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sábado, 2 de julho de 2022

A herança maldita em 2023 - William Waack

 

Esta, sim, uma herança maldita

O desespero de Bolsonaro para se reeleger compromete a recuperação do País 

Foto do autor: William Waack

William Waack

Jornalista e apresentador do programa WW, da CNNN

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Tanto faz se o pacote para turbinar benefícios sociais é tratado por “do desespero” ou “de emergência”. O que ele traduz é apenas desesperada tentativa de Jair Bolsonaro de organizar uma “virada” nas eleições.

Essa atabalhoada operação política faz parte também do modo de fazer negócios do Congresso. Outros países, como a Alemanha, recorreram a subsídios para atenuar o impacto dos preços dos combustíveis. No Brasil se alteram a Constituição, as regras fiscais e as normas para ano de eleições.

William Waack: 'O desespero de Bolsonaro para se reeleger compromete a recuperação do País'
William Waack: 'O desespero de Bolsonaro para se reeleger compromete a recuperação do País' Foto: Dida Sampaio/Estadão

O economista Marcos Mendes listou 95 medidas aprovadas pelo Congresso desde 2015 que ele considera bastante prejudiciais do ponto de vista fiscal – o atual pacote é apenas o exemplo mais recente. Não se trata apenas da concessão de benefícios a setores diversos (taxistas, usineiros, turismo). Nesse “estado de emergência” causado pelos preços de combustíveis o Congresso interferiu também na capacidade dos governadores de arrecadar.

Via decretos legislativos, altera medidas do Executivo para fixar tarifas de energia elétrica, por exemplo. Pendura na privatização da Eletrobras dispositivos para favorecer interesses econômicos regionais. E parte para cima da Petrobras com a intenção explícita de controlar a estatal, sob o pretexto de “ajudar os pobres”.

É interessante notar como essas várias medidas recentes foram aprovadas com maiorias esmagadoras, isto é, “direita” e “esquerda” estão votando do mesmo jeito. Não há muita diferença entre esses “polos” quando se trata de interferir em preços ou arranjar uma forma de gastar mais. Cabe ressaltar aqui mais uma vez como o Centrão está confortável com a vitória de Bolsonaro ou com a de Lula na eleição.

Bolsonaro não inventou nada disso aí, apenas a sua incompetência política tornou mais fácil o “modo business” (Marcos Mendes) do Congresso. Sem qualquer plano de governo a não ser continuar no governo, não tem ideia da armadilha que preparou caso se reeleja.

No momento o “pacote de emergência” serve apenas para tentar evitar perder já em primeiro turno, na crença de que o antipetismo o leve à vitória no segundo. Ocorre que as fichas foram todas agora para um conjunto de bondades que, para trazer efeito desejado, precisaria de mais do que os três meses restantes até as eleições.

Para o País, criaram-se um cipoal de judicializações e um profundo descrédito na capacidade do sistema político de levar política fiscal a sério. Achando que o adversário está fazendo o serviço sujo (arrebentar com o teto de gastos), Lula não parece até aqui ter noção do que será – esta, sim – a herança maldita.


domingo, 13 de abril de 2014

Heranca maldita: a destruicao da Petrobras pelos companheiros

O procurador da entrevista abaixo pode ser muito bem intencionado e honesto, mas é completamente ingênuo, tanto politicamente quanto economicamente.
Ele não vê nenhuma intencionalidade no caso Pasadena ou nos constantes aumentos nos custos da refinaria Abreu e Lima. Ele não percebe que as coisas aconteceram assim PORQUE tinha de ser assim. O importante não são os fins, mas são os meios, os procedimentos, justamente, que permitem liberar vastas somas de dinheiro para outras, menos santas, finalidades. Para mim, isso é tão evidente quanto ao modo de proceder que eu nem me preocuparia, no começo, em saber quem adotou tal ou qual decisão. Eu me concentraria em investigar os fluxos de dinheiro, as transações bancárias, os responsáveis últimos pelas contas, e o que foi feito desse dinheiro depois dos pagamentos realizados.
A outra ingenuidade está em pretender ver a Petrobras atuando em favor do povo brasileiro no formato atual. Para isso, só privatizando, como a Vale, que hoje tem mais funcionários e recolhe mais recursos sob a forma de impostos do que jamais teve ou pagou dividendos sob controle público. Só existe uma solução: privatizar a Petrobras. 
Paulo Roberto de Almeida 

