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domingo, 11 de fevereiro de 2024

Cúpula bolsonarista tentou dividir Exército para dar golpe, mas fracassou - MARCELO GODOY (O Estado de S. Paulo)

Cúpula bolsonarista tentou dividir Exército para dar golpe, mas fracassou

MARCELO GODOY 

O Estado de S. Paulo, 08 FEVEREIRO 2024 

A tentativa de desacreditar o Alto Comando do Exército (ACE) era parte fundamental da conspiração nascida dentro do Palácio do Planalto para dividir a corporação, colocar a tropa contra os comandantes que resistiam à ideia, e consumar o golpe de Estado tramado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e ministros militares como expôs a operação realizada pela Polícia Federal.

Após a ação dos policiais nesta quinta-feira, 8, a coluna apurou que generais e coronéis concordaram que houve “traição” e “deslealdade” na atuação da cúpula bolsonarista, formada pelos ex-ministros militares Walter Braga Netto e Augusto Heleno, e do general Estevam Theóphilo, que segundo a PF seria o responsável por operacionalizar o golpe.

Ressaltam, no entanto, que a tentativa de divisão do Exército fracassou e que a instituição não se corrompeu, embora admitam que autoridades importantes foram seduzidas pelo “canto da sereia golpista”.

Dos 16 integrantes do ACE, 11 eram contrários ao golpe e de quatro a cinco, entre eles Theóphilo, tido como o mais bolsonarista dos generais da ativa, eram favoráveis. Dois outros generais que ainda estão na ativa expressaram opiniões favoráveis ao golpe, mas não agiram para que ele se concretizasse.

Sem a adesão do Alto Comando, a conspiração golpista seguiu para o plano B, a “festa da Selma”, como os bolsonaristas chamavam o ato que depois se tornou o 8 de Janeiro: assim como no ocorreu no Sri Lanka, a ideia passou a ser colocar a população na rua, mais especificamente em frente aos quartéis, para incitar uma rebelião nas fileiras do Exército e fazer com que a tropa passasse por cima dos generais.

Uma das frentes dessa estratégia era desacreditar os comandantes os acusando, por meio do gabinete do ódio nas redes sociais de serem “melancias”, verdes e patriotas por fora, mas vermelhos e comunistas por dentro. A investigação da Polícia Federal expôs o bastidor deste processo de fritura ao encontrar mensagens nas quais Braga Netto relata que o então comandante do Exército, Freire Gomes, estava omisso e indeciso sobre o golpe

“Então vamos continuar na pressão e se isso se confirmar vamos oferecer a cabeça dele aos leões”, respondeu o capitão reformado Ailton Barros, que depois foi preso na investigação sobre as fraudes nos cartões de vacina. “Oferece a cabeça dele. Cagão”, determinou Braga Netto em seguida.

Também não passou despercebida a pressão sobre as famílias dos militares. Em dezembro do ano passado, o brigadeiro Carlos Almeida Baptista Júnior, então comandante da  Marinha, procurou interlocutores para dizer que não iria trair os valores militares.

Nas conversas, ele fazia coro ao cientista político Samuel Huntington no livro O Soldado e o Estado: “Sobre os soldados, defensores da ordem, recai uma pesada responsabilidade. Se abjurarem o espírito militar, destroem primeiro a si mesmo e, depois, a Nação”, diz a conclusão da obra.

A coluna apurou que foi Baptista Júnior o responsável por vazar a informação que os comandantes das Forças Armadas pretendiam entregar os cargos antes do fim do governo Bolsonaro para não se submeterem, ainda que brevemente, ao governo Lula. O vazamento acabou frustrando a iniciativa.

“Senta o pau no Batista Júnior. Povo sofrendo, arbitrariedades sendo feitas e ele fechado nas mordomias, negociando favores. Traidor da pátria. Daí para frente. Inferniza a vida dele e da família”, escreveu Braga Netto em uma mensagem obtida pela Polícia Federal.

O descrédito do Alto Comando permitiria o passo seguinte: a quebra de hierarquia tão cara aos militares para consumar o golpe. Então chefe do Comando de Operações Terrestres, o terceiro escalão da corporação, o general Theóphilo passou por cima do comandante do Exército e do ministro da Defesa ao se reunir diretamente com Jair Bolsonaro.

De acordo com a investigação, ele prometeu ao presidente mobilizar seus comandados, conhecidos como “kids pretos”, para prender o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.

Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira integra uma das famílias mais tradicionais do Exército brasileiro, responsável por produzir quatro generais. Entre eles, César Cals, governador do Ceará durante a ditadura, no início dos anos 70, e depois ministro de Minas e Energia no governo de João Figueiredo.

Já Guilherme Teóphilo, irmão de Estevam, chefiou o Comando Militar da Amazônia, se candidatou ao governo do Ceará pelo PSDB em 2018 e depois atuou como secretário nacional de Segurança Pública no governo Bolsonaro.

Estevam Theóphilo foi responsável por causar rusgas entre o governo Lula e o Exército mesmo após o 8 de Janeiro. Após ouvir de Mauro Cid que ele temia ser preso nas primeiras semanas de 2023, o general disse que conversaria com o então comandante do Exército, Júlio César de Arruda. O comandante insistiu em manter Cid na chefia de um batalhão de Operações Especiais após os atos golpistas, o que foi a gota d’água para Lula demiti-lo.

Theóphilo também foi um dos defensores da venda de 450 viaturas do blindado Guarani para a Ucrânia utilizar na guerra contra a Rússia. A negociação opôs o poder civil, por meio do Itamaraty, que defendia a neutralidade no conflito, e os militares, já que o Exército ficaria com parte do valor da venda. Ao fim, a operação foi vetada.

Também no início do ano passado, o Coter, então comandado pelo general Theóphilo, promoveu o 1.º Seminário Internacional de Doutrina Militar Terrestre do Exército Brasileiro para o qual foram convidados EUA, Alemanha, Reino Unido, França, além de outros países da Otan, dos Brics e do Mercosul. Duas ausências, entretanto, eram notáveis: a Rússia e a China.

Novamente, a diplomacia militar se aproximava do polo liderado pelos EUA, na contramão da neutralidade pregada pelo Itamaraty e pelo assessor especial da Presidência, o ex-chanceler Celso Amorim, que se queixou diretamente com Lula sobre a atuação dos militares na política externa.


quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Foi golpe, Golpe ou foi GOLPE? - Paulo Roberto de Almeida

Foi golpe, Golpe ou foi GOLPE?

