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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Nacionalismo miope atrasa o Brasil e nos torna mais pobres

Incrível como duzentos anos de teoria das vantagens comparativas e dezenas de anos depois de serem comprovados os efeitos nefastos do protecionismo comercial, como ainda tem gente que defende, pratica, promove, estimula e justifica o mais canhestro protecionismo comercial e o nacionalismo mais rastaquera no domínio industrial.
Enfim, tem gente que não aprendeu economia, nem mesmo frequentando cursos (supostamente) de economia na faculdade, ou exibe uma visão estreita, míope, deformada, dos fenômenos econômicos, e por isso acaba praticando o que eu chamo de stalinismo industrial, ou seja, uma estrutura industrial verticalizada, feita unicamente no próprio país, ignorando completamente o fato de que qualquer indústria, hoje em dia, tem dimensão necessariamente internacional.
Apenas rústicos podem praticar nacionalismo de botequim e protecionismo de contabilidade invertida.
Assim marcha o Brasil (ou não?).
Paulo Roberto de Almeida 




Se, efetivamente, estender para todo o setor de energia elétrica a política de conteúdo local em vigor para a indústria do petróleo - medida já em discussão no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) -, o governo premiará mais um segmento específico da indústria nacional, como tem feito com outras medidas de estímulo à atividade econômica. É muito pouco provável, contudo, que com essa medida beneficie o País. A possibilidade de se exigir dos fornecedores de equipamentos para as áreas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica um índice mínimo de componentes nacionais, repetindo o que já se faz no setor de petróleo, pode criar uma reserva de mercado para determinadas empresas instaladas no País, com todas as consequências negativas inevitáveis nesse tipo de prática.
O governo argumenta que a extensão para o setor elétrico da política de conteúdo local permitirá combater o aumento das importações, dotar a indústria nacional de maior competitividade e dar mais segurança e confiabilidade ao sistema - além de aumentar o emprego. São, basicamente, os mesmos argumentos de que lançou mão para justificar essa política para o setor de petróleo.
Segundo o governo, é cada vez maior a presença de fornecedores estrangeiros em obras de infraestrutura, em particular em projetos de exploração de recursos naturais. Primeiro vieram os europeus, depois os chineses. É crescente, segundo o Ministério de Minas e Energia, a participação de equipamentos importados e também da mão de obra estrangeira na execução e operação dos projetos nessa área. Como mostrou reportagem do Estado, o documento em estudo pelo CNPE lembra que problemas como esses no setor do petróleo foram enfrentados com a adoção da política de conteúdo local.
Ao estudar meios de ampliar essa política nacionalista, o governo Dilma dá continuidade a mais um dos muitos equívocos de seu antecessor. A contratação, no Brasil, de equipamentos para a indústria do petróleo foi uma importante bandeira eleitoral do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Ela tinha o poder de encantar uma parte do empresariado, aquela que seria diretamente beneficiada pelo aumento das encomendas, outros que ganhariam com a dinamização da atividade em sua área e os trabalhadores, pois representaria mais empregos para eles.
A realidade, porém, tem sido muito diferente do cenário prometido pelo governo na defesa dessa política. A falta de capacidade de produção da indústria nacional para atender a encomendas de grande porte, como são comuns no setor de petróleo, vem retardando projetos da Petrobrás.
Mesmo que a indústria nacional esteja preparada para atender aos pedidos volumosos nas áreas de petróleo e de energia elétrica, há outros riscos decorrentes da exigência de conteúdo nacional. A existência de um mercado cativo para o produtor local desestimula a busca da eficiência e abre espaço para a prática de preços incompatíveis com o mercado internacional. O resultado pode ser produto de qualidade inferior ao de similares disponíveis no mercado externo, mais caros e entregues fora do prazo contratual.

Não se contesta a intenção do governo de estimular e incentivar a produção local. Trata-se de discutir os limites a incentivos desse tipo. Se exagerados ou muito seletivos - como são muitos dos concedidos pelo governo Dilma a pretexto de reduzir os impactos da crise mundial sobre a economia brasileira -, resultam em perdas para os demais setores e para os contribuintes e consumidores em geral, ao aumentar custos.
No exame dessa questão - que deve levar em conta a capacidade da indústria local e os compromissos assumidos pelo Brasil na OMC, entre outros fatores, como se anuncia que será feito -, o CNPE não pode deixar de observar os objetivos para os quais foi criado, como órgão de assessoramento do presidente da República. Entre eles está a proteção dos interesses do consumidor quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos e a promoção da livre concorrência. A exigência de conteúdo nacional pode resultar no oposto desses objetivos.


