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quinta-feira, 5 de junho de 2014

Brasil-Bolivia: saga do senador boliviano asilado politico em documentario

Augusto Nunes, 4/06/2014

Em 28 de maio de 2012, acuado por ameaças que passou a receber por ter denunciado o envolvimento do governo de Evo Morales com o narcotráfico, o senador boliviano Roger Pinto Molina abrigou-se na embaixada brasileira em La Paz. A concessão do asilo pelo governo Dilma Rousseff  parecia anunciar o fim de um calvário. Era apenas outra etapa do drama ainda longe do desfecho.
Molina permaneceu 455 dias num quarto de 20 metros quadrados, impedido de tomar sol, dar entrevistas ou receber visitas livremente. A saída do inferno só se consumou porque o diplomata Eduardo Saboia, encarregado de negócios da embaixada, resolveu agir. Sem consulta ao Itamaraty, escondeu o prisioneiro num carro oficial e o trouxe para o Brasil. A viagem entre La Paz e Corumbá, em Mato Grosso do Sul, durou 22 horas.
A saga de Roger Pinto Molina é o fio condutor do documentário Missão Bolívar, de Dado Galvão, que estreia em julho. Além do protagonista, entre os entrevistados figuram Eduardo Saboia, os ex-presidentes bolivianos Carlos Mesa e Jorge Quiroga, o advogado Fernando Tibúrcio e os senadores Ricardo Ferraço (PMDB), Álvaro Dias (PSDB) e Sérgio Petecão (PSD).
Galvão também dirigiu o documentário Conexão Cuba-Honduras, de 2012, que evoca a situação política dos dois países caribenhos para tratar de liberdade de expressão e direitos humanos. Foi ele o articulador da visita ao Brasil da blogueira cubana Yoani Sánchez, em março do ano passado.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Brasil-Bolivia: novela (?) bilateral interminavel, em longos e aborrecidos capitulos...

BRASIL – BOLÍVIA
Festival de covardia
Coluna / Rosângela Bittar
Valor Econômico, 4/06/2013

Ideologia, não é; integração regional, nem se fala; dependência econômica, longe disso; adulação comercial, ora, por quê? Política externa, então, passa ao longe e ao largo do que vem ocorrendo na relação Brasil-Bolívia, trincada por razões até agora tão inexplicáveis quanto incompreensíveis.
Descobriu-se, neste momento, em reportagem da "Folha de S. Paulo" sobre o que apurou comissão de sindicância do Itamaraty, que os laços diplomáticos entre Brasil e Bolívia não apenas não se recuperaram como estão mais desamarrados que nunca.
Em breve memória: em maio de 2012, o senador boliviano Roger Pinto Molina pediu asilo ao embaixador brasileiro na Bolívia, Marcel Biato, e passou a morar no escritório da embaixada enquanto aguardava o salvo conduto para se transferir para o território brasileiro. Nos dias 23 e 24 de agosto de 2013, 453 dias depois de ingressar na embaixada onde viveu em um escritório fechado a 4 mil metros de altitude, em condições precárias e doente, o senador foi levado em um carro oficial até Corumbá, no Mato Grosso do Sul, pelo ministro Eduardo Sabóia, encarregado de negócios e responsável pela embaixada na ausência temporária do embaixador, e de lá a Brasília, onde mora.
Abriu-se, então, uma crise diplomática, alimentada sobretudo pela condução que a presidente Dilma Rousseff deu ao caso. Aconselhada a telefonar ao presidente Evo Morales e liquidar o assunto numa explicação direta, objetiva e segura, informando que poderia ser feita a transferência com absoluta discrição, dada a tradição dos dois países em concessão de asilo, e que Morales poderia continuar dizendo que o senador era um preso comum, e não político, como exigia, a presidente não fez nada disso. Declarou que o diplomata Sabóia havia colocado em risco a vida de Pinto Molina, e passou a endurecer com os brasileiros e a fazer concessões a Evo Morales.
O Itamaraty abriu sindicância para apurar responsabilidades, mas a presidente já havia condenado por antecipação e as concessões surgiram em série.
O governo brasileiro rifou o embaixador Biato num momento de crise, com o senador asilado e uma torcida de corintianos presos em La Paz; demitiu o chanceler Antonio Patriota a pedido expresso de Morales; mandou para escanteio o ministro Eduardo Sabóia, enquanto responde à sindicância que, segundo informam autoridades, está pronta (duram 30 dias, essa já faz 10 meses) e engavetada; o senador Molina ainda aguarda o refúgio, em 2014, para um asilo pedido em 2012. Os brasileiros vão mal. Evo Morales vai muito bem, com uma pressão aqui, uma ameaça acolá, vai conseguindo o que quer. A presidente Dilma está alimentando o sentimento de onipotência do governo boliviano, é o que nota uma autoridade da Bolívia. Até o ex-chanceler Celso Amorim, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foram sabotados na sua tentativa de ajudar a resolver o caso. Morales mandou inspecionar o avião que levou Amorim, em retaliação, o governo brasileiro não reagiu e os ministros silenciaram.
Sobreveio o caso da prisão dos torcedores corintianos, que não tardaram a entrar na barganha, e a segunda leva desses prisioneiros ganhou a liberdade quando Morales quis levar uma notícia boa ao ex-presidente Lula, em encontro em São Paulo, em jogada de marketing com a vida alheia. Autoridades bolivianas se manifestaram surpresas com a reação frouxa do Brasil. Um ministro chegou a dizer a uma autoridade brasileira que, "se querem ajudar o Evo Morales, digam não, ele precisa ouvir um não".
A presidente já mostrou que não tem paciência para a diplomacia que exige negociação, trabalho, conversa, e casos como esse não se resolvem com o básico, como prefere.
O que há de mais novo, sobre ele, é a informação, colhida em relatos a que a Folha teve acesso, de que nos depoimentos secretos à sindicância o ex-chanceler Antonio Patriota confirmou que houve proposta do Brasil, um ano depois da entrada do senador na embaixada, para que ele abrisse mão do asilo, numa carta a ser escrita à presidente Dilma. Em compensação o Brasil o levaria a um terceiro país, que poderia ser a Venezuela. A ideia do terceiro país foi uma das mais estapafúrdias registradas entre tantos absurdos.
Os casos de asilo são recorrentes na história dos dois países, e ocorreram normalmente, em outros governos, inclusive no de Lula, de onde o governo Dilma se origina. Uma curiosidade: em julho de 2013, um mês antes da operação de transferência do senador Pinto Molina, a Bolívia ofereceu asilo a Edward Snowden. Também um mês antes da operação, a Unasul aprovou o direito universal a asilo e explicitou que nenhum país poderia impedir o asilado de transitar até o país que concedeu o asilo. O Brasil estava cercado de leis e razão para se conduzir com coragem, mas não o fez.
Outras evidências no comportamento de autoridades bolivianas não estimularam o Brasil a rever seus equívocos, entre elas, a declaração da ministra da Justiça boliviana ao ministro da Justiça brasileiro que se o Brasil tirasse o senador, fariam "vistas grossas".
Quem deixou engrossar foi o governo brasileiro. Em lugar de um simples e rápido telefonema ao colega boliviano para explicações de praxe, a presidente Dilma alimentou a crise e Evo Morales fez bom proveito.
O governo brasileiro está mostrando que não se tratava da política de afinidade ideológica, tal o grau da trapalhada em que se enroscou. Tampouco tinha o objetivo de preservar a balança comercial. Se o Brasil é dependente da cocaína, do crack e do gás da Bolívia, a Bolívia é dependente do dinheiro dos produtos que vende.
Dez meses depois, o relatório da sindicância permanece na gaveta, talvez para sair depois das eleições, como tudo. Poderá concluir pela absolvição, exoneração ou advertência ao diplomata Eduardo Sabóia. O seu advogado, ex-presidente da OAB, Ophir Cavalcante, não admite nem advertência. Irá recorrer.

Pode-se criticar Jérôme Valcke, o irritadiço secretário-geral da Fifa, por tudo, mas não se pode duvidar de sua perspicácia. Na entrevista que deu ao "Globo", no domingo, provou ter entendido direitinho em que lugar do planeta está. Disse que, para o Brasil, ganhar a Copa interessa mais do que ter sucesso na organização do Mundial. Compreensão perfeita.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Brasil-Bolivia e Itamaraty: uma investigacao que se prolonga ao infinito

Política

Oito meses depois de comandar fuga de Molina, diplomata amarga o ostracismo

Eduardo Saboia protagonizou um dos mais marcantes episódios da diplomacia brasileira. E até agora o caso não teve desfecho