Paulo Roberto de Almeida

Então ficamos assim com a nova versão oficial da história: a destituição de Dona Dilma foi um GOLPE (apud EBC e narrativas do PT).


Sim, claro que foi um golpe, mas um golpe parlamentar conduzido na mais estrita observância da legalidade processual, segundo a CF-1988 e a Lei do Impeachment de 1950. 


O verdadeiro Golpe, na verdade, foi aplicado pelos digníssimos ministros do STF, na Lei de 1950 e na CF-88, de duas formas: o Barrosinho ter inventado uma votação de admissibilidade do processo no Senado depois da admissão do processo após votação inicial na CD, em nenhum momento previsto em qualquer texto constitucional ou infraconstitucional a partir de 1946 e de 1950, seguida, ao final do processo, pelo Levandowski, ao ter mantido os direitos políticos e outras regalias pós-presidenciais de Dona Dilma, na mais perfeita inconstitucionalidade e ilegalidade. 


Portanto, se houve Golpe ou GOLPE, este foi do STF, atuando ao arrepio do Estado de Direito. 

Quanto ao golpe parlamentar, este foi conduzido na mais perfeita legalidade, e menos por todas as ilegalidades fiscais e transgressões orçamentárias perpetradas por Dona Dilma, ao arrepio da Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000 e da própria CF-1988, e bem mais porque Dona Dilma foi um desastre nas suas relações com o corpo parlamentar. Ela, que tinha começado o terceiro governo do PT com uma maioria congressual superior a Lula I ou Lula II —, não conseguia se entender com o Congresso, e foi logo embicando com o super-larápio do Eduardo Cunha (que sozinho valia por meia roubalheira do PT), até que este resolveu puxar UM dentre as dezenas de pedidos de impeachment já apresentados contra ela, o que foi feito pelo falecido procurador e ex-fundador do PT Helio Bicudo, pelo impoluto jurista Miguel Reale Jr. e pela professora da Faculdade de Direito da USP, Janaina Paschoal, que depois se revelou uma destrambelhada parlamentar bolsonarista. 


Como em todos os demais exemplos de tentativas ou impeachments realizados na história política do Brasil — Vargas em 1954 (não aceito pela CD), Jânio em 1961 (carta-renúncia imediatamente aceita pelo presidente do Congresso), Goulart em 1964 (realizado pela via mais expedita das FFAA, com quase total e imediato apoio no Congresso), Collor em 1992, por excesso de cupidez de seu “assessor financeiro” —, o impeachment de Dona Dilma se deu por meio de um golpe parlamentar, que é o que acontece quando o incumbente da cadeira presidencial não consegue se entender com a maioria congressual, eleita pelo povo.


Lula I só não foi impeached pelo Congresso em 2005 porque FHC, do alto de sua magnanimidade para com o primeiro presidente-operário da história do Brasil, trancou essa possibilidade do lado do PSDB, e porque o grão-vizir do primeiro mandato de Lula, Zé Dirceu, já tinha começado a comprar parlamentares e bancadas inteiras com o dinheiro do Mensalão (uma fichinha, na comparação com o megarroubo industrial organizado pelo PT no Petrolão).


Então estamos servidos para as diferentes versões da história ao gosto de cada um? Foi GOLPE para o PT, foi Golpe dado pelo STF (aliás dois) e foi um mero golpe parlamentar, como já ocorreram muitos em nossa atribulada história republicana.

Mas não fiquemos por aí: D. Pedro II deu sucessivos “golpes” do Poder Moderador, cada vez que dissolvia a Assembleia Geral para formar um novo Gabinete. Este imediatamente aplicava um golpe eleitoral ao organizar a sua maioria imposta no arbítrio dos processos eleitorais do Segundo Império. 

A Velha República, por sinal, vivia de golpes fraudulentos contra a legítima representação eleitoral, ao organizar ela mesmo a roubalheira política através das comissões de “verificação”, que já tinham os nomes prontos de quem devia ou não ser “eleito”. 

As FFAA (predominantemente o Exército) se cansaram de dar golpes e mais golpes, ao julgarem (pela sua própria interpretação do “poder moderador”) que os executivos e os representantes eleitos não estavam se comportando bem. 


O fato é que, na história política brasileira, golpes sempre acontecem quando Executivo e Legislativo não se entendem. Eventualmente o STF se mete na história, ou, mais frequentemente, as FFAA intervêm no processo, por pressão dos cavalos ou na espada e nos tanques, dando a palavra final na comédia de erros. 

Nem sempre termina de forma exitosa ou bem sucedida, como na canhestra e mais  recente tentativa pelo mais patético e inepto dirigente de toda a história do Brasil (desde D. Tomé de Souza, o primeiro governador-geral do Brasil, em 1549), que nunca teve capacidade de sequer perpetrar  um mero terrorismo militar, ou, mais provável, por covardia dos comandantes das forças singulares, temerosos pelo ridículo da coisa, a despeito dos incentivos do ministrinho da Defesa, um generaleco submisso ao desvairado tenente-capitão (por obra e graça de um STM disforme).


Então, ficamos assim: cada um fica com o seu GOLPE, Golpe ou golpe, segundo sua conveniência e versão dos fatos. A História é uma mãe generosa que abriga todas as interpretações possíveis. 

A minha é apenas uma especulação jocosa e contrarianista sobre todas essas belas histórias de nossa instabilidade política, a única coisa estável na História do Brasil.


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 19/01/2023

terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Brasil de Bolsonaro participou de golpe na Bolívia? Uma boa história policial... - Dario Pignotti Garcia (Página 12)

 Bolsonaro teve reuniões secretas com ex-presidente golpista presa na Bolívia

O possível encontro com Jeanine Añez pode ser a ponta de uma meada onde conspirações, fugas clandestinas de ministros e talvez entrega de armas se enredem

Brasil 247, 18 de janeiro de 2022, 12:19 h

Por Dario Pignotti Garcia, no Página 12 - Jair Bolsonaro reconheceu ter se encontrado com a ex-presidente boliviana Jeanine Añez, confirmando as suspeitas sobre o apoio brasileiro ao golpe que derrubou o presidente Evo Morales. O possível encontro pode ser a ponta de uma meada onde conspirações, fugas clandestinas, fuga de ministros e talvez entrega de armas se enredem. Em um ato aparentemente involuntário, o capitão e presidente aposentado afirmou: "a ex-presidente da Bolívia, Jeanine... Eu estive com ela uma vez, ela é uma pessoa legal que está na prisão". Para depois acrescentar, com raiva, "você sabe qual é a acusação contra ela? (ter cometido) atos antidemocráticos". Como até o momento não há notícias de nenhuma cúpula oficial entre os dois, essa conversa ocorreu secretamente.

