...esta nota da Economist deve lembrar que "monopolios" na era das tecnologias de informção e comunicação, nunca são eternos:
Microsoft launched Windows Phone 7, its new operating system for mobile phones. The company lags behind its competitors, such as Apple and Research in Motion, and currently accounts for just 5% of the smart-phone market.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Nacionalismo canhestro e irracionalidade economica: por que governos sempre tem de ser esquizofrenicos?
Leio, numa nota qualquer, dessas que a gente percorre displicentemente ao processar materiais que recebe pela internet, uma informação sobre a disposição de um governo do continente que fatalmente dividimos com outros povos -- mas a mesma realidade existe no Brasil também -- de apertar os parafusos em matéria de "nacionalismo fundiário".
Segundo a nota, esse governo pretende solicitar a seus aliados no parlamento...
a tarefa de elaborar projeto de lei para conter processo de aquisição de terras por estrangeiros. A alta produtividade das terras do país teria atraído a atenção do agronegócio internacional, com conseqüente sobrevalorização das propriedades rurais e desestímulo a compras por produtores [nacionais]. [O presidente] tem manifestado preocupação com os riscos à soberania decorrentes da venda de terras a empresas multinacionais e, especialmente, a outros Estados.
Bem, o mesmo já ocorreu no Brasil, como todos sabem, onde o governo, alarmado politicamente com a informação que estrangeiros [bem, se tratava de um povo que era, em princípio, "aliado estratégico" do Brasil] estavam comprando terras "demais", resolveu colocar um limite a essas aquisições, numa típica medida de nacionalismo fundiário, e de simples contravenção ao princípio do tratamento nacional -- que prometemos respeitar no âmbito de nossos compromissos internacionais, especialmente no GATT-OMC -- que promete ser prejudicial aos interesses nacionais, e à economia como um todo.
Eu perguntaria simplesmente o seguinte, a esses presidentes, a esses legisladores e a todos os nacionalistas fundiários:
1) Vocês acham que os estrangeiros vão pegar as terras e sair correndo do país?
2) Vocês acham que eles vão deixar as terras inativas, apenas para fins de especulação, em lugar de produzir e retirar o seu lucro? Eles deixariam de cumprir a famosa "função social da propriedade", esse monumento à boçalidade jurídica e econômica de nossa Constituição?
3) Vocês não acham que é um fato economicamente positivo a valorização das terras nacionais, pois isso traduz, no mundo econômico, a famosa lei, bastante simples, na verdade, da oferta e da procura? Ou seja, a valorização das terras nacionais, procuradas por gregos e goianos, ou melhor, por nacionais e estrangeiros, representa, de fato, uma valorização dos ativos nacionais e constitui, portanto, um fato eminentemente positivo na vida econômica nacional. Isso não é bom?
4) Vocês não acham bom que estrangeiros venham até nosso país, se dediquem a comprar terras, a produzir e a exportar, seja para onde for, e que isso aumente o PIB nacional, as exportações, a riqueza e a renda dos nacionais, do país? O que haveria de fundamentalmente negativo na exploração econômica racional, de acordo com as leis nacionais, de terras produtivas por estrangeiros?
5) Vocês não acham que está na hora de acabar com essa mentalidade canhestra, esse nacionalismo rastaquera, esse protecionismo idiota que consiste em achar que terras nacionais só podem ser exploradas (ou não) pelos nacionais?
6) O que existe de basicamente errado em pretender produzir e exportar no país? Os recursos para isso seriam indesejáveis, o processo todo danoso para o país?
7) Onde vocês colocam a racionalidade econômica em todas essas medidas que vocês concebem e tentam colocar em prática?
Não tenho nenhuma ilusão que a mentalidade desses governantes venha a mudar, any time soon.
Como lembrava alguém, subdesenvolvimento não é apenas uma questão material, é também uma questão de mentalidade.
Atraso intelectual e simples incapacidade de raciocinar corretamente são dois traços distintivos de nosso subdesenvolvimento mental...
Triste...
Paulo Roberto de Almeida
(Beijing, 15.10.2010)
Segundo a nota, esse governo pretende solicitar a seus aliados no parlamento...
a tarefa de elaborar projeto de lei para conter processo de aquisição de terras por estrangeiros. A alta produtividade das terras do país teria atraído a atenção do agronegócio internacional, com conseqüente sobrevalorização das propriedades rurais e desestímulo a compras por produtores [nacionais]. [O presidente] tem manifestado preocupação com os riscos à soberania decorrentes da venda de terras a empresas multinacionais e, especialmente, a outros Estados.
Bem, o mesmo já ocorreu no Brasil, como todos sabem, onde o governo, alarmado politicamente com a informação que estrangeiros [bem, se tratava de um povo que era, em princípio, "aliado estratégico" do Brasil] estavam comprando terras "demais", resolveu colocar um limite a essas aquisições, numa típica medida de nacionalismo fundiário, e de simples contravenção ao princípio do tratamento nacional -- que prometemos respeitar no âmbito de nossos compromissos internacionais, especialmente no GATT-OMC -- que promete ser prejudicial aos interesses nacionais, e à economia como um todo.
Eu perguntaria simplesmente o seguinte, a esses presidentes, a esses legisladores e a todos os nacionalistas fundiários:
1) Vocês acham que os estrangeiros vão pegar as terras e sair correndo do país?
2) Vocês acham que eles vão deixar as terras inativas, apenas para fins de especulação, em lugar de produzir e retirar o seu lucro? Eles deixariam de cumprir a famosa "função social da propriedade", esse monumento à boçalidade jurídica e econômica de nossa Constituição?
3) Vocês não acham que é um fato economicamente positivo a valorização das terras nacionais, pois isso traduz, no mundo econômico, a famosa lei, bastante simples, na verdade, da oferta e da procura? Ou seja, a valorização das terras nacionais, procuradas por gregos e goianos, ou melhor, por nacionais e estrangeiros, representa, de fato, uma valorização dos ativos nacionais e constitui, portanto, um fato eminentemente positivo na vida econômica nacional. Isso não é bom?
4) Vocês não acham bom que estrangeiros venham até nosso país, se dediquem a comprar terras, a produzir e a exportar, seja para onde for, e que isso aumente o PIB nacional, as exportações, a riqueza e a renda dos nacionais, do país? O que haveria de fundamentalmente negativo na exploração econômica racional, de acordo com as leis nacionais, de terras produtivas por estrangeiros?
5) Vocês não acham que está na hora de acabar com essa mentalidade canhestra, esse nacionalismo rastaquera, esse protecionismo idiota que consiste em achar que terras nacionais só podem ser exploradas (ou não) pelos nacionais?
6) O que existe de basicamente errado em pretender produzir e exportar no país? Os recursos para isso seriam indesejáveis, o processo todo danoso para o país?
7) Onde vocês colocam a racionalidade econômica em todas essas medidas que vocês concebem e tentam colocar em prática?
Não tenho nenhuma ilusão que a mentalidade desses governantes venha a mudar, any time soon.
Como lembrava alguém, subdesenvolvimento não é apenas uma questão material, é também uma questão de mentalidade.
Atraso intelectual e simples incapacidade de raciocinar corretamente são dois traços distintivos de nosso subdesenvolvimento mental...
Triste...
Paulo Roberto de Almeida
(Beijing, 15.10.2010)
Direita e esquerda no continente: o simplismo atroz de certas "analises" politicas
Recebi, como sempre recebo, consultas de jornalistas sobre a realidade política nacional e internacional do Brasil e de outros países, para fins de elaboração de matérias de imprensa. Respondo, como sempre, objetivamente, dizendo como vejo ou como interpreto tal ou qual fenômeno ou processo político ou social, nacional ou internacional.
Geralmente, são questões objetivas, "matter of fact", como se costuma dizer no jornalismo anglo-saxão, que SEPARA SEMPRE, e de modo claro, o que é reportagem, ou seja, simples exposição de fatos objetivos, que estão ocorrendo no país e no mundo, do que é análise, ou opinião, que são considerações sobre esses mesmos fatos e processos.
Infelizmente, esse não é o caso de jornalistas brasileiros, que parece não terem aprendido nas faculdades de jornalismo do Brasil -- que acho que não mereceriam esse nome, e que a rigor talvez nem deveriam existir -- essa separação elementar entre fato e opinião.
Por isso, recusei-me a participar de um exercício que reputo viciado e deformado desde a origem.
Reproduzo aqui as perguntas do jornalista e minhas respostas:
Direita e esquerda no continente: contra o simplismo
Paulo Roberto de Almeida
Começo pela transcrição da consulta:
On Oct 15, 2010, at 3:46 AM, Xxxxx Xxxxx wrote:
Mensagem enviada pelo formulário de Contato do SITE.