Marcela Mattos, de Brasília
O diplomata Eduardo Saboia foi afastado de suas funções por tempo indeterminado por ter conduzido a operação que trouxe ao Brasil o senador boliviano Roger Pinto Molina
Protagonista de uma história com roteiro cinematográfico, com direito a fuga e ameaças, o diplomata Eduardo Saboia vive em um limbo desde que trouxe ao Brasil o senador bolivianoRoger Pinto Molina. O ex-parlamentar de oposição era perseguido pelo governo de Evo Morales e ficou asilado, com o aval do governo brasileiro, por 455 dias na Embaixada do Brasil na Bolívia. Servidor de carreira, Saboia é ministro-conselheiro do Ministério das Relações Exteriores. Após a epopeia com a fuga de Molina para o Brasil, ele se tornou alvo de processo disciplinar que se arrasta há oito meses na comissão de sindicância do Itamaraty – e não tem prazo para ser concluído. Na última quarta-feira, o colegiado voltou a empurrar a decisão se ele deve ou não ser punido pelo episódio: prorrogou os trabalhos por mais 30 dias, como vem ocorrendo sucessivamente desde outubro. Enquanto aguarda uma deliberação sobre o caso, Saboia foi deixado na geladeira e lotado em uma função administrativa. Constrangido, ele pediu licença do cargo no dia 8.
Ex-encarregado de Negócios na Embaixada brasileira, Saboia tem 46 anos, metade deles vividos no Itamaraty. A atuação do diplomata era considerada impecável pelo Ministério das Relações Exteriores e lhe rendeu, inclusive, uma condecoração pelo ex-presidente Lula com a medalha da Ordem do Rio Branco. No entanto, a carreira foi interrompida após, diante da inoperância do governo brasileiro, ajudar o senador a escapar das ameaças da tropa comandada por Morales. Molina denunciou o envolvimento de autoridades bolivianas com o tráfico de drogas. 
Logo ao chegar ao Brasil, no final de agosto, Saboia foi afastado de suas funções e tornou-se objeto de investigações de uma sindicância interna do órgão. Um relatório final, que deve ser elaborado por uma comissão, decidirá se o diplomata deve ou não ser punido. As medidas disciplinares aplicáveis vão desde uma advertência à demissão do cargo.  
Com o futuro incerto, o diplomata foi realocado no cargo secundário de assessor no departamento de Assuntos Financeiros e de Serviços do Itamaraty – uma função administrativa, sem status de chefia nem gratificações que tinha como ministro. “Isso é um assédio moral do ponto de vista de não conceder qualquer atividade na altura do que ele possa exercer. Hoje ele está sentado em uma cadeira sem fazer nada”, afirma a defesa de Saboia, o advogado Ophir Cavalcante.
Saboia, por outro lado, evita tecer comentários sobre o posto. Mas reclama da demora em ter o caso solucionado: “Hoje eu faço o trabalho que me passam. Lá dentro eu virei aquele cara que tem uma sindicância e que, por isso, é constantemente julgado. Eu já estou sendo punido”, disse, em entrevista ao site de VEJA concedida em uma confeitaria de Brasília. Antes de conversar com a reportagem, Saboia tomou um chá com o senador Molina. A defesa do boliviano o orienta a não dar entrevistas. 
Ao longo de conversa de uma hora, o diplomata explicou que decidiu pedir licença de suas funções por três meses, que pode ser prorrogada pelo mesmo período - benefício concedido por tempo de serviço a servidores públicos -, e planeja usar o tempo para avaliar “outras possibilidades” para a carreira. Na última segunda-feira, Saboia esteve no evento que selou a chapa de Eduardo Campos e Marina Silva para a disputa eleitoral deste ano. Ele nega, porém, ter pretensões políticas ou ser filiado a algum partido, mas não descarta participar da campanha: “Eu quero contar a minha história nessas eleições”.  
A fuga - Alegando ser perseguido politicamente, o senador boliviano Molina conseguiu asilo na embaixada brasileira, onde permaneceu por 15 meses em condições degradantes: viva em um pequeno quarto improvisado, sem direito a banho de sol e com permissão apenas para receber visitas esporádicas de familiares e do advogado. O governo brasileiro sabia da situação de Molina, mas não tomou providências ao longo de todo o período.
Depois de mais de um ano nessa condição, o senador entrou em depressão e teve a saúde debilitada. Em agosto de 2013, Saboia, que à época ocupava o cargo de embaixador interino, decidiu resolver o problema com as próprias mãos: em um carro oficial escoltado por fuzileiros navais brasileiros, ele e Molina viajaram por 22 horas entre La Paz e Corumbá, no Mato Grosso do Sul, e depois seguiram para Brasília em um avião obtido pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). A ação não foi previamente informada ao governo brasileiro.
A presidente Dilma Rousseff classificou o episódio como uma “quebra de hierarquia” e disse que a embaixada brasileira na Bolívia é “extremamente confortável”. Do outro lado, Saboia alegou que, por “questões humanitárias”, não poderia deixar uma pessoa viver daquela forma em uma dependência do Brasil. O diplomata ainda alegou que informou o Itamaraty somente após o episódio por motivos de segurança. Como consequência, o então ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, foi exonerado.
“O governo brasileiro deixou que o instituto do asilo se transformasse em uma situação de violação da dignidade de uma pessoa que estava sob os nossos cuidados. Isso é muito sério e é algo que deveria ser investigado: quem é o responsável ter deixado isso chegar até esse ponto?”, questiona Saboia. “Eu não tive outra opção além daquela para preservar a vida de uma pessoa e a imagem do meu país.”  
Assim como Saboia, o senador boliviano ainda não teve a situação definida. Molina espera aval do governo Dilma para morar legalmente no Brasil enquanto está abrigado, de favor, na casa do senador Sérgio Petecão (PSD-AC), em Brasília – hoje ele pode permanecer no país graças ao refúgio provisório concedido pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare).   
Questionada pela reportagem sobre o motivo da demora para a conclusão dos trabalhos da sindicância e o cargo incompatível exercido por Saboia, a assessoria de imprensa do Itamaraty afirmou que não iria comentar o caso.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Bolivia: Operacao Jaime Bondales prometia cenario de filme do Inspetor Clouseau

ITAMARATY
Itamaraty tentou tirar senador boliviano de embaixada em ação secreta
Andreza Matais
O Estado de S. Paulo, 14.02/2014

Plano era levar Roger Pinto para Venezuela ou Nicarágua, com anuência do governo boliviano

BRASÍLIA - Numa operação secreta, o Ministério das Relações Exteriores tentou retirar o senador boliviano Roger Pinto  da embaixada brasileira em La Paz, onde ficou por 450 dias aguardando o direito de se refugiar no Brasil. O plano era enviá-lo para a Venezuela ou Nicarágua, em ação acordada com o governo da Bolívia.

Um grupo de quatro diplomatas brasileiros discutiu o plano na capital boliviana com os principais assessores do presidente Evo Morales num pacote que incluiria tirar o senador da embaixada brasileira em La Paz num avião venezuelano. A estratégia consistia em deixá-lo sem saber  qual seria seu destino. sem o salvo-conduto (autorização para deixar o país sem que isso fosse considerado uma fuga) e previa que ele aceitasse receber uma junta de juízes para que fosse citado nos processos judiciais aos quais responde.

Os detalhes da operação, que livraria o governo brasileiro de se indispor com Evo Morales ao ter que abrigar o político opositor, foram confirmados ao Estado por quatro fontes que têm conhecimento da operação e constam da sindicância administrativa aberta para investigar a conduta do diplomata Eduardo Sabóia, que ajudou Pinto a fugir da Bolívia numa ação que contrariou o governo brasileiro.

O Estado apurou que diplomatas que participaram da operação secreta sob o comando do então ministro das Relações Exteriores já confirmaram a ação. O plano para tirar o senador de La Paz não deu certo porque ele não aceitou a proposta para viajar sem saber seu destino. Além disso, o presidente venezuelano Hugo Chávez morreu durante as negociações.

Processo. A sindicância que apura a participação do diplomata Eduardo Sabóia na fuga do senador está na reta final. No próximo dia 18, Sabóia será ouvido. Depois de dez dias, o colegiado decidirá se instaura processo administrativo contra ele - o que pode resultar em sua demissão do serviço público - ou se encerra o caso sem punição mais severa.

Sabóia planejou e acompanhou a fuga do senador para o Brasil após completarem 15 meses de refúgio do senador na embaixada do Brasil em La Paz sem sinais de que haveria deliberação a respeito do caso pelo governo brasileiro. Desde então, o chefe do Itamaraty é o ministro Luiz Alberto Figueiredo.

Refúgio. O governo brasileiro ainda não sabe se irá conceder refúgio ao senador. O prazo vence no dia 28 de fevereiro, mas o pedido ainda está sendo analisado.

O Secretário Nacional de Justiça, Paulo Abrão, afirmou ao Estado que Pinto Molina pode pedir à Polícia Federal a renovação da permissão para ficar no Brasil até a decisão final do Conare, órgão do Ministério da Justiça para refugiados.

"Tudo ainda depende das diligências que foram promovidas dentro do processo e que ainda dependem de resposta", justificou o secretário, acrescentando que o caso corre em sigilo no Comitê Nacional para os Refugiados e que, portanto, não poderia dar mais detalhes. "Expirando o prazo final, basta ele procurar qualquer delegacia da Polícia Federal e renovar a permissão provisória para ficar no país. Esse prazo pode ser renovado indefinidamente até a decisão final do Conare."

O advogado de Pinto criticou a demora, que diz causar instabilidade ao seu cliente, e acusou a politização do caso. O Estado apurou que a decisão só sai após as eleições presidenciais no Brasil.