Segundo essa declaração, para Bolsonaro, atacar instituições é algo que não deve ser punido com a prisão da ex-presidente, que permanece detida em um presídio em La Paz, onde se prepara para enfrentar um novo julgamento. O que Bolsonaro não disse é quando e onde ocorreu o encontro com a mulher que governou de fato entre novembro de 2019 e dezembro de 2020, quando o presidente Luis Arce tomou posse. Nesse período de pouco mais de um ano, o avião presidencial boliviano, que só pode decolar com autorização do chefe de Estado ou com ele a bordo, voou com frequência e clandestinidade para o Brasil.

A confissão
Em alguns canais bolsonaristas do YouTube, eles aparentemente perceberam a gravidade das declarações do presidente sobre sua nomeação com Añez e as retiraram do ar. O comentário presidencial, ou melhor, a confissão, poderia ser levado à consideração do tribunal, que a partir desta semana começará a julgar Añez junto com os ex-chefes militares e de polícia no processo denominado "Golpe de Estado II". 

Um ex-alto funcionário de Morales e diplomata que atualmente trabalha fora de seu país analisou, em diálogo com a condição de anonimato, a conexão Brasília-La Paz e os elementos que ela pode contribuir para o iminente novo julgamento. "Acredito que a declaração do presidente Bolsonaro é importante para este julgamento porque é mais uma prova de que o governo de Evo Morales foi atacado por uma organização internacional, isso significa que foi dada ajuda do exterior para um golpe de estado." Devemos esperar a evolução deste julgamento oral, propõe o ex-funcionário, mas "se Añez aceitar que houve essa reunião, ela terá que explicar por que não a denunciou".

"A senhora Añez está sendo investigada por não ter chegado ao poder constitucionalmente, usando o caminho da violência. O povo boliviano quer que ela seja investigada pelas mortes ocorridas para que ela chegue ao poder", continuou o diplomata.

Añez, bem-vinda
A nomeação secreta de Bolsonaro e Añez está em consonância com o apoio público dado por Brasília ao movimento que depôs Morales. Na manhã de 13 de novembro de 2019, horas após a posse de Añez, o Brasil foi o primeiro país da região a parabenizar o novo governo "constitucionalmente" surgido. Añez chegou ao Palacio del Quemado junto com o líder de Santa Cruz de la Sierra, Fernando Camacho, apelidado de "Bolsonaro da Bolívia", que em meados de 2019 havia sido recebido pelo então chanceler brasileiro, Ernesto Araújo. Após a conversa, Camacho e Araújo foram fotografados ao lado da deputada Carla Zambelli, de ardente linhagem bolsonarista.

Vale ressaltar que o golpe boliviano não foi do novo tipo "soft", seja parlamentar ou via "lawfare", como os que derrubaram Dilma Rousseff em 2016 e o ex-presidente paraguaio Fernando Lugo em 2012. O da Bolívia estava no clássico moldes com a participação de policiais e militares, guardando alguma semelhança com aqueles que levaram às ditaduras dos anos 60 e 70 até hoje defendidas pelo presidente brasileiro.

O apoio brasileiro ao regime cívico-militar de La Paz continuou em 2020 com o objetivo de construir uma hegemonia regional de direita, incluindo o apoio aos candidatos Keiko Fujimori no Peru e Antonio Kast no Chile. Para tanto, era preciso impedir o retorno do Movimento Morales ao Socialismo através da candidatura de Luis Arce, que finalmente venceria por larga margem em outubro de 2020. Nesse caso, o Brasil foi o último país importante que manifestou seu desejo de libertar Arce, ex-ministro da Economia e Finanças durante os governos de Morales.

Voos
A Página 12 publicou em junho de 2020, quando Añez estava no Palácio del Quemado há seis meses, um artigo assinado por Felipe Yapur sobre os "voos suspeitos e repetidos" do avião presidencial da Força Aérea Boliviana 001, o FAB001, com destino ao Brasil. A investigação é baseada em informações da empresa de rastreamento de voos dos EUA FlightAware.

Na lista de viagens ao Brasil estão várias a Brasília onde poderia ter ocorrido o encontro entre Bolsonaro e Añez, ao qual o ex-capitão se referiu durante uma transmissão ao vivo nas redes sociais ocorrida meses atrás, quando acusou seu rival, Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores para "apoiar a volta do povo de Evo Morales na Bolívia".

O primeiro voo do FAB001 foi em 11 de novembro de 2019 “após a queda do presidente Morales e antes da assunção de Añez”, diz a fonte boliviana consultada por este jornal. "Minha percepção é que a movimentação do avião no dia 11 de novembro é extremamente estranha, não sabemos se foi para levar algo ou trazer algo do Brasil. Sou diplomata de carreira, quando um presidente sai do país ele tem que avisar e deixar o vice-presidente, e isso não aconteceu."

Senador Carvalho 
O senador brasileiro Rogério Carvalho, do PT, não tem dúvidas sobre a participação brasileira na trama contra Morales. "De zero a dez, a chance de Bolsonaro apoiar o golpe é dez." Questionado por este jornal, o deputado afirmou que "Bolsonaro dá seu total apoio a qualquer governo que seja antidemocrático ou a forças políticas antidemocráticas".

Segundo Carvalho, o Congresso poderia tomar providências sobre o assunto e descobrir como eram as relações de Bolsonaro com Añez e outras possíveis conexões.

Uma área cheia de perguntas sem resposta é a fronteira entre os dois países, com mais de 3.400 quilômetros de extensão, por onde teriam passado recursos para o movimento sedicioso de 2019 e que poderia ter servido como zona de fuga em 2020 para funcionários de Añez. Luis Fernando López e o Ministro do Governo Arturo Murillo.

