Se o financiamento não pode ser privado, terá de ser público. O STF, que não foi eleito para legislar, definirá que o Congresso é livre para fazer a escolha única. O "novo constitucionalismo" é só bolivarianismo com sotaque praieiro. Engana trouxas com seu jeitinho beagle de ser. Um rottweiler do estado democrático e de direito logo reage. O PT já havia tentado extinguir as doações privadas. Não deu certo. Agora a OAB, que pede a inconstitucionalidade da atual lei, serve-lhe de instrumento para o golpe togado, no tapetão. O que o partido tem com isso? Explica-se.
Numa argumentação confusa, preconceituosa, Luiz Fux, o relator, vituperou contra a participação do dinheiro privado em eleições. Ele acha que o capitalismo distorce a democracia, cantilena repetida por outros. Falta-lhes bibliografia para constatar que, felizmente, a democracia é que distorceu o capitalismo. Fux sustenta que partidos com mais financiamento privado têm mais votos. Toma o efeito como causa: quem tem mais votos é que tem mais financiamento privado. Sob a lei atual, uma legenda com então seis anos de existência, o PSDB, venceu a eleição presidencial de 1994 e se reelegeu em 1998. Em 2002, perdeu para uma outra, nascida nanica em 1980: o PT. Está em seu terceiro mandato.
A consequência natural do acolhimento da ADI é o financiamento público. Os petistas apresentarão uma emenda popular com esse conteúdo. É operação casada com a OAB. Como distribuir o dinheiro? Ou o critério seria o tamanho da bancada na Câmara ou o número de votos na eleição anterior. O principal beneficiado seria o PT. Uma vantagem presente e transitória seria transformada em ativo permanente.
Sindicatos, movimentos sociais e ONGs já atuam como cabos eleitorais do PT, e a massiva propaganda institucional é mera campanha eleitoral disfarçada. O partido quer agora que a supremacia alcançada ao longo de 20 anos de financiamento privado impeça seus adversários de tentar o mesmo caminho. Eles se tornariam reféns do status alcançado pelo petismo.
Há um aspecto adicional: partidos que têm de se financiar na sociedade obrigam-se a dialogar, a estabelecer pactos, a modular a ação segundo os valores da comunidade que pretendem governar. Se o dinheiro é garantido por um cartório, amplia-se o espaço do seu arbítrio, não o de sua independência.
Fux atribuiu até a ainda pequena presença de mulheres na política ao financiamento privado. Sei. O capital é feio, sujo, malvado e machista. É um caso de falácia lógica, sintetizada na expressão latina "post hoc ergo propter hoc" - ou: "depois disso, logo, por causa disso". Dilma é presidente "apesar do capital" ou "por causa do capital"? Nem uma coisa nem outra. As duas conclusões são estúpidas. De resto, de 1994 a esta data, na vigência do financiamento privado, o número de mulheres na política aumentou. Por causa dele ou apesar dele?
P.S. - "Você já elogiou o STF e agora ataca." Desculpem este modo de ser: quando gosto, digo "sim"; quando não, "não". Parece exótico?
twitter.com/reinaldoazevedo
Um comentário:
Excerto da coluna de Dora Kramer:
"Palavra da Ordem. O presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, discorda da avaliação de que o veto ao financiamento de empresas privadas para campanhas políticas vá aumentar o uso do caixa 2.
"'Ao contrário, tornará mais visível o recurso ilegal', diz ele, explicando o seguinte: se só puderem fazer doações pessoas físicas, o volume de dinheiro à disposição de cada partido ou candidato será consideravelmente menor.
"Portanto, qualquer campanha milionária será automaticamente alvo de suspeita de utilização de recursos "por fora", facilitando a fiscalização. Ou seja, seria possível perceber a ilegalidade a olho nu. Hoje, segundo ele, os montantes são absurdamente altos e permitem a diluição entre a contabilidade legal e a arrecadação não declarada.
"O efeito colateral, na visão de Marcus Vinicius, será a realização de campanhas mais modestas sem tanta ênfase na forma, em benefício do conteúdo."
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,marcacao-cerrada-,1107920,0.htm
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