O advogado do senador boliviano, Fernando Tibúrcio Peña, afirmou que o adiamento causa intranquilidade ao seu cliente e demonstra que o processo ainda esta politizado. "Na época em que ele chegou ao Brasil, o ministro da Justiça me disse que havia interesse em resolver o caso rapidamente, mas vejo que o caso continua politizado", declarou.

domingo, 20 de outubro de 2013

Derrocada institucional do Itamaraty - Revista Consultor Jurídico


DERROCADA INSTITUCIONAL DO ITAMARATY AFETA ATÉ O JUDICIÁRIO BRASILEIRO

Revista Consultor Jurídico

 
O episódio envolvendo a operação que trouxe clandestinamente ao Brasil o senador boliviano Roger Pinto Molina, articulada pelo ex-encarregado de negócios da missão brasileira na Bolívia, Eduardo Saboia, não foi um incidente isolado e tampouco o fruto de um rompante de insubordinação de um diplomata. Justamente em sentido contrário, tratou-se de “um episódio altamente simbólico”que ilustra um processo complexo de “derrocada institucional” do Itamaraty, agravado ainda pelo contexto de um Executivo sem agenda para a política externa e refratário à experiência e competência técnica de suas missões no exterior.  Este é o pensamento de fontes do Ministério das Relações Exteriores, em Brasília, ouvidas ao longo dos meses de agosto e setembro pela revistaConsultor Jurídico.
Esse fenômeno de “opacidade institucional” pode elucidar as questões por trás da atitude de Saboia, garantem diplomatas. O vácuo de liderança e estratégia que levou o ex-encarregado de negócios a uma atitude severa tem origens profundas e envolvem uma gama distinta de fatores. O primeiro aspecto dessa crise está relacionado ao próprio Itamaraty, instituição que encontra dificuldades de se inserir na estrutura administrativa de Estado desde a promulgação da Constituição de 1988. “A instituição não se atualizou”, como foi dito à ConJur.
O outro fator diz respeito à posição da Bolívia no quadro da política externa brasileira. O país reflete, em particular, a falta de consistência da estratégia diplomática do Brasil para toda a América Latina. Trata-se, na visão de especialistas, de uma nação profundamente dividida culturalmente, com dificuldades de consolidação de uma identidade nacional. Como agravante, o comportamento imprevisível do governo do presidente Evo Morales e a tolerância do Executivo brasileiro com o governo boliviano por questões referentes meramente à conveniência política têm deixado o Itamaraty no vácuo provocado pela ausência de autonomia e autoridade. Sem espaço para tomar decisões, a diplomacia brasileira tem dificuldade de exercer seu papel em situações como a que envolvem, por exemplo, as empresas do Brasil na Bolívia.
O caso das empresas brasileiras naquele país é elucidativo. Independente de questões próprias à esfera da disputa comercial e dos erros que as companhias brasileiras possam vir a cometer, o fato é que as empresas do Brasil com presença na Bolívia têm sido constrangidas, postas à prova e, não raro, se encontram em situação de completa vulnerabilidade frente aos desmandos das autoridades bolivianas e à instabilidade institucional do país vizinho. O quadro parece não sensibilizar o Planalto. Alheio à realidade daquele país, o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, sob o pretexto de sugerir que o Brasil deveria repensar seu modelo de desenvolvimento nacional, chegou a afirmar que as empresas transnacionais brasileiras têm um “comportamento subimperialista”.
A despeito das evidências, prevalecem os “desígnios imprevisíveis do Planalto”, como foi qualificado à ConJur. “É a burocracia de Estado tentando preservar as aparências”, disse.
A exemplo de cada vez mais setores da vida pública e privada no Brasil, o cerne dessa crise, tudo indica, deverá ser atraído para o Judiciário. É o que sugere, de um lado, a impetração de pedido de Habeas Corpus em favor do senador Roger Pinto Molina no Supremo Tribunal Federal. De outro lado, talvez caiba à Justiça manifestar-se sobre um conflito interno da política externa brasileira. “Não é só perda de credibilidade, mas do direito de estabelecer sua própria agenda. Em outros tempos, seria absurdo conceber que um diplomata tivesse que ir à Justiça para resolver uma questão que é de foro da estratégia da política diplomática”, foi dito à reportagem da ConJur em Brasília.
Centralismo
O centralismo no planejamento da política externa, com decisões desenhadas essencialmente com um fundo político e frequentemente alheias às preocupações de Estado, compromete a atuação da diplomacia como um todo, mas, no caso de vizinhos “complicados”, o prejuízo é patente. “A Bolívia não perdoa a indiferença”, diz uma fonte, sobre a lacuna de consistência e o descaso do governo brasileiro em relação ao intricado contexto do país vizinho.
Some-se também a prevalência de posturas ideologizadas e mesmo de uma visão romântica da Bolívia por políticos e autoridades do alto escalão, apesar do apelo do corpo diplomático brasileiro naquele país para que o Executivo estabeleça uma política clara e estrategicamente coerente para lidar com um vizinho tão complexo. A situação repete-se não só com as nações de fronteira, mas com toda a América Latina.
Posturas ideologizadas não se traduzem necessariamente em liderança, como se viu na chamada guerra das papeleiras, o conflito diplomático entre Argentina e Uruguai em virtude da instalação de duas fábricas de papel e celulose de origem finlandesa na margem oriental do Rio Uruguai. A Argentina acabou por rejeitar a intermediação do Brasil, proposta pelo então presidente Lula, sob a justificativa de que aquele era uma questão bilateral e também pela ausência de diretrizes estabelecidas pelo Mercosul para lidar com conflitos do tipo. O caso é considerado por alguns diplomatas e especialistas como uma das razões para a “implosão” do bloco regional.
Paralelo à frouxidão da política externa com a própria vizinhança, o Brasil, nos últimos anos, ensaiou movimentos ousados entre os chamados “grandes interlocutores globais”, como nos casos da negociação por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU e a estratégia brasileira de se aproximar do Irã ainda no segundo mandato do governo Lula. Para fontes consultadas pela ConJur, enquanto que, na superfície, o que se tinha era uma política externa voltada para o “terceiro mundo”, que não se pautava pelos grandes agentes globais, no fundo, prevaleciam critérios arbitrários em prejuízo da tradição diplomática brasileira que sempre se impôs pelo preparo de seus diplomatas e o cunho estratégico. Ou seja, perdia-se, cada vez mais, a perspectiva de uma política externa que tinha como base se projetar, primeiramente, da relação estratégica com os vizinhos para, então, junto aos “grandes interlocutores globais”. No caso da Bolívia, em que a política externa precisa definir a estratégia para administrar os "interesses conflitantes" entre ambos os países, o quadro tornou-se insustentável frente a irresponsabilidade do governo na condução do episódio.
Direitos humanos
Ao passo em que as bandeiras do governo de Evo Morales iam “caindo uma a uma” — o indigenismo, o ambientalismo e, por fim, os direitos humanos — a diplomacia brasileira na Bolívia passou a lidar com o diálogo surdo entre ambos os chefes de Estado, com promessas vagas e evasivas desconsideradas de lado a lado, tão logo se encerravam as visitas oficiais. Nesse limbo, é que ocorriam involuções como o caso do senador de oposição boliviano Roger Pinto Molina, que, desde 8 de junho de 2012, vivia, em condição de asilado e em estado de cerco, na embaixada brasileira em La Paz.
O governo boliviano alega que o parlamentar pediu asilo para não ter que responder na Justiça do seu país por crimes financeiros calculados em pelo menos US$ 1,7 milhões. Apesar das condições de alojamento precárias, problemas de saúde do deputado e provocações de autoridades policiais bolivianas, Brasília não quis interferir, mesmo com a resistência do governo boliviano em proceder com o salvo-conduto, com fins de avançar com o asilo territorial.
Outro ponto que ilustra as contradições e a debilidade da relação Brasil-Bolívia foi a resposta do governo brasileiro ao ser informado da entrada de Molina no Brasil. Sucederam às ameaças informais de suspensão de asilo e extradição, a transferência do chanceler Antonio Patriota, a remoção do embaixador Marcel Biato e de Eduardo Saboia e a abertura de uma sindicância para avaliar o caso.
Porém, em paralelo, ocorriam falhas no nível burocrático mais elementar, como, por exemplo, o governo não se manifestar oficialmente sobre a presença do senador boliviano em território nacional. Além de colocar em dúvida o próprio cumprimento da decisão do asilo, o governo brasileiro não fez qualquer declaração oficial sobre a chegada e a presença Molina no país. Coube ao próprio político ter de ir ao cartório, há algumas semanas, para, enfim, fazer uma declaração juramentada, com a finalidade de obter alguma  garantia, uma documentação sobre sua condição de asilado.
O documento será usado, assim, como elemento da defesa de Saboia no processo administrativo. O diplomata é representando pelos advogados Pedro Paulo de Medeiros e Ophir Cavalcante Júnior. O constitucionalista Ives Gandra e o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso chegaram a se oferecer para representar Eduardo Saboia, por simpatia pela causa do diplomata.
O mito do Rio Branco
Quanto ao referido quadro de desgaste institucional do Itamaraty, o período correspondente a promulgação da Carta de 1988 é apontado como a época em que o Ministério das Relações Exteriores começou a enfrentar as dificuldades de se inserir no modelo de padronização do Poder Público brasileiro pós-1970. A instituição não fez, nas palavras de uma das fontes consultadas, a "transição" para o novo modelo de Estado, pautado pela transparência e a diálogo com uma opinião pública cada vez mais atenta à agenda internacional e seu impacto doméstico.
Como "não houve decisões" do próprio órgão em relação a esse novo contexto institucional, uma série de questões sobre a natureza da carreira não foi enfrentada. O resultado, apontam, vai além do despreparo do Itamaraty para lidar com a opinião pública, mas envolve a própria transformação do perfil do diplomata brasileiro. Se antes se orgulhavam  de ser "generalistas" preparados com excelência, uma referência para a diplomacia de outros países, a complexidade da agenda externa de uma potência emergente como é o Brasil hoje, exige conhecimentos especializados e, sobretudo, descentralização e celeridade dos processos decisórios.
Trata-se de uma mudança mais profunda no próprio perfil da carreira, que vai de encontro ao chamado mito do Rio Branco, do diplomata que saí em missão como sacerdotes faziam, "como um estratega e intérprete da  vontade do Estado".  A carreira mudou. Não são só mais diplomatas, são também diplomatas que permanecem mais tempo na carreira e uma geração com uma formação distinta, já que mudou até mesmo o perfil de treinamento do Instituto Rio Branco.
Nas palavras de uma fonte consultada pela ConJur, o Itamaraty corre o risco de se tornar um "funcionalismo de 2° escalão", onde são raros os casos de diplomatas que ascendem aos cargos de direção e projeção política na carreira. "A expressão acabada disso é que abdicamos pouco a pouco de nossa tarefa mais nobre e fundamental, a de intérprete", avaliou.
Conjur / Portal do Holanda

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Brasil-Bolivia: inquisicao do Itamaraty (Diario do Poder; Veja)

Ex-chanceler depõe na inquisição contra Sabóia
Diário do Poder, 4 de outubro de 2013
O ex-chanceler Antônio Patriota foi convocado para depor nesta sexta-feira (5) no “tribunal de inquisição”, criado pelo governo federal nos moldes do regime militar, para “apurar a atitude” do diplomata humanitário Eduardo Sabóia, que ajudou o senador boliviano Roger Molina, asilado há 455 dias na embaixada brasileira em La Paz, a sair do país. Na época, Molina andava depressivo e ameaçava se matar.

