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sábado, 21 de outubro de 2023

Origens dos povos atuais do Oriente Médio - Guga Chacra (O Globo)

 Origens dos povos atuais do Oriente Médio

Guga Chacra

O Globo, 20/10/2023


Meu avô nasceu otomano, achava que fosse sírio, disseram que era libanês e, se nascesse alguns quilômetros mais ao Sul, seria palestino. As vilas daquela região do Mediterrâneo Oriental integravam o Império Otomano, com sede na distante Istambul (Constantinopla). Não existiam fronteiras no que hoje é Israel, territórios palestinos, Líbano e Síria. A pessoa se identificava com sua vila, com sua religião e com sua região. Poderia ser um cristão melquita de Zahle, um muçulmano sunita de Nablus, um judeu de Aleppo, um muçulmano xiita de Nabatieh, um cristão armênio de Jerusalém, um druso das Colinas do Golã, um alauíta de Tartus ou um cristão greco-ortodoxo de Haifa. Todos eram súditos otomanos. A noção de Estado nacional era inexistente naquela região até a Primeira Guerra Mundial, quando os otomanos foram derrotados e viram seu império desmoronar. França e Reino Unido, que foram os vencedores da guerra, dividiram entre si essa região do Levante, assim como outras partes do Império Otomano, a não ser pela Turquia. Por exemplo, os britânicos uniram três províncias diferentes na Mesopotâmia e inventaram uma monarquia artificial chamada Iraque. Anos depois, fariam o mesmo no que hoje é a Jordânia. A França ficou com o que hoje é a Síria e o Líbano, que foram criados durante o mandato francês nos anos 1920 e viriam a ficar independentes nos anos 1940. O Reino Unido, por sua vez, ficou com a região da Palestina histórica. Como no restante do Levante, tratava-se de uma região multireligiosa. Basta ver que a cidade antiga de Jerusalém historicamente é dividida em quatro quadriláteros – o cristão, o armênio (que tb é cristão), o islâmico e o judaico. A maioria da população era muçulmana, mas havia expressivas minorias de diferentes denominações cristãs e judaicas. Diferentemente do que ocorreu no Líbano e na Síria com a França, a região onde estava a Palestina histórica teve um status indefinido pelos britânicos. Afinal, além da população que ali vivia (muçulmanos, cristãos e judeus), ocorreu uma enorme imigração de judeus europeus durante o movimento sionista. Diferentemente da população local, eles traziam uma noção de Estado-nacional e, diante das perseguições que sofriam na Europa (pogroms), consideravam o que hoje é Israel como o único lugar onde poderiam estabelecer uma nação judaica dado os laços milenares com região, onde está Jerusalém, berço do judaísmo – essa ideia ganhou ainda mais força ao redor do mundo com o Holocausto. Neste momento, duas identidades passam a se chocar. A dos muçulmanos e cristãos, que não tiveram uma nação para as suas vilas sob o mandato britânico, diferentemente do que ocorreu com os das vilas nas recém-independentes Síria e Líbano com a França – e com o colapso otomano começava a emergir a identidade palestina. E a dos judeus tanto vindos da Europa como os locais, que queriam uma nação judaica. Naquele momento, talvez, até pudessem ter um Estado sectário sem maioria religiosa, como o Líbano. No fim, os palestinos não aceitaram a partilha por avaliar ser injusta porque dava áreas de expressiva maioria árabe para Israel. O fato é que houve a guerra de 1948que resultou na expulsão e saída da maioria dos palestinos do territórios israelenses – a maioria dos habitantes de Gaza descende de palestinos que viviam há gerações no que hoje é Israel. Paralelamente, nos ano seguintes, houve a expulsão ou saída de judeus de países como Síria, Egito, Iraque e, posteriormente, Líbano. Segundo o escritor franco-libanês Amin Maalouf, que preside a Academia Francesa de Letras, estes dois acontecimentos são a tragédia do Levante, como é conhecida esta região. oglobo.globo.com/blogs/guga-cha

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