Nome: Xxxxx Xxxxxx
Cidade: Xxxxxxx
Estado: XX
Email: xxxxxxx@xxxxxxxxxxx.com.br
Assunto: Sem assunto
Mensagem: Prezado Paulo Roberto,
Estou fazendo uma matéria sobre a direita na América Latina, tentando estabelecer uma relação entre os recentes indícios de perda de poder da esquerda no continente, e de recuperação de espaço da direita. Gostaria de lhe fazer as seguintes perguntas:
- A eleição de Juan Manuel Santos, na Colômbia, e o recente flerte do candidato à presidência José Serra com a direita, haja vista as declarações do candidato Indio da Costa e a polêmica recente em torno do aborto, podem indicar uma nova onda da direita na América Latina?
- Esses indícios estariam em linha com o crescimento da onda conservadora global, percebida pelo fortalecimento da direita europeia e do Tea Party nos EUA?
- Ao mesmo tempo, é possível dizer que a esquerda bolivariana da latino-americana está enfraquecida? Dado o fortalecimento da oposição na Venezuela? Podemos prever nesses países um retorno da direita ao poder?
- Como essa nova onda afeta a geopolítica latino-americana? Podemos ver, no futuro um fortalecimento dos Estados Unidos na região?
- Como a política externa brasileira poderia mudar, em caso da eleição de José Serra para presidente? O senhor o vê como um líder conservador? Ou mais conservador que Dilma?
Desde já, agradeço,
Xxxxx Xxxxxx
Minha resposta: [PRA]
Xxxxx Xxxxxx,
O que voce me coloca nao são simples questoes, mas uma análise política completa do continente e do Brasil.
Devo dizer, antes de tudo, que sou contra simplificações e maniqueísmos tipicos de certa "ciência social" que olha o mundo sempre pelo prisma da divisão anacrônica e totalmente acadêmica de direita e esquerda. Os votantes, em todos os países, quando fazem suas escolhas, não estao, em sua imensa maioria, decidindo academicamente entre um candidato de direita ou outro de esquerda, mas sim pretendendo escolher aquele que vai melhorar suas vidas. Isto é elementar. Quem classifica os candidatos entre esquerda e direita sao os acadêmicos e os jornalistas, ambos simplisticamente.
Como voce vê, sou contra essas premissas das quais vc parte e que devem guiar sua matéria, por isso não pretendo participar com opiniões ou observações minhas tendo esse diapasão. Aliás, se quiser justamente usar meu argumento acima para introduzir um elemento de caução analítica na sua matéria, por favor, sinta-se à vontade.
Quem vê "flerte de Serra com a direita", numa classificação totalmente esquizofrênica, é você, não eu, e acho esse tipo de análise totalmente equivocada. Só quem vê o mundo por esse prisma, pode identificar oposição ao aborto como um posicionamento à "direita", seja lá o que isso queira dizer. Acho isso inaceitável no plano dos procedimentos corretos de análise política e até de metodologia de trabalho.
"Onda conservadora global": realmente isso é simplismo extremo, e totalmente equivocado. Pessoas, comunidades votam com base nos problemas locais e nacionais, não tendo suporte em ideologias. Mais uma vez o reducionismo desse tipo de análise é atroz.
Achar que a "esquerda bolivariana" está enfraquecida, por causa do avanço dos votos contrários a Chávez na Venezuela, e que a "direita" pode voltar ao poder é de uma miopia que condiz com toda essa visão do mundo, que encontro totalmente equivocada.
Quem diz que Serra seria mais "conservador" em politica externa do que Dilma é você, e acho isso simplesmente patético em termos de abordagem das questões de política externa (e outras, certamente), que acha que Lula, e supostamente Dilma, fez ou faria uma politica de "esquerda" ou "progressista". Esses rótulos são tão canhestros, que prefiro não participar de um exercício de reducionismo analítico e de simplificação política como o que vc pretende fazer.
Por favor, take me out dessa matéria, mantenha-me fora.
Digo isso não por antipatia por você, pelo jornal, ou por qualquer motivo "bilateral", mas por discordar completamente da abordagem e das premissas. É meu direito manter uma postura que considero como de simples honestidade intelectual, não coonestando análises que encontro equivocadas em seus fundamentos analíticos, e não apenas quanto ao fundo da matéria.
---------------------
Paulo Roberto Almeida
Geralmente, são questões objetivas, "matter of fact", como se costuma dizer no jornalismo anglo-saxão, que SEPARA SEMPRE, e de modo claro, o que é reportagem, ou seja, simples exposição de fatos objetivos, que estão ocorrendo no país e no mundo, do que é análise, ou opinião, que são considerações sobre esses mesmos fatos e processos.
Infelizmente, esse não é o caso de jornalistas brasileiros, que parece não terem aprendido nas faculdades de jornalismo do Brasil -- que acho que não mereceriam esse nome, e que a rigor talvez nem deveriam existir -- essa separação elementar entre fato e opinião.
Por isso, recusei-me a participar de um exercício que reputo viciado e deformado desde a origem.
Reproduzo aqui as perguntas do jornalista e minhas respostas:
Direita e esquerda no continente: contra o simplismo
Paulo Roberto de Almeida
Começo pela transcrição da consulta:
On Oct 15, 2010, at 3:46 AM, Xxxxx Xxxxx wrote:
Mensagem enviada pelo formulário de Contato do SITE.
Nome: Xxxxx Xxxxxx
Cidade: Xxxxxxx
Estado: XX
Email: xxxxxxx@xxxxxxxxxxx.com.br
Assunto: Sem assunto
Mensagem: Prezado Paulo Roberto,
Estou fazendo uma matéria sobre a direita na América Latina, tentando estabelecer uma relação entre os recentes indícios de perda de poder da esquerda no continente, e de recuperação de espaço da direita. Gostaria de lhe fazer as seguintes perguntas:
- A eleição de Juan Manuel Santos, na Colômbia, e o recente flerte do candidato à presidência José Serra com a direita, haja vista as declarações do candidato Indio da Costa e a polêmica recente em torno do aborto, podem indicar uma nova onda da direita na América Latina?
- Esses indícios estariam em linha com o crescimento da onda conservadora global, percebida pelo fortalecimento da direita europeia e do Tea Party nos EUA?
- Ao mesmo tempo, é possível dizer que a esquerda bolivariana da latino-americana está enfraquecida? Dado o fortalecimento da oposição na Venezuela? Podemos prever nesses países um retorno da direita ao poder?
- Como essa nova onda afeta a geopolítica latino-americana? Podemos ver, no futuro um fortalecimento dos Estados Unidos na região?
- Como a política externa brasileira poderia mudar, em caso da eleição de José Serra para presidente? O senhor o vê como um líder conservador? Ou mais conservador que Dilma?
Desde já, agradeço,
Xxxxx Xxxxxx
Minha resposta: [PRA]
Xxxxx Xxxxxx,
O que voce me coloca nao são simples questoes, mas uma análise política completa do continente e do Brasil.
Devo dizer, antes de tudo, que sou contra simplificações e maniqueísmos tipicos de certa "ciência social" que olha o mundo sempre pelo prisma da divisão anacrônica e totalmente acadêmica de direita e esquerda. Os votantes, em todos os países, quando fazem suas escolhas, não estao, em sua imensa maioria, decidindo academicamente entre um candidato de direita ou outro de esquerda, mas sim pretendendo escolher aquele que vai melhorar suas vidas. Isto é elementar. Quem classifica os candidatos entre esquerda e direita sao os acadêmicos e os jornalistas, ambos simplisticamente.
Como voce vê, sou contra essas premissas das quais vc parte e que devem guiar sua matéria, por isso não pretendo participar com opiniões ou observações minhas tendo esse diapasão. Aliás, se quiser justamente usar meu argumento acima para introduzir um elemento de caução analítica na sua matéria, por favor, sinta-se à vontade.
Quem vê "flerte de Serra com a direita", numa classificação totalmente esquizofrênica, é você, não eu, e acho esse tipo de análise totalmente equivocada. Só quem vê o mundo por esse prisma, pode identificar oposição ao aborto como um posicionamento à "direita", seja lá o que isso queira dizer. Acho isso inaceitável no plano dos procedimentos corretos de análise política e até de metodologia de trabalho.
"Onda conservadora global": realmente isso é simplismo extremo, e totalmente equivocado. Pessoas, comunidades votam com base nos problemas locais e nacionais, não tendo suporte em ideologias. Mais uma vez o reducionismo desse tipo de análise é atroz.
Achar que a "esquerda bolivariana" está enfraquecida, por causa do avanço dos votos contrários a Chávez na Venezuela, e que a "direita" pode voltar ao poder é de uma miopia que condiz com toda essa visão do mundo, que encontro totalmente equivocada.
Quem diz que Serra seria mais "conservador" em politica externa do que Dilma é você, e acho isso simplesmente patético em termos de abordagem das questões de política externa (e outras, certamente), que acha que Lula, e supostamente Dilma, fez ou faria uma politica de "esquerda" ou "progressista". Esses rótulos são tão canhestros, que prefiro não participar de um exercício de reducionismo analítico e de simplificação política como o que vc pretende fazer.
Por favor, take me out dessa matéria, mantenha-me fora.
Digo isso não por antipatia por você, pelo jornal, ou por qualquer motivo "bilateral", mas por discordar completamente da abordagem e das premissas. É meu direito manter uma postura que considero como de simples honestidade intelectual, não coonestando análises que encontro equivocadas em seus fundamentos analíticos, e não apenas quanto ao fundo da matéria.
