feito para resolver esse problema?

Paes de Barros - Se for bem planejada c bem implementada, a educação de tempo integral pode reduzir essa desigualdade. Ela pode dar ao aluno mais pobre aquilo que uma família em melhores condições oferece para uma criança e que tem tanto impacto positivo no aprendizado. Se numa família mais rica a criança tem acesso a um lugar iluminado e tranquilo para estudar, é isso que a escola tem de ter. A escola tem de desenhar mecanismos para tornar a educação mais independente do ambiente familiar. Tem de dizer para o pai: eu só preciso que o senhor faça a criança dormir cedo, faça ela se alimentar bem e seja carinhoso e encorajador. Não adianta pedir para o pai estudar com ele, para fazer pesquisas em livros a que ele não tem acesso. É preciso cuidar também da autoeficácia. O aluno bom é aquele que acredita que é capaz de aprender. O aluno confiante que tem um professor que acredita nele vai aprender muito mais.

ÉPOCA - O senhor é um entusiasta da ideia de que os esforços de educação devem ser concentrados nos primeiros anos de vida da criança. A principal meta do governo para a primeira infância é a criação de milhares de creches. É o caminho certo?

Paes de Barros - Essa é uma questão importante e muito complexa. A creche não é a solução para todas as crianças. Mães e pais, em suas casas, com suporte do Estado, com atendimento médico, podem promover o desenvolvimento fantástico da criança. Um exemplo é o Primeira Infância Melhor, do Rio Grande do Sul. É um programa de visitação domiciliar, de um profissional que vai observar a criança e dar orientação para a família de como cuidar dela. O plano do governo diz que, daqui a dez anos, teremos 50% das crianças nas creches. Mas o que precisamos é de um plano que cuide de 100% das crianças aqui e agora. Precisamos de um programa em que os agentes de saúde olhem pelo desenvolvimento das crianças e orientem as famílias. Ninguém no mundo cuidou da primeira infância colocando todas as crianças em creches de tempo integral. A creche é uma resposta para as crianças pequenas de mães pobres que trabalham. Para esse público, é uma opção eficaz. A creche aumenta mais a renda da família que o Bolsa Família. E faz isso de forma autônoma. Agora, existe um problema com as creches no Brasil que chega a ser uma maluquice: a maior parte das creches públicas é usada por mães que não trabalham. Existe hoje espaço nas creches brasileiras para abrigar a vasta maioria das mães pobres que trabalham. Mas não se dá prioridade a elas. O Ministério Público diz que o direito à creche é universal. Ocorre que quem tem tempo para pegar a fila da creche, quem vai lá no Ministério Público reclamar que quer creche, é a mãe que não trabalha. A política de creches deveria ser focalizada em quem precisa.

ÉPOCA - Na criação do Bolsa Família, houve resistência de setores do governo Lula ao programa por se tratar de uma política focalizada, considerada neoliberal por eles. Ainda há preconceito contra as políticas de focalização?

Paes de Barros - Esse debate sobre a focalização foi superado. O que continua a existir é uma coisa discriminatória contra o setor privado. A educação claramente discrimina a universidade privada diante da pública, como se, por definição, algo estatal fosse melhor do que o privado. O programa nacional de alfabetização, por exemplo, tem de ser com as universidades públicas, e não com as privadas. Por quê? É pura discriminação - e ela tem de ser contestada. Há a ideia de que privatizar parte da educação é mercantilizar o setor. Esse é o grande nó dos serviços públicos do Brasil. Na educação essa mentalidade é brutal e representa um grande problema. Não se pode usar o Fundeb (fundo de financiamento para a educação básica) para contratar uma rede de escolas de educação média para prover os serviços de um Estado. Um Estado poderia gastar menos contratando uma rede de ensino particular. Ele não se preocuparia com infraestrutura, nem com o quadro de docentes. O loco do Estado seria o controle da qualidade do ensino. Isso economizaria dinheiro e dor de cabeça. Imagina isso no Estado de São Paulo, que tem mais de 200 mil professores. As Organizações Sociais (OS) deram certo na saúde. Mas não se pode usar OS na educação. Não podemos testar o modelo de charters schools no Brasil, que são escolas privadas pagas em parte pelo governo e gratuitas para a população. Na Colômbia estão fazendo isso. A Suécia está se livrando de todas as escolas públicas. O país paga para a rede privada prover o estudo. Para a família é gratuito — e só o que importa é a qualidade.