Armas?
O diplomata e ex-funcionário de Morales lembra que Murillo, depois de passar pelo Brasil, foi preso nos Estados Unidos por lavagem de dinheiro e outros crimes relacionados à compra de armas. E suspeita que o ex-chefe da Defesa, López, possa estar escondido no Brasil. A nossa fonte, que entrevistamos em agosto e voltamos a consultar brevemente no domingo, refere-se novamente às viagens clandestinas da FAB001 e destaca a realizada no final de dezembro de 2020.

A data desse voo coincide com a de um documento do Ministério da Defesa boliviano no qual se menciona que uma carga de armas deve ser retirada em 30 de dezembro. Dezembro? ? Sim", "Existe algum documento com papel timbrado do Ministério da Defesa do Estado Plurinacional da Bolívia que diga que haveria entrega de armas no Brasil? Sim. É possível que as armas sejam entregues em um aeroporto no Brasil para outro país. Isso é normal?" pergunta o ex-funcionário boliviano.

E conclui propondo que sejam investigados os pontos de “contato” que relacionam “Bolsonaro dizendo que se encontrou com Añez” com a possível “saída do país do ex-presidente” e a suposta “entrega de armas no Rio”.

https://www.brasil247.com/poder/bolsonaro-teve-reunioes-secretas-com-ex-presidente-golpista-presa-na-bolivia

domingo, 5 de setembro de 2021

Celso Rocha de Barros acha que já teve golpe (FSP)

 Tem o “Se” na frente, mas não concordo com tudo, pois mais importante que golpe, putsch, quartelada, é o que se há de fazer DEPOIS.

Um artigo meio exagerado sobre as possibilidades de golpe, pois parte do pressuposto de que “as FFAA” — que são tomadas como se fossem um monobloco — já aderiram ao projeto do capitão, que tem sim a intenção de provocar um golpe, via confusão, o que está longe de conformar um início de governo golpista. Os bolsonaristas radicais podem causar confusão nas ruas, mas não têm a mais mínima condição de formar um governo aceitável pela população. Não se governa com baionetas, já disse alguém, nem elas estarão todas ensarilhadas para servir a um psicopata perverso.

Paulo Roberto de Almeida


Se um protesto grande no 7 de Setembro basta para convencer os militares, então já teve golpe

Atos bolsonaristas foram convocados do centro do poder para destruir os limites que a democracia lhe impõe

Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

Folha de S. Paulo, 5/09/2021

Nesta terça-feira (7) os golpistas de Bolsonaro farão uma manifestação para tentar convencer os quartéis de que um golpe seria popular.

É quase impossível que as manifestações não encham. É, de longe, a manifestação fascista que passou mais tempo sendo planejada. Prefeitos bolsonaristas, pastores bolsonaristas, líderes bolsonaristas do agronegócio, todos estão trabalhando pela manifestação fascista com muito mais empenho do que nos Ustrapaloozas anteriores.

A contabilidade do bolsonarismo é sempre clandestina e ilegal, mas não há dúvida de que será uma manifestação cara.

Não será, nem de longe, uma manifestação como as outras, um análogo das Diretas Já, das marchas dos sem-terra, da Marcha para Zumbi, dos protestos de 2013, dos atos pró-impeachment de 2016, dos protestos recentes contra Bolsonaro.


Todas essas foram manifestações típicas de regime democrático, convocadas para protestar contra o centro do poder ou para apresentar-lhe reivindicações.

A passeata desta terça foi convocada do centro do poder para destruir os limites que a democracia lhe impõe.

Sempre pode haver militantes violentos em manifestações democráticas. Mas há uma diferença radical entre um maluco com um coquetel molotov feito em casa e o presidente da República convocando as Forças Armadas e os policiais à deserção, pedindo-lhes que usem as armas do Estado brasileiro em favor de um dos lados da disputa política.

Por isso é ridículo analisar as ações do Supremo Tribunal Federal contra os extremistas como repressão à liberdade de expressão. A prisão de Roberto Jefferson não é o Estado reprimindo um indivíduo, é a Suprema Corte se defendendo, e defendendo a democracia brasileira, de uma tentativa de destruição pelo Palácio do Planalto.

Roberto Jefferson não é a parte mais fraca diante do poder. Joga como vanguarda de uma conspiração armada que envolve os mais altos escalões do Poder Executivo e começa pelo presidente da República.

Se você é analista político e diz que não compreende essa diferença, eu até gostaria de mudar sua opinião, mas estou meio sem grana.

Vai dar certo? É difícil dizer, pois não está claro se as Forças Armadas teriam que ser convencidas pelas massas a dar um golpe (nesse caso, não vai ter golpe) ou se só querem uma desculpa vagabunda qualquer para fazê-lo (nesse caso, vai).

Os militares sabem ler pesquisa de opinião. Sabem que mesmo uma manifestação enorme não adianta muita coisa se não estiver em sintonia com o que a maioria da população pensa. A grande maioria dos brasileiros acha o governo Bolsonaro uma porcaria.

A passeata não vai fazer a comida, a gasolina ou a energia elétrica ficarem mais baratas, não vai ressuscitar as centenas de milhares de mortos da pandemia, não vai fazer as commodities subirem de novo pra gente ver se dessa vez o Guedes aproveita.

Os problemas e os escândalos que destruíram a popularidade de Bolsonaro ainda existirão no dia seguinte. E, ao contrário de 1964, os militares já são vidraça.

Nesta terça haverá um festival de reacionarismo e de tudo que faz do Brasil um país atrasado, mas, como argumento para justificar golpe de Estado, mesmo uma manifestação grande será uma desculpa bem vagabunda. Se isso for suficiente para convencer as Forças Armadas, então já teve golpe.





segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

De quem são as Forças Armadas - José Eduardo Faria (Estado da Arte)

 Política 

De quem são as Forças Armadas?