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Paulo Roberto Almeida
Campanha etilico-surrealista: confesso que nao entendi nada...
Eu bem que me esforço por entender o que leio, mas confesso que estas palavras, estes argumentos, expedidos por alguém que fala muito, demais, escapam ao meu simples modo de raciocínio linear, lógico, direto.
Como diriam os franceses: ça me dépasse...
Enfim, se alguém entendeu me avise, por favor...
Paulo Roberto de Almeida
No Piauí, Lula compara tucanos a 'gente do mal'
Maiá Menezes
O Globo, 14.10.2010
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou nesta quarta-feira, sem citar nomes, os tucanos de "gente do mal", ao comparar os projetos políticos do PSDB e o seu desempenho como presidente.
Em discurso para cerca de dez mil pessoas, na Avenida Marechal Castelo Branco, em Teresina, Lula fez elogios à beleza de Dilma três vezes e atacou o adversário:
- O que está em jogo são dois projetos. Um que está aí desde que Cabral descobriu. Os de sempre mandando, ganhando, perdendo. Agradeço aos votos que vcs não deram a mim, mas também aos votos que vocês não deram a eles. Porque essa gente foi do mal com o povo pobre. Em 2006, eles acabaram com o CPMF. Eles tiraram esse imposto, R$ 120 bilhões em quatro anos, achando que iriam prejudicar o Lula. Mas o Lula não foi prejudicado porque pode pagar plano. Prejudicaram as pessoas mais pobres, que precisam do SUS. Eu disse a eles: nas eleições, eles vão ter o troco. E em 2006, no Piauí, tiveram.
Lula, ao lado de Dilma, que discursara antes, afirmou que a hora é de comparar projetos, mais que pessoas:
- Se a gente achar que a disputa que está em jogo é apenas a disputa entre a candidata Dilma e o candidato de lá a gente vai cometer um engano muito grande. Não é a disputa entre um homem e uma mulher. Se fosse só isso, eu ainda assim preferia essa mulher do que aquele homem para presidir o destino do meu país. Porque conheço a sensibilidade de cada um. Conheço a alma e a cabeça dos dois e é por isso que acho que ela é infinitamente melhor para o país.
Ele também afirmou que o PSDB foi contra políticas de inclusão:
- Vocês sabem como era o Nordeste e a vida do povo mais pobre antes de eu chegar à Presidência. Quando criamos o Bolsa Família, os de lá diziam que era esmola e que a gente estava fazendo populismo. Eles não têm noção do que significa R$ 100 para uma pessoa pobre. Eles dão de gorjeta quanto tomam de uísque. Vocês sabem como era o desemprego nesse país antes de eu chegar à Presidência. Vocês sabem a destruição das empresas brasileiras. Como andava o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, até a Petrobras eles tentaram mudar de nome. Vocês sabem quantos investimentos deixaram de vir para o Piauí antes de eu ser presidente, porque as pessoas diziam que não iam investir aqui porque o Nordeste não ia para a frente.
Mais uma vez lamentando sua foto não ter estado nas urnas, nessa eleição, Lula afirmou que "o espírito democrático" o levou a optar por apoiar uma candidata em vez de optar pela reeleição:
- Como somos democratas e queremos fortalecer a democracia trocamos prazerozamente a voz de taquara rachada de um homem por uma mulher mineira, gaúcha, puiauisense,que tem competência para dirigir o país nos proximos anos.
===========
Retomando:
Acho que sei porque a candidata oficial caiu tanto, e porque os discursos desse personagem surrealista que está aí acima não convence mais: As pessoas são espertas, apesar de que alguns espertos querem fazê-las de idiotas. As pessoas percebem quando estão tentando enganá-las, com palavras vazias... Elas devem dizer: "Essa aí pensa que somos uns idiotas?"
Por outro lado, o maniqueismo, a simplificação e a falsidade, mentiras mesmo, de quem expede os conceitos são atrozes. Confesso que eu esperava um pouco mais de respeito aos fatos por parte de quem preside aos destinos do país.
Como diriam os franceses: ça me dépasse...
Enfim, se alguém entendeu me avise, por favor...
Paulo Roberto de Almeida
No Piauí, Lula compara tucanos a 'gente do mal'
Maiá Menezes
O Globo, 14.10.2010
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou nesta quarta-feira, sem citar nomes, os tucanos de "gente do mal", ao comparar os projetos políticos do PSDB e o seu desempenho como presidente.
Em discurso para cerca de dez mil pessoas, na Avenida Marechal Castelo Branco, em Teresina, Lula fez elogios à beleza de Dilma três vezes e atacou o adversário:
- O que está em jogo são dois projetos. Um que está aí desde que Cabral descobriu. Os de sempre mandando, ganhando, perdendo. Agradeço aos votos que vcs não deram a mim, mas também aos votos que vocês não deram a eles. Porque essa gente foi do mal com o povo pobre. Em 2006, eles acabaram com o CPMF. Eles tiraram esse imposto, R$ 120 bilhões em quatro anos, achando que iriam prejudicar o Lula. Mas o Lula não foi prejudicado porque pode pagar plano. Prejudicaram as pessoas mais pobres, que precisam do SUS. Eu disse a eles: nas eleições, eles vão ter o troco. E em 2006, no Piauí, tiveram.
Lula, ao lado de Dilma, que discursara antes, afirmou que a hora é de comparar projetos, mais que pessoas:
- Se a gente achar que a disputa que está em jogo é apenas a disputa entre a candidata Dilma e o candidato de lá a gente vai cometer um engano muito grande. Não é a disputa entre um homem e uma mulher. Se fosse só isso, eu ainda assim preferia essa mulher do que aquele homem para presidir o destino do meu país. Porque conheço a sensibilidade de cada um. Conheço a alma e a cabeça dos dois e é por isso que acho que ela é infinitamente melhor para o país.
Ele também afirmou que o PSDB foi contra políticas de inclusão:
- Vocês sabem como era o Nordeste e a vida do povo mais pobre antes de eu chegar à Presidência. Quando criamos o Bolsa Família, os de lá diziam que era esmola e que a gente estava fazendo populismo. Eles não têm noção do que significa R$ 100 para uma pessoa pobre. Eles dão de gorjeta quanto tomam de uísque. Vocês sabem como era o desemprego nesse país antes de eu chegar à Presidência. Vocês sabem a destruição das empresas brasileiras. Como andava o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, até a Petrobras eles tentaram mudar de nome. Vocês sabem quantos investimentos deixaram de vir para o Piauí antes de eu ser presidente, porque as pessoas diziam que não iam investir aqui porque o Nordeste não ia para a frente.
Mais uma vez lamentando sua foto não ter estado nas urnas, nessa eleição, Lula afirmou que "o espírito democrático" o levou a optar por apoiar uma candidata em vez de optar pela reeleição:
- Como somos democratas e queremos fortalecer a democracia trocamos prazerozamente a voz de taquara rachada de um homem por uma mulher mineira, gaúcha, puiauisense,que tem competência para dirigir o país nos proximos anos.
===========
Retomando:
Acho que sei porque a candidata oficial caiu tanto, e porque os discursos desse personagem surrealista que está aí acima não convence mais: As pessoas são espertas, apesar de que alguns espertos querem fazê-las de idiotas. As pessoas percebem quando estão tentando enganá-las, com palavras vazias... Elas devem dizer: "Essa aí pensa que somos uns idiotas?"
Por outro lado, o maniqueismo, a simplificação e a falsidade, mentiras mesmo, de quem expede os conceitos são atrozes. Confesso que eu esperava um pouco mais de respeito aos fatos por parte de quem preside aos destinos do país.
Candidaturas brasileiras em OIs: nao se pode ganhar em todas...
...mas, pensando bem, o Brasil ganhou alguma?
Paulo Roberto de Almeida
Brasileiro perde disputa por cargo da UIT
Valor Economico, 14/10/2010
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdeu mais uma disputa por um cargo na burocracia internacional. Agora foi o posto estratégico de diretor do Departamento de Radiodifusão, da União Internacional de Telecomunicações (UIT), numa votação que mobilizou 157 países membros da entidade, numa conferência no México.
O candidato brasileiro Fábio Leite obteve 67 votos, diante de 90 do francês François Rancy. E, apesar do crescente engajamento do governo brasileiro na África, foram justamente os países africanos que deram os votos que foram decisivos para a vitória do candidato francês na segunda rodada da votação.
Essa diretoria da UIT gerencia a atribuição de frequências radioelétricas e de órbitas de satélites e da qual depende a indústria de "wireless", que fatura quase US$ 50 bilhões por ano em todo o mundo.
Caberá agora ao francês organizar a grande conferência mundial de radiocomunicações prevista para 2012. Ele será peça-chave na passagem à televisão digital e sistemas de telefonia celular da próxima geração, dois desafios técnicos, mas sobretudo socioeconômicos.
