Os 20 anos do Mercosul
Editorial - O Estado de S.Paulo
29 de março de 2011
Passados 20 anos desde a assinatura do Tratado de Assunção, que o criou, o Mercado Comum do Sul (Mercosul) é um arremedo do que poderia ter sido e do que se esperava que fosse. Na forma, alcançou a condição de união aduaneira, etapa superior da integração econômica e comercial dos países que o compõem, com a livre circulação de mercadorias e serviços entre eles. Mas, na realidade, é apenas uma caricatura dessa condição, pois a Tarifa Externa Comum, que caracteriza esse tipo de associação, é cheia de exceções e com frequência alguns dos membros do bloco impõem restrições e barreiras à entrada de produtos originários dos demais. Atitudes desse tipo enfraquecem o bloco, mas, mesmo assim, foram toleradas por outros governos, especialmente o de Lula.
Quando de sua assinatura pelos presidentes da Argentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai, no dia 26 de março de 1991, o Tratado de Assunção representava a busca de maior integração econômico-comercial entre esses países e o reencontro deles com a democracia. O Mercosul é a expressão desse reencontro e "a demonstração da capacidade conjunta dos quatro países de sobrepor a diferenças do passado uma agenda compartilhada de valores e interesses comuns", afirmaram os ministros de Relações Exteriores da Argentina, Héctor Timerman, do Brasil, Antonio Patriota, do Paraguai, Jorge Lara Castro, e do Uruguai, Luis Almagro, em artigo conjunto publicado sábado no Estado.
As exportações totais do bloco passaram de US$ 49 bilhões em 1999 para US$ 280,4 bilhões em 2010. Nesse período, as exportações entre os países que compõem o bloco passaram de 9% para 15,7% das exportações totais desses países. O bloco também propiciou investimentos de empresas brasileiras nos demais países do bloco, e vice-versa, o que estimulou o desenvolvimento de atividades agropecuárias e industriais na região. No plano político, o Mercosul desempenhou papel relevante na contenção de tentativas de golpes de Estado no Paraguai, em 1999 e em 2000.
No entanto, no campo comercial, muito pouco das esperanças geradas à época da assinatura do Tratado se concretizou. O que poderia ter sido, para o Brasil e para os demais sócios, um poderoso instrumento de estímulo ao crescimento da economia regional e de fortalecimento do bloco nas negociações internacionais tornou-se, em muitas situações, um peso morto, um obstáculo a essas negociações. Pelo fato de o Mercosul ser formalmente uma união aduaneira, seus membros não podem assinar, isoladamente, acordos de livre comércio com outros países ou outros blocos.
Em raras ocasiões, os dois principais países do bloco, Brasil e Argentina, conseguiram acertar suas posições nas negociações internacionais. Numa delas, conseguiram enterrar o projeto de constituição da Área de Livre Comércio das Américas, que, bem negociada, criaria mais oportunidades de acesso ao maior mercado de consumo do mundo, o americano, sem expor o setor produtivo local a uma concorrência predatória.
Por causa das diferenças de interesses comerciais entre os sócios do Mercosul, são muito poucos os acordos concluídos pelo bloco. Entre outros, o Mercosul tem acordo de livre comércio com Israel e tratado de preferências fixas com a Índia e a África do Sul. Há anos negocia um acordo de livre comércio com a União Europeia, o que pela primeira vez lhe daria acesso mais fácil a uma fatia expressiva do mercado dos países industrializados, mas, mais uma vez, as negociações estão emperradas.
Para a consolidação e a expansão do bloco, pior do que as dificuldades para se chegar a um ponto comum entre os sócios para a conclusão de acordos comerciais é a insistência com que o governo da Argentina recorre a medidas protecionistas que impedem ou retardam a entrada no país de produtos originários dos demais membros do bloco.
Sem ter contribuído, como poderia, para a maior inserção do bloco no mercado internacional, nem para aumentar a competitividade de cada um de seus sócios, o Mercosul ainda precisa justificar sua existência.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
terça-feira, 29 de março de 2011
segunda-feira, 28 de março de 2011
Anarquia tributária no Brasil: uma jabuticaba do tamanho de uma jaca...
O Brasil nunca foi um país economicamente normal, e eu diria mesmo que ele sempre foi relativamente esquizofrênico. Também, com governos que sofrem de transtorno bipolar não é difícil ter comportamentos totalmente irracionais no plano fiscal, que tornam a administração econômica algo caótico, quando não inútil, como enxugar gelo, por exemplo.
O que vai abaixo é um exemplo das nossas loucuras econômicas...
Paulo Roberto de Almeida
Guerra fiscal contra o Brasil
Editorial - O Estado de S.Paulo
27 de março de 2011
A guerra fiscal dos portos - estímulos à importação concedidos por alguns Estados - deve ter custado ao País 711 mil empregos entre 2001 e 2010 e uma perda de produção equivalente a R$ 55,4 bilhões, segundo cálculo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A produção perdida nesse período equivale ao produto bruto anual de uma cidade como Campinas. A perda acumulada de empregos poderá chegar a 1,5 milhão até 2015, segundo o estudo, se essa política for mantida. Esse trabalho da Fiesp contém a primeira estimativa dos estragos causados à economia brasileira pela política de importação mantida por dez Estados sem autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária(Confaz), único órgão competente para aprovar a concessão de certos tipos de incentivos estaduais.
A chamada guerra dos portos é um tipo especialmente danoso de guerra fiscal. A modalidade tradicional, inaugurada há mais de 20 anos por vários Estados, consiste na concessão de estímulos para atração de empresas ou de novos investimentos.
Essa modalidade nunca foi aprovada pelo Confaz e jamais foi eliminada, apesar de sua evidente ilegalidade, apontada em vários processos abertos na Justiça. Governos estaduais adotaram várias formas de incentivo, eliminando ou reduzindo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ou diferindo o recolhimento por vários anos (na prática isso acabaria equivalendo a uma isenção).
A guerra fiscal tradicional transferia capitais e empregos de um Estado para outro. Os estímulos distorciam as motivações do investimento e isso tendia a reduzir a eficiência do sistema produtivo. A difusão dessa estratégia, com sua adoção por vários Estados, resultou em leilões de atração de investimentos e elevou o custo fiscal de cada centavo aplicado pelas empresas na construção de fábricas e de outras instalações.
O novo tipo de guerra fiscal é mais danoso, como se observa no estudo da Fiesp, porque resulta na transferência de empregos não só de um Estado para outro, mas do Brasil para o exterior. A redução do ICMS cobrado na importação de bens industriais confere uma importante vantagem ao fabricante estrangeiro. Seu produto é desonerado ao entrar no mercado brasileiro, enquanto o produto nacional continua embutindo o custo de todos os impostos e contribuições.
Na prática, os governos estaduais oferecem um subsídio à empresa de fora do País para competir vantajosa e deslealmente com a indústria brasileira. Do ponto de vista dos interesses nacionais, essa política é uma aberração além de ser, naturalmente, uma ilegalidade indisfarçável. Enquanto o governo federal abre investigações e processos internacionais contra práticas desleais de comércio de outros países, governos estaduais minam o poder de competição das empresas nacionais.
O estudo da Fiesp compara a evolução das importações de produtos industrializados, entre 2001 e 2010, nos Estados com incentivos e nos demais. Nos primeiros, as importações daqueles bens cresceram bem acima da média anual de 12,6% observada no segundo grupo de Estados. O caso de Santa Catarina é especialmente notável: sua participação nas importações de industrializados aumentou de 2% do total nacional em 2003, no início de seu programa de incentivos, para 6,6% em 2010.
Em consequência de políticas desse tipo, as importações brasileiras de produtos industrializados devem ter sido, no ano passado, 9,8% maiores do que seriam sem os incentivos. Dos US$ 145,1 bilhões gastos com esses produtos em 2010, US$ 14,2 bilhões devem ser explicáveis pelas políticas estaduais, segundo o estudo. Esses incentivos agravam os problemas de competitividade já enfrentados pelos empresários nacionais - aqueles causados por fatores como o câmbio valorizado, os impostos excessivos e as deficiências de logística.
O documento da Fiesp menciona dez Estados envolvidos nesse tipo de aberração fiscal: Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo, Sergipe, Alagoas, Maranhão, Pernambuco, Mato Grosso do Sul, Tocantins e Goiás. Estes três últimos, curiosamente, não têm portos marítimos e Goiás e Tocantins nem sequer têm fronteiras com o exterior.
O que vai abaixo é um exemplo das nossas loucuras econômicas...
