Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 31/07/2013
Em dois dias, três índices diferentes, medidos por institutos diferentes, apontaram para uma forte redução da confiança no governo por parte do consumidor, da indústria e do comércio.
Há duas semanas, a presidente Dilma Rousseff, criticou os propagadores do pessimismo que azedam tudo e criam um ambiente ruim para recuperação da atividade econômica. E culpou os analistas da economia, sem precisar melhor o seu alvo.
O governo é incapaz de reconhecer seus erros na condução da economia, divulga só o que lhe interessa, maquia resultados e distorce fatos.
Nenhum estrago à credibilidade do governo foi maior do que as práticas argentinas do secretário do Tesouro, Arno Augustin, de submeter as contas públicas de 2012 a artifícios contábeis. Até agora, ninguém entendeu como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pode garantir um superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), em 2013, de 2,3% do PIB.
As contas públicas são opacas. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, admitiu em entrevista ao Estadão (21/7) que "a política fiscal não é clara". E, antes dele, o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto declarou ao Estadão (8/6) que a percepção do mercado é de que "a situação fiscal do Brasil é uma esculhambação". E, ainda ontem, o próprio Delfim advertiu que essa contabilidade criativa distorce as estatísticas da dívida pública líquida.
Também ontem, o economista-chefe do Grupo Credit Suisse, Nilson Teixeira, advertiu que, para a recuperação da confiança é necessário que o governo aponte o resultado real das contas públicas, "sem manobras contábeis".
O governo não apenas gasta demais, mas, sobretudo, gasta mal; investe pouco e administra pior ainda seus projetos de investimento. Em praticamente todos eles, temos a síndrome das obras de transposição do Rio São Francisco, que não terminam nunca e custam cada vez mais, para benefício sabe-se lá de quem.
Por que, por exemplo, a presidente Dilma insiste em afirmar que a inflação fechará este ano "na meta", quando se sabe que a meta de inflação é de 4,5% e não os 6,5% (que incluem a margem extra de tolerância) a que ela se refere? Todas as projeções apontam para uma inflação acima dos 5,5% em 2013. Por que não admitir que esse estouro é gol contra e não uma vitória sobre a alta de preços, especialmente quando se leva em conta a deterioração do poder aquisitivo do assalariado.
Não há comentário da área econômica do governo que não atribua os números ruins da atividade econômica aos graves problemas externos - que os analistas, é claro, acabam piorando com seu pessimismo. Apesar disso, também o governo garante que a virada vem vindo aí e que tudo vai melhorar, inclusive as avaliações da população em relação ao desempenho da presidente Dilma. Ora, se estamos mal porque o mundo vai mal, então como é que se pode esperar pela melhora, se os prognósticos são de uma piora do comportamento da economia mundial?
A maneira como o governo administra a economia e as contas públicas é parte essencial do problema da falta de confiança. E as críticas que lança a esmo contribuem para a prostração.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.