Antes dessa, o governo Lula já havia perdido disputas para as direções da Organização Mundial do Comércio (OMC), da União Internacional de Telecomunicações (UIT), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), além de votações emblemáticas, como a presidência da Conferência Internacional do Trabalho, quando Ricardo Berzoini era o ministro do Trabalho, e a vaga de juiz do Órgão de Apelação da OMC.
Paulo Roberto de Almeida
Brasileiro perde disputa por cargo da UIT
Valor Economico, 14/10/2010
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdeu mais uma disputa por um cargo na burocracia internacional. Agora foi o posto estratégico de diretor do Departamento de Radiodifusão, da União Internacional de Telecomunicações (UIT), numa votação que mobilizou 157 países membros da entidade, numa conferência no México.
O candidato brasileiro Fábio Leite obteve 67 votos, diante de 90 do francês François Rancy. E, apesar do crescente engajamento do governo brasileiro na África, foram justamente os países africanos que deram os votos que foram decisivos para a vitória do candidato francês na segunda rodada da votação.
Essa diretoria da UIT gerencia a atribuição de frequências radioelétricas e de órbitas de satélites e da qual depende a indústria de "wireless", que fatura quase US$ 50 bilhões por ano em todo o mundo.
Caberá agora ao francês organizar a grande conferência mundial de radiocomunicações prevista para 2012. Ele será peça-chave na passagem à televisão digital e sistemas de telefonia celular da próxima geração, dois desafios técnicos, mas sobretudo socioeconômicos.
Antes dessa, o governo Lula já havia perdido disputas para as direções da Organização Mundial do Comércio (OMC), da União Internacional de Telecomunicações (UIT), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), além de votações emblemáticas, como a presidência da Conferência Internacional do Trabalho, quando Ricardo Berzoini era o ministro do Trabalho, e a vaga de juiz do Órgão de Apelação da OMC.
Politica Externa de fantasia: o Estadao ataca outra vez...
O Estadão pode demorar um pouco, mas acho que não passa três semanas sem lançar um editorial criticando causticamente a política externa do governo do PT, essa mesma que é apresentada como "ativa e altiva", como defensora da soberania nacional, como aquela que tem a capacidade de dizer não, como aquela que tem um outro olhar sobre as coisas, enfim, tudo aquilo que já foi argumentado a favor da nossa diplomacia.
O Estadão não tem nenhum respeito por essas realizações...
Que jornal!
Aliás, se eu bem me lembro da história dessa refinaria, a Petrobras discutiu durante muito tempo onde fazer uma nova, no Nordeste. Ela tinha várias opções, segundo propostas dos estados: no Ceará, no Rio Grande do Norte, em Pernambuco e na Bahia, e se supõe que a empresa estivesse fazendo consideracoes de ordem estritamente técnica e comercial, ou seja, ver, do ponto de vista do abastecimento em matéria prima, das conexões em transportes, proximidade dos mercados consumidores, etc. Enfim, tudo isso estava sendo debatido pela Petrobras, que em principio estava levando o empreendimento sozinho, em bases puramente comerciais.
Ai chegou o Hugo Chávez, que tinha ouvido dizer que o voluntário brasileiro que tinha combatido no exército de Bolivar, Abreu e Lima, era de Pernambuco: ele então disse que queria fazer junto mas que tinha de ser em Pernambuco.
Lembro-me perfeitamente da ministra Dilma Roussef, não sei se ainda de Minas e Energia ou se já na Casa Civil, respondendo a um jornalista, quando questionada sobre onde seria construída a nova refinaria da Petrobras, respondeu, do alto da sua defesa da soberania nacional, algo assim: "Isso o Hugo Chávez já decidiu: vai ser em Pernambuco!"
Nunca vi tamanha defesa da soberania como essa.
Vivendo e aprendendo...
Paulo Roberto de Almeida
A PDVSA e a fantasia petista
Editorial- O Estado de S. Paulo, 14/10/2010
Nem sequer um centavo foi investido até agora pela estatal venezuelana PDVSA na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A obra é tocada só com recursos da Petrobrás, embora tenha sido planejada e anunciada como empreendimento conjunto. A pedra fundamental foi lançada em dezembro de 2005 pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez. Esse projeto seria a primeira grande realização da Aliança Estratégica formalizada em fevereiro daquele ano, em Caracas, com a presença da ministra de Minas e Energia do Brasil, Dilma Rousseff. Passados cinco anos, o balanço de realizações conjuntas é irrisório. A PDVSA deveria custear 40% da refinaria. Sem cumprir sua parte, pode ser forçada a renunciar ao projeto. Outras tentativas de cooperação também fracassaram. Uma delas, já abandonada, foi o plano de atuação da Petrobrás na área petrolífera do Orinoco.
A Aliança Estratégica formalizada pelos presidentes Chávez e Lula foi uma tentativa de combinar duas bandeiras do atraso - o bolivarianismo do caudilho venezuelano e o terceiro-mundismo requentado da diplomacia petista. Nada útil poderia resultar desse acasalamento.
Atribuir a expansão do comércio bilateral a essa iniciativa é um disparate evidente. O intercâmbio do Brasil com toda a América do Sul cresceu nos últimos dez anos, como consequência da prosperidade regional e de um esforço de integração intensificado a partir dos anos 90. Empresas brasileiras já tinham interesses na Venezuela bem antes da aproximação Chávez-Lula.
A “aliança” formalizada em 2005 e reafirmada em 2009 apenas acrescentou ingredientes ideológicos à cooperação bilateral. Foi mais uma aposta errada do presidente Lula - uma entre várias escolhas estratégicas baseadas na fantasia e não no cálculo de interesses concretos.
A ampliação do comércio bilateral foi muito mais acidentada do que teria sido, certamente, se a Venezuela estivesse sob um governo democrático, sem delírios expansionistas e livre da retórica anticapitalista. Atrasos de pagamentos foram um problema frequente para exportadores brasileiros, assim como a discriminação cambial a favor de produtores de outros países.
O governo petista não só aceitou essas distorções, como ainda se esforçou para incluir no Mercosul a Venezuela do presidente Chávez. A inclusão ainda não se consumou porque não foi aprovada pelo Congresso paraguaio. Se for consumada, o bloco regional, já emperrado e com enormes dificuldades para negociar com grandes parceiros como União Europeia e Estados Unidos, ainda passará a depender dos humores e das ambições de um caudilho fanfarrão.
Esse caudilho, é bom não esquecer, não tem prazo para deixar o governo de seu país nem está sujeito a limitações de tipo democrático. A diplomacia petista notabilizou-se pela frequência de suas apostas erradas. Ao enterrar a Alca, deixou espaço para uma série de acordos bilaterais dos Estados Unidos com outros países latino-americanos. Além disso, jogou fora a chance de negociar condições preferenciais de acesso a vários mercados antes da grande invasão chinesa.
Produtores brasileiros têm perdido competitividade tanto nos Estados Unidos como na América Latina. Se o Mercosul quiser iniciar um novo entendimento com Washington, terá de negociar levando em conta regras de investimento e de propriedade intelectual já acertadas naqueles acordos.
A diplomacia petista errou também - por esquecer os interesses nacionais - ao eleger a maioria dos “parceiros estratégicos”. Estados Unidos e Europa continuam sendo muito mais importantes que o Brasil para russos e chineses. Nenhum desses parceiros se afastou de seus interesses para favorecer o comércio com o Brasil. Ao contrário: as conveniências brasileiras foram preteridas, quase sempre (como, por exemplo, na atribuição, pelo governo russo, de cotas para exportadores de carne). Os africanos nunca deixaram de se aliar aos europeus nas questões comerciais. Se a coerência no erro é uma virtude, então a diplomacia petista tem pelo menos essa qualidade. A aliança com Hugo Chávez comprova esse fato.
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Addendum: da coluna do jornalista Carlos Brickman:
Los hermanos no telhado
A parceria entre Brasil e Venezuela para construir a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, está morrendo. Até o momento, passado um ano da assinatura do contrato, só a Petrobras pôs dinheiro no projeto. A venezuelana PDVSA, que deu até o nome à refinaria (Abreu e Lima foi um general brasileiro, nascido em Pernambuco, que lutou ao lado de Simon Bolívar nas guerras de independência da América espanhola), não investiu nada. O presidente venezuelano Hugo Chávez começou se responsabilizando por metade dos investimentos; depois, a metade passou a 40%, desde que o BNDES financiasse também a sua parte. Entretanto, até agora não apresentou ao BNDES nenhuma garantia do financiamento.
O Estadão não tem nenhum respeito por essas realizações...
Que jornal!
Aliás, se eu bem me lembro da história dessa refinaria, a Petrobras discutiu durante muito tempo onde fazer uma nova, no Nordeste. Ela tinha várias opções, segundo propostas dos estados: no Ceará, no Rio Grande do Norte, em Pernambuco e na Bahia, e se supõe que a empresa estivesse fazendo consideracoes de ordem estritamente técnica e comercial, ou seja, ver, do ponto de vista do abastecimento em matéria prima, das conexões em transportes, proximidade dos mercados consumidores, etc. Enfim, tudo isso estava sendo debatido pela Petrobras, que em principio estava levando o empreendimento sozinho, em bases puramente comerciais.