Entrevista - Marinus Marsico

'Se a Petrobras não fosse pública, já tinha quebrado'

Representante do Ministério Público no Tribunal de Contas da União afirma que a estatal de petróleo sofre com má gestão e ingerência política desde 2005

Laryssa Borges, de Brasília
Procurador do Ministério Público do Tribunal de Contas da União (TCU), Marinus Marsico
CAIXA-PRETA – O procurador do Ministério Público do Tribunal de Contas da União (TCU), Marinus Marsico: 'Se a empresa não fosse pública, já tinha quebrado' (Adauto Cruz/Correio Braziliense/D.A. Press)
Procurador do Ministério Público do Tribunal de Contas da União há quase duas décadas, Marinus Marsico já comprou briga com corruptos que aparelharam o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), enfrentou servidores que insistiam em receber supersalários no Congresso e participou do acordo com o Grupo OK, do senador cassado Luiz Estevão, para reaver 500 milhões de reais desviados do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. Há cerca de dois anos, revira cada detalhe da ruidosa compra da refinaria de Pasadena, no Texas, pela Petrobras, um dos mais malsucedidos negócios da história da petrolífera brasileira. Para ele, apesar de o caso Pasadena ser "indefensável", a Petrobras sofre com desmandos políticos desde o segundo mandato do ex-presidente Lula. “A Petrobras está afundando. Há uma mistura de má gestão com o fato de ter se tornado um braço político do governo. Se a empresa não fosse pública, já tinha quebrado”, disse em entrevista ao site de VEJA.

