Minha Declaração de Voto: em quem não vou votar...
Paulo Roberto Almeida
Vou voltar a um assunto do qual eu preferia não me ocupar: as próximas eleições, em segundo turno, de 31 de outubro. Não para declarar o meu voto em favor de um dos dois candidatos, mas para retomar a mensagem que eu já havia delineado uma primeira vez neste texto: “Declaração de voto: dez pequenas regras contrarianistas”, Espaço Acadêmico (ano 10, n. 112, setembro 2010, p. 80-87; link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/11010/5972). Ou seja, eu declaro peremptoriamente que não tenho candidato, no sentido em que não me julgo representado ou identificado com nenhuma das propostas que estão sendo oferecidas pelos dois candidatos restantes. Sou por demais independente e contestador desse status quo “estagnacionista” no Brasil para me encantar com a visão do mundo e com os projetos estatizantes e dirigistas de cada um deles. Mas tenho, sim, minhas preocupações, que tenho expressado aqui em caráter parcial e fragmentado, “pílulas de pensamento” que não chegam a constituir exatamente uma proposta coerente (tanto porque não me julgo homem de partido e não tenho por que ficar fazendo publicidade de propostas políticas). Por isso mesmo vou repetir o mesmo procedimento seguido da vez anterior, e dizer em quem, ou em quais propostas não vou votar, pois as encontro especialmente negativas do ponto de vista da democracia, dos direitos humanos, das liberdades em geral no Brasil, além e acima das medidas de caráter econômico que possam ser implementadas por um ou outro dos candidatos eleitos.
Sim, tenho quase certeza de que as políticas econômicas não tendem a diferir muito entre si e representarão, na verdade, uma continuidade do que já temos. Claro, num caso temos a gastança compulsiva daqueles que acreditam no Estado, que acham que só o Estado pode fazer “justiça social”, e no outro temos um pouco mais, mas apenas um pouco mais, de responsabilidade fiscal, com uma visão mais mercadista ou menos intrusiva do papel do Estado na vida econômica. Isso pode fazer uma grande diferença no médio e longo prazo, embora seja menos relevante no horizonte de 4 anos, mas pode sim ser impactante dependendo das decisões que serão tomadas na próxima administração.
O que me separa de um deles, portanto, não é bem a economia, mas a política, ou mais exatamente os valores que devem guiar a atividade política e a chamada governança, com seus reflexos na vida de todos e cada um de nós, em termos de ética na vida pública, nos negócios, na gestão governamental, no tratamento dos meios de comunicação e coisas assim. Acho que não preciso me estender demasiado pois os leitores que frequentam este espaço são suficientemente inteligentes para saber do que estou falando e o que pretendo dizer, sem precisar expressar com todas as letras.
Acredito, sim, que o Brasil corre um grande perigo: o do retrocesso nessas práticas que podem ter uma influência decisiva na governança e nos valores que queremos ver predominando na vida pública. Como sempre escrevi aqui, eu tenho horror à desonestidade intelectual, à mentira, à fraude, à mistificação, à demagogia e ao populismo. E não tenho nenhum restrição de dizer que gostaria de ter, sim, um governo de elite, se por elite entendemos o mérito, o conhecimento, a busca do melhor, independentemente de origem social, de pertencimento étnico, de afiliação política ou religiosa. Membros da elite buscam o refinamento das pessoas, não a vulgaridade e o rebaixamento no mínimo denominador comum. Pessoas que integram a elite – e são todos aqueles que detém cargos de responsabilidade na vida pública, qualquer que seja a sua origem social ou condição profissional – visam o bem comum, isto é, o da coletividade, não o de um grupo determinado, não o de uma facção; elas querem a união dos esforços para vencer obstáculos, não opor classe contra classe, grupo contra grupo, como fazem todos os candidatos a ditador ou caudilho. Assim como eu ascendi à elite vindo de um meio muito pobre, pelo trabalho e pelo estudo, eu pretendo que todos tenham as chances que eu tive, por meio de escolas de qualidade que se dediquem a unir os brasileiros, não a dividi-los em supostas raças ou grupos étnicos. Sou contra qualquer apartheid, sou contra a vulgaridade, sou contra a mediocridade.
Não acho que preciso me estender mais sobre o assunto. Todos sabem o que penso, e todos podem assumir sua própria responsabilidade dentro de dois dias.
Por fim, quero dizer que mesmo sendo contra o voto obrigatório, sou contra o voto nulo, e acho que cada um deve assumir sua parcela de responsabilidade sobre o país que desejamos ter para nós e para todos aqueles com os quais convivemos, inclusive aqueles que virão depois de nós.
Boa cidadania a todos.
Paulo Roberto Almeida
(Shanghai, 29.10.2010)
5 comentários:
Paulo,
é uma lástima chegarmos a este ponto com uma campanha tão pobre em matéria de discussão quanto às demandas do país, ao estabelecimento de objetivos e à mobilização de meios para sua consecução. Ambos os candidatos diferem em grau quanto a suas sanhas estatizantes; além de um ser muito mais danoso às instituições democráticas do que o outro. No entanto, esses estadófilos não querem tratar de um problema muito importante: como um Estado com baixa capacidade de investimento em relação à sua arrecadação poderá cumprir as maravilhas apregoadas? Ou se reformula o Estado, tornando-o mais eficiente; ou se eleva a tributação, dando a possibilidade desse paquiderme crescer mais forte sem mudanças estruturais significativas. Este é sempre o caminho mais fácil; aquele já demanda muito maior esforço e dadas nossas características sócio-culturais é muito difícil que venha a ocorrer. O Brasil não se prepara para identificar e aproveitar as vantagens de uma época de maior integração global, nem se proteger dos efeitos negativos que esta nova época possa lhe trazer. E assim devemos prosseguir: massas de assistidos pelo Estado, custos de transação altíssimos, limitada mobilidade social por falta de empreendedorismo...
Novamente, preferimos comprar o bilhete para a gafieira do que para o jockey club. Até quando será assim?
Um forte abraço!
P.S: é claro que os amigos do rei vão muito bem...
O Sr. consegue votar aí no Japão?
Tentei descobrir em qual ele nao votaria. Pelo que li, arrisco que ele nao vota no Serra. Acertei?
Antes de qualquer comentário, parabéns pelo seu novo livro que foi citado no blog anteriormente. Por conseguinte, o voto não deve ser omisso, e todos os cidadãos devem realmente ter parcela na democracia que é proposta. Habermas, um dos grandes explanadores de como deve ser um projeto democrático de sociedade. Devemos ter um capacidade intersubjetiva de reflexão, exercendo soberania através da troca livre de argumentos, liberdade de consciência e do voto nesse contexto. Portanto, é necessário sempre lutar por uma melhor efetivação da aplicabilidade democrática teorizada inúmeras vezes. A democracia nunca acaba, processo contínuo.
Att
Danilo Belo da Silva Melo
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