Ai chegou o Hugo Chávez, que tinha ouvido dizer que o voluntário brasileiro que tinha combatido no exército de Bolivar, Abreu e Lima, era de Pernambuco: ele então disse que queria fazer junto mas que tinha de ser em Pernambuco.
Lembro-me perfeitamente da ministra Dilma Roussef, não sei se ainda de Minas e Energia ou se já na Casa Civil, respondendo a um jornalista, quando questionada sobre onde seria construída a nova refinaria da Petrobras, respondeu, do alto da sua defesa da soberania nacional, algo assim: "Isso o Hugo Chávez já decidiu: vai ser em Pernambuco!"
Nunca vi tamanha defesa da soberania como essa.
Vivendo e aprendendo...
Paulo Roberto de Almeida
A PDVSA e a fantasia petista
Editorial- O Estado de S. Paulo, 14/10/2010
Nem sequer um centavo foi investido até agora pela estatal venezuelana PDVSA na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A obra é tocada só com recursos da Petrobrás, embora tenha sido planejada e anunciada como empreendimento conjunto. A pedra fundamental foi lançada em dezembro de 2005 pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez. Esse projeto seria a primeira grande realização da Aliança Estratégica formalizada em fevereiro daquele ano, em Caracas, com a presença da ministra de Minas e Energia do Brasil, Dilma Rousseff. Passados cinco anos, o balanço de realizações conjuntas é irrisório. A PDVSA deveria custear 40% da refinaria. Sem cumprir sua parte, pode ser forçada a renunciar ao projeto. Outras tentativas de cooperação também fracassaram. Uma delas, já abandonada, foi o plano de atuação da Petrobrás na área petrolífera do Orinoco.
A Aliança Estratégica formalizada pelos presidentes Chávez e Lula foi uma tentativa de combinar duas bandeiras do atraso - o bolivarianismo do caudilho venezuelano e o terceiro-mundismo requentado da diplomacia petista. Nada útil poderia resultar desse acasalamento.
Atribuir a expansão do comércio bilateral a essa iniciativa é um disparate evidente. O intercâmbio do Brasil com toda a América do Sul cresceu nos últimos dez anos, como consequência da prosperidade regional e de um esforço de integração intensificado a partir dos anos 90. Empresas brasileiras já tinham interesses na Venezuela bem antes da aproximação Chávez-Lula.
A “aliança” formalizada em 2005 e reafirmada em 2009 apenas acrescentou ingredientes ideológicos à cooperação bilateral. Foi mais uma aposta errada do presidente Lula - uma entre várias escolhas estratégicas baseadas na fantasia e não no cálculo de interesses concretos.
A ampliação do comércio bilateral foi muito mais acidentada do que teria sido, certamente, se a Venezuela estivesse sob um governo democrático, sem delírios expansionistas e livre da retórica anticapitalista. Atrasos de pagamentos foram um problema frequente para exportadores brasileiros, assim como a discriminação cambial a favor de produtores de outros países.
O governo petista não só aceitou essas distorções, como ainda se esforçou para incluir no Mercosul a Venezuela do presidente Chávez. A inclusão ainda não se consumou porque não foi aprovada pelo Congresso paraguaio. Se for consumada, o bloco regional, já emperrado e com enormes dificuldades para negociar com grandes parceiros como União Europeia e Estados Unidos, ainda passará a depender dos humores e das ambições de um caudilho fanfarrão.
Esse caudilho, é bom não esquecer, não tem prazo para deixar o governo de seu país nem está sujeito a limitações de tipo democrático. A diplomacia petista notabilizou-se pela frequência de suas apostas erradas. Ao enterrar a Alca, deixou espaço para uma série de acordos bilaterais dos Estados Unidos com outros países latino-americanos. Além disso, jogou fora a chance de negociar condições preferenciais de acesso a vários mercados antes da grande invasão chinesa.
Produtores brasileiros têm perdido competitividade tanto nos Estados Unidos como na América Latina. Se o Mercosul quiser iniciar um novo entendimento com Washington, terá de negociar levando em conta regras de investimento e de propriedade intelectual já acertadas naqueles acordos.
A diplomacia petista errou também - por esquecer os interesses nacionais - ao eleger a maioria dos “parceiros estratégicos”. Estados Unidos e Europa continuam sendo muito mais importantes que o Brasil para russos e chineses. Nenhum desses parceiros se afastou de seus interesses para favorecer o comércio com o Brasil. Ao contrário: as conveniências brasileiras foram preteridas, quase sempre (como, por exemplo, na atribuição, pelo governo russo, de cotas para exportadores de carne). Os africanos nunca deixaram de se aliar aos europeus nas questões comerciais. Se a coerência no erro é uma virtude, então a diplomacia petista tem pelo menos essa qualidade. A aliança com Hugo Chávez comprova esse fato.
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Addendum: da coluna do jornalista Carlos Brickman:
Los hermanos no telhado
A parceria entre Brasil e Venezuela para construir a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, está morrendo. Até o momento, passado um ano da assinatura do contrato, só a Petrobras pôs dinheiro no projeto. A venezuelana PDVSA, que deu até o nome à refinaria (Abreu e Lima foi um general brasileiro, nascido em Pernambuco, que lutou ao lado de Simon Bolívar nas guerras de independência da América espanhola), não investiu nada. O presidente venezuelano Hugo Chávez começou se responsabilizando por metade dos investimentos; depois, a metade passou a 40%, desde que o BNDES financiasse também a sua parte. Entretanto, até agora não apresentou ao BNDES nenhuma garantia do financiamento.
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Religiao e desenvolvimento: um questionario e minhas respostas
Fui consultado por uma jornalista que esclareceu sua afiliação evangélica: "jornalista de publicação informativa do segmento evangélico e de circulação nacional". Ela mandou-me uma pesquisa Gallup sobre relações entre religião e desenvolvimento, ou nível de prosperidade material, e formulou uma série de perguntas, todas elas muito interessantes e inteligentes.
Como sei que minhas respostas serão aproveitadas apenas parcialmente, e como sei que este tema sempre desperta curiosidade nos estudiosos de ciências humanas em geral, permito-me transcrever aqui minhas respostas, não como religioso, mas como simples estudioso das religiões e, sobretudo, do desenvolvimento econômico e social em escala comparada.
Acredito que o tema é relevante, mas desde já me posiciono contra a posição fundamentalista que está vinculada a certas confissões evangélicas, no sentido de apoiar o criacionismo e se posicionar contra o evolucionismo. Aqui não é uma questão de fé ou de postura anti-religiosa. Acredito que essa posição é errada, e é profundamente danosa para o desenvolvimento do espírito científico, em qualquer país, em qualquer época, com qualquer religião.
Como disse em uma das minhas respostas: esses fundamentalistas serão, eventualmente salvos, pelo avanço da pesquisa científica em matéria de doenças e procedimentos terapêuticos, mas dificilmente, ou JAMAIS, poderão colaborar para a descoberta da cura ou de inovações levando a melhor condição de vida enquanto ficarem presos a essas concepções ingênuas e no fundo anti-racionalistas.
Paulo Roberto de Almeida
Pesquisa sobre Religião e Desenvolvimento
Paulo Roberto de Almeida
Respondendo a perguntas colocadas por repórter de confissão evangélica.
Perguntas:
1) Que relação pode haver entre a religiosidade de um povo e seu nível de renda?
PRA: Não existe um padrão universal e uma correlação unívoca – ou seja, de causa a efeito, numa só direção – entre religião e prosperidade, ou entre religião e nível de vida de um povo, pois as situações são as mais diversas possíveis e têm mais a ver com a formação histórica e cultural de um povo do que propriamente com o seu nível de vida. Todos os povos têm, naturalmente, religiões, alguma emergindo naturalmente, como o antigo paganismo ou politeísmo, outras surgindo com base em profetas ou figuras carismáticas (Cristo, ou Maomé, por exemplo). Alguns povos “importam” suas religiões – como o budismo na China e no Japão, por exemplo, propagado a partir da Índia, a partir de monges missionários, mercadores, viajantes, etc. Outros povos são levados à conversão por colonização ou dominação externa, como a maior parte dos povos autóctones da América Latina. Ou seja, as situações são muito diversas, pois entre todos esses povos encontramos nações extremamente desenvolvidas (como Europa e Estados Unidos, onde o cristianismo se propagou por evangelização ao longo dos séculos) e outras totalmente miseráveis (como a índia secular, por exemplo, basicamente hinduísta, mas também muçulmana e dotada de dezenas de outras religiões, inclusive o próprio budismo, no qual existem povos hoje desenvolvidos, como os japoneses, e outros ainda “atrasados”, como no Nepal, Butão, o próprio Tibete, etc.