  • Espera-se que Patriota assuma a ordem para segregar o senador em um cubículo sem janelas, na embaixada, e proibir visitas até da família.
  • Patriota teria ordenado o confisco do celular e do laptop de Molina, mas os diplomatas exigiram isso por escrito, e a determinação foi ignorada.
  • O corregedor do Itamaraty, Heraldo Póvoas de Arruda, prorrogou o prazo para que a comissão de sindicância contra Eduardo Sabóia.
    =======

    Coluna de Lauro Jardim, na Veja, 4/10/2013, 12:22 \ Governo
    Preparando a defesa

    Eduardo Saboia anda focado na preparação defesa do processo administrativo disciplinar a que responde no Itamaraty, aberto depois da operação de resgate do senador boliviano Roger Molina para o Brasil. Ontem, Saboia ligou para Ricardo Ferraço perguntando se poderia testemunhar a seu favor. Convite aceito.
    Chamado para depôr, Ferraço vai reforçar a versão de que o Ministério das Relações Exteriores recebeu diversos de Saboia comunicados sobre a gravidade da situação de confinamento de Molina na embaixada brasileira na Bolívia .
    Começam na sexta-feira as oitivas da sindicância feita pelo governo sobre a conduta de Eduardo Saboia no episódio da fuga do  senador Roger Molina. O primeiro a ser ouvido será Antonio Patriota.

    Por Lauro Jardim
  • Brasil-Bolivia: a fuga do Senador e o papel do ministro da Defesa, ex-chanceler

    Da coluna do ex-prefeito, atual vereador, Cesar Maia, em 4/10/2013:

    A VERDADE SOBRE A FUGA DO SENADOR BOLIVIANO PARA O BRASIL!

        
    (MRE, 09/13) 1. A situação está complicada porque ficaram evidenciados, na comissão de sindicância, os seguintes fatos: (a) Evo Morales autorizara a retirada discreta (sub-reptícia) do Senador Pinto na direção da fronteira com o Brasil, desde que isso não o envolvesse; (b) Dilma teve conhecimento da proposta, mas insistiu no salvo-conduto, debaixo do protesto de não querer expor o asilado a qualquer risco;
      
    2. (c) Eduardo Saboia, não tendo a "luz verde" do Itamaraty, recorreu a seu padrinho de batismo, o Embaixador Celso Amorim; e (d) este lhe recomendou que, com a ajuda de dois fuzileiros navais, fizesse a longa viagem de 2.200 km até a fronteira brasileira. Eduardo Saboia não terá promoção neste Governo. Mas não sofrerá nenhuma punição grave - senão a casa cai... Ele não é bobo. Guardou todos os documentos.

    segunda-feira, 23 de setembro de 2013

    Los hermanos cocaleros de los companeros: muy amigos.. de la coca... - Senador Roger Pinto Molina

    COLUNA ESPLANADA

    Molina diz ter mapeamento da coca Bolívia-Brasil

    Senador boliviano que fugiu para o Brasil disse que tem mapeamento e relatórios que comprovariam que 60% da cocaína consumida no país vem da Bolívia

    por Leandro Mazzini

    sexta-feira, 20 de setembro de 2013

    Brasil-Bolivia: Senado vai pedir todos os telegramas de e para La Paz (Claudio Humberto)

    O presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Ricardo Ferraço (PMDB-ES), decidiu requerer a troca de mensagens entre o Itamaraty e a embaixada em La Paz, nos 455 dias de asilo do senador Roger Molina. Para Ferraço, o exame da “série telegráfica” esclarecerá o real interesse do Itamaraty em resolver o problema e as razões do diplomata Eduardo Sabóia, que ajudou Molina a fugir para o Brasil.
    Mensagens do Itamaraty, recomendando empurrar o caso com a barriga, forçaram Eduardo Sabóia a agir por razões humanitárias.
    Emails atribuídos ao subsecretário-geral de América do Sul, Antonio Simões, instruíam a embaixada a “enrolar” o caso do senador Molina.
    Seguem as retaliações do Itamaraty contra diplomatas em La Paz. Ontem, foi removido para Brasília o conselheiro Manoel Montenegro.

    Do Diário do poder, Claudio Humberto, 19 de setembro de 2013

    quinta-feira, 12 de setembro de 2013

    O Itamaraty ruge, rosna e ameaca morder; finalmente criou coragem...

    ...embora não se tenha certeza se pelos bons motivos.
    Julguem vcs mesmos.

    Se é verdade que o secretário-geral das Relações Exteriores do Itamaraty, Eduardo dos Santos, ameaçou o senador Roger Pinto Molina de expulsão caso ele comparecesse ao Senado, estamos diante de um caso de uma absurda gravidade. Se as coisas se deram como diz o advogado Fernando Tibúrcio — e, infelizmente, parece que sim! —, tratou-se de uma pressão escandalosamente ilegal, com o Itamaraty atuando como polícia política. O que responde o Ministério das Relações Exteriores? Reproduzo trecho da reportagem da VEJA.com (em vermelho)
    O Itamaraty, por meio da assessoria de imprensa, afirmou que Eduardo dos Santos ligou para o advogado de Molina “apenas para recordar ao senador os termos da Convenção de Caracas sobre asilo diplomático”. Entre os termos do tratado, está a proibição ao asilado de intervir na política interna e de o país abrigar pessoas condenadas que ainda não cumpriram a pena.
    Vale dizer: houve pressão, sim!
    É o fim da picada. Molina recebeu asilo diplomático. Não porque Dilma ou Itamaraty sejam generosos. É o que está previsto no Inciso X do Artigo 4º da Constituição (em azul)
    Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
    X – concessão de asilo político.

    Ainda que se quisesse argumentar que o asilo deixou de ter validade quando Molina deixou a embaixada e veio para o Brasil, é preciso lembrar que o senador já entrou com um pedido de refúgio. Sob que argumento o Brasil colocaria o senador para fora? Deportação? O Brasil iria deportar um perseguido político, ao qual já havia concedido asilo e que entrou com um pedido de refúgio? De fato, ao asilado e ao refugiado, não se concede a licença para fazer proselitismo político. ATENDER, NO ENTANTO, AO CONVITE DO CONGRESSO NACIONAL, O PODER POR EXCELÊNCIA DO REGIME DEMOCRÁTICO, caracteriza essa transgressão? O Itamaraty, agora, determina as vontades do Congresso? O Executivo decide quem o outro Poder pode ou não ouvir?
    Por qualquer ângulo que se queira, Molina só poderá sair à força do Brasil se houver uma extradição. E não se extradita ninguém do país sem a autorização do Supremo Tribunal Federal, conforme prevê a Constituição.
    Notem: o que o Itamaraty admite já é grave o bastante e indica até onde a política externa brasileira está comprometida com as protoditaduras bolivarianas. O tal Eduardo dos Santos falou grosso com o advogado do senador Molina porque o Brasil, mais uma vez, falou fino com a Bolívia.
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    Leiam com muita atenção o que vai abaixo. Se a coisa aconteceu desse modo mesmo, a ocorrência é da maior gravidade. Volto no próximo post.
    Por Marcela Mattos, na VEJA.com:
    Em depoimento na Justiça Federal nesta quarta-feira, o advogado do senador boliviano Roger Pinto Molina, refugiado no Brasil desde 24 de agosto, afirmou ter sofrido ameaças do Itamaraty. Fernando Tibúrcio contou em juízo que o secretário-geral das Relações Exteriores, Eduardo dos Santos, lhe telefonou no último dia 3 alegando que se Molina comparecesse à audiência em comissão na Câmara dos Deputados, o boliviano seria expulso do país.