As denúncias envolvendo a Petrobras, incluindo irregularidades em contratos, não são exatamente uma novidade para o TCU. A Petrobras é uma caixa-preta? A Petrobras é uma empresa muito difícil de fiscalizar e, com certeza, se fosse mais transparente, se não se preocupasse tanto com essa questão de sigilo comercial, muitas vezes indevido, tenho certeza que esses contratos desastrosos, como o de Pasadena, não teriam ocorrido. Se há dez anos houvesse a possibilidade de a Petrobras ser fiscalizada como deve ser, hoje não teríamos esse tipo de situação. Ela se fecha em um falso argumento de que é uma empresa de mercado e com sigilos comerciais. Chama muito a atenção no caso da Petrobras a quantidade de irregularidades e a magnitude dessas irregularidades. Não falamos de milhões, mas de bilhões de reais.
Qual foi a influência do governo nas decisões tomadas pela Petrobras nos últimos anos? Esse mal de misturar o público com o privado é algo que sempre existiu, desde o surgimento dessa esdrúxula figura da sociedade de economia mista. Mas, ultimamente, essa situação aumentou muito, é só ver os escândalos. Problemas sempre existiram, mas agora são problemas em grau exponencial e se chegou a um ponto intolerável em que a empresa, se não fosse pública, quebraria. E isso tudo ocorreu no período de 2005 a 2010 [no governo Lula]. Esse foi o período mais sério para a Petrobras mesmo.
A gestão de José Sergio Gabrielli, presidente da Petrobras na época da compra da refinaria de Pasadena, era fechada? Havia muito mais resistência da Petrobras, resistência à fiscalização do tribunal como um todo, na gestão do Gabrielli. Agora está um pouco mais transparente, mas há um longo caminho a percorrer. Nas informações que pedi à Petrobras sobre Conselhos de Administração e Fiscais, os dados foram passados parcialmente. Sonegar informação ao Ministério Público causa uma ação de improbidade contra as pessoas que o fizeram. A tarefa da atual presidente da Petrobras, Graça Foster, é muito difícil porque cabe mudar uma empresa que ultimamente andou se descuidando muito de sua eficiência, realizando gastos desnecessários e, sobretudo, sem autonomia, sem condições de determinar pelas leis de mercado quais seriam suas fontes de receita.
Quando o senhor fala em falta de autonomia, quer dizer que existe ingerência política? Sim, há uma forte ingerência política na Petrobras. A presidente da Petrobras não consegue colocar o preço do seu produto principal, que é a gasolina, em um patamar compatível com uma empresa de mercado. Por isso, a Petrobras tem hoje o maior nível de endividamento entre as grandes petroleiras no mundo, três vezes maior do que o razoável para o resultado operacional dela. Isso é resultado dessa mão invisível do governo. Sempre tem um braço forte do governo.
A Petrobras está afundando? A Petrobras está afundando, sem sombra de dúvida. Por mais que se fale e se apresentem números, ou por mais que se coloquem recordes de produção petrolífera, vemos que ela está afundando. É isso que o mercado pensa sobre a empresa. Há uma mistura de má gestão com o fato de a empresa ter se tornado um braço político do governo. Não há nenhuma teoria conspiratória em relação a isso. E se o mercado precifica a empresa nesse sentido, é sinal de que ela não vai nada bem.
A compra da refinaria de Pasadena foi o pior negócio da Petrobras nos últimos anos? Não há defesa em Pasadena. A coisa foi tão abertamente um escândalo que não há a mínima possibilidade de se defender qualquer coisa na transação. Tudo ocorreu justamente na época em que a administração pública federal atravessava aquela euforia de que tudo era possível, tudo se podia, com índices políticos de popularidade muito altos. Criou-se aquela ilusória sensação de que o mundo pertence a nós. Por conta disso fizeram a transação sem o mínimo cuidado. Fiquei escandalizado com a questão da Petrobras em Pasadena e me senti até ofendido com o negócio porque, como órgão de fiscalização, ofendeu a minha inteligência o fato de se ter feito uma contratação sem o mínimo cuidado. Parece que a Petrobras considera que nós somos idiotas, que a gente não vai ver nada e que nunca vão descobrir nada.
Há críticas à refinaria Abreu e Lima? Abreu e Lima é pior nos valores — e o foco do TCU é economizar para o contribuinte. Mas, no lado simbólico, Pasadena é uma afronta. Na época do contrato, a Astra [empresa belga parceira que vendeu metade da refinaria para a Petrobras] colocava avisos aos acionistas afirmando ‘que maravilha, fizemos um grande negócio, muito maior do que qualquer expectativa razoável’.
O que o TCU pode fazer em relação a Pasadena? Na minha representação pedi que se apurassem responsabilidades na diretoria-executiva e eventualmente nos conselhos. Configurado o débito, tem-se o rol de responsáveis que são obrigados a devolver esses recursos. O tribunal também pode aplicar multas, que podem ser proporcionais ao débito ou decorrentes de atos de gestão temerários, ilegítimos, antieconômicos. O problema é que não é factível que se paguem as multas.
A área internacional da Petrobras, que foi comandada por Nestor Cerveró, é a mais problemática? A área internacional é a que tem mais irregularidades. É uma área problemática. O que quero é que a Petrobras passe a funcionar em prol da sociedade brasileira. É uma coisa decepcionante e triste porque a Petrobras é uma empresa que não precisava passar por essas vicissitudes. A gente vê muitos indícios de uso político da empresa. É uma tristeza ver tanto potencial desperdiçado. Veja o caso do parecer falho. O parecer era falho e isso foi descoberto depois e nada foi feito com quem fez o parecer? A pessoa continuou muito bem em uma subsidiária da Petrobras [Cerveró foi para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora] e só agora, depois do escândalo, é que foi exonerada. Por que as medidas não foram adotadas antes? Tem que ser investigada se essa omissão no parecer é dolosa e, se for, isso é um crime. Se foi culposa, por incompetência ou falta de cuidado, essa pessoa não poderia mais continuar na empresa. Se em um banco um funcionário causasse um prejuízo de 1 bilhão de dólares para a instituição, certamente ele não continuaria com o trabalho e poderia até ir para a cadeia.
O que acha da CPI da Petrobras? Se a CPI for realmente um instrumento em que todos os seus integrantes tenham a vontade genuína de investigar e corrigir os problemas encontrados na Petrobras, ela é muito bem-vinda. A CPI tem instrumentos superiores aos do TCU para a investigação. Mas esse talvez seja um mundo utópico. Não ponho muitas esperanças no avanço dessas investigações, por mais respeito que eu tenha pelo Parlamento. A CPI é um instrumento da minoria. Se ela é sufocada pela maioria governista, não há investigação. Seria bom se houvesse uma evolução política, que os direitos da minoria fossem respeitados e que as investigações não fossem bloqueadas. Mas acho que isso é sonhar muito. 