José Eduardo Faria

José Eduardo Faria é Professor Titular do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). É professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-Direito) e um dos ganhadores do Prêmio Jabuti (Direito) em 2012, além de Prêmios Esso de Jornalismo (1974 e 1976).

terça-feira, 1 de abril de 2014

Frank D. McCann: tentando entender os militares brasileiros - Entrevista Estadao

'Vivi com o golpe toda a minha carreira'
Em entrevista ao Estado, historiador americano explica em que 1964 foi diferente das outras tentativas de golpe
Entrevista: Frank D. McCann
Wilson Tosta
O Estado de S. Paulo28 de março de 2014

Entender 1964 tem sido um dos desafios profissionais do historiador norte-americano Frank McCann. “Vivi com o golpe toda a minha carreira”, conta o pesquisador, que era estudante da pós-graduação em História do Brasil na Universidade de Indiana quando o governo João Goulart caiu. Ele relata que ainda lembra de quando viu a foto do presidente Castelo Branco pela primeira vez no New York Times e afirma que acompanhou “obsessivamente” o noticiário da época, tentando compreender o que acontecia em seu objeto de estudo. Em 1965, saciou um pouco da curiosidade no Brasil, para onde se mudara com a família para pesquisar e preparar sua dissertação. McCann ainda se lembra de ler as manchetes sobre o AI-2, que acabou com os partidos, nas bancas da Avenida Rio Branco, no Centro do Rio de Janeiro. O ambiente, diz, era muito tenso, devido a rumores de uma rebelião de linha dura na Vila Militar.
“Eu não tinha ideia, então, de que eu passaria muito da minha vida tentando entender os militares brasileiros", afirma
A seguir, os principais trechos de sua entrevista ao Estado:

Antes de 64, o Brasil viveu várias tentativas de golpe militar de direita: 54, 55 , 61, além das Revoltas de Jacareacanga e Aragarças. Todas fracassaram . Por que a tentativa de 64 foi vitoriosa?
As tentativas de golpe anteriores a 64 fracassaram porque não foram suficientemente apoiadas por todas as Forças Armadas, porque faltou apoio civil em grande escala ou porque foram localizadas dentro de uma das Forças. Oficiais superiores e a elite civil culparam Goulart e seus aliados , como Brizola , da extensa agitação social em todo o Brasil. As imagens das manifestações das Ligas Camponesas no Nordeste permaneceram na memória dos opositores do governo. A discussão da necessidade de reforma agrária , da expansão da educação, do controle dos recursos naturais, foi considerada muito radical, de alguma forma contaminada pelo comunismo. A opinião pública foi manipulada para alimentar o medo. As elites civis e a Igreja Católica viram a ameaça vermelha à sua porta. Brizola falando em armar um tipo de milícia deixou as pessoas assustadas. O Brasil parecia prestes a explodir. Discussão racional, calma, dos problemas nacionais tornou-se rara.

De onde veio o golpe?
Para mim, a grande questão é: por que os militares pensavam que tinham o direito ou dever de criticar publicamente , atacar ou depor um governo? Historicamente, eles têm dito muitas vezes que seus antecessores tinham deposto a monarquia e instalado a República, e tinham o dever de defendê-la e protegê-la. Claro que era uma responsabilidade autoassumida. Infelizmente, na República Velha políticos civis aparentemente encorajaram esse tipo de pensamento, de envolver os militares em seus esquemas partidários. A disciplina solta no Exército permitiu que oficiais acreditassem que eram os guardiães da República. A muito antiga prática de dar anistia a todos os envolvidos em revoltas diminuiu o autocontrole. Em 1904, 1922 e 1924, os rebeldes foram expulsos, mas depois de um tempo tiveram permissão para retornar e ter carreiras normais. Isso significava que os rebeldes não eram fortemente penalizados por sua rebelião. A instituição era muito insular, uma coisa à parte da sociedade, muito controlada pelo próprio corpo de oficiais. A estrutura das Forças Armadas tornou o controle civil extremamente difícil, se não impossível.

Mas o que diferencia o golpe de 64 das tentativas anteriores?
Uma coisa que aconteceu em 54, 55 e 61 foi que a intervenção dos militares levou à passagem da Presidência para outro civil. Em 64 não havia apoio suficiente para qualquer político civil. As figuras proeminentes foram, cada um, um pouco divisionistas, Carlos Lacerda  foi o mais divisionista. Antes do golpe, Castelo Branco tinha passado semanas de reuniões reservadas  com os líderes civis e ganhou sua confiança. Ao determinar a deposição de Goulart, os políticos civis pensaram que o golpe seria apenas empurrá-lo de lado, e um deles levaria o Planalto. Eles não sabiam que um conjunto significativo de oficiais passou a acreditar que seu caminho para servir à nação era dirigi-la. Claro que é necessário lembrar que foi um período quente da Guerra Fria, e os militares brasileiros estavam imersos na mentalidade do anticomunismo. Eles faziam um culto a 1935, a rebelião financiada por Moscou no Exército. Os generais de 64 tinham sido jovens oficiais em 1930 e abraçaram os mitos sobre 1935, como o de oficiais brasileiros assassinados durante o sono, o que não aconteceu, mas eles acreditavam. A falta de disciplina que mencionei anteriormente foi um fator que contribuiu para a revolta de 1935 . Oficiais legalistas afrontados pelos rebeldes derrotados riram quando eles foram levados para a prisão.

Sem o cabo Anselmo e sem a reunião dos sargentos no Automóvel Club teria havido golpe?
Certamente o motim dos marinheiros e a revolta dos sargentos contrariaram e preocuparam os oficiais, que viram essas ações como quebra de disciplina. Foi bom para os oficiais insuflar a revolta , mas não para a tropa mais baixa. O cabo Anselmo foi, naturalmente , muito problemático, porque era um agente dos golpistas que agia como um provocador . Mas veja, realmente, todos os participantes no golpe estavam quebrando a cadeia de comando , quebrando hierarquia.

 Por que o suposto esquema militar de apoio ao presidente Jango falhou?
Era muito pequeno, muito desorganizado e sem saber o que estava acontecendo até muito tarde. Eu suspeito que muitos oficiais acharam mais fácil apenas serem arrastados na corrente e não estavam dispostos a se opor a seus comandantes e colegas.