Paulo Roberto de Almeida
Guerra fiscal contra o Brasil
Editorial - O Estado de S.Paulo
27 de março de 2011
A guerra fiscal dos portos - estímulos à importação concedidos por alguns Estados - deve ter custado ao País 711 mil empregos entre 2001 e 2010 e uma perda de produção equivalente a R$ 55,4 bilhões, segundo cálculo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A produção perdida nesse período equivale ao produto bruto anual de uma cidade como Campinas. A perda acumulada de empregos poderá chegar a 1,5 milhão até 2015, segundo o estudo, se essa política for mantida. Esse trabalho da Fiesp contém a primeira estimativa dos estragos causados à economia brasileira pela política de importação mantida por dez Estados sem autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária(Confaz), único órgão competente para aprovar a concessão de certos tipos de incentivos estaduais.
A chamada guerra dos portos é um tipo especialmente danoso de guerra fiscal. A modalidade tradicional, inaugurada há mais de 20 anos por vários Estados, consiste na concessão de estímulos para atração de empresas ou de novos investimentos.
Essa modalidade nunca foi aprovada pelo Confaz e jamais foi eliminada, apesar de sua evidente ilegalidade, apontada em vários processos abertos na Justiça. Governos estaduais adotaram várias formas de incentivo, eliminando ou reduzindo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ou diferindo o recolhimento por vários anos (na prática isso acabaria equivalendo a uma isenção).
A guerra fiscal tradicional transferia capitais e empregos de um Estado para outro. Os estímulos distorciam as motivações do investimento e isso tendia a reduzir a eficiência do sistema produtivo. A difusão dessa estratégia, com sua adoção por vários Estados, resultou em leilões de atração de investimentos e elevou o custo fiscal de cada centavo aplicado pelas empresas na construção de fábricas e de outras instalações.
O novo tipo de guerra fiscal é mais danoso, como se observa no estudo da Fiesp, porque resulta na transferência de empregos não só de um Estado para outro, mas do Brasil para o exterior. A redução do ICMS cobrado na importação de bens industriais confere uma importante vantagem ao fabricante estrangeiro. Seu produto é desonerado ao entrar no mercado brasileiro, enquanto o produto nacional continua embutindo o custo de todos os impostos e contribuições.
Na prática, os governos estaduais oferecem um subsídio à empresa de fora do País para competir vantajosa e deslealmente com a indústria brasileira. Do ponto de vista dos interesses nacionais, essa política é uma aberração além de ser, naturalmente, uma ilegalidade indisfarçável. Enquanto o governo federal abre investigações e processos internacionais contra práticas desleais de comércio de outros países, governos estaduais minam o poder de competição das empresas nacionais.
O estudo da Fiesp compara a evolução das importações de produtos industrializados, entre 2001 e 2010, nos Estados com incentivos e nos demais. Nos primeiros, as importações daqueles bens cresceram bem acima da média anual de 12,6% observada no segundo grupo de Estados. O caso de Santa Catarina é especialmente notável: sua participação nas importações de industrializados aumentou de 2% do total nacional em 2003, no início de seu programa de incentivos, para 6,6% em 2010.
Em consequência de políticas desse tipo, as importações brasileiras de produtos industrializados devem ter sido, no ano passado, 9,8% maiores do que seriam sem os incentivos. Dos US$ 145,1 bilhões gastos com esses produtos em 2010, US$ 14,2 bilhões devem ser explicáveis pelas políticas estaduais, segundo o estudo. Esses incentivos agravam os problemas de competitividade já enfrentados pelos empresários nacionais - aqueles causados por fatores como o câmbio valorizado, os impostos excessivos e as deficiências de logística.
O documento da Fiesp menciona dez Estados envolvidos nesse tipo de aberração fiscal: Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo, Sergipe, Alagoas, Maranhão, Pernambuco, Mato Grosso do Sul, Tocantins e Goiás. Estes três últimos, curiosamente, não têm portos marítimos e Goiás e Tocantins nem sequer têm fronteiras com o exterior.
O começo é sempre dificil, vamos tentar outra vez - diplomacia dilmista...
Sempre tive curiosidade em saber quem elaborava certas notas...
Agora acho que teremos um upgrade conceitual, pelo menos nisso.
Dilma cobra do Itamaraty diplomacia de resultados
NATUZA NERY
Folha de S.Paulo, 28/03/2011
Presidente quer de seu chanceler menos simbolismos e mais ganhos
Planalto reclamou da pouca "substância" no encontro com Obama e de fala sobre Líbia que irritou rebeldes do país
BRASÍLIA - Quando o chanceler Antonio Patriota indicou à presidente Dilma Rousseff que a vinda de Barack Obama ao Brasil em apenas três meses de governo já era, em si, um êxito, ela rebateu incomodada: afora os simbolismos, queria ver ganhos concretos.
A relação de Dilma com o Itamaraty passa por ajustes.
E só agora o Ministério das Relações Exteriores começa a entender o que a presidente quer nos próximos quatro anos: uma "diplomacia de resultados".
Embora haja sintonia na área dos direitos humanos, ainda existe descompasso em outras frentes.
Patriota, bem avaliado internamente neste início de governo, foi alvo de críticas nos casos Líbia-Obama.
O Planalto viu pouca "substância" e muita retórica no saldo do encontro com o presidente americano, e não gostou nada da nota "genérica" emitida no último domingo pelo Itamaraty pedindo o cessar-fogo no país de Muammar Gaddafi.
A presidente gostou menos ainda de saber que rebeldes líbios haviam criticado o posicionamento do Brasil, interpretado como tolerante ao regime ditatorial.
No dia seguinte ao comunicado, Dilma telefonou a Patriota enquanto embarcava para Manaus. Reclamou do tom da nota e de não ter sido consultada previamente sobre assunto "tão delicado". Ele concordou, e desculpou-se ao fim da conversa.
Depois de eleita, Dilma afirmou que não toleraria violações aos direitos humanos, uma mudança de rumo em relação ao ex-presidente Lula. Na quinta-feira, o Brasil contrariou o Irã em um organismo da ONU, após anos agindo no sentido contrário.
Com seu voto, o Brasil ajudou a aprovar o envio de um relator da ONU para investigar denúncias de caráter humanitário na nação persa. Outro sinal de diferença de estilo: foi Dilma, e não o ministério, quem escreveu a maior parte do discurso feito à mídia ao lado de Obama.
No lugar de um rascunho mais sóbrio, a presidente proferiu um discurso que tratava de "contradições" em negociações comerciais, financeiras e, no caso da reforma do Conselho de Segurança da ONU, políticas.
Na ocasião, referiu-se ao "passado" dando recado do que informou não querer no futuro: relacionamento bilateral "encoberto por retórica vazia". Até o roteiro usado por ela no encontro com Obama -fichas com os principais temas da conversa, os "talking points"- foi alterado para dar uma entonação mais objetiva à reunião.
AUTOCRÍTICA
Segundo relatos obtidos pela Folha, Patriota já teria dito que precisa se adequar ao estilo Dilma, e diplomatas resgatam a máxima de que não há Fla-Flu em política externa e que nem sempre os ganhos são concretos.
A despeito dos ajustes, interlocutores palacianos afirmam que a presidente tende a dar, aos poucos, mais poder ao Itamaraty e que ela não reproduziu o modelo "dual" de seu antecessor.
O então chanceler Celso Amorim dividia com Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência ainda no cargo, negociações internacionais importantes. Marco Aurélio, porém, continua liderando diálogos na América Latina e em outros países.
Dilma fará, em abril, sua primeira viagem à China, um parceiro estratégico e negociador duro. O evento dirá quão afinados estarão Itamaraty e a "diplomacia de resultados" desejada por Dilma.
Colaborou PATRÍCIA CAMPOS MELLO
Agora acho que teremos um upgrade conceitual, pelo menos nisso.
Dilma cobra do Itamaraty diplomacia de resultados
NATUZA NERY
Folha de S.Paulo, 28/03/2011
Presidente quer de seu chanceler menos simbolismos e mais ganhos
Planalto reclamou da pouca "substância" no encontro com Obama e de fala sobre Líbia que irritou rebeldes do país
BRASÍLIA - Quando o chanceler Antonio Patriota indicou à presidente Dilma Rousseff que a vinda de Barack Obama ao Brasil em apenas três meses de governo já era, em si, um êxito, ela rebateu incomodada: afora os simbolismos, queria ver ganhos concretos.
A relação de Dilma com o Itamaraty passa por ajustes.
E só agora o Ministério das Relações Exteriores começa a entender o que a presidente quer nos próximos quatro anos: uma "diplomacia de resultados".
Embora haja sintonia na área dos direitos humanos, ainda existe descompasso em outras frentes.
Patriota, bem avaliado internamente neste início de governo, foi alvo de críticas nos casos Líbia-Obama.