terça-feira, 1 de outubro de 2013

O modo de producao lulista: uma nova categoria da historia universal

Nunca antes na historia da Humanidade, tamanha mediocridade se viu alçada à condição de pensamento. Nunca antes na história do Brasil, a degradação do pensamento atingiu níveis tão baixos. Jamais fomos confrontados a tanta ignorância em estado bruto. Nunca tivemos tantos mafiosos no comando do país. O Brasil parece anestesiado em face da burrice e da estupidez.
Paulo Roberto de Almeida

A herança maldita
MARCO ANTONIO VILLA
O Globo, 1/10/2013

Em meio a esta barafunda, não causam estranheza o ataque, o controle e a sujeição do Supremo Tribunal Federal à horda lulista

O lulismo vai deixar sinais indeléveis no Estado brasileiro. E, pelo visto, deve permanecer no poder até, no mínimo, 2018. Inexiste setor do Estado em que não tenha deixado sua marca. A eficácia na tomada do aparelho estatal é parte de um projeto de manietar o país, de controlar os três poderes.
O grande empresariado foi se transformando em um dos braços do Estado. A cada dia aumentou sua dependência dos humores governamentais. Ter uma boa relação com o Palácio do Planalto virou condição indispensável para o sucesso. O empresário se tornou capitalista do capital alheio, do capital público. Para a burguesia lulista, nenhum empreendimento pode ter êxito sem a participação dos fundos de pensão dos bancos e empresas estatais, dos generosos empréstimos do BNDES e da ação direta do governo criando um arcabouço legal para facilitar a acumulação de capital — sem esquecer as obras no exterior, extremamente lucrativas, de risco inexistente, onde a empresa recebe de mão beijada, sem concorrência, como as realizadas na África e na América Latina.
A petrificação da pobreza se transformou em êxito. Coisas do lulismo. As 14 milhões de famílias que recebem o benefício do Bolsa Família são, hoje, um importante patrimônio político. Se cada família tiver, em média, 4 eleitores, estamos falando de 1/3 do eleitorado. A permanênciaad aeternum no programa virou meio de vida. E de ganhar eleição. Que candidato a presidente teria coragem de anunciar o desejo de reformar o programa estabelecendo metas de permanência no Bolsa Família?
A máquina do Estado foi inchada por milhares de petistas e neopetistas. Além dos quase 25 mil cargos de assessoria, nos últimos onze anos foram admitidos milhares de novos funcionários concursados — portanto, estáveis. Diversamente do que seria razoável, a maior parte não está nas áreas mais necessitadas. Um bom (e triste) exemplo é o das universidades federais. Foi realizada uma expansão absolutamente irresponsável. Faculdades, campi, cursos, milhares de funcionários e docentes, para quê? Havia algum projeto de desenvolvimento científico? A criação dos cursos esteve vinculada às necessidades econômicas regionais? Foi realizado algum estudo das carências locais? Ou tudo não passou, simplesmente, de atendimento de demandas oligárquicas, corporativas e para dourar os números do MEC sobre o total de universitários no país?
Sem ter qualquer projeto para o futuro, foi acentuado o perfil neocolonial da nossa economia. Vivemos dependentes da evolução dos preços das commodities no mercado internacional — e rezando para que a China continue crescendo. Não temos uma política industrial. O setor foi perdendo importância. O investimento em ciência e tecnologia é ínfimo. A chamada nova economia tem importância desprezível no nosso PIB. A qualificação da força de trabalho é precária. Convivemos com milhões de analfabetos como se fosse um dado imutável da natureza.
A política externa amarrou o destino do Brasil a um terceiromundismo absolutamente fora de época. Nos fóruns internacionais, o país se transformou em aliado preferencial das ditaduras e adversário contumaz dos Estados Unidos. Abandonamos o estabelecimento de acordos bilaterais para fomentar o comércio. Enquanto o eixo dinâmico do capitalismo foi se transferindo para a região Ásia-Pacífico, o Brasil aprofundou ainda mais sua relação com o Mercosul. Em vez de buscar novas parcerias, optamos por transformar os governos bolivarianos em aliados incondicionais.
Entre os artistas, a dependência estatal foi se ampliando. Uma simples peça de teatro, um filme, um show musical, nada mais é realizado sem que tenha a participação do Estado, direta ou indiretamente. Ter bons relações com o lulismo virou condição indispensável para a obtenção de “apoio cultural”. Nunca na história republicana artistas foram tão dependentes do governo — nem no Estado Novo. E cumprem servilmente o dever de obediência ao governo, sem qualquer questionamento.
O movimento sindical foi apresado pelo governo. Os novos pelegos controlam com mão de ferro “seus” sindicatos. Recebem repasses milionários sem ter de prestar contas a nenhum organismo independente. Não vai causar estranheza se o Congresso — nesta escalada de reconhecer novas profissões — instituir a de sindicalista. A maioria dos dirigentes passou rapidamente pela fábrica ou escritório e está há décadas “servindo” os trabalhadores. Ser sindicalista virou um instrumento de ascensão social. E caminho para alçar altos voos na política.
O filé mignon do sindicalismo são os fundos de pensão das empresas e bancos estatais. Seus diretores — do dia para a noite — entraram no topo da carreira de profissionais do mercado financeiro. Recebem salários e bonificações de dar inveja aos executivos privados. Passam a conviver com a elite econômica. São mimoseados pela burguesia financeira de olho nos recursos milionários dos fundos. Mas ser designado para a direção do Fundo de Amparo ao Trabalhador é o sonho dourado dos novos pelegos.
Em meio a esta barafunda, não causam estranheza o ataque, o controle e a sujeição do Supremo Tribunal Federal à horda lulista. Os valores éticos e republicanos não combinam com sua ação política. Daí a necessidade de aparelhar todas as instâncias do Estado. E colocá-las a seu serviço, como já o fez com o Congresso Nacional; hoje, mero puxadinho do Palácio do Planalto.
Na república lulista, não há futuro, só existe o tempo.
Marco Antonio Villa é historiador

