Qualquer observador mais atento, que não fosse toldado por preconceitos ideológicos primários, como certos "desenvolvimentistas de botequim", sabia que o principal obstáculo para uma reforma verdadeira das instituições de Bretton Woods era a sobre-representação europeia, desproporcional em relação a seu peso econômico na atual economia mundial.
Por isso, na última escolha para o Diretor Gerente do FMI, depois do escândalo do fauno Dominique Strauss-Khan, teria sido importante o Brasil apoiar um nome comprometido com as reformas, que poderia ter sido qualquer um menos um europeu. Havia, por exemplo, o ex-presidente do Banco Central mexicano, muito próximo dos americanos, todos eles interessados em repartir o poder excessivo hoje detido pelos europeus nas duas irmãs de Bretton Woods.
E quem o Brasil escolhe apoiar?
A candidata francesa, se autoenganando com o fato de ela ter prometido "reformas" na instituição. Bem, nos últimos três anos, o FMI só fez apoiar os processos de ajuste na Eurioa, sendo muito mais concessivo, leniente e bondoso com os caloteiros europeus do que havia sido, nos anos 1980 e 1990 com os latinos e outros países periféricos.
Por que o Brasil apoiou um europeu só os companheiros ideológicos da Fazenda podem explicar, mas o preço está descrito abaixo.
Paulo Roberto de Almeida
Valor Econômico – Brics permanecem sem
novas cotas no FMI
Por Assis Moreira | De Genebra, 2/02/2013
Em junho do ano passado, os cinco países que formam os
Brics - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - anunciaram que
contribuiriam com US$ 75 bilhões para reforçar o caixa do Fundo Monetário
Internacional (FMI) para a chamada muralha anti-crise. Mas os líderes dos
emergentes condicionaram a liberação do dinheiro a que todas as reformas
acertadas no G-20, em 2010, fossem implementadas no tempo previsto, para lhes
dar mais poder de decisão na instituição monetária mais importante do mundo e
refletir a nova realidade econômica global.
Desde então, as duas reformas prometidas fracassaram.
Ontem, por causa da resistência dos europeus, o FMI constatou o fiasco na
tentativa de completar a revisão da fórmula de cotas para redistribuir o poder
de decisão a partir de 2014. Desde 2011, a reforma estava praticamente
bloqueada. Em reunião na quarta, a diretoria-executiva do FMI só conseguiu
aprovar um documento com vagas orientações futuras. A tentativa agora é para a
revisão da fórmula estar pronta antes da próxima reforma geral de cotas,
programada para até janeiro de 2014. Mas as dúvidas se acumulam sobre isso.
Em outubro passado, por falta de ratificação pelo
Congresso dos EUA, não pôde entrar em vigor a reforma de 2010 aumentando as
cotas para os emergentes. Por ela, o Brasil passará a estar entre os dez
maiores em cotas e poder de voto no Fundo. E as cadeiras dos países que formam
os Brics juntas representarão 15,47% e passarão a deter direito de veto nas
principais decisões se atuarem de forma coordenada. Mas vão ter de esperar.
Nesse cenário, o dinheiro anunciado pelos Brics para o
FMI tende a demorar. Somente a China assinou o contrato com o Fundo, mas não
colocou à disposição os US$ 43 bilhões prometidos. Brasil, Rússia e Índia, cada
um com US$ 10 bilhões, sequer concluíram as negociações dos contratos, assim
como a África do Sul, que ofereceu US$ 2 bilhões.
Ilustrando a impaciência dos emergentes, o
diretor-executivo para Brasil e outros dez países na diretoria do Fundo, Paulo
Nogueira Batista Júnior, voltou a advertir que países subrepresentados no FMI
podem se distanciar da instituição caso a reforma permaneça bloqueada ou ocorra
em ritmo lento demais. "Eles [emergentes] vão continuar a se apoiar na
segurança dada por suas próprias reservas internacionais e intensificar esforços
para contribuir e reformar acordos regionais e outros acordos
financeiros", afirmou Nogueira Batista, que diz opinar em caráter pessoal.
A briga no FMI parece perdida em complexidades
técnicas, mas é essencialmente política, sobre a repartição de poder para
refletir a mudança na economia global. E deve ser tema da reunião dos líderes
dos Brics em março, na África do Sul. No caso da reforma das quotas de 2010,
pode entrar em vigor desde que o Congresso dos EUA a ratifique. Mas o confronto
entre a Casa Branca e o Congresso e uma agenda carregada com o limite da dívida
americana e questões fiscais tumultuam o processo.
Quanto à revisão da fórmula das cotas, a dificuldade é
causada pela obstrução do bloco europeu, que perderá poder em favor de
emergentes. Os europeus divergem muito entre si, mas no âmbito do G-20 e no FMI
sabem somar forças. A coordenação mais estreita que existe no FMI e no G 20 é
entre os europeus, segundo Nogueira Batista. Para ele, o problema fundamental
na governança do FMI é a "evidente super-representaçao da Europa".
Aponta, primeiro, uma grande diferença entre o peso da Europa no poder de voto
no FMI e seu peso na economia mundial. A parte da União Europeia no PIB global,
medido em PPC (Paridade de Poder de Compra), é de 20% e está caindo. Em
contrapartida, os membros da UE tem quase um terço do poder de voto no Fundo.
Além disso, nota que a Europa tem número
desproporcional de cadeiras (8 das 24) no conselho-executivo do Comitê
Financeiro e Monetário Internacional (IMFC, na sigla em inglês). Chega a nove,
quando a Espanha junta seu poder de voto com México e Venezuela. Recentes
mudanças anunciadas nas cadeiras na Europa são "cosméticas", já que
basicamente melhora a posição de emergentes membros da UE, como República Checa,
Polônia e Hungria. Para completar, a Europa mantém a posição de diretor-geral
do FMI, com a francesa Cristine Lagarde.
Aplicando a atual fórmula, as quotas e poder de voto
de Brasil, Rússia, Índia e África do Sul deveriam diminuir. Todos os países
Brics, com exceção da China, estão super-representados.
Para o futuro, o staff do Fundo sugeriu uma fórmula
que dá peso a novas variáveis, como abertura financeira e contribuição
financeira para o Fundo. Vários países reclamam de lacunas, com a proposta
produzindo resultados que não refletem suas posições relativas na economia
global, incluindo a crescente importância dos emergentes e dos países em
desenvolvimento.
O Brasil defende que a fórmula seja baseada numa
mistura de variáveis do PIB, com maior peso para a Paridade de Poder de Compra.
A futura quota (2,316%) e poder de voto (2,218%) pela reforma de 2010, quando
implementada, ainda ficarão bem abaixo da participação média do Brasil no PIB
mundial (2,654%) no período de referência 2006-2008. Para os brasileiros, se o
PIB passar a receber maior peso na fórmula, como o país defende, o Brasil
ganhará novos aumentos relativos de quotas na próxima revisão em janeiro de
2014. A diretoria do FMI aponta apoio considerável para manter as reservas
internacionais com seu peso atual.
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