    O senador Roger Molina havia sido convidado para participar de audiência na terça-feira passada, na Comissão de Segurança, com o objetivo de prestar depoimentos sobre sua fuga ao Brasil. A reunião estava marcada para 16h30. Tibúrcio, no entanto, conta que foi ameaçado por volta das 11 horas. “Atendi o telefone e o Eduardo dos Santos me pediu o contato do Roger Pinto. Passei. Ele me disse: ‘Eu tenho instruções para dizer ao senhor que se o senador prestar depoimento no Congresso, ele vai ser expulso amanhã’”.
    O advogado de Molina teria respondido ao secretário-geral que não aceita ameaças. Apesar disso, por precaução, o senador boliviano não compareceu à audiência. “Ele se sentiu intimidado”, alegou. O Itamaraty, por meio da assessoria de imprensa, afirmou que Eduardo dos Santos ligou para o advogado de Molina “apenas para recordar ao senador os termos da Convenção de Caracas sobre asilo diplomático”. Entre os termos do tratado, está a proibição ao asilado de intervir na política interna e de o país abrigar pessoas condenadas que ainda não cumpriram a pena. Na última sexta-feira, autoridades bolivianas vieram ao Brasil entregar documentos que mostram que Molina responde a cinco processos – que o senador afirma serem fruto de perseguição política pela oposição que faz ao governo boliviano.
    Diante do juiz, de advogados e de representantes do Ministério Público, Tibúrcio condenou o episódio: “O que ocorreu não foi uma coisa que se espera do estado brasileiro. Era um convite do Congresso Nacional. Isso é uma interferência do Executivo no Poder Legislativo”. Tibúrcio ressaltou que, em outra situação, durante reunião no Itamaraty, já havia recebido o mesmo recado. Ele não deu detalhes sobre esse encontro. Presente na audiência, a procuradora da República Luciana Loureiro Oliveira afirmou que o Ministério Público vai apurar o caso. “A defesa e o senador podem recorrer ao MP diante de qualquer fato que ocorra no sentido de constranger ou de tentar macular o processo”, disse.
    Na audiência também estavam o senador boliviano Roger Molina e o diplomata Eduardo Saboia, então encarregado pela embaixada, responsável por trazer o parlamentar ao país. Tibúrcio afirmou que no “momento correto” vai convocar uma entrevista coletiva para explicar o episódio. Molina refugiou-se na Embaixada do Brasil em La Paz, na Bolívia, em maio de 2012, alegando sofrer perseguição política por parte do presidente Evo Morales. Quinze meses depois, após viver em condições insalubres, o diplomata Eduardo Saboia o trouxe para o país. O caso levou à demissão do ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota.

    quarta-feira, 4 de setembro de 2013

    A novela boliviana e os companheiros - Sergio Fausto

    O porquê do imbróglio boliviano

    04 de setembro de 2013 | 2h 08
    SERGIO FAUSTO - O Estado de S.Paulo
    A ira do Planalto abateu-se sobre o encarregado de negócios da embaixada brasileira em La Paz, o diplomata Eduardo Saboia, responsável pela operação que trouxe ao Brasil o senador Roger Pinto. Tamanha reação não se explica pelo simples argumento da quebra de hierarquia. O maior pecado de Saboia foi ter exposto a complacência que caracterizou a atitude de Brasília ante a negativa intransigente do governo boliviano de conceder o salvo-conduto que permitiria a viagem regular do senador para o Brasil, onde havia recebido asilo político. Se o Planalto tivesse empenhado, ao longo dos 452 dias em que Roger Pinto esteve abrigado na embaixada brasileira, um décimo da firmeza que agora demonstra na ira punitiva contra Eduardo Saboia, o caso teria encontrado solução diplomática pelas vias normais.
    A questão central, portanto, não é saber se a decisão do encarregado de negócios - corajosa, a meu ver - representou quebra justificada ou injustificada de hierarquia. Mas, isso sim, por que, mais uma vez, o Brasil se dobrou às conveniências políticas domésticas de um governo "bolivariano". O pior, no entanto, ainda pode estar por vir, se o Planalto ceder às pressões de Evo Morales, de setores do PT e de outros partidos de esquerda em favor da extradição do senador. Seria o cúmulo.
    Ninguém minimamente bem informado pode desconhecer que processos judiciais têm sido utilizados por Morales como ferramenta de intimidação e perseguição política. A instrumentalização do Poder Judiciário é uma marca do seu governo, assim como do governo chavista. Faz parte de um projeto de submissão das instituições e dos Poderes da República a uma maioria política que se legitima pela via eleitoral e busca eternizar-se no poder pela captura do Estado, convertendo-o em fator de desequilíbrio decisivo da competição política, inclusive eleitoral.
    Na democracia o Judiciário é, por definição, um Poder que não está a serviço de uma transitória maioria política. Trata-se de um poder contramajoritário, que deve aplicar o regramento jurídico vigente com imparcialidade e, na sua instância mais elevada, a Corte Suprema, controlar a constitucionalidade das decisões dos demais Poderes. Na Bolívia, Morales não se limitou a obter uma Constituição ao feitio de seu projeto político, num processo tumultuoso, pouco aberto ao contraditório e que culminou com a aprovação do texto constitucional num quartel cercado por forças militares e sem a presença das oposições. Decidiu também convocar eleições para a composição do Judiciário, por meio de procedimentos que asseguravam vantagem à força política majoritária do país, o Movimiento al Socialismo (MAS), por ele liderado. Chamou isso de "democratização da Justiça".
    Já ao início de seu primeiro mandato Morales abriu processos por crime de responsabilidade contra os quatro presidentes que o precederam, entre eles o historiador e jornalista Carlos Mesa Gisbert, um homem inatacável, que conheço e admiro. Salvo no caso de Sánchez de Lozada, em nenhum dos demais se encontraram elementos que justificassem as acusações levantadas. Mais de uma dezena de ex-funcionários do Estado boliviano ou políticos da oposição se encontram encarcerados preventivamente há vários anos. Um ex-ministro morreu no cárcere, aos 80 anos, depois que a Justiça lhe negou pedido de prisão domiciliar por motivos de saúde. Um ex-governador de Pando, província que faz fronteira com o Acre, está detido há cinco anos sem processo judicial em curso. Juan Antonio Morales, economista de reputação internacional e presidente do Banco Central Boliviano por 11 anos, só recentemente teve sua prisão domiciliar relaxada, para dar aulas em universidade, a despeito da inexistência de provas ou mesmo indícios contra ele.
    Os processos e acusações contra o senador Roger Pinto se multiplicaram depois que ele denunciou o envolvimento de membros do governo de Morales com o narcotráfico. Nessas circunstâncias, resolveu buscar asilo político no Brasil em maio de 2012, refugiando-se na embaixada brasileira em La Paz. Apenas em março de 2013 se constituiu uma comissão binacional para encontrar uma solução para o assunto. Segundo correspondência citada por Eduardo Saboia, nessa comissão "os bolivianos fingiam que negociavam e nós fingíamos que acreditávamos".
    A Bolívia é um país soberano, que não deve e não pode ser tratado com imposições pelo Brasil. Mas entre a imposição imperial e a frouxidão complacente não faltavam alternativas e recursos de poder para uma atuação brasileira que resultasse no cumprimento efetivo de uma decisão tomada pelo próprio Brasil, sob o entendimento de que as acusações de corrupção contra o senador tinham motivação política.
    Quando, em 2010, esteve em pauta o pedido de extradição de Cesare Battisti, feito pelo governo italiano, o governo Lula não se pejou em contrariar parecer do órgão técnico que cuida da avaliação de pedidos de asilo político no governo brasileiro, tampouco teve escrúpulos em desconsiderar decisões condenatórias por crimes de terrorismo, tomadas por tribunais italianos e referendas por tribunal da União Europeia. Argumentou o então ministro da Justiça, Tarso Genro, que o ex-integrante do grupo Proletários Armados pelo Comunismo havia sido condenado em condições de exceção.
    Não se vê agora tamanho zelo pelo devido processo legal da parte dos que defendem a extradição do senador boliviano. Desconfiam da justiça do Estado italiano, um país democrático, e acreditam na justeza da Bolívia de Evo Morales. Trata-se de uma esquerda que, como os Bourbons, nunca esquece e nada aprende. Se a presidente Dilma Rousseff acolher o pedido de extradição, demonstrará que a política externa do Brasil se move ao sabor das preferências ideológicas de forças que ocupam transitoriamente o governo federal.
    * DIRETOR EXECUTIVO DO iFHC, É MEMBRO DO GACINT-USP. E-MAIL:SFAUSTO40@HOTMAIL.COM

    terça-feira, 3 de setembro de 2013

    Ainda a novela boliviana e brasilo-bolivariana: materias da Veja

    O preço de fazer o certo
    Duda Teixeira
    Veja, 31/09/2013

    Eduardo Saboia deve ser exaltado por ter dado fim a um impasse diplomático e feito jus à tradição humanitária do Brasil. Em vez disso, está sendo achincalhado pelo governo

    A covardia é a chave para uma vida tranquila. Na hora do aperto, mesmo com injustiças sendo cometidas à sua volta, há quem escolha se resignar às circunstâncias. E há quem, confrontado com um grave dilema ético, acabe se atendo a convicções nobres, e não apenas ao instinto de salvar a própria pele. Durante meses, Eduardo Saboia, encarregado de negócios do Brasil na Bolívia, acompanhou de perto o definhamento do senador boliviano Roger Pinto Molina, um perseguido político que se asilou na embaixada brasileira em La Paz em maio de 2012. Embora o Brasil tivesse dado asilo ao senador, o governo boliviano lhe negara a autorização para sair do país. Nas últimas semanas, Pinto Molina já não fazia exercícios na bicicleta ergométrica que lhe emprestaram e chorava constantemente. Deprimido e com os laços familiares restringidos por exigência do governo boliviano, aproximara-se dos militares brasileiros que faziam sua guarda. Para alguns, falava em se matar cortando os pulsos com uma faca ou tentando um choque elétrico. Na manhã da sexta-feira 23, o advogado de Pinto Molina entrou duas vezes na sala de Saboia. Disse que, se o seu cliente se matasse, a responsabilidade seria do diplomata, que estava no comando da embaixada. O funcionário público exemplar e orgulhoso de sua função como “cumpridor de instruções” pôs então um plano obedecendo clandestino de fuga em ação. Mesmo sem o salvo-conduto do governo boliviano e sem avisar o Itamaraty — Saboia sabia que não receberia autorização dos superiores — eles viajariam por 22 horas até a fronteira com o Brasil em dois carros Nissan Patrol da embaixada. Pinto Molina vestiu um colete à prova de bala e Saboia entrou no veículo com uma Bíblia e um mapa nas mãos. “Se o senador morresse naquela salinha. eu não poderia depois me justificar dizendo que estava apenas cumprindo instruções dos meus superiores”, disse Saboia a VEJA após a sua chegada ao Brasil. “Não desejo a nenhum funcionário público viver o que eu passei naquela sexta-feira.”