Os militares eram um grupo coeso na ditadura ou havia divisões significativas entre eles?
Durante os anos militares, houve uma divisão, com aqueles que eram oficiais profissionais e não pensavam que governar o país era o seu papel (de um lado). Havia outros, menos comprometidos com a profissão de soldado, que foram corrompidos pelas oportunidades de remuneração extra e benefícios ilegais. Sem dúvida, houve alguns que gostaram dos papéis repressivos, da espionagem, do sigilo, na verdade talvez até gostassem de ferir os outros. Alguns, talvez por causa de sua educação limitada, não conseguiam entender que o que as pessoas que queriam era uma sociedade justa , com oportunidades reais de possuir terra , obter educação e expressar seus pensamentos. Lembro-me de, em 1976, um coronel em uma reunião em Brasília, que me disse que ele e seu irmão, também um coronel, mal podiam falar um com o outro, porque discordaram totalmente ao longo da "Revolução" . O irmão aparentemente justificava as prisões , desaparecimentos e torturas, enquanto ele acreditava que esse tipo de comportamento repressivo estava abaixo da dignidade de um oficial do Exército.

 Por que a transição política foi tão lenta, com a demora em desmontar o aparato repressivo, com o SNI, em contraste com países vizinhos, como a Argentina?
Boa pergunta . Acho que Geisel não sabia como domar o tigre. Talvez ele pensasse que, dando tempo suficiente, as emoções fortes iriam passar, e o discurso racional seria possível. Por que demoraram tanto tempo para desmantelar o SNI eu não sei, mas suspeito que era de alguma utilidade para Sarney. Provavelmente vai demorar muitos anos para que todos os arquivos sejam estudados. A Argentina foi um caso muito diferente. O Exército não tinha histórico de assumir o governo. O caso argentino foi mais brutal e ainda mais irracional do que o brasileiro. Foi uma sorte que os generais fossem loucos o suficiente para atacar as Malvinas e fossem derrotados pelo Reino Unido.

 Um dos grupo mais perseguidos, talvez o mais perseguido, durante a ditadura foi o dos militares. Houve 7.500 militares cassados. Ocorreu uma guerra à parte entre militares durante o período?
Sim, houve uma purga interna nas Forças Armadas. Estou certo de que muitos inocentes sofreram. O pensamento cego que passou no Exército sobre o comunismo é notável . Alguns oficiais que estavam simplesmente a favor da regra constitucional foram rotulados como radicais e, portanto, comunistas . O livro de Shawn Smallman, “Fear and Memory in the Brazilian Army and Society, 1889-1954” (Univ. of North Carolina Press, 2001) estudou os aspectos da purga . O livro de Maud Cahirio, “A Política nos Quartéis” ( Zahar , 2012) traça as lutas internas . As instituições militares sofreram com tudo isso e perderam um pouco de sua capacidade 
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 Na Argentina, no Uruguai e no Chile, as ditaduras não foram nacionalistas nem estatizantes. Por que no Brasil os governos militares criaram e fortaleceram empresas estatais e mantiveram a legislação de direitos trabalhistas , além de tentar desenvolver alguns setores nacionais, diferentemente do que aconteceu em ditaduras vizinhas?
Os militares brasileiros estiveram profundamente comprometidos com o desenvolvimento econômico por décadas. Eles costumavam dizer que um país pobre não poderia ter um bom establishment militar. Eles se sentiram no dever de desenvolver e melhorar o País, para que pudessem ter os meios para se defender adequadamente. Eles não queriam os recursos naturais do País em mãos de estrangeiros . Curiosamente, alguns oficiais me disseram que na década de 1990, quando conversaram com ex-comunistas , ficaram surpresos ao descobrir que eles queriam as mesmas coisas para o Brasil. Um coronel intelectual disse que pensou que a coisa toda, o golpe , o regime militar , tudo tinha sido um erro enorme.

 A tortura foi excesso de fanáticos e sádicos ou foi política de Estado, estimulada pelo topo da hierarquia?
O uso de tortura é algo que faz pouco sentido. Oficiais , mesmo seniores como o general Carlos Meira Mattos, a justificavam como a única forma rápida para encontrar o a bomba-relógio ligada. Mas a realidade é que havia poucas bombas em funcionamento, e pior que muitas pessoas foram torturadas semanas e meses depois de serem presas quando não poderiam ter nenhuma informação útil. Uma estudante minha de pós-graduação, Martha K. Huggins , fez dois estudos, “Political Policing: the United States and Latin America” (Durham: Duke University Press, 1998) e “Violence Workers: Police Torturers and Murderers Reconstruct Brazilian Atrocities” (Berkeley: University of California Press, 2002), que mostraram alguma influência americana no uso da tortura . Lembro-me de estar no Rio em 1969 e de relatos de americanos estarem presentes durante as sessões de tortura no quartel-general da Marinha. De meus estudos de história do Exército , eu diria que nenhum estrangeiro tinha nada a ensinar aos brasileiros sobre como torturar ou maltratar prisioneiros. É verdade que os brasileiros estavam longe de serem tão perversos quanto os argentinos ou chilenos no uso de tortura ou assassinato, mas isso não é algo de que se orgulhar . Alguns dos abusos foram protagonizados por pessoal das polícias militares estaduais, mas porque o Exército brasileiro colocou seus oficiais no comando de cada PM estadual, o que traz a responsabilidade de volta para o Exército. A tortura era generalizada.
Claro que os leitores vão dizer que os Estados Unidos fizeram o mesmo contra supostos terroristas após o 11 de setembro. Infelizmente isso é verdade, mas eu acho que não foram os Estados Unidos , mas o governo de George W. Bush , que fez isso. Até onde sei, o Exército dos Estados Unidos não estava envolvido, pelo menos até o episódio da prisão no Iraque. Como cidadão americano estou profundamente envergonhado com o que o gangue de Bush fez.
 Agora, assassinato é algo ainda pior do que tortura. Sabemos a partir do caso da Casa da Morte de Petrópolis que as pessoas presas lá foram torturadas até morrerem e foram enterradas em segredo. Segundo a imprensa, os torturadores eram pessoal do Exército . Talvez mais vergonhoso de um ponto de vista militar foi o assassinato de prisioneiros no Araguaia. Em combate é matar ou ser morto , mas a honra militar exige que os prisioneiros sejam protegidos. Foram esses assassinatos encomendados? Por quem? Por quê? Parece que alguns oficiais generais estavam cientes de que isso estava acontecendo . É muito possível que Ernesto Geisel soubesse .