ÉPOCA - Apesar da discriminação contra o setor privado, o Bolsa Família, formulado por liberais como o senhor, se transformou em uma vitrine dos governos do PT. O senhor se ressente por isso?

Paes de Barros - Não tenho problema nenhum com essa apropriação. Na verdade, é o contrário. Eu gostaria que eles tivessem se apropriado de outras ideias minhas. Foi um privilégio poder ter contribuído de alguma forma com a mudança social que ocorreu nos últimos anos. O presidente Lula fez coisas surpreendentes nesse sentido. Ele tem o mérito fantástico de ter escutado os caras mais variados da face da terra. Saiu copiando ideia de tudo que é lugar, coisas dramaticamente diferentes, filosófica e ideologicamente contrárias. O ProUni, que concede bolsas de estudo em rede privada, e o ProUni, que é a expansão das universidades públicas, são contradições frontais. O Fernando Henrique escolheria um dos dois, nunca faria os dois. O Lula não tinha muita ideologia. Ele tinha um senso prático e uma vontade de melhorar a vida das pessoas. Se você me perguntar por que a desigualdade caiu no Brasil, direi que não sei a razão e que isso é ótimo. Quando se sabe o motivo do crescimento econômico, isso significa que ele não será sustentável. Não tem nenhuma indústria que mantenha o crescimento de um país por um longo período. Quando é algo espalhado, misturado, que não dá para dizer que foi A, B ou C, é positivo, porque foi algo que aconteceu em todos os setores, por todo o país.

ÉPO - Quais das suas ideias o senhor se ressente por não terem sido implementadas?

Paes de Barras - A principal foi a da junção de toda a política de transferência. Unir o seguro-desemprego com o Bolsa Família. Hoje, o beneficiário que conseguir um emprego formal perde o direito ao benefício. Se ele perder o emprego, não o ganha de volta. A gente tem de construir um sistema que junte isso tudo num programa que estimule o trabalho e a formalização. Da forma como está, ele desestimula o cidadão a ser formal, ou a voltar a trabalhar. Passei o último governo inteiro tentando emplacar esse plano, mas não fui ouvido. Desenvolvi outro programa para a população isolada na área de fronteira do país que garante a permanência nessa faixa. Temos 600 mil pessoas lá. Na próxima geração, não teremos ninguém. Isso será um problemão para o Brasil.

ÉPO - Tivemos vários ganhos na redução de desigualdade nos últimos 20 anos. Essas conquistas estão em risco com a crise que o país está vivendo agora?

Paes de Barros - Os ganhos sociais são muito sólidos. Não acho que corremos muito risco. A crise que temos é inventada por nós mesmos. Não temos crise por causa de desastre natural, ou alguma doença, ou algum inimigo que causou alguma coisa. É um desarranjo institucional. Fomos muito desorganizados, gastamos mais do que tínhamos. Dado isso, essa crise teria tudo para ser de curta duração. Seria o caso de chamar todo mundo, organizar e proteger a renda dos mais pobres. Metade da população brasileira tem menos de 20% da renda brasileira. É fácil proteger 20% da renda brasileira. Porque se a renda brasileira precisar cair 4%, basta os outros 80% perderem 5% que a renda dos mais pobres não precisa cair nada. Num país com uma política social poderosa como a do Brasil, dá para blindar os pobres. Para isso precisamos de um corte orçamentário cuidadoso. Agora, estamos caminhando para a direção errada. Fizemos cortes toscos, no abono salarial e no seguro-desemprego, que poderiam ser alterados de outra forma. E transformamos uma crise que poderia ser de curta duração em algo de média duração. Falta coesão e uma liderança que junte todo mundo em torno de uma mesa para fazer um ajuste sério. Hoje é como se estivéssemos numa enchente desastrosa, com água até o joelho, e a oposição quer sentar numa mesa boiando na enchente para discutir quem é o culpado, em vez de correr para escoar a água.