O Planalto viu pouca "substância" e muita retórica no saldo do encontro com o presidente americano, e não gostou nada da nota "genérica" emitida no último domingo pelo Itamaraty pedindo o cessar-fogo no país de Muammar Gaddafi.
A presidente gostou menos ainda de saber que rebeldes líbios haviam criticado o posicionamento do Brasil, interpretado como tolerante ao regime ditatorial.
No dia seguinte ao comunicado, Dilma telefonou a Patriota enquanto embarcava para Manaus. Reclamou do tom da nota e de não ter sido consultada previamente sobre assunto "tão delicado". Ele concordou, e desculpou-se ao fim da conversa.
Depois de eleita, Dilma afirmou que não toleraria violações aos direitos humanos, uma mudança de rumo em relação ao ex-presidente Lula. Na quinta-feira, o Brasil contrariou o Irã em um organismo da ONU, após anos agindo no sentido contrário.
Com seu voto, o Brasil ajudou a aprovar o envio de um relator da ONU para investigar denúncias de caráter humanitário na nação persa. Outro sinal de diferença de estilo: foi Dilma, e não o ministério, quem escreveu a maior parte do discurso feito à mídia ao lado de Obama.
No lugar de um rascunho mais sóbrio, a presidente proferiu um discurso que tratava de "contradições" em negociações comerciais, financeiras e, no caso da reforma do Conselho de Segurança da ONU, políticas.
Na ocasião, referiu-se ao "passado" dando recado do que informou não querer no futuro: relacionamento bilateral "encoberto por retórica vazia". Até o roteiro usado por ela no encontro com Obama -fichas com os principais temas da conversa, os "talking points"- foi alterado para dar uma entonação mais objetiva à reunião.
AUTOCRÍTICA
Segundo relatos obtidos pela Folha, Patriota já teria dito que precisa se adequar ao estilo Dilma, e diplomatas resgatam a máxima de que não há Fla-Flu em política externa e que nem sempre os ganhos são concretos.
A despeito dos ajustes, interlocutores palacianos afirmam que a presidente tende a dar, aos poucos, mais poder ao Itamaraty e que ela não reproduziu o modelo "dual" de seu antecessor.
O então chanceler Celso Amorim dividia com Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência ainda no cargo, negociações internacionais importantes. Marco Aurélio, porém, continua liderando diálogos na América Latina e em outros países.
Dilma fará, em abril, sua primeira viagem à China, um parceiro estratégico e negociador duro. O evento dirá quão afinados estarão Itamaraty e a "diplomacia de resultados" desejada por Dilma.
Colaborou PATRÍCIA CAMPOS MELLO
"J." Kassab: a frase de dois séculos, ou a quadratura dos arredondamentos...
Impagável esse prefeito, que se acredita maior que seus votos, e que já tentou surripiar JK da sigla JK, escrevendo Gilberto com Jota...
Dele retenho uma frase que mereceria estar em qualquer antologia política:
"Partido não será de direita, nem de esquerda, nem centro."
Kassab, Exclusivo: em entrevista à Estadão ESPN
Vamos colocar esse partido no lugar que ele merece: no quadrado da hipotenusa do Pi, elevado à 0,00001 potência....
Alguns comentários impagáveis no site do Estadão:
Nem esquerda nem direita nem centro! então para que um novo partido, não tem ideologia???!!!! é para locação???
Sinceramente, às vezes tenho a impressão que o prefeito Kassab é um fiel consumidor do cigarrinho do capeta...
Nem de esquerda, direita ou de centro. Será o PTO, partido dos traidores e oportunistas. Já nasceu morto.
Tá certo será um partido de FUNDOS, buscará muitos fundos para angariar o máximo de dinheiro. E se possível ultrapassar o PMDB o rei dos ministérios que tem muito dinheiro.
UM PARTIDO QUE NÃO SERÁ! Será apenas uma legenda de aluguel que se deixa vender baratinho, baratinho...
Noberto Bobbio Estava errado! Não existe mais direita nem esquerda. O que há, de fato, é uma bipolarização em torno daqueles que estão comendo (a dita situação) e daqueles que estão de fora querendo comer (oposição). É só isso. O resto são elucubrações teóricas desprovidas de valor prático.
Dele retenho uma frase que mereceria estar em qualquer antologia política:
"Partido não será de direita, nem de esquerda, nem centro."
Kassab, Exclusivo: em entrevista à Estadão ESPN
Vamos colocar esse partido no lugar que ele merece: no quadrado da hipotenusa do Pi, elevado à 0,00001 potência....
Alguns comentários impagáveis no site do Estadão:
Nem esquerda nem direita nem centro! então para que um novo partido, não tem ideologia???!!!! é para locação???
Sinceramente, às vezes tenho a impressão que o prefeito Kassab é um fiel consumidor do cigarrinho do capeta...
Nem de esquerda, direita ou de centro. Será o PTO, partido dos traidores e oportunistas. Já nasceu morto.
Tá certo será um partido de FUNDOS, buscará muitos fundos para angariar o máximo de dinheiro. E se possível ultrapassar o PMDB o rei dos ministérios que tem muito dinheiro.
UM PARTIDO QUE NÃO SERÁ! Será apenas uma legenda de aluguel que se deixa vender baratinho, baratinho...
Noberto Bobbio Estava errado! Não existe mais direita nem esquerda. O que há, de fato, é uma bipolarização em torno daqueles que estão comendo (a dita situação) e daqueles que estão de fora querendo comer (oposição). É só isso. O resto são elucubrações teóricas desprovidas de valor prático.
Mercosul aos 20 anos (1): um pouco de sua história - Paulo R. de Almeida
O primeiro de uma série...
Mercosul aos 20 anos (1): um pouco de sua história
Paulo Roberto de Almeida
Especial para o iG, 28/03/2011 10:46
A não consecução plena do Mercosul se deve à incapacidade dos países membros de cumprir com as normas e decisões pactuadas
De onde veio o Mercosul? De um projeto político, mas com intenções claramente econômicas de integração bilateral: a Ata para a Integração Brasil-Argentina, de 1986, estabelecendo, segundo modalidades baseadas na complementação industrial, o Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE), de caráter gradual, flexível e equilibrado, e prevendo tratamentos preferenciais frente a terceiros mercados. No seu âmbito foram assinadas duas dúzias de protocolos setoriais para a integração progressiva de diversos ramos da indústria e da agricultura dos dois países, assim como foram assinados, também bilateralmente, acordos de cooperação em outras áreas (como a nuclear, por exemplo).
Edificando sobre o que parecia ser uma metodologia eficiente, em 1988, foi adotado o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento entre Brasil e Argentina, com o objetivo de consolidar o processo de integração bilateral e instituir, numa primeira etapa, um espaço econômico comum no prazo máximo de dez anos. Estavam previstas a harmonização das políticas aduaneiras, comercial, agrícola, industrial e de transportes e comunicações, assim como a coordenação de políticas monetária, fiscal e cambial; numa segunda etapa, se procederia à harmonização gradual das demais políticas necessárias à formação do mercado comum.
Se tudo marchasse conforme o previsto pelos arquitetos originais do projeto de integração bilateral, o mercado comum brasileiro-argentino deveria ter início em 1998, supondo-se que os protocolos setoriais de complementação econômica e a liberalização comercial tivessem avançado de maneira satisfatória, sem nenhuma resistência de setores pouco competitivos num e noutro país. Esse processo bilateral e administrado – bem mais mercantilista do que propriamente livre-cambista – foi interrompido e substituído, em meados de 1990, por um outro modelo de integração, no qual mecanismos e prazos (ainda que não suas modalidades institucionais) foram profundamente modificados em relação ao protótipo original.
As razões foram basicamente políticas: duas novas administrações – o presidente Carlos Saul Menem, na Argentina, o presidente Fernando Collor, no Brasil – tomaram posse e passaram a introduzir profundas mudanças, ditas neoliberais, nas políticas econômicas dos dois países e, consequentemente, em suas políticas setoriais, como a comercial e a industrial. No que se refere especificamente ao processo de integração bilateral, este abandonou a versão flexível, gradualista e setorial – ou seja, dirigida e administrada pelos governos – que exibia até então, em favor de um ritmo e uma amplitude bem mais amplos e acelerados do que o talvez desejado pelos ramos e setores apresentando problemas de competitividade e certa sensibilidade à abertura generalizada.