A nação mais avançada do mundo, que é indiscutivelmente os EUA, pelo menos em termos científicos e tecnológicos, é, também, a mais religiosa, ou parece ser, com uma profusão de cultos, sobretudo evangélicos e protestantes (mas aberta a todas as confissões, num sistema tão livre quanto anárquico, de religiões, de opiniões, de iniciativas individuais, enfim, de ampla liberdade). Ao lado, temos o México e os países da América Central, todos uniformemente católicos e relativamente atrasados, com um nível de renda per capita 5 ou 6 vezes menor do que nos EUA.
Em resumo, não há um padrão, e muita tinta já se gastou, desde Max Weber, em tentativas de correlação entre uma coisa e outra, sem muito sucesso aparente.
2) Em sua opinião, há uma influência recíproca entre religião e economia?
PRA: Sim e não, dependendo do que se pretende como fatores causais. Essa influência pode ser positiva, ou seja, levar um povo a prosperar com base em suas habilidades próprias. Mas as relações reais são muito complexas. Acredito, por exemplo, que uma religião que coloca a mulher em papel subordinado, como ocorre no islamismo em grande medida, atua num sentido negativo para fins de desenvolvimento social e prosperidade. Religiões que atribuem forte papel à mulher, como mãe e responsável pela educação dos filhos – como ocorre na tradição judaica, e parcialmente no cristianismo – podem ser extremamente positivas na inovação e na prosperidade. Os judeus, por exemplo, constituem menos de 1% da população mundial, mas contribuíram de maneira absolutamente “desproporcional” para o progresso da humanidade, nos mais diversos campos do saber, da ciência, da cultura. Basta ver a proporção de Prêmios Nobel ganhos por pessoas de origem judia. Creio que o grande papel, aqui, é o da mãe e da família judia, extremamente focadas no desenvolvimento dos filhos, na sua educação, numa vida digna e voltada para o benefício da comunidade. Não se encontra esse tipo de motivação e de vocação entre todas as religiões. Mas fatores causais podem ser mais de origem cultural, ou costumeira, do que propriamente religiosa, pois o patriarcado, ou dominação masculina, e a conseqüente opressão da mulher, existem em várias religiões.
3) De acordo com a pesquisa, quanto mais religiosos são os habitantes de um país, mais pobre ele tende a ser. O senhor concorda com essa conclusão?
PRA: Não concordo, absolutamente, e o exemplo já citado dos EUA nega esse tipo de afirmação. Mas, mais uma vez, essa relação é complexa, e não se pode, sem ser leviano, estabelecer uma correlação entre o grau de “religiosidade” – o que isto quer dizer?; trata-se aqui de conceito essencialmente subjetivo – de um povo e o nível de sua prosperidade material. Certas religiões podem contribuir para certa estagnação – ou falta de inovação de certos povos, como determinadas variantes do islamismo, a partir de certa fase – e outras permitirem o desenvolvimento.
Tudo depende, em minha opinião, da capacidade de ser exercido o chamado “espírito criativo”, algo que, como a religião, parece ser inato no homem (ou nos seres humanos). As religiões que “congelam” determinados conceitos sociais e impedem o avanço da pesquisa e da inovação – em matérias científicas, como biologia, história, etc. – contribuem para o atraso de seus povos. Aquelas que permitem a chamada “exegese”, ou seja, a interpretação dos “livros sagrados”, para adaptar as mensagens religiosas à dinâmica econômica e científica, contribuem para o desenvolvimento dos povos, e isso ocorreu no cristianismo. Mas esse itinerário ainda não foi conhecido no islamismo, pelo menos em várias de suas interpretações literais; pode ser que o islamismo evolua para esse mesmo tipo de secularização que permita uma interpretação alusiva, e não literal, da palavra escrita, ou seja, que permita a exegese (algo mais ligado à tolerância do que ao dogmatismo). Não devemos esquecer, por outro lado, que a Europa conheceu terríveis guerras de religião, responsáveis por morticínios inacreditáveis na concepção moderna dos direitos humanos.
Acredito que o fanatismo, a intolerância, o dogmatismo e o exclusivismo religiosos podem ser, sim, fatores de atraso, ao passo que a tolerância, o espírito aberto, a capacidade de absorver e integrar novas descobertas na cultura religiosa dominante são, ou podem ser, fatores de progresso e de prosperidade.
4) A pesquisa aborda a questão de forma genérica, no entanto, não deveriam ter levado em consideração as diferenças doutrinárias de uma religião para outra, já que essas diferenças poderiam ter apontado outro resultado, a exemplo de Max Weber que considerou o Protestantismo melhor para o desenvolvimento econômico do que o Catolicismo?
PRA: A tese de Max Weber é extremamente controversa, sempre foi aliás. Ele escreveu numa época – começo do século 20 – quando os povos protestantes pareciam ser a vanguarda do desenvolvimento econômico mundial, e de fato a Europa e os EUA estavam na dominação indisputada do mundo, exercendo uma extraordinária hegemonia econômica, tecnológica e cientifica. Mas, o capitalismo – que esteve na base desse excepcional desenvolvimento – nasceu na Itália católica, e não nos povos setentrionais protestantes. É certo que o comportamento mais aberto às inovações financeiras levaram protestantes a se desenvolverem mais rapidamente, e que o preconceito cristão, ou católico, contra o lucro e a usura pode ter contribuído para um desenvolvimento capitalista mais lento, mas mesmo essa tese é sujeita a caução. Se dizia, algumas décadas atrás, que os povos asiáticos, que possuem dezenas de religiões, mas poucos são cristãos ou protestantes, estavam condenadas ao atraso e à miséria, mas nas ultimas três décadas são os que mais avançaram no mundo em termos de prosperidade material, deixando para trás a América Latina quase toda ela católica, que décadas atrás aparecia como mais promissora para fins de crescimento e riqueza. Tudo isso NÃO TEM a ver com religião, e sim com as políticas econômicas corretas e, sobretudo, com a educação do povo. Mais do que as religiões, são as instituições sociais que podem ser “colaborativas” ou “impeditivas” do progresso.
5) A seu ver, é a religião que leva uma população à pobreza ou é a riqueza que tende a afastar as pessoas da religiosidade?
PRA: De modo algum; todas as situações são encontradas nos mais diferentes povos, locais e épocas históricas. Existe, aparentemente, uma correlação entre prosperidade material e uma atitude menos “religiosa”, ou seja, mais laica, ou secularizada, como ocorre entre os povos nórdicos, por exemplo, onde se pode notar uma forte diminuição da assistência a cultos religiosos, do pagamento de contribuições às Igrejas e do ensino religioso, de forma geral. Mas, acredito que a religião é um traço civilizacional que vai acompanhar as comunidades humanas sempre, independentemente do grau de seu desenvolvimento (ou ausência de) prosperidade material.
6) A religião desempenha um papel importante no desenvolvimento econômico de um país?
PRA: Eu diria que esse papel é em geral neutro e não depende da religião em si, ou seja, da “mensagem sagrada”, e sim das instituições que determinam a criação de riqueza. Certas instituições são mais favoráveis a isso, como o instituto da propriedade, o respeito aos contratos, o chamado rule of Law, ou seja, o respeito à lei e à legalidade jurídica num pais, etc. Tudo isso pode ser, e é, positivo para fins de desenvolvimento, independentemente da religião específica de um povo. Mas, se uma religião se atém, por exemplo, a uma leitura literal e obrigatória sobre determinados fenômenos naturais, e recusa a abertura à pesquisa e à inovação, ela pode, sim, ser fator de atraso. Por exemplo, não se pode ter carreira cientifica em biologia, ou nas ciências de modo geral, sem aderir a alguns pressupostos da teoria da seleção natural, de origem darwiniana (mas a evolução é um fato, que independe de teorias). Quem não aceita esses pressupostos simplesmente não consegue fazer biologia, ou até geologia ou, no limite, a história e a arqueologia. Tudo isso pode representar fatores de atraso absoluto no desenvolvimento material, pois a tecnologia só pode avançar com plena utilização do espírito cientifico. Todas as pessoas podem ser salvas pela medicina avançada, mesmo recusando seus pressupostos básicos, e negando a teoria evolucionista, por exemplo. Mas essas pessoas JAMAIS contribuirão para aquela solução cientifica que salva as suas vidas se elas não aderirem a certas metodologias científicas que uma determinada vertente religiosa, intolerante e dogmática, pretende banir do ensino laico (que deve ser aberto a todo e qualquer desenvolvimento científico, pois isso é importante e crucial para a humanidade).
Eu me proclamo, apenas para fins de honestidade intelectual, como uma pessoa irreligiosa – ou seja, não me posiciono quanto às religiões, embora as respeite historicamente – e essencialmente como um racionalista. Sou, sim, um grande estudioso das religiões, como deveria ser todo espírito aberto e propenso ao progresso material e espiritual da humanidade.
Paulo Roberto de Almeida (Beijing, 14.10.2010)
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Agora a pesquisa que motivou a consulta:
Pesquisa: 80% da população mundial vê a religião como importante .
Qui, 02 de Setembro de 2010
Fonte: Christian Post – Link: http://www.christianpost.com/article/20100901/over-8-in-10-worldwide-see-religion-as-important/
Mais de oito em cada dez adultos em todo o mundo dizem que a religião é uma parte importante de suas vidas diárias, de acordo com pesquisas do Gallup realizada em 114 países.