terça-feira, 30 de julho de 2013

Construindo a heranca maldita das contas publicas - Mansueto Almeida

Subsídios a programas federais podem criar novo ‘esqueleto’ no Tesouro

Segundo economista do Ipea, pagamentos devidos pelo Tesouro em subsídios e subvenções que ficaram dos anos anteriores cresceram 48,6% desde 2012, e já chegam a R$ 15,9 bi

Lu Aiko Otta, de O Estado de S. Paulo, 29/07/2013
BRASÍLIA - O apoio financeiro federal a programas como o Minha Casa, Minha Vida e os empréstimos a juros abaixo dos de mercado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) pode estar formando um novo "esqueleto" nas contas públicas, afirma o economista Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Isso porque o Tesouro Nacional tem de pagar aos bancos oficiais responsáveis por esses programas a diferença entre o juro cobrado dos tomadores e o custo de captação dos recursos, que correspondem aos subsídios. Porém, esses repasses estão sendo represados e transferidos de um ano para outro.
"Para mim é um esqueleto, porque não conhecemos exatamente o montante, mas sabemos que é brutal", disse Almeida. "É uma conta grande que estão jogando para o futuro."
Ele fez um levantamento no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), que é a base de dados onde são registrados todos os gastos do governo. Lá, constatou que há um estoque de R$ 15,9 bilhões em pagamentos devidos pelo Tesouro por conta de subsídios e subvenções inscritos em "restos a pagar". Isso significa que esses valores deveriam ter sido quitados em anos anteriores, mas não o foram e ficaram como pendência para 2013.
Os números mostram também que o volume de "restos a pagar" de subsídios e subvenções aumentou 48,6% em comparação com 2012. Para o economista, isso é uma indicação de que a prática de adiar esses pagamentos está se intensificando.
"Essa é uma conta que o Tesouro paga quando quer, porque os grandes credores são bancos oficiais", disse. Além do Minha Casa, Minha Vida e do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do BNDES, há um volume grande de subsídios nos programas de financiamento rural do Banco do Brasil.
Nesta segunda-feira, o BNDES também anunciou a redução nos juros do Programa Prorenova, destinado a empresas agrícolas que queiram renovar ou expandir canaviais. O juro foi para 5,5% ao ano, o que significa praticamente uma taxa negativa, já que a inflação vem rondando a casa dos 6%. O banco disse esperar encerrar o ano com uma carteira de R$ 3 bilhões em financiamentos.
Adiamento. Há duas semanas, o governo anunciou um corte de R$ 10 bilhões em suas despesas deste ano, dos quais R$ 2,5 bilhões ocorrerão nos gastos com subsídios e subvenções. No entendimento de Almeida, não se trata de uma redução efetiva de despesas. Seria apenas um adiamento, como já vem ocorrendo.
Pelos dados do Siafi, o Tesouro não pagou este ano nenhum centavo ao BNDES por conta dos subsídios gerados pelo PSI. Tampouco foram transferidos à Caixa valores referentes aos programas de habitação para famílias de baixa renda.
O economista aponta ainda uma discrepância entre os dados do Siafi e as contas do próprio BNDES. O sistema mostra pagamentos pendentes de R$ 6,3 bilhões ao banco, mas este registrou em seu balanço que tem R$ 12 bilhões a receber do Tesouro Nacional.
Almeida levanta a hipótese de o Tesouro não haver ainda contabilizado todo seu débito. Em dezembro, o Ministério da Fazenda baixou uma portaria pela qual, desde abril de 2012, os subsídios nas operações com o BNDES só serão devidos 24 meses após apurados.
Ainda de acordo com Almeida, com a aproximação dos leilões de concessão em infraestrutura, a tendência é que a conta de subsídios dê um salto.
Procurado, o Ministério da Fazenda não respondeu até o fechamento desta edição. /COLABOROU VINÍCIUS NEDER 