 O que fica do golpe para o Brasil de hoje?
A questão desde 1985 tem sido: como evitar que tudo aconteça de novo? É bom que presidente Dilma tenha proibido os militares de comemorar 1964 e o regime posterior , mas isso não é suficiente. As escolas militares deveriam estar ensinando sobre tudo isso como um exemplo do que os militares brasileiros não devem fazer. A melhor proteção para as Forças Armadas é ver o golpe como um erro grave. Não foi uma vitória sobre o comunismo, mas um ataque à democracia e ao Brasil como um país livre. Devo lembrar que as Forças Armadas de hoje não são as mesmas que as de 1964.
Os instituições militares de hoje no Brasil são politicamente neutras e totalmente engajadas na sua missão de defesa nacional.
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Original das respostas, em inglês, do historiador, como recebido do próprio:

Questions sent by Wilson Tosta as an ‘interview’ on Golpe of 1964.
Ah Wilson, these are very good questions.  I have lived with the coup of 1964 for my whole career.  I was a graduate student at Indiana University specializing in Brazilian history when it occurred.  I remember where I was the day I first saw Castello Branco’s photo in the New York Times.  I followed the news reports obsessively trying to understand what was happening.  Then in 1965 my wife and I and our two little girls went to Rio for a year so I could research my dissertation.  I remember reading the headlines at the news stands on Av. Rio Branco when the AI-2 was decreed abolishing the then political parties.  The atmosphere was very tense due to rumors of a rebellion of hard liners at Vila Militar.  I had no idea then that I would spend much of my life trying to understand the Brazilian military.
1) Antes de 64, o Brasil viveu várias tentativas de golpe militar de direita: 54, 55, 61, além das revoltas de Jacareacanga e Aragarças, no governo Juscelino. Todas fracassaram. Por que a tentativa de 64 deu certo? O que a diferenciou das outras?
The earlier coup attempts failed because they were not sufficiently supported throughout the armed forces, lacked large scale civilian backing, or were localized within one service. 
Higher officers and the civilian elite blamed Goulart, and his allies such as Brizola, for the extensive social unrest throughout Brazil.  The images of the demonstrations of the Peasant Leagues in the northeast lingered in the memories of government opponents.  Talk of the need for land reform, expanded education, control of natural resources was perceived as very radical, somehow tainted by communism.  Public opinion was manipulated to stoke fear.  The civilian elites and the Catholic Church saw the Red Menace at their doorsteps.  Brizola talking about arming a type of militia frightened people.  Brazil seemed to be ready to explode.  Rational, calm discussion of national problems became rare.  
For me the big question is why would military officers (in Brazil this mostly means army officers) think that they had the right (duty??) to publicly criticize, attack, or depose a government?  Historically they have often said that their predecessors had deposed the monarchy and installed the republic and they had the duty thereby to defend and protect it.  Of course that was a self-assumed ‘responsibility’.  Unhappily in the Old Republic civilian politicians seemingly encouraged that kind of thinking to involve the military in their partisan schemes. 
The loose discipline in the army allowed officers to believe that they were the guardians of the republic. The very old practice of giving amnesty to those involved in revolts diminished self-control.   In 1904, 1922, and 1924 rebels were expelled from the ranks, but after a while allowed to return and have normal careers.  That meant that rebels were not heavily penalized for their rebellion.  A basic lack of discipline was bred into the officer corps.   The institution was too insular, too much a thing apart from society, too much controlled by the officer corps itself.  The structure of the armed forces made civilian control extremely difficult, if not impossible.
The plotting in 1954 against Getúlio was cut short by his suicide and the huge popular reaction in the streets.  Some scholars think it delayed the seizure of power until the next decade, I think it was more complicated and that the events of the next years produced the climate that made 64 possible. 
One thing that happened in 54, 55, and 61, was that whatever intervention the military took, they supported the passing of the presidency to another civilian.  In 64 there was not sufficient elite support for any particular civilian politician.  The outstanding figures were each somewhat divisive, Carlos Lacerda being the most divisive.  Prior to the coup Castello Branco had spent weeks meeting quietly with civilian leaders and had gained their confidence.  By determining to depose Goulart the civilian politicians thought that a coup would merely push him aside and one of their number would take the Planalto.  They were unaware that a significant body of officers had come to believe that the way for them to serve the nation was to direct it. 
Of course it is necessary to remember that it was a hot period of the Cold War and the Brazilian military mentally was deep into the mindset of anti-communism.  They had made a cult out of the 1935 Moscow- funded rebellion in the army.   The generals of 64 had been young officers in the 1930s and they embraced the myths about 1935 , such as Brazilian officers being shot in their sleep.  that did not happen but they believed that it did.  The lack of discipline that I mentioned earlier was a contributing factor to the 1935 revolts.  Loyalist officers long remembered and were affronted that the defeated rebels laughed as they were marched to prison. 
2) Qual foi o papel da quebra de hierarquia para o sucesso do golpe? Podemos dizer que, sem o cabo Anselmo, sem o motim dos marinheiros no Sindicato dos Metalúrgicos do Rio e sem o almoço dos sargentos no Automóvel Clube, teria havido golpe bem-sucedido?