O governo continua apostando no mercado interno para enfrentar a crise global, mas até agora a aposta deu pouco ou nenhum resultado. As políticas de estímulo resultaram quase exclusivamente no aumento do consumo, do endividamento, da insolvência e das importações. Jornais publicam longas matérias sobre os altos níveis de calote, em geral involuntário, e sobre como evitar as armadilhas do crédito. O problema é importante, mas é apenas um dos muitos sintomas de um desarranjo muito mais amplo. Por nove semanas o mercado financeiro reduziu as projeções de crescimento econômico. O último número é 2,01%, mediana das previsões coletadas pelo Banco Central (BC) para o Boletim Focus. O próprio BC já havia, em junho, baixado sua estimativa de 3,5% para 2,5%.
A economia brasileira teria crescido muito mais no ano passado e continuaria a expandir-se com folga, neste ano, se o aumento do produto interno bruto (PIB) fosse mais dependente do consumo privado e do custeio do setor público. Foi essa, no entanto, a terapia básica adotada pelo governo. Teria dado resultados melhores, provavelmente, se os grandes problemas da produção nacional fossem conjunturais. Não são, mas os formuladores da política oficial têm agido como se a maior ameaça econômica viesse de fora, isto é, das grandes potências em crise. Com essa interpretação, tão irrealista quanto confortável, o governo se dispensa de cuidar mais seriamente dos problemas reais, todos made in Brazil.
Gastança pública e estímulo ao consumo são bons para fazer a economia pegar no tranco, em tempos de desemprego e muita capacidade ociosa. A longo prazo, o crescimento depende mesmo é da taxa de investimento e da eficiência do capital investido. Entre janeiro e março deste ano, o Brasil investiu o equivalente a 18,7% do PIB. Além de baixa, essa proporção foi inferior à do primeiro trimestre do ano passado (19,5%) e à de igual período de 2010 (19,2%). Mesmo para esse resultado abaixo de medíocre foi necessária a participação externa, porque a taxa de poupança, naqueles três meses, ficou em 15,7% do PIB (17% em 2011). O governo, como já foi comprovado muitas vezes, é o mais importante moedor de recursos e tem-se dedicado com empenho à despoupança.
O Ministério da Fazenda reduziu de 20,8% para 20,4% sua projeção da taxa de investimento. A nova estimativa apareceu em abril, no último boletim da série Economia Brasileira em Perspectiva. Esse tipo de correção tem sido frequente. O setor privado investe menos do que poderia, se enfrentasse menos entraves, e o governo, bem menos do que promete, por incapacidade gerencial. Neste ano, o governo federal acelerou os empenhos e desembolsos, num esforço para se antecipar às limitações do período eleitoral. Mesmo assim, os resultados foram ruins.
De janeiro a junho, o Tesouro aplicou R$ 18,9 bilhões, 2,1% mais que em igual período de 2011, descontada a inflação, mas 13,7% menos que no primeiro semestre de 2010. Além disso, o total desembolsado correspondeu a apenas 21% do valor previsto para 2012 no Orçamento Geral da União. Como sempre, restos a pagar, R$ 14,1 bilhões, compuseram a maior parte dos desembolsos.
A realização do PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento, continua deficiente e os números divulgados pelo governo são enfeitados. No primeiro semestre, 52,6% dos desembolsos foram financiamentos destinados aos programas habitacionais, como indica tabela divulgada pela organização Contas Abertas. A maior parte do PAC é executada mais lentamente. Também é ruim a execução dos projetos dependentes das estatais. Mesmo a mais eficiente, a Petrobrás, tem sido incapaz de entregar os resultados prometidos, como deixou claro a nova presidente, Graça Foster, em suas primeiras declarações depois de assumir o posto.
O baixo investimento seria compensado, em parte, se a produtividade do capital investido fosse mais alta. Não se pode, no entanto, contar com isso. No setor privado, é normal o esforço para extrair o máximo de cada real investido, mas a aplicação do dinheiro no setor público segue outros critérios. Queimam-se recursos com emendas parlamentares de alcance paroquial. Montanhas de dinheiro são perdidas em projetos mal preparados, em contratos com empreiteiras malandras, em convênios com organizações delinquentes e em negócios com fornecedores despreparados. O escândalo do petroleiro João Cândido, lançado ao mar com discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e só entregue dois anos depois, é um exemplo especialmente pitoresco de como investir mal.
Tudo isso se reflete na balança comercial. Até a primeira semana de julho, as exportações foram 1,4% menores que as de um ano antes, as importações, 4% maiores e o superávit, 44,6% inferior. O sistema produtivo está emperrado e só o governo insiste em desconhecer esse fato.

3 comentários:

Marcelo Delfino disse...

A última coisa de que o Governo Lula-Dilma pode ser chamado é de nacionalista. Essa gente é adepta do Foro de São Paulo, e Lula dialogou com o Consenso de Washington, junto com o suposto rival Fernando Henrique Cardoso.

Jean Padilha disse...

kkkkkkkkkkkkk... Muito bom o post.

Acredito eu que esta gente realmente não aprendeu completamente nada de economia. É cada idéia que, se um ser humano for de fato racional - nota-se que nem precisa ser um expert no assunto, apenas ter uma visão holística, não muito apurada, e possuir um básico conhecimento técnico de gestão - percebe-se que tal idéia é de girico com relação a intervenções do tipo.

Este tipo de situação causa um profundo descontentamento, pois "luta-se" tanto para que o país siga em linhas retas e alguns muitos calhordas que estão no poder acabam fazendo nada, ou melhor, muita coisa, mas que só levará ao fundo do poço.

Paulo Roberto de Almeida disse...

Marcelo Delfino,
Ninguém DIALOGA com o Consenso de Washington. Ao que se saiba, ele não tem endereço conhecido em Washington, a despeito de seu inspirador, o economista John Williamson (que tem uma filha que trabalha com favelas no Rio), trabalha no Institute for International Economics.
Trata-se, como o nome indica, de um Consenso, ou seja, um conjunto de proposições.
Já escrevi bastante sobre isso. Pode ler no meu site...
Paulo Roberto de Almeida
www.pralmeida.org