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Venezuela: uma agenda carregada para o novo "presidente"

Venezuela: a herança maldita de Chávez 

Veja.com, 24/04/2013
Hugo Chávez chegou ao poder na Venezuela em fevereiro de 1999 e, ao longo de catorze anos, criou gigantescos desequilíbrios econômicos, acabou com a independência das instituições e deixou um legado problemático para seu sucessor. Confira alguns dos desafios que o novo presidente terá de enfrentar:

1) PDVSA em ruínas
O petróleo, extraído quase inteiramente pela PDVSA, a Petrobras da Venezuela, é responsável por 50% das receitas do governo venezuelano. Além do prejuízo de uma economia não diversificada, Chávez demitiu em 2003 40% dos funcionários da companhia após uma greve geral e os substituiu por aliados. A partir daí, as metas de investimento não foram cumpridas e a produção estagnou.
O plano de investimentos da PDVSA divulgado em 2007 previa a produção de 6 milhões de barris por dia este ano, mas entrega menos da metade. A exploração de petróleo caiu de 3.2 milhões de barris diários (em 1998) para 2,6 milhões (dado de 2011). O caudilho foi beneficiado, no entanto, pelo aumento do preço do produto e usou a fortuna para financiar programas assistencialistas e comprar aliados na América Latina. 
Os candidatos já disseram que vão manter as 'misiones', como são conhecidos os programas assistencialistas. O desafio será fazer isso sem afetar a capacidade de investimento na petrolífera e aumentando a produção. 

2) Desmonte das instituições
Em 1999, Chávez aprovou uma nova Constituição que eliminou o Senado e estendeu seu mandato para seis anos, além de conseguir uma lei que lhe permitia governar por decreto. A concentração de poderes promovida pelo caudilho, no entanto, não se restringiu ao Legislativo. O Judiciário foi tomado por juízes alinhados ao chavismo. A cúpula das Forças Armadas também demonstrou lealdade ao coronel logo depois de anunciada sua morte, quando as tropas foram colocadas nas ruas com o objetivo declarado de "manter a ordem". "Vida longa, Chávez. Vida longa, revolução", bradou o ministro da Defesa, Diego Alfredo Molero Bellavia. A oposição em várias oportunidades pediu a obediência à Constituição.
A imprensa também não escapou do controle imposto por Chávez. Em 2007, o governo não renovou a concessão do maior canal de televisão venezuelano, a RCTV. Recentemente, a Globovisión, única emissora que ainda mantém uma linha crítica ao governo, admitiu que está negociando a venda do canal, inviabilizado pelas constantes pressões e prejudicado pelo combalido mercado de anunciantes na Venezuela. 

3) Criminalidade alta
A criminalidade disparou na Venezuela ao longo dos 14 anos de governo Chávez. Em 1999, quando se elegeu, o país registrava cerca de 6.000 mortes por ano, a uma taxa de 25 por 100.000 habitantes, maior que a do Iraque e semelhante à do Brasil, que já é considerada elevada. Segundo a ONG Observatório Venezuelano de Violência (OVV), em 2011, foram cometidos 20.000 assassinatos do país, em um índice de 67 homicídios por 100.000 habitantes. Em 2012, a organização registrou 21.672 homicídios, ou 73 a cada 100.000 habitantes. 
O Ministro de Interior e Justiça divulgou a ocorrência de 16.072 homicídios no país em 2012, contra 14.092 registrados em 2011, um aumento de 14%. Com isso, a taxa de homicídios passou de 48 para 54 a cada 100.000 habitantes. Os números de outro órgão oficial são diferentes. Dados do Corpo de Investigações Científicas, Penais e Criminalísticas, citados pelo jornal El Universal, apontam 21.600 assassinatos em 2012, contra 18.850 em 2011.

