Há exatamente uma semana o Real completou os primeiros 18 anos do que espero seja a longa vida de uma moeda que veio para ficar como um dos símbolos do avanço institucional do País. Os brasileiros que tinham 18 anos em 1994 - e, portanto, todos os que estão hoje na faixa dos 36-40 anos - provavelmente não têm nenhuma lembrança pessoal significativa, isto é, vivida, da marcha da insensatez que foi a evolução do processo inflacionário no Brasil pré-Real.
Vale lembrar: no meio século que vai de meados dos anos 40 a meados dos anos 90, o Brasil só teve três anos de inflação inferior a 10% (nos anos 40). Entre 1950 e 1980 a taxa média de inflação foi da ordem de 25%-30% ao ano. Do início dos anos 80 (quando chegou a 100%) até o Real, a taxa média anual foi superior a 600%, passando dos 1.000% em 1989 e chegando a quase 2.500% em 1993. Na literatura econômica há uma palavra para isso: hiperinflação.
Ainda era muito precária, à época, a percepção, que hoje felizmente existe, de que a inflação é um imposto. E o mais injusto de todos, porque incide principalmente sobre os mais pobres. Não é por acaso que os indicadores de concentração de renda e riqueza no Brasil nas últimas décadas - sejam os índices de Gini, sejam as parcelas de renda apropriadas pelo 1% mais rico e pelos 20% mais pobres - mostram que os piores anos de desigualdade na concentração de renda no Brasil foram ao final dos anos 80 e início dos anos 90.
O povo brasileiro entendeu, muito rapidamente, que o controle da inflação propiciado pelo Real era algo que redundava em seu benefício. E hoje a inflação baixa é vista como um objetivo da sociedade e como obrigação de qualquer governo minimamente responsável. Não é um fim em si mesmo, como sempre afirmamos, mas uma condição indispensável para que outros objetivos econômicos e sociais possam ser alcançados. Afinal, com inflação alta, crônica e crescente não há possibilidade alguma de verdadeira inclusão social, tampouco de crescimento sustentado.
O que quero dizer com isso? Que a importância e o significado do Real, que ora atinge sua maioridade, transcende de muito a derrota da hiperinflação em 1994. E que a agenda do Brasil pós-hiperinflação se confundia com a própria agenda do desenvolvimento econômico e social do País, que pôde, sem a zoeira da inflação, começar a alargar seus horizontes e procurar tornar-se um país mais normal, mais previsível, mais confiável, mais competitivo. Um país talvez capaz de crescer de forma sustentada, com inflação sob controle, com maior justiça social, menos pobreza, com as finanças públicas em ordem, infraestrutura decente, melhor educação e maior eficiência nos setores público e privado.
Como sabemos, 18 anos são pouco para a magnitude dessa empreitada. Mas o Brasil não começou com o Real e já havia avançado muito em períodos anteriores, apesar de aparências em contrário. Agora é preciso contemplar os próximos 18 anos. Afinal, 2030 está logo ali adiante, quando os que chegaram à sua maioridade com o Real - como meu filho mais moço - terão dobrada sua idade.
Quem viver até lá acompanhará as tentativas do governo atual, e os labores dos governos que se lhe seguirão, de lidar com as urgências constantemente postas e repostas pelo sempre fugidio "momento presente" - que exigem respostas no curto prazo da parte dos responsáveis por políticas públicas. Respostas que serão tão mais adequadas quanto mais levem em conta objetivos de longo prazo: políticas de Estado, e não apenas do governo de turno; para a próxima geração, e não somente para a próxima eleição.
Como procurou fazer o governo FHC, nessa área de respostas a problemas que precisavam ser encarados com firmeza - e o foram. Exemplos: a resolução de problemas de liquidez e solvência no sistema bancário nacional, privado e público; a reestruturação das dívidas de Estados e municípios então insolventes do ponto de vista fiscal e desde então sem problemas mais sérios nessa área; a Lei de Responsabilidade Fiscal, de maio de 2000, marco de mudança histórica nas finanças públicas brasileiras; o reconhecimento de que as necessidades de investimentos do País (não do governo) superavam de muito a capacidade do setor público e de suas empresas, exigindo mudanças, até mesmo constitucionais, que abrissem espaço ao investimento privado, doméstico e internacional.
É verdade que o ex-presidente Lula nunca reconheceu de público o quanto seu governo se beneficiou desses avanços. Ao contrario, preferiu caracterizá-los como herança maldita, algo que não engrandece. Mas não importa, a presidente Dilma fez tal reconhecimento de público de maneira muito explícita em mais de uma ocasião, desde seu relevante discurso de posse. Como antes haviam feito importantes ministros de Lula, como Antônio Palocci e Paulo Bernardo.