Chapolim Colorado descolora na crise brasileira - Rodolfo Amstalden (Empiricus)

O analista de negócios revela ser um admirador do Chávez, não o aloprado bolivariano, obviamente, mas o simpático heroi mexicano dos fracos e oprimidos.
Pois é: quem poderá nos salvar?
No momento ninguém.
Então vamos rir um pouco, pelo menos dos títulos...
Paulo Roberto de Almeida


Empiricus - Rodolfo Amstalden

00:06 - Quem poderá me defender?

Há quem diga que o pior já passou.

Reforma ministerial de repente é tratada como a solução de todos os problemas da nação.

Isso para mim é um grande mistério.

Será que a troca de ministros seria capaz de animar as expectativas de mercado?

Segundo o Focus publicado pela manhã:

- IPCA esperado 2015 aumentou para 9,32%; é a 17ª semana consecutiva de alta.

- IPCA esperado 2016 aumentou para 5,43%, embora o Bacen ignore essa variável irrelevante.

- PIB em contração de -1,97% em 2015 e zerado em 2016.

Há também um risco gigantesco de que o Brasil vire junk.

E, depois do employment report de sexta, Wall Street passa a ver 56% de probabilidade de juros americanos elevados em setembro.

01:15 - Sigam-me os bons

O contrato DI de janeiro de 2017 disparou 88 pontos na semana passada, em seu maior salto semanal desde o ocasionado pelos protestos de 2013.

Papéis pós-fixados de dez anos rendem em torno de 14% ao ano, a segunda maior taxa de mercados emergentes, perdendo apenas para a Nigéria.

NTN-B (Tesouro IPCA) passou a oferecer juros reais acima de 7,00% ao ano.

Quem é que vai bater essa renda fixa tão gorda?

A Bolsa brasileira precisa ceder um pouco mais para se equiparar às gostosuras do Tesouro Direto.

02:23 - Ninguém tem paciência comigo

Ibovespa começa a semana negociando um pouco acima de 11x os lucros esperados para 2015.

Está suficientemente barato?

A média histórica dos últimos cinco anos descreve um múltiplo de 10x.

Teríamos que nos situar pelo menos em cima dessa média.

Como agravante, a tal média histórica dos últimos cinco anos não competia com juros de 14%.

Logo, teríamos que nos situar pelo menos um pouco abaixo dessa média.

Portanto, 11x lucros não é uma coisa assim que se diga, supimpa, mas que ótimo trabalho! - mas é melhor do que nada.

03:22 - Você me deixa louco

Nossa Bolsa se divide entre o Bom Ibovespa e o Mau Ibovespa.

Quem a considera barata ao valuation de 11x entende que o Mau Ibovespa, por ser cíclico, um dia se recupera.

Afinal, ainda existe muito petróleo e minério de ferro para se extrair do solo brasileiro.

Fico pensando no que isso significa a médio prazo.

No século XIX, a Califórnia se destacava pelas jazidas repletas de toneladas de ouro.

No século XXI, a Califórnia se destaca pelo Vale do Silício, cujo valor independe inclusive de reservas de silício.

A riqueza não se esconde mais debaixo da terra; está na cabeça das pessoas e no uso eficiente de tecnologia.
 
04:26 - Não são pedras, são aerolitos

A Receita Federal publicou novas classes de estatísticas das declarações de imposto de renda - talvez fomentada por demandas pikettyanas.

Descobriu-se o óbvio.

Existe um grupo de contribuintes muito pequeno - de apenas 71 mil pessoas - que ganha mais de 160 salários mínimos por mês.

São pessoas que possuem participação acionária em empresas, recebendo lucros e dividendos “não-tributáveis” (pois já são tributados no âmbito corporativo).

Ao conhecer essa informação, você pode reagir de três formas:

1) Morrer de inveja.

2) Tributar ainda mais essas pessoas, comprometendo empregos e investimentos.

3) Tornar-se uma dessas pessoas.

A terceira alternativa é - de longe - a que me parece mais inteligente.