    Ao saber, no domingo 25, que Pinto Molina estava no Brasil, o governo boliviano inicialmente reagiu com aparente alívio, afirmando que o episódio não afetava as relações entre os dois países. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, Morales já havia sugerido à presidente Dilma Rousseff, em reunião reservada, que fecharia os olhos se o Brasil tirasse Pinto Molina da embaixada clandestinamente. Ou seja, Morales só não queria dar o salvo-conduto para não parecer que estava amolecendo com os opositores. Dilma teria ficado furiosa com a proposta. da mesma forma que ficou ao saber da insubordinação de Saboia. Uma nota do Itamaraty no próprio domingo afirmava que Saboia estava sendo chamado a Brasília para esclarecimentos e que um processo administrativo seria aberto. Ele pode ser expulso da carreira diplomática. Dois diplomatas se recusaram a participar da comissão que o julgará. Por não ter controle sobre os próprios subordinados, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, teve de entregar o cargo, que foi assumido por Luiz Alberto Figueiredo. Já Patriota foi para o lugar de Figueiredo, na chefia da representação brasileira na ONU. A relação entre Dilma ePatriota nunca foi das melhores, porque ela prefere tomar decisões seguindo o compasso político e se irritava com a abordagem técnica dele em relações internacionais. Curiosamente, o governo boliviano só passou a demonstrar indignação e a exigir a extradição de Pinto Molina depois de perceber a tempestade que o Palácio do Planalto começou a causar em tomo do tema. Afinal, do ponto de vista prático, Saboia resolveu um problema que constrangia e emperrava as relações entre os dois países.

    O castigo a Saboia, portanto, não é proporcional às consequências de sua insubordinação — principalmente porque, não contente em puni-lo pelos canais oficiais, o governo iniciou um verdadeiro linchamento público do funcionário. “Minha maior preocupação agora é tirar minha família da Bolívia”, diz Saboia. Na escola de dois de seus três filhos (o mais novo tem autismo), em Santa Cruz de la Sierra, os colegas perguntavam ameaçadoramente na segunda-feira quem eram os parentes do diplomata que tirou o opositor, inimigo número 1 de Morales, do país. Saboia e o embaixador Marcel Biato, que atuou em La Paz até junho, foram afastados de suas funções na Bolívia. Biato também teve a nomeação para um posto na Suécia frustrada.

    Saboia e Biato são diplomatas reconhecidamente fiéis às diretrizes governamentais. Quando caminhava pelos corredores da embaixada e negociava o salvo-conduto para Pinto Molina, Biato repetia a todo momento que a vontade da presidente deveria ser cumprida. Ele nem estava em La Paz na ocasião da fuga. Saboia, que faz 46 anos no dia 3, foi um dos mais diletos praticantes e admiradores da diplomacia brasileira iniciada pelo governo Lula e que Celso Amorim definiu como “altiva e ativa" (expressão que, alias, é usada por Saboia). Na infância, ele foi amigo dos filhos de Amorim e chegou a queimar com o mais velho deles uma coleção de selos nazistas de seu avô. Passou em primeiro lugar no concurso para o Itamaraty em 1989 e terminou o curso em segundo na turma. Na lista dos três homens que ele diz admirar estão o ex-presidente Lula. Amorim e o seu pai, Gilberto Saboia, que foi membro da Comissão de Direito Internacional da ONU. Eduardo Saboia é o tipo de funcionário público que se exaspera com a ineficiência. Uma amostra disso foi o seu empenho em negociar a libertação dos doze corintianos presos em Oruro acusados de ter lançado um sinalizador que matou o torcedor boliviano Kevin Espada, de 14 anos, durante um jogo em fevereiro. Saboia foi dezoito vezes à cidade para negociar a soltura do grupo, que fora preso sem provas. No início, levou calmantes, que comprou com o próprio dinheiro, e cobertores para os torcedores. Na Páscoa, Saboia chegou a levar a mulher e os dois filhos à prisão para comer e rezar uma missa com os detentos. Quando todos os outros escalões da hierarquia diplomática pareciam ter abandonado o problema, Saboia insistiu nas negociações e pouco a pouco conseguiu o retomo dos torcedores ao Brasil (na semana passada, três deles foram identificados como incitadores de uma briga em um jogo em Brasília).

    Pela eficiência com que defendiam os interesses brasileiros, Saboia e o embaixador Biato — este um grande estimulador da maior presença da Polícia Federal na Bolívia para auxiliar no combate ao narcotráfico — começaram a ser boicotados pelo governo Evo Morales, com a conivência da administração Dilma. Em uma reunião realizada entre representantes dos dois países em março, em Cochabamba, Biato e Saboia foram deixados do lado de fora por Patriota, atendendo a um pedido do ministro da Presidência, Juan Ramón Quintana. O boliviano, acusado de ligações com um narcotraficante brasileiro, também exigiu a troca do embaixador e a restrição às visitas a Pinto Molina. O governo brasileiro assentiu. Em junho, Biato deixou o posto e Saboia passou a ser obrigado a barrar os amigos políticos de Pinto Molina na porta da embaixada. “A subserviência da política externa brasileira aos interesses bolivianos vem de longe”, diz Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, que foi buscar Saboia e Pinto Molina de avião em Corumbá após a bem-sucedida fuga da Bolívia. Ao colocar a afinidade do seu partido, o PT, com o sub-bolivarianismo de Morales à frente dos interesses brasileiros, o governo Dilma acaba com o espaço de ação dos seus diplomatas. “Esse é o tipo de situação que leva a atos desesperados como o de Saboia”, diz Rubens Ricúpero, ex-embaixador do Brasil na Itália. Em terra de covardes, um funcionário público que tem princípios pode virar um rei.

    Um perseguido Político

    Quando o advogado e pecuarista Roger Pinto Molina, do estado de Pando, na fronteira com o Acre, se tornou o chefe da oposição ao governo de Evo Morales, sua vida se transformou. Ao ajudar os colegas senadores e outros opositores a apontar os vínculos entre os funcionários de alto escalão do poder e o narcotráfico, passou a ser atacado verbalmente por diversos membros do governo, e vinte acusações foram levantadas contra ele na Justiça.

    Oito delas são por desacato. Foram iniciadas por quadros do governo enfurecidos com suas revelações: o vice-presidente Álvaro Garcia Linera e o ministro da Presidência Juan Ramón Quintana. Entre as demais, há uma por desmatamento. Duas árvores teriam sido cortadas em sua propriedade. O senador estava em La Paz na ocasião, mas seria cúmplice por não ter denunciado o fato. A aparente contravenção poderia lhe render oito anos de prisão. Ele também é acusado de assassinato, mas o processo não diz quem ele teria matado. Existe homicídio sem vítima?

    Quatro acusações são por corrupção. Em junho, quando o senador ainda estava na embaixada em La Paz, ele foi condenado a um ano de prisão por três delitos, entre eles o de ter se apoderado de recursos destinados à Universidade Amazônica de Pando. O julgamento ocorreu sem a presença do réu e sem que ele tivesse a chance de se defender.

    Assim que o senador pôs os pés na embaixada em La Paz, os diplomatas brasileiros cuidaram de levantar informações fidedignas sobre seu novo hóspede. Era crucial dissipar a dúvida se se tratava de um criminoso que deveria ser entregue à polícia ou um perseguido político, contra o qual o governo da Bolívia levantara acusações falsas apenas para calar uma voz dissidente. A resposta veio onze dias depois, com a concessão de asilo político. “Seja bem-vindo ao Brasil”, disse o embaixador Marcel Biato ao anunciara decisão brasileira de reconhecerem Pinto Molina um perseguido político.

    La Paz agora quer obter de Brasília a repatriação do senador que os diplomatas brasileiros abrigaram e ajudaram a fugir da Bolívia. Vontade de ceder ao narcoestado vizinho não falta ao governo do PT. O ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, chegou ao absurdo de afirmar que Pinto Molina terá de refazer seu pedido de asilo político. Adams não sabe que o direito internacional reconhece as embaixadas como territórios do país representado? Sabe. Mas atualmente, no seio do governo do PT, ignorar, fingir, virar o rosto para não ver malfeitorias e abusos dos direitos humanos tem valido a pena para os burocratas. Vale tudo, desde que sirva aos interesses políticos do pan-esquerdismo latino-americano, doutrina que os petistas colocam acima, muito acima, dos interesses nacionais brasileiros.

    Um dever moral
    Coluna - J.R Guzzo

    O servidor público mais detestado pelo governo da presidente Dilma Rousseff no presente momento é um tipo de ser humano raríssimo de encontrar no mundo oficial de hoje — um homem de bem.