4) Inflação galopante
A economia venezuelana tem um histórico de inflação alta, desde antes de Chávez chegar ao poder. Contudo, a gastança pública aliada a uma política expansionista e estatizante fez com que a alta dos preços atingisse níveis absurdos. Segundo o FMI, a inflação anual venezuelana fechou 2012 a 26,3%. Para 2013, a projeção é que o índice chegue a 29%. Os números poderiam ser muito piores se não fosse o controle de preços exercido pelo governo. No entanto, essa regulação afetou a produção e levou a escassez de alimentos básicos como leite e carne. A desvalorização de mais de 30% da moeda, que entrou em vigor em fevereiro, fez com que alguns preços duplicassem.

5) Crise elétrica
Entre o final de 2009 e início de 2010, a Venezuela sofreu uma crise no setor elétrico, agravada pela estiagem que reduziu drasticamente os níveis dos rios que alimentam as hidrelétricas. Preocupado em ajudar financeiramente os aliados latino-americanos, o governo Chávez deixou de investir em novas usinas. E as companhias do setor elétrico, sob a praga da gestão chavista, tiveram queda na produção por falta de manutenção, corrupção e aumento escandaloso do número de funcionários. A crise foi tão grave que paralisou vários setores da economia e obrigou o governo a declarar estado de emergência no país.
Para contornar a situação, Chávez propôs o "banho socialista" de três minutos, pediu para os venezuelanos usarem lanternas para ir ao banheiro no meio da madrugada e exortou as grandes empresas a gerar sua própria eletricidade. Em 2012, Chávez reconheceu que a Venezuela ainda sofria com problemas elétricos, mas disse que, se não tivesse chegado ao poder em 1999, o país se iluminaria com lanternas e cozinharia com lenha.
O fato é que ainda hoje apagões são registrados em todo o país. O discurso de Nicolás Maduro agora é colocar a culpa nos "inimigos da pátria", que estariam sabotando o sistema de energia. Na reta final da campanha, o governista acusou a oposição a planejar um grande apagão e ordenou que as estações elétricas fossem ocupadas por militares.

6) Exportação do bolivarianismo
Boa parte dos recursos do petróleo venezuelano foi usada por Chávez para comprar aliados na região e ampliar o alcance de sua 'revolução bolivariana'. O maior beneficiário é Cuba, cuja mesada vinda dos cofres venezuelanos equivale a 22% do PIB - a ilha foi o destino do coronel ao longo de todo o tratamento contra o câncer e a oposição venezuelana denuncia a interferência dos irmãos Castro na política do país. Chávez também abasteceu o caixa de campanha de candidatos presidenciais populistas na América Latina e Central, como Cristina Kirchner, na Argentina, Evo Morales, na Bolívia, e  Daniel Ortega, na Nicarágua. Na última semana, o principal candidato opositor às eleições presidenciais, Henrique Capriles, afirmou que a Argentina deve 13 bilhões de dólares ao país pelos convênios para envio de petróleo.

7) Endividamento estatal
Durante a era Chávez, o endividamento do governo subiu de 37% para 51% do PIB. A dívida pública externa oficial está em 107 bilhões de dólares, sem contar a dívida da PDVSA com fornecedores e sócios e os débitos do governo com empresas expropriadas. No total, a conta deve chegar a 140 bilhões de dólares, um grande desafio ao próximo presidente venezuelano, seja de que lado ele estiver.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Planejadores, burocratas e desperdicio de dinheiro...