Certainly the sailors’ mutiny and the earlier sergeant’s revolt upset and worried the officers, who saw these actions as breaking of discipline.  It was fine for officers to plot and revolt but not for the lower ranks.  Cabo Anselmo was, of course, really problematic because he was an agent of the golpistas acting as a provocateur.   Legally everyone participating in the coup was breaking the chain of command, quebrando hierarquia.  Just because Generals were leading and giving orders did not make the rebellion legal or right.
3) Como era o jogo dos generais na época? Quem ficou com João Goulart, quem mudou de lado e quem estava contra ele desde o início, nas Forças Armadas? E quais eram os motivos dessas posições (ou suas mudanças)?
A few general officers attempted to side with the government, the Third Army in Rio Grande do Sul comes to mind.  But supporters were quickly pushed aside, arrested, retired. 
4) Golpistas civis esperavam que os militares apenas derrubassem o governo Goulart e lhes passassem o poder. Por que isso não aconteceu e os militares ficaram 21 anos mandando no Brasil?
I think I mentioned this above.   But it is important to remember that a lot of civilians supported the military’s intervention. 
5) Por que o suposto esquema militar de apoio ao presidente Jango falhou?
Why did it fail?  It was too small, too disorganized and unaware what was happening until too late.   I suspect that many officers found it easier just to be swept along in the current and were unwilling to oppose their commanders and colleagues. 
 6) A visão de que os militares eram um grupo coeso durante o regime é verdadeira ou havia divisões políticas significativas entre eles? Quais eram essas divisões?
During the military years there was a division between those who were professional officers who did not think that running the country was their role.   There were others less committed to the profession of soldiering who were corrupted by the opportunities for extra pay and illegal benefits.  Undoubtedly there were some who enjoyed the repressive roles, the spying, the secrecy, indeed maybe even enjoyed hurting others.  Some, perhaps because of their limited education, could not understand that people who wanted a just society with real opportunities to own land, get an education, and to express their thoughts, could be anything other than communists.
   I remember in 1976 meeting a colonel in Brasilia who told me that he and his brother, also a colonel, could barely speak with each other because they disagreed completely over the course of the “Revolution”.   His brother apparently justified the arrests, disappearances, and torture, while he believed such repressive behavior was beneath the dignity of an army officer.
7) A abertura política começou em 1975, e os militares só deixaram o poder dez anos depois. Mesmo assim, por pelo menos mais dez anos os militares eram vistos com receio pelos brasileiros. Houve ainda demora no desmonte de estruturas repressivas - o SNI só acabou em 1990, por exemplo. Qual foi o motivo de uma transição tão lenta? Como comparar essa transição com as de países vizinhos, como Argentina e Uruguai?
Why so slow a transition?  Good question.  I think that Geisel did not know how to get off the tiger.  Perhaps he thought that given enough time the high emotions would pass and rational discourse would be possible.  Why it took so long to dismantle the SNI I do not know, but I suspect that it was of some use to Sarney.   Likely it will take many years for all those files to be studied.
 Argentina was a very different case.  The army there had a history of coup making and taking over the government.  The Argentine case was more brutal and even more irrational than the Brazilian one.  It was fortunate that the generals were crazy enough to attack the Falklands and get routed by the British.  Today, the Argentines should be thanking the British rather than posturing ridiculously about the islands being theirs. 
8) Fala-se que os militares perseguiram adversários durante a ditadura. Um dos grupos mais atingidos, talvez aquele que foi mais perseguido, era formado por militares: 7.500 integrantes das Forças Armadas foram cassados no período. Pode-se falar que houve uma guerra à parte entre os militares naquela época?
Yes there was an internal purge within the armed forces.  I am sure that many innocents suffered.  The blind thinking that went on in the army about communism is notable.  Some officers who were simply in favor of constitutional rule were labeled as radicals and thus communists.  Shawn Smallman’s book Fear and Memory in the Brazilian Army and Society, 1889-1954 (Univ. of North Carolina Press, 2001) studied aspects of the purge.  Maud Cahirio’s A Política nos Quartéis (Zahar, 2012) traces the internal struggles.  The military institutions suffered from all this and lost some of their capability.
9) Na Argentina, no Uruguai e no Chile, as ditaduras não foram nacionalistas nem estatizantes. Por que no Brasil os governos militares criaram e fortaleceram empresas estatais e mantiveram a legislação de direitos trabalhistas, diferentemente do que acontecia em países vizinhos?
 The Brazilian military was deeply committed to economic development going back decades.  They used to say that a poor country could not have a good military establishment.  They felt a duty to develop and improve the country so that they could have the means to defend it adequately.  They did not want the nation’s natural resources in the hands of foreigners.  Interestingly, some officers told me that in the 1990s they had conversations with ex-communists, they were surprised to find that they wanted the same things for Brazil.  One intellectual colonel said he thought the whole thing, the golpe, the military regime, had all been a huge mistake.
10) A tortura e o extermínio de oposicionistas foi fruto de excessos de subordinados ou havia aquiescência do topo da hierarquia para que se torturasse, em defesa do regime?
The use of torture is something that makes little sense.  Officers, even senior ones like General Carlos Meira Mattos justified it as the only quick way to find the ticking “time bomb”.   But the reality is that there were few such ticking bombs and worse that many people were tortured weeks and months after being arrested when they could have no useful information.  A graduate student of mine, Martha K. Huggins, who did two studies: Political Policing: the United States and Latin America (Durham: Duke University Press, 1998) and Violence Workers: Police Torturers and Murderers Reconstruct Brazilian Atrocities (Berkeley: University of California Press, 2002) that showed some American training in the use of torture.   I recall being in Rio in 1969 and hearing reports of Americans being present during torture sessions in the Naval headquarters. 
From my studies of army history I would say that no foreigner had to teach Brazilians how to torture or mistreat prisoners.  It is true that the Brazilians were nowhere near as bad as the Argentines or Chileans in the use of torture or murder, but that is not something of which to be proud.   Some of the abuses were carried out by state Policia Militar personnel, but because the Brazilian army placed one of its officers in command of every state PM, that brings the responsibility back to the army.  Torture was widespread.  
 Of course your readers will say that the United States did the same against supposed terrorists after 9/11.  Sadly that is true, but I think it was not the United States, but the George W. Bush administration, that did it.  As far as I know the United States Army was not involved, at least until the prison episode in Iraq.  As an American citizen I am deeply, deeply ashamed of what the Bush gang did.
Now murder is something even worse than torture.  We know from the case of the ‘Death House’ in Petropolis that people taken there were tortured to death and buried in secret.  According to press accounts the torturers were army personnel.
Perhaps more shameful from a military point of view was the murder of prisoners in the Araguaia.  In combat it is kill or be killed, but military honor demands that prisoners be protected.  Were these murders ordered?  By whom?  Why?  It seems that some general officers were aware that this was happening.  It is very possible that Ernesto Geisel knew.  Elio Gaspari laid it out clearly.  Interested readers will find more than they want to know in Claudio Guerra’s Memórias de uma Guerra Suja (Topbooks, 2012).   He tells of his experiences as a DOPS agent working with a parallel army chain of command to murder leftists.
The question since 1985 has been how to prevent all this happening again?  It is good that Presidenta Dilma has forbidden the military to commemorate 1964 and the subsequent regime, but that is not enough.  The military schools should be teaching about all this as an example of what the Brazilian military should not do.  The best protection is for the armed forces to see it as a serious mistake.  It was not a victory over communism, rather it was an attack on democracy and on Brazil as a free country.   

Devo lembrar aos leitores que as Forças Armadas de hoje não são as mesmas que as de 1964. Os instituições militares de hoje no Brasil são politicamente neutra e totalmente engajados na sua missão de defesa nacional.