Um estranho método de leitura
Paulo Roberto de Almeida
Colegas acadêmicos ou diplomáticos que me conhecem sabem que eu sou um leitor compulsivo. Não tanto quanto Carmen Lícia, que sempre leu muito mais e bem mais rápido do que eu, mas ainda assim um leitor e um anotador – daí a maior lentidão na leitura – de alto desempenho. Durante muitos anos mantive uma seção permanente no boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros, chamada Prata da Casa, na qual em fazia quatro ou seis pequenas resenhas a cada número, apresentando e avaliando as obras elaboradas por diplomatas merecedoras de registro (e não apenas temas diplomáticos, mas também romances e poesia). Os frequentadores de meu blog Diplomatizzando também sabem que resenhas de livros, minhas ou de terceiros, constituem postagens muito frequentes nessa ferramenta, ao lado de matérias minhas ou retransmissões de outras fontes, sempre com comentários meus.
Uma lista especial de meus trabalhos, feita muitos anos atrás, compilando unicamente os registros relativos às resenhas de livros, alcançou centenas de títulos, sendo que a coleção completa dos textos foi para mais de meio milhar de páginas. Desistir de compor uma obra unicamente com resenhas e artigos de resenhas, mas ainda assim fiz uma, selecionando os trabalhos mais interessantes e recolhendo as resenhas até o início dos anos 1990. Resultou num livro em edição de autor, feito apressadamente ao final de minha estada na embaixada em Paris, em dezembro de 1994 e impresso na própria embaixada (que tinha uma pequena gráfica no subsolo do elegante prédio da Cour Albert 1er: Vivendo com Livros (Paris: Editora Maíra, 1994, 406 pp.)
Depois disso, só voltei a essa prática de fazer compilações de resenhas depois de passar, a partir do início dos anos 2000, a resenhar sistematicamente os livros dos diplomatas, para fins da Seção “Prata da Casa” no boletim (hoje revista) da ADB. Por sugestão do próprio presidente da Fundação Alexandre de Gusmão, compilei as centenas de mini-resenhas feitas entre 2004 e 2014 e produzi alguns volumes consolidando estas resenhas, inclusive um grande livro com todo o material coletado sob este título Prata da Casa: os livros dos diplomatas (Hartford, 2014, mais de 600 p.); disponível no Academia.edu (link do livro: https://www.academia.edu/5763121/Prata_da_Casa_os_livros_dos_diplomatas_Edicao_de_Autor_2014_).
Sou reconhecidamente, portanto, um leitor voraz, com os problemas habituais de todo “colecionador” de livros: estantes abarrotadas, dificuldades de achar aqueles que eu sei que possuo, mas que, sem encontrar, preciso recorrer às minhas bibliotecas habituais para alguma consulta, passagem para os suportes digitais, etc. Tudo isso é conhecido, e comum a todos os grandes leitores. O que é menos conhecido é o meu método de selecionar livros e de começar novas leituras. Sempre começo pelo fim, não as conclusões, mas os índices, de nomes ou de matérias. É o que eu faço habitualmente, quando vou a livrarias ou a bibliotecas abertas, as que ainda existem. Nos Estados Unidos e na Europa, era o meu método favorito de escolher livros que vou comprar, emprestar para ler em casa, ou ler na própria livraria, o que fiz centenas de vezes nas boas livrarias americanas, numa mesa do café existente. Nenhum livro acadêmico publicado nesses países se permite vir a público sem um Index (ou mais de um).
No Brasil, mesmo os livros universitários não costumam vir acompanhados desses instrumentos, absolutamente necessários para uma leitura rigorosa dos temas mais relevantes, em uma obra de algumas centenas de páginas. Se consultarmos, por exemplo, um bom livro de estudos literários, comportando um índice onomástico, constataremos que as entradas nos nomes de Machado de Assis, Drummond, Mário de Andrade serão bem mais recorrentes e numerosas do que as de outros escritores conhecidos. O que fazer, então, com os livros que, mesmo sendo acadêmicos, não possuem índices temáticos? A solução fica sendo o recurso à bibliografia, para verificar as principais entradas relativas aos autores consultados.
Creio que todas as editoras brasileiras, sobretudo as acadêmicas, deveriam impor como obrigação a publicação de Indexes, que é por onde eu começo minhas leituras.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4607, 17 março 2024, 2 p.