    Seu nome é Eduardo Saboia. Sua profissão é diplomata de carreira, em serviço no Itamaraty. Tem 45 anos de idade, mais de vinte na ativa e era, até a semana passada, encarregado de negócios na Embaixada do Brasil em La Paz, na Bolívia. Não há, na sua ficha funcional, nenhuma nota de reprovação. Ele acaba de ser afastado do posto, vai responder a uma comissão de inquérito no Itamaraty e tem pela frente, provavelmente, uma sucessão de castigos que promete mantê-lo num purgatório profissional até o dia em que se aposentar. Não podem botá-lo na rua, como gostariam, porque exerce função de estado e a lei não permite que seja demitido — mas entrou para a lista negra da casa e parece altamente improvável que saia dela enquanto valores como justiça, decência e integridade continuarem vetados no Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Saboia cometeu um delito que Dilma, seu assessor internacional Marco Aurélio Garcia, intendente-geral do Itamaraty, e os principais mandarins do PT não perdoam: teve a coragem de cumprir um dever moral.

    Os fatos são claros como água pura da fonte, e provocam, como tantos outros que vêm acontecendo ultimamente, uma sensação cada vez mais desconfortável: a de que o atual governo, de desatino em desatino, vai se tomando incompreensível. Mais do que a tão falada banalidade do mal, o que se tem no Brasil de hoje é a banalidade das atitudes sem nexo. No dia 28 de maio do ano passado, o senador boliviano Roger Pinto Molina refugiou-se na Embaixada do Brasil em La Paz, alegando sofrer perseguição política por parte do presidente da Bolívia, Evo Morales. Dez dias depois, o governo brasileiro lhe concedeu asilo e passou a esperar, como determina uma das mais antigas e respeitadas práticas da diplomacia latino-americana, o salvo-conduto do governo boliviano — documento que, pela praxe, a Bolívia tinha o dever de expedir em poucos dias. De lá para cá já se passaram quinze meses — e durante esse tempo todo nem a Bolívia concedeu o salvo-conduto, como tinha obrigação de conceder, nem o Brasil insistiu para que o documento fosse concedido, como tinha obrigação de insistir.

    Era uma situação que satisfazia tanto a Evo quanto a Dilma. Evo continuava a supliciar seu inimigo: confinado numa pequena sala dos escritórios da embaixada. Molina passou quinze meses sem tomar sol, sofria de problemas de saúde que não podiam ser tratados ali e levava a vida de um presidiário. Os diplomatas brasileiros pediram que a Bolívia autorizasse, pelo menos, que ele fosse transferido para a residência do embaixador. Nada feito: se deixasse o local onde estava, ameaçou Evo, “o governo boliviano” não poderia garantir sua “integridade física”. A presidente Dilma, por sua vez, ganhava a oportunidade de fazer uma viagem imaginária ao passado — não podendo mais sonhar com a ditadura do proletariado, como fazia em sua juventude, pelo menos prestava serviço a alguém que considera um símbolo da “resistência ao imperialismo”. O problema, para ambos, foi o encarregado de negócios Eduardo Saboia. Na simples condição de funcionário que age em obediência a seus princípios como ser humano, ele decidiu que não iria engolir passivamente a humilhação de servir de carcereiro. Durante 450 dias fez tudo o que pôde para resolver a situação dentro das normas, do profissionalismo e da disciplina. Mandou 600 mensagens a seus superiores, implorando uma solução. Veio duas vezes ao Brasil só para cuidar do caso. Perdeu a conta de quantas horas passou em saias de espera em La Paz. Por fim, ao constatar que o estado de saúde do senador Molina tinha chegado a um ponto crítico, decidiu trazê-lo por conta própria para o asilo no Brasil, numa viagem de carro que levou 22 horas entre La Paz e a fronteira brasileira. Foi no que acabou dando a recusa do governo em tratar o problema, desde seu início, com um mínimo de lógica.


    Nos dias seguintes, em vez de agir como presidente, Dilma se entregou a acessos de cólera que não resolvem nada, a começar pela demissão do seu ministro das Relações Exteriores. Mas seu problema é outro. Chama-se Eduardo Saboia e gente que, como ele, não tem medo de separar o certo do errado, por disporem de consciência, coluna vertebral e compaixão. É um espelho para o qual a presidente e seu círculo íntimo odeiam olhar. Veem, nele, o que deveriam ser e não são.

    segunda-feira, 2 de setembro de 2013

    A grande fuga: versao boliviana - adrenalina garantida, repeteco nem pensar - revista IstoE

    A escapada pelos abondes
    ISTOÉ revela os bastidoresu da fuga que constrangeu o País e provocou a troca de comando no Itamaraty. Como foi a aventura do embaixador brasileiro e do senador boliviano, que saíram da embaixada em La Paz e atravessaram a fronteira
    Claudio Dantas Sequeira, Izabelle Torres e Josie Jeronimo
    IstoÉ, 1/09/2013

    PROTAGONISTAS
    O então chanceler Antonio Patriota, o embaixador Eduardo Saboia e o senador
    boliviano Roger Pinto Molina (da esq. para a dir.) envolveram-se na rumorosa fuga
    La Paz, sexta-feira 23 de agosto, 15h. O sol a pino e a baixa umidade reforçam a sensação térmica da primavera boliviana e embalam a tradicional sesta local. No horário em que boa parte dos moradores está cochilando, as ruas livres do tráfego servem como corredor de fuga a dois veículos 4x4 Nissan Patrol, com placas diplomáticas. A bordo de um deles, o senador boliviano Roger Pinto Molina confere o relógio e olha para o alto com um leve sorriso de satisfação. “Foi a primeira vez que pude ver o sol claramente. E de uma perspectiva diferente”, lembra, em referência aos 454 dias que passou asilado numa pequena sala da embaixada do Brasil. Durante esse tempo, Molina jamais teve direito a um salvo-conduto, documento legal que poderia ter sido fornecido pelo governo boliviano para garantir sua saída com tranquilidade em direção ao país no qual decidiu se refugiar. Planejada ao longo de três meses, com o conhecimento de algumas autoridades do governo brasileiro e uma mal disfarçada tolerância do governo do presidente Evo Morales, que enviou vários sinais a Brasília de que não faria oposição à saída de Molina, desde que não pudesse ser acusado de proteger um inimigo com 22 processos no currículo, a “operación libertad” foi cercada de uma série de preparativos, inclusive medidas de proteção pessoal e monitoramento de riscos. No momento em que se preparava para entrar no automóvel, Molina contou com o auxílio de um fuzileiro naval, adido militar na embaixada, para vestir o colete à prova de balas.

    Três dias antes de partir, Roger Molina falou do plano de fuga à sua filha Denise Pinto Bardales, carinhosamente chamada pelo pai de “Talita”, sugerindo que ela fosse para Brasileia, no Acre, onde a mãe, Blanca, vive há um ano com as outras duas filhas do senador, um genro e quatro netos menores de idade. Num gesto revelador das relações próximas entre autoridades dos dois países, a família Molina foi abrigada no Brasil pelo governador Tião Viana (PT/AC), seu amigo. Além de Talita, sabiam da “operación libertad” o embaixador Marcelo Biato, o conselheiro Manuel Montenegro e o encarregado de negócios da embaixada Eduardo Saboia, que assumiu a responsabilidade pela fase final da operação, que era retirar Molina da Bolívia e levá-lo, são e salvo, para o Brasil. Há pelo menos um mês, a operação chegou aos ouvidos de políticos, advogados e empresários que partilham informações e interesses nas relações entre Brasil e Bolívia. Um plano alternativo chegou a ser elaborado, na verdade, envolvendo uma operação triangular. Numa primeira etapa, Molina seria levado de avião para o Peru. Depois, seria conduzido ao Brasil. Ao verificar que o envolvimento de um país que nada tinha a ver o caso poderia ampliar as complicações de um plano já complicado, decidiu-se pela viagem de automóvel entre La Paz e Corumbá.

    Escondidos na neblina Na segunda-feira 19, num gesto que seus superiores no Itamaraty interpretariam como bisonha tentativa de despistar sua participação na operação, o embaixador Biato saiu de férias e coube a Saboia organizar todos os detalhes finais e fazer a viagem. Na quinta-feira 22, dia anterior à fuga, Molina recebeu a visita de um médico do Senado boliviano, que produziu um laudo atestando que ele enfrentava problemas de saúde, inclusive depressão. Substituindo Biato em sua ausência, naquele mesmo dia, Eduardo Saboia enviou uma cópia do laudo para o Itamaraty e, no mesmo despacho, observou que a situação pedia uma intervenção sem demora em auxílio do senador, afirmação vista como uma senha para o início da “operación libertad.”

    Ao deixar, na sexta-feira 23, a garagem do edifício Multicentro, complexo empresarial onde funciona a sede diplomática brasileira, o comboio seguiu em velocidade pela avenida Arce rumo à autopista El Alto, na saída da capital boliviana. A orientação era fazer meia-volta e retornar à embaixada ao menor sinal de que autoridades bolivianas pretendessem criar embaraços ao comboio. Lembrando que chegou a passar mal no trajeto, Molina conta: “Se eu fosse para um hospital, corria o risco de ser preso. Então decidimos seguir”. Depois de seis horas de estrada, o grupo chegou a Cochabamba, na região do Chapare, uma das principais bases eleitorais do presidente Evo Morales. Ali, milhares de famílias de agricultores plantam a folha da coca, tradicional ingrediente da cultura boliviana, que em grande parte é desviada para servir ao narcotráfico. Em Cochabamba, a avenida Blanco Galindo corta a cidade. O comboio levou três horas para atravessar a região, sob neblina espessa. A tensão não deixava ninguém cochilar. “Se fossemos detidos ali, seria a morte ou algo parecido”, afirma o senador. Em mais de um contato com o governo brasileiro, quando enviou uma emissária em audiência com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o governo de Evo Morales já havia deixado claro que gostaria de ver Roger Molina fora do País, desde que jamais pudesse ser acusado por seus próprios eleitores de proteger um político acusado de corrupção pela Justiça. “É loucura!”, reagiu Dilma ao ser consultada sobre a operação, deixando claro que o Brasil não poderia aceitar uma proposta que não tinha garantia contra riscos, inclusive possíveis ameaças à vida de Molina. Convencida de que o governo brasileiro fizera sua parte, ao garantir asilo para o senador boliviano, Dilma esperava que, incomodado com o desgaste que Molina causava a Morales, este tomasse a única medida cabível, que era dar o salvo-conduto.