A nova estrutura, prevendo uma redução dos prazos à metade do originalmente previsto e uma cobertura total do universo tarifário (em lugar da abordagem por protocolos setoriais, como previsto nos mecanismos em vigor), foi consolidada na chamada Ata de Buenos Aires, assinada em julho de 1990 pelos dois novos presidentes e registrada pouco depois na Aladi como Acordo de Complementação Econômica n. 14 (ACE-14). A ela reagiriam imediatamente os países vizinhos, sobretudo os dois menores, cuja interface de comércio com os dois maiores era, como sempre foi, muito importante em suas relações econômicas regionais.
Como resultado dessas consultas realizadas no segundo semestre de 1990 e início do ano seguinte, com a participação inclusive do Chile – que, no entanto, não aderiu ao novo esquema por diferenças insanáveis entre as estruturas alfandegárias –, chegou-se ao Tratado de Assunção (TA), assinado em 26 de março de 1991. Os que se deram ao trabalho de comparar os dois instrumentos, o ACE-14 e o TA, constataram que o segundo é praticamente uma cópia, quadrilateralizada, daquele primeiro instrumento bilateral, preservando-se, com alguns ajustes, os mesmos mecanismos de desgravação tarifária e as mesmas instituições.
A primeira característica do TA é a de que, diferentemente de outros tratados constitutivos de um mercado comum – como, por exemplo, o tratado de Roma de 1957, que instituiu a Comunidade Econômica Europeia, cuja peça central era o mercado comum de bens, serviços e fatores produtivos –, esse instrumento jurídico fundacional do Mercosul é um simples acordo-quadro. Com efeito, o TA não é o tratado do Mercado Comum do Sul, mas como seu nome indica, um tratado para a constituição de um mercado comum entre os quatro países membros, sendo explicitamente transitório e praticamente desprovido de mecanismos compulsórios como seu contraparte europeu.
Para ser mais preciso, os dois únicos dispositivos autoaplicáveis, definidos nos artigos 1º e 18º, referiam-se, de um lado, à implementação da liberalização comercial entre os sócios – objeto do Anexo I, que descrevia a modalidade a ser aplicada para a desgravação automática de tarifas – e, de outro, à convocação de uma conferência diplomática para “determinar a estrutura institucional definitiva dos órgãos de administração do Mercado Comum”. Todos os demais artigos, inclusive o primeiro, voltados para os componentes do futuro “mercado comum” não definiam mecanismos de implementação ou modalidades de entrada em vigor, com o que o projeto mercado comum ficava dependente de algumas poucas medidas descritas de modo genérico: estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum, coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais e harmonização de legislações nos setores pertinentes.
Cabe, com efeito, sublinhar essas características do TA, que dificultam o atingimento ou a consecução dos objetivos fixados, à falta de mecanismos, competências e prazos que definam precisamente o que vai ser feito, por quem, e quando. O contraste com o modelo europeu é, obviamente, flagrante. O artigo 23 do Tratado de Roma (revisto) estipula, por exemplo, que a “Comunidade é fundada sobre uma união aduaneira que se estende ao conjunto dos intercâmbios de mercadorias e que implica a proibição, entre os Estados membros, de direitos alfandegários na importação e exportação e de todas as taxas com efeito equivalente, bem como a adoção de uma tarifa alfandegária comum em suas relações com terceiros países”. Consequentemente, o capítulo sobre a união alfandegária (aliás, o primeiro) estipula, em seu artigo 25, que “os direitos alfandegários na importação e na exportação ou as taxas com efeitos equivalentes, são proibidos entre os Estados membros. Esta proibição se aplica igualmente aos direitos alfandegários de caráter fiscal”.
O artigo 26 do Tratado de Roma, por sua vez, diz que os direitos alfandegários – ou seja, as tarifas de comércio exterior – são fixados pelo Conselho, decidindo por maioria qualificada, sob proposta da Comissão”. Não é preciso dizer que todos esses dispositivos são controlados em diversas instâncias comunitárias, e os países membros que por acaso derroguem a essas obrigações podem ser sancionados, inclusive pecuniariamente, pelo Tribunal de Justiça Europeu. Nada disso, é claro, existe no Mercosul.
O Protocolo de Ouro Preto (POP, de 1994), que confirmou os mecanismos e instituições do TA – criando, ademais do Conselho e do Grupo Mercado Comum, que já existiam no esquema bilateral, uma Comissão de Comércio –, não inovou em praticamente nada no plano substantivo, contentando-se em afirmar, em seu artigo 34, que o Mercosul “terá personalidade jurídica de Direito Internacional”. Não se sabe, exatamente, as implicações dessa caracterização, uma vez que o bloco não é dotado de vontade própria, tendo sido confirmada sua estrutura institucional de natureza intergovernamental, que já era a do esquema bilateral Brasil-Argentina e que foi preservada no sistema quadrilateral. Também foram preservados desvios “pontuais” ou admitidas várias “exceções” – nacionais, sublinhe-se enfaticamente – que deveriam ter sido eliminadas paulatinamente, num julgamento otimista quanto à convergência imaginada nos primeiros tempos de “institucionalização”.
Independentemente, porém, dessa estabilização institucional – ou da preferência por um processo estritamente controlado pelos governos dos Estados membros, e não dotado de ferramentas autônomas, ou “desnacionalizadas”, como no modelo europeu – é um fato que o processo de integração conheceu notável dinamismo em sua primeira década, tanto no que se refere ao crescimentos dos fluxos e intercâmbios recíprocos, como no plano dos instrumentos acessórios – tratados e protocolos setoriais – negociados e implementados com vistas a cumprir o objetivo da abertura e da harmonização legal entre os países. O comércio recíproco cresceu significativamente, tanto para dentro como para fora do bloco – em parte respondendo a processos nacionais de abertura econômica e de liberalização comercial, mas também ao impulso dado por uma tarifa que, na média, teve alíquotas sensivelmente reduzidas.
As interações de todo tipo entre as economias nacionais assumiram grande importância para os agentes econômicos, e para os governos, de cada um dos Estados membros. No caso dos dois pequenos, a já alta participação dos dois grandes em suas economias foi consolidada; no caso da Argentina, o Brasil passou a ocupar a primeira posição no intercâmbio comercial externo, a ponto de se chegar a falar, no final da década, de uma “Brasil dependência”. Para o Brasil, também, a despeito da maior diversificação de parceiros externos, o peso do Mercosul cresceu em seu comércio exterior, alcançando mais de 17% do total (sendo a maior parte com a Argentina, obviamente) em 1998, para um volume em torno de 4% ao início do processo.
A “estrutura institucional definitiva” do Mercosul, tal como estabelecida no POP e apenas complementada aqui e ali por alguns instrumentos secundários – sistema de solução de controvérsias, mas sem tribunal arbitral pleno – e alguns poucos mecanismos de coordenação ou de cooperação setorial (em especial na área jurídica), não foi capaz de lidar com pressões sistêmicas ou crises estruturais. Muitas serão as razões da crise séria atravessada pelo Mercosul a partir de 1999, da qual ele não parece ter se redimido desde então, mesmo se os volumes de comércio – depois de terem sido reduzidos à metade com a crise da desvalorização brasileira, em 1999, e a crise terminal do sistema de conversibilidade monetária na Argentina, entre 2000 e 2001 – conheceram uma retomada desde meados da primeira década dos 2000 e passaram a novos patamares desde então.
Podem ser apontados fatores conjunturais de origem nacional – como abalos nos processos de estabilização respectivos do Brasil e da Argentina, que também impactaram os menores – e também elementos de natureza sistêmica ou estrutural, derivados da própria insuficiência do Mercosul enquanto arquitetura “disciplinadora” das principais políticas econômicas nacionais, macroeconômicas e setoriais, como responsáveis pelos sérios abalos enfrentados pelo bloco desde o final de sua primeira década. Um diagnóstico preciso das razões da crise – tanto as temporárias, ou conjunturais, como as de fundo, ou estruturais – é importante justamente para poder justificar todo o argumento deste ensaio especulativo, qual seja: o de saber se o Mercosul deve continuar a ser “construído”, segundo as mesmas bases institucionais seguidas até aqui, ou se ele deve ser repensado, revisto e eventualmente reconfigurado, numa versão talvez menos ambiciosa do que aquela definida pelos TA e POP.
Permito-me afastar, desde logo, razões frequentemente apontadas por críticos externos – geralmente “juristas de academia”, ou sociólogos universitários – como estando na origem dessa crise, que seriam, segundo esses observadores, as “insuficiências institucionais” ou o “déficit democrático” no bloco. Quem assim argumenta defende obviamente a ideia de que o Mercosul está em crise por ter preservado sua natureza intergovernamental, em lugar de ter avançado, no momento apropriado – em Ouro Preto, ou posteriormente –, para uma estrutura de tipo comunitária, com instituições supranacionais que seriam supostamente capazes de disciplinar os países membros no cumprimento de seus “deveres integracionistas”. Outra linha de argumentos, que reputo igualmente falsos – e no entanto defendida inclusive por responsáveis políticos do próprio bloco –, imputa a “assimetrias estruturais” entre os países membros – ou seja desníveis socioeconômicos entre eles – a razão dos problemas na construção do Mercosul, preconizando, a partir daí, um “nivelamento de terreno”, para que se possa avançar, supostamente “harmoniosamente”, em direção dos objetivos fixados em 1991.