A propósito, é importante reconhecer que o governo Dilma, à diferença de seu antecessor, que nem sequer tentou (ou porque não quis, ou porque não pôde, ou talvez porque o extraordinário vento a favor que pegou da economia mundial lhe permitiu evitar incorrer em custos políticos domésticos), está procurando enfrentar certas "urgências do gradualismo", para as quais deveria ter apoio de quem pensa no longo prazo, como a mudança do insustentável regime de previdência do setor público e as "inexoráveis" concessões ao setor privado em áreas de infraestrutura, por exemplo. Para não falar nas necessárias resistências do Executivo às insaciáveis demandas de sua vastíssima "base de apoio" por contínua expansão dos gastos públicos no curto, no médio e no longo prazos.
Debates desse tipo são fundamentais quando se olha à frente. Afinal, teremos nada menos que cinco eleições presidenciais nos próximos 18 anos.
PEDRO S. MALAN, ECONOMISTA, FOI MINISTRO DA FAZENDA NO GOVERNO FHC. E-MAIL: MALAN@ESTADAO.COM.BR
4 comentários:
não fala bobagem. Desde quando esses "pilares" sustentaram alguma coisa? Cansei de ver você e outros conservadores dizendo que o Brasil cresceu nos últimos anos por causa do boom das commodities. Além deste, o pilar que realmente sustentou o ingresso de capitais todos esses anos foram os juros estratosféricos. Esse foi o único pilar da política econômica até o ano passado.
Anonimo contraditorio,
Nao cometa bobagens logico-formais, e outras contradicoes substanciais. Suas afirmacoes nao fazem nenhum sentido.
Conservadores sao os que na pretendem mudar nada, certo?
Ora, quem nao reformou uma virgula das politicas economicas anteriores foram os petralhas-conservadores, alias reacionarios, pois estao fazendo o Brasil retroceder 50 anos em materia de politicas comercial, industrial e outras.
De minha parte, eu reformaria tudo, das instituicoes 'as politicas, e portanto, sou revolucionario, nao conservador.
Se nao eram "pilares" porque o governo Lula os manteve, e ate aprofundou, num primeiro momento, oara comecar a desmantelar disfarcadamente, ate de forma envergonhada, sem confessar, depois disso.
Uma das fontes do crescimento na era Lula, pela qual ele nao e' em nada, absolutamente responsavel, foi o boom das commodities, o que foi dado de graca ao Brasil e o governo nao soube aproveitar, pois a sua "nova geografia" foi de uma bovagem a toda prova. Teve outras fontes tb, inclusive a desvalorizacao e a flutuacao que se seguiu.
O governo Lula so fez populismo cambial, mas isso ele confessa, e nem pode.
Ingresso de capitais pode nao ter a nada a ver com crescimento, apenas especulacao.
Entao vc quer dizer que o governo Lula manteve juros estratofericos durante oito anos so para nos prejudicar, quando poderia ter mudado o "modelo" e baixado os juros?
Que burrice!
De toda forma, juros altos nao faziam parte do modelo neoliberal: eles sao uma consequencia conjuntural do alto endivudamento publico.
O que o governo fez para baixa-los?
Aumentou as despesas publicas tres vezes acima do crescimento do PIB e duas vezes acima da inflacao?
Mas que burrice!
Ou que governo conservador, nao e'?
Anonimo contraditorios tem vergonha de se expor ou lhes falta coragem para debater abertamente?
Tem medo de ser contraditado?
Melhor aprender economia antes ou estudar a historia economica recente.
Meu blog costuma ser reservado a ideias inteligentes.
Da proxima vez, vc nao entra se continuar ignorante e contraditorio.
Paulo Roberto de Almeida
Professor, esse seu blog e a melhor coisa que existe na Internet! Cada vez que acesso fico mais impressionado com a qualidade do material postado e com seus comentarios. Esse ultimo post sobre o Plano Real e qualquer coisa! Parabens por seu trabalho!
Abraco,
Felipe Xavier
-- Uma breve história do Plano Real, aos seus 18 anos --
por Leandro Roque
Quando Itamar Franco assumiu interinamente a Presidência da República no dia 29 de dezembro de 1992, imediatamente após a renúncia de Fernando Collor, a inflação acumulada em 12 meses estava em 1.119%. Em 1991, ela havia sido de 472%. Em 1990, de 1.621%. Com o país mergulhado em uma crise política e com a economia em frangalhos, não havia a menor perspectiva entre a população de que houvesse qualquer arrefecimento na inflação de preços.
http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1294
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