E, como pesquisas anteriores encontraram, ainda há uma forte correlação entre o nível socio-econômico do país e a religiosidade de seus moradores.
Nos países mais pobres do mundo - aquelas com renda média per capita de 2000 dólares ou menos - a proporção mediana que dizem que a religião é importante em suas vidas diárias é de 95 por cento, informou nesta terça-feira Gallup.
Em contraste, a mediana para os países mais ricos - aqueles com renda média per capita acima de USD $ 25.000 - é de 47 por cento
"Os cientistas sociais têm colocado diante inúmeras explicações possíveis para a relação entre a religiosidade de uma população e o seu nível de renda média," observou o editor Steve Gallup Crabtree.
"Uma teoria é que a religião desempenha um papel mais funcional nos países mais pobres do mundo, ajudando muitos moradores a lidarem com uma luta diária para prover a eles e suas famílias. A análise anterior Gallup apoia esta idéia," acrescentou.
Na análise da Gallup de 2009, inquéritos realizados em 143 países, nos três anos anteriores, a organização concluiu que a relação entre religiosidade e bem-estar emocional é mais forte entre aqueles nos países pobres do que entre aqueles no mundo desenvolvido.
Em seu último relatório, Gallup disseram que a religião era considerada importante por 95 por cento das pessoas em países com 2.000 dólares ou menos renda per capita. E para os países com renda per capita acima de USD $ 2.000, mas menos de USD $ 5.000, 92 por cento das pessoas disseram que a religião é uma parte importante da sua vida quotidiana.
Depois de 5.000 dólares, os números declinaram mais, com 82 por cento considerando a religião como importante para os países dentro do grupo USD $ 5.001-12,500. Para renda de USD $ 12.501-25.000, 70 por cento disseram o mesmo. E para os países com renda per capita mais USD $25.001, apenas 47 por cento disseram que a religião é uma parte importante da sua vida quotidiana.
Tal como em inquéritos anteriores, no entanto, os Estados Unidos estão entre os países ricos, que vêm escapando à tendência.
Segundo a última pesquisa Gallup, 65 por cento dos americanos dizem que a religião é importante em suas vidas diárias. Outros países de alta renda mais propensos a enfatizar a importância da religião incluem Itália, Grécia, Singapura e países do Golfo Pérsico.
Os seis principais países com maior porcentagem de pessoas colocando importância da religião foram Bangladesh, Nigéria, Iêmen, Indonésia, Malawi, e Sri Lanka - com pelo menos 99 por cento em cada comunicação a religião como importante em suas vidas diárias.
Os seis países com os menores percentuais foram a Estónia (16 por cento), Suécia (17 por cento), Dinamarca (19 por cento), Japão (24 por cento) e Hong Kong (24 por cento).
Resultados de pesquisas Gallup são baseados em entrevistas telefônicas e presenciais, realizadas em 2009 com cerca de 1.000 adultos em cada país.
Fonte: Folha Gospel
Como sei que minhas respostas serão aproveitadas apenas parcialmente, e como sei que este tema sempre desperta curiosidade nos estudiosos de ciências humanas em geral, permito-me transcrever aqui minhas respostas, não como religioso, mas como simples estudioso das religiões e, sobretudo, do desenvolvimento econômico e social em escala comparada.
Acredito que o tema é relevante, mas desde já me posiciono contra a posição fundamentalista que está vinculada a certas confissões evangélicas, no sentido de apoiar o criacionismo e se posicionar contra o evolucionismo. Aqui não é uma questão de fé ou de postura anti-religiosa. Acredito que essa posição é errada, e é profundamente danosa para o desenvolvimento do espírito científico, em qualquer país, em qualquer época, com qualquer religião.
Como disse em uma das minhas respostas: esses fundamentalistas serão, eventualmente salvos, pelo avanço da pesquisa científica em matéria de doenças e procedimentos terapêuticos, mas dificilmente, ou JAMAIS, poderão colaborar para a descoberta da cura ou de inovações levando a melhor condição de vida enquanto ficarem presos a essas concepções ingênuas e no fundo anti-racionalistas.
Paulo Roberto de Almeida
Pesquisa sobre Religião e Desenvolvimento
Paulo Roberto de Almeida
Respondendo a perguntas colocadas por repórter de confissão evangélica.
Perguntas:
1) Que relação pode haver entre a religiosidade de um povo e seu nível de renda?
PRA: Não existe um padrão universal e uma correlação unívoca – ou seja, de causa a efeito, numa só direção – entre religião e prosperidade, ou entre religião e nível de vida de um povo, pois as situações são as mais diversas possíveis e têm mais a ver com a formação histórica e cultural de um povo do que propriamente com o seu nível de vida. Todos os povos têm, naturalmente, religiões, alguma emergindo naturalmente, como o antigo paganismo ou politeísmo, outras surgindo com base em profetas ou figuras carismáticas (Cristo, ou Maomé, por exemplo). Alguns povos “importam” suas religiões – como o budismo na China e no Japão, por exemplo, propagado a partir da Índia, a partir de monges missionários, mercadores, viajantes, etc. Outros povos são levados à conversão por colonização ou dominação externa, como a maior parte dos povos autóctones da América Latina. Ou seja, as situações são muito diversas, pois entre todos esses povos encontramos nações extremamente desenvolvidas (como Europa e Estados Unidos, onde o cristianismo se propagou por evangelização ao longo dos séculos) e outras totalmente miseráveis (como a índia secular, por exemplo, basicamente hinduísta, mas também muçulmana e dotada de dezenas de outras religiões, inclusive o próprio budismo, no qual existem povos hoje desenvolvidos, como os japoneses, e outros ainda “atrasados”, como no Nepal, Butão, o próprio Tibete, etc.
A nação mais avançada do mundo, que é indiscutivelmente os EUA, pelo menos em termos científicos e tecnológicos, é, também, a mais religiosa, ou parece ser, com uma profusão de cultos, sobretudo evangélicos e protestantes (mas aberta a todas as confissões, num sistema tão livre quanto anárquico, de religiões, de opiniões, de iniciativas individuais, enfim, de ampla liberdade). Ao lado, temos o México e os países da América Central, todos uniformemente católicos e relativamente atrasados, com um nível de renda per capita 5 ou 6 vezes menor do que nos EUA.
Em resumo, não há um padrão, e muita tinta já se gastou, desde Max Weber, em tentativas de correlação entre uma coisa e outra, sem muito sucesso aparente.
2) Em sua opinião, há uma influência recíproca entre religião e economia?
PRA: Sim e não, dependendo do que se pretende como fatores causais. Essa influência pode ser positiva, ou seja, levar um povo a prosperar com base em suas habilidades próprias. Mas as relações reais são muito complexas. Acredito, por exemplo, que uma religião que coloca a mulher em papel subordinado, como ocorre no islamismo em grande medida, atua num sentido negativo para fins de desenvolvimento social e prosperidade. Religiões que atribuem forte papel à mulher, como mãe e responsável pela educação dos filhos – como ocorre na tradição judaica, e parcialmente no cristianismo – podem ser extremamente positivas na inovação e na prosperidade. Os judeus, por exemplo, constituem menos de 1% da população mundial, mas contribuíram de maneira absolutamente “desproporcional” para o progresso da humanidade, nos mais diversos campos do saber, da ciência, da cultura. Basta ver a proporção de Prêmios Nobel ganhos por pessoas de origem judia. Creio que o grande papel, aqui, é o da mãe e da família judia, extremamente focadas no desenvolvimento dos filhos, na sua educação, numa vida digna e voltada para o benefício da comunidade. Não se encontra esse tipo de motivação e de vocação entre todas as religiões. Mas fatores causais podem ser mais de origem cultural, ou costumeira, do que propriamente religiosa, pois o patriarcado, ou dominação masculina, e a conseqüente opressão da mulher, existem em várias religiões.
3) De acordo com a pesquisa, quanto mais religiosos são os habitantes de um país, mais pobre ele tende a ser. O senhor concorda com essa conclusão?
PRA: Não concordo, absolutamente, e o exemplo já citado dos EUA nega esse tipo de afirmação. Mas, mais uma vez, essa relação é complexa, e não se pode, sem ser leviano, estabelecer uma correlação entre o grau de “religiosidade” – o que isto quer dizer?; trata-se aqui de conceito essencialmente subjetivo – de um povo e o nível de sua prosperidade material. Certas religiões podem contribuir para certa estagnação – ou falta de inovação de certos povos, como determinadas variantes do islamismo, a partir de certa fase – e outras permitirem o desenvolvimento.