Não creio, por um lado, que as supostas razões institucionais estejam na origem da crise atual – e dos retrocessos práticos – do Mercosul, pela simples razão de que a estrutura institucional oferece um quadro jurídico suficiente para a realização dos objetivos de fato colocados no horizonte de realizações do bloco, que seriam uma zona de livre comércio mais ou menos completa e uma união aduaneira funcional e respondendo aos requerimentos desse conceito (ou seja, política comercial comum e uma tarifa completa harmonicamente aplicada). Ou seja, mesmo deixando de lado, no momento, o objetivo que pode ser tido como algo utópico do “mercado comum” – no sentido não em que ele seja irrealizável, mas a partir da simples constatação da pequena densidade de interdependência recíproca –, ainda assim nos confrontamos com a insuficiência das duas primeiras etapas do processo integrador.
A não consecução plena do Mercosul se deve, não a problemas institucionais – já que os instrumentos existentes seriam teoricamente suficientes e adequados para materializar o mercado comum –, mas à incapacidade dos países membros, ou de seus governos, de cumprir com as normas e decisões pactuadas conjuntamente nas reuniões decisórias de cúpula. Em resumo, os mecanismos em vigor seriam suficientes para atender às metas fixadas, caso os governos resolvessem empreender o caminho de uma real abertura recíproca, o que implicaria, obviamente, em empreender reformas internas tendentes a uma efetiva compatibilização com os objetivos integracionistas.
Não se pode, por outro lado, admitir, que supostas “assimetrias estruturais” estejam na origem das deficiências ou insuficiências do bloco, enquanto união aduaneira, uma vez que assimetrias existem em todas e quaisquer relações de interdependência que se possa conceber, tanto no plano puramente nacional – desníveis sociais e regionais, por exemplo – como na esfera externa ou internacional – diferenciais de competitividade existentes entre os países e economias, derivados de dotações diferentes de fatores, de políticas divergentes ou por quaisquer outros motivos – e isso desde o começo do mundo, ou pelo menos desde que os povos e sociedades começaram a interagir em bases regulares e pacíficas. Ou seja, essas supostas “assimetrias” estão justamente na base das vantagens ricardianas, do comércio entre as economias, dos investimentos externos e do progresso material dos povos, uma vez que são elas que estimulam a interpenetração, as trocas, a interdependência e a prosperidade comum.
Lutar “contra” assimetrias, supostas ou imaginadas, em sua maior parte, significa negar ou obstaculizar o benefício das trocas e da construção de “campeões de produtividade” em cada um dos países, já que se tenta, por medidas governamentais, influir em poderosos mecanismos de mercado, cujo impacto efetivo nos diferenciais de competitividade e nos padrões de trocas e de investimentos são sempre superiores aos parcos recursos que os governos possam mobilizar para esses esforços de “contenção” dos desafios colocados inevitavelmente em face dos agentes econômicos uma vez iniciado o processo de integração. Em última instância, esse esforço de “corrigir assimetrias” se revela tão inútil, ou vão, quanto essas tentativas de se lutar contra os desafios da globalização, que estarão inevitavelmente presentes, de uma maneira ou de outra, direta ou indiretamente, no radar econômico de todos os agentes econômicos nacionais, independentemente de quão fechadas sejam as fronteiras.
Pode-se atribuir aos problemas econômicos criados por crises internas ou externas – ou seja, processos inacabados de estabilização, ou choques adversos vindo de fatores que escapam ao controle dos decisores nacionais – uma parte das reticências em avançar no processo de integração por parte dos dirigentes políticos dos países membros. Em outros termos, inversão repentina de competitividade devido a bruscas alterações cambiais, crises de balanço de pagamentos geralmente associados a grandes déficits nas transações correntes, problemas fiscais agudos provocados por desequilíbrios internos não previstos ou repentinos, enfim, esses inúmeros problemas de gestão macroeconômica constituem fatores de atraso ou de bloqueio que podem provocar paradas ou retrocessos nos ritmos de abertura recíproca que deveriam ser implícitos aos processos de integração, ou seja, permanentes e irreversíveis.
Brasília, 25 de março de 2011.
Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas, mestre em Planejamento Econômico pela Universidade de Antuérpia, diplomata, professor de Economia Política nos programas de Mestrado e Doutorado do Uniceub. Site: www.pralmeida.org. Nenhum dos argumentos ou posições apresentados neste ensaio especulativo – em caráter exclusivamente pessoal – representa posições oficiais do governo brasileiro ou podem ser identificados a propostas do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
Mercosul aos 20 anos (1): um pouco de sua história
Paulo Roberto de Almeida
Especial para o iG, 28/03/2011 10:46
A não consecução plena do Mercosul se deve à incapacidade dos países membros de cumprir com as normas e decisões pactuadas
De onde veio o Mercosul? De um projeto político, mas com intenções claramente econômicas de integração bilateral: a Ata para a Integração Brasil-Argentina, de 1986, estabelecendo, segundo modalidades baseadas na complementação industrial, o Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE), de caráter gradual, flexível e equilibrado, e prevendo tratamentos preferenciais frente a terceiros mercados. No seu âmbito foram assinadas duas dúzias de protocolos setoriais para a integração progressiva de diversos ramos da indústria e da agricultura dos dois países, assim como foram assinados, também bilateralmente, acordos de cooperação em outras áreas (como a nuclear, por exemplo).
Edificando sobre o que parecia ser uma metodologia eficiente, em 1988, foi adotado o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento entre Brasil e Argentina, com o objetivo de consolidar o processo de integração bilateral e instituir, numa primeira etapa, um espaço econômico comum no prazo máximo de dez anos. Estavam previstas a harmonização das políticas aduaneiras, comercial, agrícola, industrial e de transportes e comunicações, assim como a coordenação de políticas monetária, fiscal e cambial; numa segunda etapa, se procederia à harmonização gradual das demais políticas necessárias à formação do mercado comum.
Se tudo marchasse conforme o previsto pelos arquitetos originais do projeto de integração bilateral, o mercado comum brasileiro-argentino deveria ter início em 1998, supondo-se que os protocolos setoriais de complementação econômica e a liberalização comercial tivessem avançado de maneira satisfatória, sem nenhuma resistência de setores pouco competitivos num e noutro país. Esse processo bilateral e administrado – bem mais mercantilista do que propriamente livre-cambista – foi interrompido e substituído, em meados de 1990, por um outro modelo de integração, no qual mecanismos e prazos (ainda que não suas modalidades institucionais) foram profundamente modificados em relação ao protótipo original.
As razões foram basicamente políticas: duas novas administrações – o presidente Carlos Saul Menem, na Argentina, o presidente Fernando Collor, no Brasil – tomaram posse e passaram a introduzir profundas mudanças, ditas neoliberais, nas políticas econômicas dos dois países e, consequentemente, em suas políticas setoriais, como a comercial e a industrial. No que se refere especificamente ao processo de integração bilateral, este abandonou a versão flexível, gradualista e setorial – ou seja, dirigida e administrada pelos governos – que exibia até então, em favor de um ritmo e uma amplitude bem mais amplos e acelerados do que o talvez desejado pelos ramos e setores apresentando problemas de competitividade e certa sensibilidade à abertura generalizada.
A nova estrutura, prevendo uma redução dos prazos à metade do originalmente previsto e uma cobertura total do universo tarifário (em lugar da abordagem por protocolos setoriais, como previsto nos mecanismos em vigor), foi consolidada na chamada Ata de Buenos Aires, assinada em julho de 1990 pelos dois novos presidentes e registrada pouco depois na Aladi como Acordo de Complementação Econômica n. 14 (ACE-14). A ela reagiriam imediatamente os países vizinhos, sobretudo os dois menores, cuja interface de comércio com os dois maiores era, como sempre foi, muito importante em suas relações econômicas regionais.
Como resultado dessas consultas realizadas no segundo semestre de 1990 e início do ano seguinte, com a participação inclusive do Chile – que, no entanto, não aderiu ao novo esquema por diferenças insanáveis entre as estruturas alfandegárias –, chegou-se ao Tratado de Assunção (TA), assinado em 26 de março de 1991. Os que se deram ao trabalho de comparar os dois instrumentos, o ACE-14 e o TA, constataram que o segundo é praticamente uma cópia, quadrilateralizada, daquele primeiro instrumento bilateral, preservando-se, com alguns ajustes, os mesmos mecanismos de desgravação tarifária e as mesmas instituições.