    Fugitivos de fraldas Pano de fundo daquela viagem dramática, as relações entre Dilma e Evo Morales atingiram um momento especial quando ambos se encontraram durante uma viagem à África. Evo pediu uma “bilateral” à presidenta brasileira e aproveitou o encontro para denunciar que o senador estava tendo um comportamento inapropriado, chegando a fazer reuniões políticas. Em seguida, Dilma determinou ao chanceler Antonio Patriota que verificasse as queixas de Morales, pedindo ao ministro que se encarregasse pessoalmente de resolver o caso com as autoridades bolivianas. Quan­­­­do Patriota lhe disse que pretendia escolher um responsável para tocar a missão, Dilma reagiu de forma dura, conforme relatou um assessor palaciano: “Você deve cuidar de tudo pessoalmente”.

    SUSTO NA FRONTEIRA
    A polícia boliviana parou a comitiva e solicitou documentos. Atemorizado,
    o senador Roger Pinto pensou em sair correndo a pé do carro
    Às 4h30 da madrugada do sábado 24, já em Santa Cruz de La Sierra, o comboio fez uma parada técnica para “esticar as pernas”. Antes e depois, o combinado era seguir caminho de qualquer maneira. Para não perder tempo com refeições, levaram-se garrafas de água mineral, barras de cereais, frutas e biscoitos. Para não irem ao banheiro, usavam fraldas geriátricas. Antes do amanhecer, já estavam na estrada rumo a Puerto Suarez. Percorreram mais 660 quilômetros pela Rodovia 4, cruzando San José de Iquitos e outros três pequenos municípios. Na rota de saída do território boliviano, passaram por cerca de 12 postos de controle, chamados “trancas”. A cada parada, o motorista no veículo da frente identificava o comboio diplomático: “Estamos em missão diplomática, deixem-nos passar”. Os viajantes jamais foram submetidos a qualquer controle que, mesmo em operação de rotina, poderia detectar alguma falha nos documentos portados pelo senador, político conhecido no país inteiro.

    TERRITÓRIO INIMIGO
    O momento mais difícil e perigoso da fuga ocorreu quando a comitiva passou
    por Chapare (foto), região cocaleira dominada por aliados de Evo Morales
    Perto das 12h30, o grupo chegou a Puerto Suarez, fronteira com Corumbá. A luz amarela intermitente no painel do veículo alertava para o baixíssimo nível de combustível. Foi então que Saboia, católico praticante, abriu a “Bíblia” em Salmos e rezou baixo com Molina, evangélico. A tensão aumentou ao pararem no último posto policial na fronteira boliviana. Embora Saboia tivesse plena ciência do interesse de Morales em permitir que Molina deixasse o país, havia o temor de um imprevisto. “Se o primeiro carro fosse bloqueado, teríamos que jogar o nosso no acostamento e passar. Ou eu desceria e sairia correndo para cruzar a fronteira a pé”, revelou o senador boliviano. Após o trajeto de 22 horas, Molina disse, como um desabafo: “Senti um conforto emocional muito grande, após tanta pressão durante 22 horas e meia e 1,6 mil quilômetros. Foram momentos dramáticos e emocionantes”, desabafou Molina.

    Cercados no hotel Minutos depois, já no Brasil, eles tiveram que fazer outra parada, desta vez no posto da Polícia Federal. Estavam em Corumbá. Dois policiais fardados pediram que Saboia e Molina aguardassem no interior do veículo, enquanto eles faziam algumas ligações. Cerca de 40 minutos depois, cinco policiais à paisana chegaram ao local. Cumprimentaram a todos e disseram ter ordens superiores para fazer a escolta do grupo. Apreensivos e bastante cansados da tensão da viagem, Molina e seus acompanhantes receberam um tratamento regular, diante das circunstâncias. Foram levados ao hotel Santa Mônica. Ainda no carro, Molina ligou para o senador Ricardo Ferraço (PMDB/ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores, que almoçava despreocupadamente com a esposa em sua casa, em Vitória (ES). Ao atender, Ferraço ouviu Molina gritar do outro lado da linha. “Estou no Brasil! Necessito de ajuda para chegar a Brasília.” Ferraço primeiro tentou contato com o presidente do Senado, o peemedebista Renan Calheiros (AL). A ideia era dar um caráter mais oficial à acolhida de Roger Molina. “Vai que ele oferece um avião da FAB? Era uma questão humanitária”, diz. Sem conseguir falar com Renan, ele procurou empresários e, duas horas depois, conseguiu um avião para levar o senador até a Capital Federal.

    Às 14 horas do sábado 24, o senador Molina adentrou ao hotel com Saboia e o resto do comboio. Foi direto para seus aposentos, no quarto andar. Os próprios policiais fizeram o check-in. Numa medida para evitar a presença de desconhecidos e monitorar o que se passava no quarto do senador, bloquearam todos os apartamentos daquele andar. O boliviano tomou um banho, trocou de roupa e tirou uma foto com celular. Anexou a imagem a um SMS que enviou para a filha. “Cheguei em Corumbá. Avise a todos que estou bem!” Funcionários do hotel ouvidos por ISTOÉ afirmam que o trânsito de autoridades na fronteira é comum. Por isso não suspeitaram da missão até o fim da tarde, quando “um ministro” ligou querendo falar com Saboia.

    O prefeito de Corumbá, Paulo Duarte (PT), foi acionado no início da noite. O primeiro contato partiu do Itamaraty, o segundo de uma autoridade que ele prefere proteger. “Pediram que eu descobrisse se alguém com o nome de Roger Pinto Molina havia entrado em algum hospital da cidade”, relata. Funcionários da Secretaria de Saúde do município foram tirados de casa para fazer a varredura. Como não acharam ninguém, tentaram os hotéis. O Santa Mônica foi a primeira opção. Ao comunicar que havia encontrado Molina, Duarte foi orientado a achar um médico de confiança para examiná-lo. O médico encontrou o senador boliviano com um quadro agudo de desidratação e taquicardia. Ele foi medicado e orientado a repousar.

    Às 20h, Ferraço desembarcou no aeroporto local. Seguiram-se, então, novos momentos de tensão. Pelo que ficara combinado, era nesse horário que ele deveria resgatar Molina. Não encontrou ninguém e ligou para o senador. Tentou também o diplomata Eduardo Saboia, mas ambos estavam incomunicáveis. “Foram horas de preocupação. Não sabia o que ia acontecer”, afirmou Ferraço. Uma hora depois, um agente da PF chegou ao aeroporto e avisou ao senador que ia buscar Molina. Às 22h, os agentes da PF montaram guarda na recepção do hotel, para impedir movimentos de entrada e saída, ação que ficou registrada nas câmeras de circuito interno de tevê do hotel. 
    Conselhos do governador No aeroporto, Saboia e Roger Molina se despediram dos policiais e embarcaram. “Estou aliviado em estarmos no Brasil. Só estou preocupado com a minha família, que ficou na Bolívia”, afirmou um emocionado Saboia a Ferraço. A esposa de Saboia também é diplomata, lotada em Santa Cruz, e estava em casa com o filho. No trajeto, os dois contaram a Ferraço que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, havia telefonado para o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, pedindo que um médico credenciado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) fosse até o hotel atender Molina. Era 1h20 quando o avião desembarcou em Brasília. O senador boliviano pediu, então, para que o carro oficial do senador Ferraço o levasse para a casa do advogado Fernando Tibúrcio, que possui vários contatos com a oposição boliviana. É amigo, inclusive, do empresário Tito Quiroga, que já foi candidato a presidente e é adversário de Evo Morales. Um pouco depois, Molina deu um longo depoimento ao documentarista Dado Galvão, que se aproximou de integrantes da oposição ao governo Dilma durante a patrulha petista contra a dissidente cubana Yoani Sánchez.

    Ao descobrir que diplomatas brasileiros organizaram um plano que ela havia condenado de forma clara e definitiva, a presidenta demitiu Antonio Patriota de um cargo que ele conseguia conservar com dificuldades imensas, apesar da vitória inédita representada pela conquista da direção geral da Organização Mundial de Comércio por um candidato brasileiro. Submetido a uma investigação para apurar suas responsabilidades, o próprio Saboia foi removido de seu posto em La Paz e, em qualquer caso, só poderia contar com oportunidades de promoção na carreira em nova combinação política. O destino do senador Roger Molina parece encaminhado para que ele permaneça no País, desde que tenha disposição para manter uma postura discreta, longe de manifestações políticas, comportamento que se costuma pedir a quem pretende assumir a condição de refugiado. Foi por essa razão que, após conselhos do senador Jorge Vianna (PT-AC), ele cancelou depoimentos públicos nos quais seria chamado a criticar Evo Morales e, por tabela, fazer referências negativas à diplomacia do governo Dilma.


    Fotos: André Ribeiro; Marcos Boaventura/Folhapress; Paulo Yuji Takarada; Joel Rodrigues/FRAME
    Fotos: Michel Filho/Agência O Globo; Leon Neal/afp photo
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