Tudo depende, em minha opinião, da capacidade de ser exercido o chamado “espírito criativo”, algo que, como a religião, parece ser inato no homem (ou nos seres humanos). As religiões que “congelam” determinados conceitos sociais e impedem o avanço da pesquisa e da inovação – em matérias científicas, como biologia, história, etc. – contribuem para o atraso de seus povos. Aquelas que permitem a chamada “exegese”, ou seja, a interpretação dos “livros sagrados”, para adaptar as mensagens religiosas à dinâmica econômica e científica, contribuem para o desenvolvimento dos povos, e isso ocorreu no cristianismo. Mas esse itinerário ainda não foi conhecido no islamismo, pelo menos em várias de suas interpretações literais; pode ser que o islamismo evolua para esse mesmo tipo de secularização que permita uma interpretação alusiva, e não literal, da palavra escrita, ou seja, que permita a exegese (algo mais ligado à tolerância do que ao dogmatismo). Não devemos esquecer, por outro lado, que a Europa conheceu terríveis guerras de religião, responsáveis por morticínios inacreditáveis na concepção moderna dos direitos humanos.
Acredito que o fanatismo, a intolerância, o dogmatismo e o exclusivismo religiosos podem ser, sim, fatores de atraso, ao passo que a tolerância, o espírito aberto, a capacidade de absorver e integrar novas descobertas na cultura religiosa dominante são, ou podem ser, fatores de progresso e de prosperidade.
4) A pesquisa aborda a questão de forma genérica, no entanto, não deveriam ter levado em consideração as diferenças doutrinárias de uma religião para outra, já que essas diferenças poderiam ter apontado outro resultado, a exemplo de Max Weber que considerou o Protestantismo melhor para o desenvolvimento econômico do que o Catolicismo?
PRA: A tese de Max Weber é extremamente controversa, sempre foi aliás. Ele escreveu numa época – começo do século 20 – quando os povos protestantes pareciam ser a vanguarda do desenvolvimento econômico mundial, e de fato a Europa e os EUA estavam na dominação indisputada do mundo, exercendo uma extraordinária hegemonia econômica, tecnológica e cientifica. Mas, o capitalismo – que esteve na base desse excepcional desenvolvimento – nasceu na Itália católica, e não nos povos setentrionais protestantes. É certo que o comportamento mais aberto às inovações financeiras levaram protestantes a se desenvolverem mais rapidamente, e que o preconceito cristão, ou católico, contra o lucro e a usura pode ter contribuído para um desenvolvimento capitalista mais lento, mas mesmo essa tese é sujeita a caução. Se dizia, algumas décadas atrás, que os povos asiáticos, que possuem dezenas de religiões, mas poucos são cristãos ou protestantes, estavam condenadas ao atraso e à miséria, mas nas ultimas três décadas são os que mais avançaram no mundo em termos de prosperidade material, deixando para trás a América Latina quase toda ela católica, que décadas atrás aparecia como mais promissora para fins de crescimento e riqueza. Tudo isso NÃO TEM a ver com religião, e sim com as políticas econômicas corretas e, sobretudo, com a educação do povo. Mais do que as religiões, são as instituições sociais que podem ser “colaborativas” ou “impeditivas” do progresso.
5) A seu ver, é a religião que leva uma população à pobreza ou é a riqueza que tende a afastar as pessoas da religiosidade?
PRA: De modo algum; todas as situações são encontradas nos mais diferentes povos, locais e épocas históricas. Existe, aparentemente, uma correlação entre prosperidade material e uma atitude menos “religiosa”, ou seja, mais laica, ou secularizada, como ocorre entre os povos nórdicos, por exemplo, onde se pode notar uma forte diminuição da assistência a cultos religiosos, do pagamento de contribuições às Igrejas e do ensino religioso, de forma geral. Mas, acredito que a religião é um traço civilizacional que vai acompanhar as comunidades humanas sempre, independentemente do grau de seu desenvolvimento (ou ausência de) prosperidade material.
6) A religião desempenha um papel importante no desenvolvimento econômico de um país?
PRA: Eu diria que esse papel é em geral neutro e não depende da religião em si, ou seja, da “mensagem sagrada”, e sim das instituições que determinam a criação de riqueza. Certas instituições são mais favoráveis a isso, como o instituto da propriedade, o respeito aos contratos, o chamado rule of Law, ou seja, o respeito à lei e à legalidade jurídica num pais, etc. Tudo isso pode ser, e é, positivo para fins de desenvolvimento, independentemente da religião específica de um povo. Mas, se uma religião se atém, por exemplo, a uma leitura literal e obrigatória sobre determinados fenômenos naturais, e recusa a abertura à pesquisa e à inovação, ela pode, sim, ser fator de atraso. Por exemplo, não se pode ter carreira cientifica em biologia, ou nas ciências de modo geral, sem aderir a alguns pressupostos da teoria da seleção natural, de origem darwiniana (mas a evolução é um fato, que independe de teorias). Quem não aceita esses pressupostos simplesmente não consegue fazer biologia, ou até geologia ou, no limite, a história e a arqueologia. Tudo isso pode representar fatores de atraso absoluto no desenvolvimento material, pois a tecnologia só pode avançar com plena utilização do espírito cientifico. Todas as pessoas podem ser salvas pela medicina avançada, mesmo recusando seus pressupostos básicos, e negando a teoria evolucionista, por exemplo. Mas essas pessoas JAMAIS contribuirão para aquela solução cientifica que salva as suas vidas se elas não aderirem a certas metodologias científicas que uma determinada vertente religiosa, intolerante e dogmática, pretende banir do ensino laico (que deve ser aberto a todo e qualquer desenvolvimento científico, pois isso é importante e crucial para a humanidade).
Eu me proclamo, apenas para fins de honestidade intelectual, como uma pessoa irreligiosa – ou seja, não me posiciono quanto às religiões, embora as respeite historicamente – e essencialmente como um racionalista. Sou, sim, um grande estudioso das religiões, como deveria ser todo espírito aberto e propenso ao progresso material e espiritual da humanidade.
Paulo Roberto de Almeida (Beijing, 14.10.2010)
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Agora a pesquisa que motivou a consulta:
Pesquisa: 80% da população mundial vê a religião como importante .
Qui, 02 de Setembro de 2010
Fonte: Christian Post – Link: http://www.christianpost.com/article/20100901/over-8-in-10-worldwide-see-religion-as-important/
Mais de oito em cada dez adultos em todo o mundo dizem que a religião é uma parte importante de suas vidas diárias, de acordo com pesquisas do Gallup realizada em 114 países.
E, como pesquisas anteriores encontraram, ainda há uma forte correlação entre o nível socio-econômico do país e a religiosidade de seus moradores.
Nos países mais pobres do mundo - aquelas com renda média per capita de 2000 dólares ou menos - a proporção mediana que dizem que a religião é importante em suas vidas diárias é de 95 por cento, informou nesta terça-feira Gallup.
Em contraste, a mediana para os países mais ricos - aqueles com renda média per capita acima de USD $ 25.000 - é de 47 por cento
"Os cientistas sociais têm colocado diante inúmeras explicações possíveis para a relação entre a religiosidade de uma população e o seu nível de renda média," observou o editor Steve Gallup Crabtree.
"Uma teoria é que a religião desempenha um papel mais funcional nos países mais pobres do mundo, ajudando muitos moradores a lidarem com uma luta diária para prover a eles e suas famílias. A análise anterior Gallup apoia esta idéia," acrescentou.
Na análise da Gallup de 2009, inquéritos realizados em 143 países, nos três anos anteriores, a organização concluiu que a relação entre religiosidade e bem-estar emocional é mais forte entre aqueles nos países pobres do que entre aqueles no mundo desenvolvido.
Em seu último relatório, Gallup disseram que a religião era considerada importante por 95 por cento das pessoas em países com 2.000 dólares ou menos renda per capita. E para os países com renda per capita acima de USD $ 2.000, mas menos de USD $ 5.000, 92 por cento das pessoas disseram que a religião é uma parte importante da sua vida quotidiana.
Depois de 5.000 dólares, os números declinaram mais, com 82 por cento considerando a religião como importante para os países dentro do grupo USD $ 5.001-12,500. Para renda de USD $ 12.501-25.000, 70 por cento disseram o mesmo. E para os países com renda per capita mais USD $25.001, apenas 47 por cento disseram que a religião é uma parte importante da sua vida quotidiana.
Tal como em inquéritos anteriores, no entanto, os Estados Unidos estão entre os países ricos, que vêm escapando à tendência.
Segundo a última pesquisa Gallup, 65 por cento dos americanos dizem que a religião é importante em suas vidas diárias. Outros países de alta renda mais propensos a enfatizar a importância da religião incluem Itália, Grécia, Singapura e países do Golfo Pérsico.
Os seis principais países com maior porcentagem de pessoas colocando importância da religião foram Bangladesh, Nigéria, Iêmen, Indonésia, Malawi, e Sri Lanka - com pelo menos 99 por cento em cada comunicação a religião como importante em suas vidas diárias.
Os seis países com os menores percentuais foram a Estónia (16 por cento), Suécia (17 por cento), Dinamarca (19 por cento), Japão (24 por cento) e Hong Kong (24 por cento).
Resultados de pesquisas Gallup são baseados em entrevistas telefônicas e presenciais, realizadas em 2009 com cerca de 1.000 adultos em cada país.
Fonte: Folha Gospel
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