A primeira característica do TA é a de que, diferentemente de outros tratados constitutivos de um mercado comum – como, por exemplo, o tratado de Roma de 1957, que instituiu a Comunidade Econômica Europeia, cuja peça central era o mercado comum de bens, serviços e fatores produtivos –, esse instrumento jurídico fundacional do Mercosul é um simples acordo-quadro. Com efeito, o TA não é o tratado do Mercado Comum do Sul, mas como seu nome indica, um tratado para a constituição de um mercado comum entre os quatro países membros, sendo explicitamente transitório e praticamente desprovido de mecanismos compulsórios como seu contraparte europeu.
Para ser mais preciso, os dois únicos dispositivos autoaplicáveis, definidos nos artigos 1º e 18º, referiam-se, de um lado, à implementação da liberalização comercial entre os sócios – objeto do Anexo I, que descrevia a modalidade a ser aplicada para a desgravação automática de tarifas – e, de outro, à convocação de uma conferência diplomática para “determinar a estrutura institucional definitiva dos órgãos de administração do Mercado Comum”. Todos os demais artigos, inclusive o primeiro, voltados para os componentes do futuro “mercado comum” não definiam mecanismos de implementação ou modalidades de entrada em vigor, com o que o projeto mercado comum ficava dependente de algumas poucas medidas descritas de modo genérico: estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum, coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais e harmonização de legislações nos setores pertinentes.
Cabe, com efeito, sublinhar essas características do TA, que dificultam o atingimento ou a consecução dos objetivos fixados, à falta de mecanismos, competências e prazos que definam precisamente o que vai ser feito, por quem, e quando. O contraste com o modelo europeu é, obviamente, flagrante. O artigo 23 do Tratado de Roma (revisto) estipula, por exemplo, que a “Comunidade é fundada sobre uma união aduaneira que se estende ao conjunto dos intercâmbios de mercadorias e que implica a proibição, entre os Estados membros, de direitos alfandegários na importação e exportação e de todas as taxas com efeito equivalente, bem como a adoção de uma tarifa alfandegária comum em suas relações com terceiros países”. Consequentemente, o capítulo sobre a união alfandegária (aliás, o primeiro) estipula, em seu artigo 25, que “os direitos alfandegários na importação e na exportação ou as taxas com efeitos equivalentes, são proibidos entre os Estados membros. Esta proibição se aplica igualmente aos direitos alfandegários de caráter fiscal”.
O artigo 26 do Tratado de Roma, por sua vez, diz que os direitos alfandegários – ou seja, as tarifas de comércio exterior – são fixados pelo Conselho, decidindo por maioria qualificada, sob proposta da Comissão”. Não é preciso dizer que todos esses dispositivos são controlados em diversas instâncias comunitárias, e os países membros que por acaso derroguem a essas obrigações podem ser sancionados, inclusive pecuniariamente, pelo Tribunal de Justiça Europeu. Nada disso, é claro, existe no Mercosul.
O Protocolo de Ouro Preto (POP, de 1994), que confirmou os mecanismos e instituições do TA – criando, ademais do Conselho e do Grupo Mercado Comum, que já existiam no esquema bilateral, uma Comissão de Comércio –, não inovou em praticamente nada no plano substantivo, contentando-se em afirmar, em seu artigo 34, que o Mercosul “terá personalidade jurídica de Direito Internacional”. Não se sabe, exatamente, as implicações dessa caracterização, uma vez que o bloco não é dotado de vontade própria, tendo sido confirmada sua estrutura institucional de natureza intergovernamental, que já era a do esquema bilateral Brasil-Argentina e que foi preservada no sistema quadrilateral. Também foram preservados desvios “pontuais” ou admitidas várias “exceções” – nacionais, sublinhe-se enfaticamente – que deveriam ter sido eliminadas paulatinamente, num julgamento otimista quanto à convergência imaginada nos primeiros tempos de “institucionalização”.
Independentemente, porém, dessa estabilização institucional – ou da preferência por um processo estritamente controlado pelos governos dos Estados membros, e não dotado de ferramentas autônomas, ou “desnacionalizadas”, como no modelo europeu – é um fato que o processo de integração conheceu notável dinamismo em sua primeira década, tanto no que se refere ao crescimentos dos fluxos e intercâmbios recíprocos, como no plano dos instrumentos acessórios – tratados e protocolos setoriais – negociados e implementados com vistas a cumprir o objetivo da abertura e da harmonização legal entre os países. O comércio recíproco cresceu significativamente, tanto para dentro como para fora do bloco – em parte respondendo a processos nacionais de abertura econômica e de liberalização comercial, mas também ao impulso dado por uma tarifa que, na média, teve alíquotas sensivelmente reduzidas.
As interações de todo tipo entre as economias nacionais assumiram grande importância para os agentes econômicos, e para os governos, de cada um dos Estados membros. No caso dos dois pequenos, a já alta participação dos dois grandes em suas economias foi consolidada; no caso da Argentina, o Brasil passou a ocupar a primeira posição no intercâmbio comercial externo, a ponto de se chegar a falar, no final da década, de uma “Brasil dependência”. Para o Brasil, também, a despeito da maior diversificação de parceiros externos, o peso do Mercosul cresceu em seu comércio exterior, alcançando mais de 17% do total (sendo a maior parte com a Argentina, obviamente) em 1998, para um volume em torno de 4% ao início do processo.
A “estrutura institucional definitiva” do Mercosul, tal como estabelecida no POP e apenas complementada aqui e ali por alguns instrumentos secundários – sistema de solução de controvérsias, mas sem tribunal arbitral pleno – e alguns poucos mecanismos de coordenação ou de cooperação setorial (em especial na área jurídica), não foi capaz de lidar com pressões sistêmicas ou crises estruturais. Muitas serão as razões da crise séria atravessada pelo Mercosul a partir de 1999, da qual ele não parece ter se redimido desde então, mesmo se os volumes de comércio – depois de terem sido reduzidos à metade com a crise da desvalorização brasileira, em 1999, e a crise terminal do sistema de conversibilidade monetária na Argentina, entre 2000 e 2001 – conheceram uma retomada desde meados da primeira década dos 2000 e passaram a novos patamares desde então.
Podem ser apontados fatores conjunturais de origem nacional – como abalos nos processos de estabilização respectivos do Brasil e da Argentina, que também impactaram os menores – e também elementos de natureza sistêmica ou estrutural, derivados da própria insuficiência do Mercosul enquanto arquitetura “disciplinadora” das principais políticas econômicas nacionais, macroeconômicas e setoriais, como responsáveis pelos sérios abalos enfrentados pelo bloco desde o final de sua primeira década. Um diagnóstico preciso das razões da crise – tanto as temporárias, ou conjunturais, como as de fundo, ou estruturais – é importante justamente para poder justificar todo o argumento deste ensaio especulativo, qual seja: o de saber se o Mercosul deve continuar a ser “construído”, segundo as mesmas bases institucionais seguidas até aqui, ou se ele deve ser repensado, revisto e eventualmente reconfigurado, numa versão talvez menos ambiciosa do que aquela definida pelos TA e POP.
Permito-me afastar, desde logo, razões frequentemente apontadas por críticos externos – geralmente “juristas de academia”, ou sociólogos universitários – como estando na origem dessa crise, que seriam, segundo esses observadores, as “insuficiências institucionais” ou o “déficit democrático” no bloco. Quem assim argumenta defende obviamente a ideia de que o Mercosul está em crise por ter preservado sua natureza intergovernamental, em lugar de ter avançado, no momento apropriado – em Ouro Preto, ou posteriormente –, para uma estrutura de tipo comunitária, com instituições supranacionais que seriam supostamente capazes de disciplinar os países membros no cumprimento de seus “deveres integracionistas”. Outra linha de argumentos, que reputo igualmente falsos – e no entanto defendida inclusive por responsáveis políticos do próprio bloco –, imputa a “assimetrias estruturais” entre os países membros – ou seja desníveis socioeconômicos entre eles – a razão dos problemas na construção do Mercosul, preconizando, a partir daí, um “nivelamento de terreno”, para que se possa avançar, supostamente “harmoniosamente”, em direção dos objetivos fixados em 1991.
Não creio, por um lado, que as supostas razões institucionais estejam na origem da crise atual – e dos retrocessos práticos – do Mercosul, pela simples razão de que a estrutura institucional oferece um quadro jurídico suficiente para a realização dos objetivos de fato colocados no horizonte de realizações do bloco, que seriam uma zona de livre comércio mais ou menos completa e uma união aduaneira funcional e respondendo aos requerimentos desse conceito (ou seja, política comercial comum e uma tarifa completa harmonicamente aplicada). Ou seja, mesmo deixando de lado, no momento, o objetivo que pode ser tido como algo utópico do “mercado comum” – no sentido não em que ele seja irrealizável, mas a partir da simples constatação da pequena densidade de interdependência recíproca –, ainda assim nos confrontamos com a insuficiência das duas primeiras etapas do processo integrador.
A não consecução plena do Mercosul se deve, não a problemas institucionais – já que os instrumentos existentes seriam teoricamente suficientes e adequados para materializar o mercado comum –, mas à incapacidade dos países membros, ou de seus governos, de cumprir com as normas e decisões pactuadas conjuntamente nas reuniões decisórias de cúpula. Em resumo, os mecanismos em vigor seriam suficientes para atender às metas fixadas, caso os governos resolvessem empreender o caminho de uma real abertura recíproca, o que implicaria, obviamente, em empreender reformas internas tendentes a uma efetiva compatibilização com os objetivos integracionistas.
Não se pode, por outro lado, admitir, que supostas “assimetrias estruturais” estejam na origem das deficiências ou insuficiências do bloco, enquanto união aduaneira, uma vez que assimetrias existem em todas e quaisquer relações de interdependência que se possa conceber, tanto no plano puramente nacional – desníveis sociais e regionais, por exemplo – como na esfera externa ou internacional – diferenciais de competitividade existentes entre os países e economias, derivados de dotações diferentes de fatores, de políticas divergentes ou por quaisquer outros motivos – e isso desde o começo do mundo, ou pelo menos desde que os povos e sociedades começaram a interagir em bases regulares e pacíficas. Ou seja, essas supostas “assimetrias” estão justamente na base das vantagens ricardianas, do comércio entre as economias, dos investimentos externos e do progresso material dos povos, uma vez que são elas que estimulam a interpenetração, as trocas, a interdependência e a prosperidade comum.
Lutar “contra” assimetrias, supostas ou imaginadas, em sua maior parte, significa negar ou obstaculizar o benefício das trocas e da construção de “campeões de produtividade” em cada um dos países, já que se tenta, por medidas governamentais, influir em poderosos mecanismos de mercado, cujo impacto efetivo nos diferenciais de competitividade e nos padrões de trocas e de investimentos são sempre superiores aos parcos recursos que os governos possam mobilizar para esses esforços de “contenção” dos desafios colocados inevitavelmente em face dos agentes econômicos uma vez iniciado o processo de integração. Em última instância, esse esforço de “corrigir assimetrias” se revela tão inútil, ou vão, quanto essas tentativas de se lutar contra os desafios da globalização, que estarão inevitavelmente presentes, de uma maneira ou de outra, direta ou indiretamente, no radar econômico de todos os agentes econômicos nacionais, independentemente de quão fechadas sejam as fronteiras.
Pode-se atribuir aos problemas econômicos criados por crises internas ou externas – ou seja, processos inacabados de estabilização, ou choques adversos vindo de fatores que escapam ao controle dos decisores nacionais – uma parte das reticências em avançar no processo de integração por parte dos dirigentes políticos dos países membros. Em outros termos, inversão repentina de competitividade devido a bruscas alterações cambiais, crises de balanço de pagamentos geralmente associados a grandes déficits nas transações correntes, problemas fiscais agudos provocados por desequilíbrios internos não previstos ou repentinos, enfim, esses inúmeros problemas de gestão macroeconômica constituem fatores de atraso ou de bloqueio que podem provocar paradas ou retrocessos nos ritmos de abertura recíproca que deveriam ser implícitos aos processos de integração, ou seja, permanentes e irreversíveis.
Brasília, 25 de março de 2011.
Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas, mestre em Planejamento Econômico pela Universidade de Antuérpia, diplomata, professor de Economia Política nos programas de Mestrado e Doutorado do Uniceub. Site: www.pralmeida.org. Nenhum dos argumentos ou posições apresentados neste ensaio especulativo – em caráter exclusivamente pessoal – representa posições oficiais do governo brasileiro ou podem ser identificados a propostas do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
Fascismo corporativo: de Mussolini ao PT
Parece que não mudou muito, ou não mudou nada...
Mentalidade Fascistóide
João Luiz Maua
março 28, 2011
Durante a crise de 2008, em meio a uma queda acentuada dos preços de seus produtos e de uma forte retração da demanda internacional, o presidente da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, teve a ousadia de, em nome dos interesses dos acionistas, tomar algumas decisões que contrariavam os interesses políticos do Governo Lula, como a demissão de pessoal, o corte de investimentos e a aquisição de navios no exterior. Dali em diante, mesmo que de forma dissimulada, sua substituição passou a ser uma questão de honra para os áulicos petistas.
Semana passada, finalmente, a máscara caiu e o ministro Guido Mantega pediu formalmente a cabeça de Agnelli ao comando do Bradesco, maior acionista privado da companhia. Apesar dos excelentes resultados obtidos pela Vale durante a gestão do executivo, quando o valor de mercado saltou de US$ 9 bi para incríveis US$ 176 bilhões, dificilmente o governo não sairia ganhando com a chantagem, ainda que contra a vontade da maioria dos acionistas e funcionários.
O capitalismo de compadres (talvez “comparsas” fosse uma alcunha mais adequada) que vigora atualmente em terras tupiniquins tornou a maior parte das empresas, notadamente as que atuam em setores fortemente regulados, como o bancário, reféns dos humores de políticos e burocratas (embora, a bem da verdade, elas não tenham muito do que reclamar, já que os benefícios que tiram desta relação incestuosa com o governo não são desprezíveis). Exemplo claro de que a bajulação e o compadrio muitas vezes chegam às raias da indecência foi a recente demissão de Alexandre Schwartsman do Banco Santander, ocorrida logo depois que o economista teve o atrevimento de afirmar, na cara do presidente da Petrobras, algo que todo mundo já sabia: que as contas do governo são elaboradas através de malabarismos e artifícios contábeis.
Mas voltemos a Agnelli. Uma fonte do Governo Dilma, ouvida pela Agência Reuters sob a condição de anonimato, resumiu toda a questão de forma simples e direta. Segundo ela, a Vale “é a maior exportadora do Brasil e não pode se comportar de forma que não esteja de acordo com os interesses nacionais” (seja lá o que isto queira dizer). A mesma fonte admitiu ainda certo ciúme governamental, proveniente de uma suposta influência da Vale na China, de longe o maior importador de minérios do mundo e grande potência econômica emergente. Nas suas palavras, “Agnelli tem mais poder de persuasão sobre os chineses do que o embaixador brasileiro ou, até mesmo, a presidente”.
Aquela curta entrevista deixou patente a mentalidade fascistóide reinante nas entranhas do governo petista. No livro “Fascismo de esquerda”, Jonah Goldberg sustenta com propriedade que muitos esquerdistas estão corretos quando lamentam a cumplicidade entre governo e grandes corporações. O que eles são totalmente incapazes de compreender, no entanto, é que este é o sistema que eles mesmos abraçaram. Um sistema no qual o governo consente que os empresários permaneçam à frente dos negócios e, numa demonstração de cooperação e unidade, até mesmo lhes garante muitos benefícios e privilégios de toda sorte. Em troca, espera apenas que eles concordem com sua agenda política – e, de preferência, o ajude a implementá-la.
Arranjos como esse não foram raros ao longo da História. Desde o fascismo de Mussolini, passando pelo Nazismo de Hitler ou o New Deal de Roosevelt, até os dias de hoje, inúmeros governos mundo afora praticaram – e ainda praticam – esse “capitalismo” de Estado. No nazismo, por exemplo, os empresários provavam a sua lealdade ao Fuher sendo bons “cidadãos corporativos”, exatamente como fazem muitos hoje. Segundo Goldberg, a maneira de demonstrar lealdade difere significativamente – e o conteúdo moral das diferentes agendas também. É evidente a diferença entre o que o regime nazista esperava dos “bons empresários alemãos” e o que o petismo espera das nossas lideranças empresariais, como Agnelli, Eike Batista ou os banqueiros do Bradesco e do Santander. Isto, no entanto, não altera algumas semelhanças fundamentais.
Muito embora existam correntes socialistas radicais dentro do próprio PT que pregam isso abertamente, não há razões para acreditar que o governo atual pretenda reestatizar a Vale. O que ele quer, repito, é atrelar a Vale à sua agenda política e social. “A Responsabilidade social corporativa”, costumam dizer os esquerdistas, “é a pedra angular do desenvolvimento econômico e social sustentável”. Não é preciso ser nenhum George Orwell para decifrar o que isso quer dizer em “novilíngua”.
Mentalidade Fascistóide
João Luiz Maua
março 28, 2011
Durante a crise de 2008, em meio a uma queda acentuada dos preços de seus produtos e de uma forte retração da demanda internacional, o presidente da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, teve a ousadia de, em nome dos interesses dos acionistas, tomar algumas decisões que contrariavam os interesses políticos do Governo Lula, como a demissão de pessoal, o corte de investimentos e a aquisição de navios no exterior. Dali em diante, mesmo que de forma dissimulada, sua substituição passou a ser uma questão de honra para os áulicos petistas.
Semana passada, finalmente, a máscara caiu e o ministro Guido Mantega pediu formalmente a cabeça de Agnelli ao comando do Bradesco, maior acionista privado da companhia. Apesar dos excelentes resultados obtidos pela Vale durante a gestão do executivo, quando o valor de mercado saltou de US$ 9 bi para incríveis US$ 176 bilhões, dificilmente o governo não sairia ganhando com a chantagem, ainda que contra a vontade da maioria dos acionistas e funcionários.
O capitalismo de compadres (talvez “comparsas” fosse uma alcunha mais adequada) que vigora atualmente em terras tupiniquins tornou a maior parte das empresas, notadamente as que atuam em setores fortemente regulados, como o bancário, reféns dos humores de políticos e burocratas (embora, a bem da verdade, elas não tenham muito do que reclamar, já que os benefícios que tiram desta relação incestuosa com o governo não são desprezíveis). Exemplo claro de que a bajulação e o compadrio muitas vezes chegam às raias da indecência foi a recente demissão de Alexandre Schwartsman do Banco Santander, ocorrida logo depois que o economista teve o atrevimento de afirmar, na cara do presidente da Petrobras, algo que todo mundo já sabia: que as contas do governo são elaboradas através de malabarismos e artifícios contábeis.
Mas voltemos a Agnelli. Uma fonte do Governo Dilma, ouvida pela Agência Reuters sob a condição de anonimato, resumiu toda a questão de forma simples e direta. Segundo ela, a Vale “é a maior exportadora do Brasil e não pode se comportar de forma que não esteja de acordo com os interesses nacionais” (seja lá o que isto queira dizer). A mesma fonte admitiu ainda certo ciúme governamental, proveniente de uma suposta influência da Vale na China, de longe o maior importador de minérios do mundo e grande potência econômica emergente. Nas suas palavras, “Agnelli tem mais poder de persuasão sobre os chineses do que o embaixador brasileiro ou, até mesmo, a presidente”.
Aquela curta entrevista deixou patente a mentalidade fascistóide reinante nas entranhas do governo petista. No livro “Fascismo de esquerda”, Jonah Goldberg sustenta com propriedade que muitos esquerdistas estão corretos quando lamentam a cumplicidade entre governo e grandes corporações. O que eles são totalmente incapazes de compreender, no entanto, é que este é o sistema que eles mesmos abraçaram. Um sistema no qual o governo consente que os empresários permaneçam à frente dos negócios e, numa demonstração de cooperação e unidade, até mesmo lhes garante muitos benefícios e privilégios de toda sorte. Em troca, espera apenas que eles concordem com sua agenda política – e, de preferência, o ajude a implementá-la.
Arranjos como esse não foram raros ao longo da História. Desde o fascismo de Mussolini, passando pelo Nazismo de Hitler ou o New Deal de Roosevelt, até os dias de hoje, inúmeros governos mundo afora praticaram – e ainda praticam – esse “capitalismo” de Estado. No nazismo, por exemplo, os empresários provavam a sua lealdade ao Fuher sendo bons “cidadãos corporativos”, exatamente como fazem muitos hoje. Segundo Goldberg, a maneira de demonstrar lealdade difere significativamente – e o conteúdo moral das diferentes agendas também. É evidente a diferença entre o que o regime nazista esperava dos “bons empresários alemãos” e o que o petismo espera das nossas lideranças empresariais, como Agnelli, Eike Batista ou os banqueiros do Bradesco e do Santander. Isto, no entanto, não altera algumas semelhanças fundamentais.
Muito embora existam correntes socialistas radicais dentro do próprio PT que pregam isso abertamente, não há razões para acreditar que o governo atual pretenda reestatizar a Vale. O que ele quer, repito, é atrelar a Vale à sua agenda política e social. “A Responsabilidade social corporativa”, costumam dizer os esquerdistas, “é a pedra angular do desenvolvimento econômico e social sustentável”. Não é preciso ser nenhum George Orwell para decifrar o que isso quer dizer em “novilíngua”.
Mercosul: a visao sempre otimista do Dr. Rosinha
Aos vinte anos, Mercosul é um dos blocos mais importantes do mundo, diz Rosinha
Informe da Liderança do PT na Câmara dos Deputados, 28/03/2011
O Tratado de Assunção, que deu origem ao Mercosul, completou vinte anos no último sábado. O deputado Dr. Rosinha (PT-PR) avalia que o bloco, que é composto por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, consolidou-se, sobretudo nos últimos cinco anos, como um dos blocos econômicas mais importantes e estratégicos do mundo. Ele observou que o bloco hoje é reconhecido no mundo inteiro e já negociou, de forma soberana, acordos comerciais importantes com países do continente africano, com Israel e ,mais recentemente, com a União Europeia. A Venezuela encontra-se em processo de adesão ao grupo.
Nos últimos cinco, o Mercosul ganhou maturidade e conquistou o respeito do mercado financeiro mundial. Por iniciativa do presidente Lula, o bloco deixou de ser simplesmente comercial e aberto para o mundo, adotando uma política de inserção maior entre seus membros, a partir da criação de um fundo de convergência, que tem orçamento anual de U$ 100 milhões”, destacou Dr. Rosinha.
Outro avanço estratégico para o bloco, destacou Rosinha, foi a criação do Parlasul. A adoção de um parlamento comum para o Mercosul, explicou o petista, deu ao bloco mais unidade e abriu novas possibilidades para o fortalecimento econômico e social comum. Esse é um diferencial para esse grupo de países”, disse, lembrando que o Parlasul foi criado em 2003, já no governo do presidente Lula.
Mercosul - O Tratado de Assunção, que oficializou a criação do bloco, foi assinado em 26 de março de 1991. Nesse período, a economia brasileira quintuplicou de tamanho o Produto Interno Bruto (PIB) saltou de US$ 386,2 bilhões em 1991, para US$ 2,07 trilhões no ano passado. O comércio exterior deu um salto: as exportação cresceram 542,7%, saindo de US$ 31,6 bilhões em 1991 para US$ 201 bilhões em 2010 com alta de 88% no superávit comercial.
Informe da Liderança do PT na Câmara dos Deputados, 28/03/2011
O Tratado de Assunção, que deu origem ao Mercosul, completou vinte anos no último sábado. O deputado Dr. Rosinha (PT-PR) avalia que o bloco, que é composto por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, consolidou-se, sobretudo nos últimos cinco anos, como um dos blocos econômicas mais importantes e estratégicos do mundo. Ele observou que o bloco hoje é reconhecido no mundo inteiro e já negociou, de forma soberana, acordos comerciais importantes com países do continente africano, com Israel e ,mais recentemente, com a União Europeia. A Venezuela encontra-se em processo de adesão ao grupo.
Nos últimos cinco, o Mercosul ganhou maturidade e conquistou o respeito do mercado financeiro mundial. Por iniciativa do presidente Lula, o bloco deixou de ser simplesmente comercial e aberto para o mundo, adotando uma política de inserção maior entre seus membros, a partir da criação de um fundo de convergência, que tem orçamento anual de U$ 100 milhões”, destacou Dr. Rosinha.
Outro avanço estratégico para o bloco, destacou Rosinha, foi a criação do Parlasul. A adoção de um parlamento comum para o Mercosul, explicou o petista, deu ao bloco mais unidade e abriu novas possibilidades para o fortalecimento econômico e social comum. Esse é um diferencial para esse grupo de países”, disse, lembrando que o Parlasul foi criado em 2003, já no governo do presidente Lula.
Mercosul - O Tratado de Assunção, que oficializou a criação do bloco, foi assinado em 26 de março de 1991. Nesse período, a economia brasileira quintuplicou de tamanho o Produto Interno Bruto (PIB) saltou de US$ 386,2 bilhões em 1991, para US$ 2,07 trilhões no ano passado. O comércio exterior deu um salto: as exportação cresceram 542,7%, saindo de US$ 31,6 bilhões em 1991 para US$ 201 bilhões em 2010 com alta de 88% no superávit comercial.
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