Os brasileiros comuns, cidadãos pagadores de impostos como eu e você, não se dão conta da herança maldita que está sendo construída todos os dias, pelas mãos do governo, sob a forma de um endividamento exacerbado, criando uma conta que será paga por esta geração, um pouco mais adiante, e pela geração seguinte (e se calhar pela outra também).
Pessoas comuns não se dão conta que todas essas benesses, concedidas apenas a empresários amigos, serão pagas com o dinheiro arrancado dos seus bolsos. Os próprios empresários contemplados, temporariamente aliviados de seu constrangimento financeiro, não se dão conta que eles também, a categoria como um todo, continuará pagando esses benefícios setoriais e microeconômicos, com maiores custos macroeconômicos e menor eficiência do Estado nos serviços essenciais.
Em última instância, cada vez que o Estado cria um sistema público de financiamento, ele está arrancando, literalmente, da sociedade, os recursos de que necessita para fazer essas bondades setoriais.
As pessoas simplesmente não se dão conta de que o Estado não cria rigorosamente nada, que ele não produz um quilo de riqueza, um grama de valor agregado, que tudo o que ele "entrega" a alguém foi arrancado previamente de outro alguém, vários alguens, e que essas pessoas somos nós, trabalhadores e empresários, produtores de riqueza justamente, os únicos que podem fazer isso.
Quando é que as pessoas vão começar a tomar consciência disso?
Vai demorar um bocado, suponho. Até lá, o Estado vai continuar arrancando dinheiro da sociedade e enganando todo mundo com suas falsas promessas.
Por que as pessoas não acham melhor gastar o seu próprio dinheiro, em lugar de permitir que ele faça um "passeio" pelas mãos do Estado e volte sempre menorzinho, e apenas para as mãos de alguns?
Paulo Roberto de Almeida

Tesouro e BNDES, ligações perigosas
Editorial - O Estado de S.Paulo
13 de julho de 2010

Mais que um fomentador de desenvolvimento econômico, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é hoje uma poderosa arma política na mão do governo. Pode ser usado para uma sadia política de expansão e modernização do sistema produtivo e para a elevação dos indicadores sociais. Mas também pode servir para beneficiar empresários, grupos e setores selecionados de acordo com os interesses políticos de quem chefia o governo. Com desembolsos maiores que os do Banco Mundial, o BNDES administra uma espécie de orçamento paralelo, engordado com recursos do Tesouro Nacional. Esse dinheiro é subsidiado e para transferi-lo o Executivo tem aumentado a dívida bruta do setor público.

Desde o ano passado o BNDES recebeu do Tesouro R$ 180 bilhões para fornecer empréstimos a custo reduzido. Para formalizar a ajuda ao banco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou em 2008 a Medida Provisória 453, convertida em junho do ano seguinte na Lei n.º 11.948. A lei fixa a remuneração devida ao Tesouro e determina uma prestação trimestral de contas ao Congresso. Mas não indica prioridades nem vincula o uso do dinheiro a planos ou programas identificados oficialmente como orientações de governo.

Noutros tempos, mesmo durante o período militar, o contribuinte dispunha de informação bastante clara para relacionar a ação do BNDES às grandes linhas das políticas públicas. O planejamento no atual governo não é muito mais que um conjunto mal costurado de intenções e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é uma colagem meramente improvisada de promessas e planos.

Mais do que em qualquer outro momento, o BNDES pode conduzir suas operações de acordo com critérios próprios ou apenas vagamente relacionados a qualquer ideia de plano governamental. Isso é evidente no relatório trimestral enviado em abril ao Congresso. Há no começo uma referência ao Programa de Sustentação de Investimentos (PSI), lançado pelo governo em junho de 2009 como parte da política antirrecessiva. Mas isso é ação de conjuntura. Pode ser útil, mas não caracteriza planejamento econômico. Dos R$ 32,8 bilhões emprestados para projetos do PAC, R$ 25,6 bilhões, 78%, foram destinados a investimentos da Petrobrás ou com sua participação. O BNDES operou, nesses casos, como canal de transferência de recursos do Tesouro, a custo reduzido, para a estatal.

Um dos projetos incluídos no PAC - e mencionado no relatório - é a implantação, pela Fíbria, de uma linha de produção de celulose branqueada. Essa empresa surgiu quando a Votorantim comprou a Aracruz, em 2009. O empréstimo foi um desdobramento dessa incorporação.

A transação foi possibilitada pelo apoio do BNDES, numa evidente operação de salvamento, justificada, oficialmente, pelo interesse em criar uma empresa líder no mercado mundial, etc. Argumentos de igual valor seriam aplicáveis à prestação de socorro a outras empresas. Pode-se tentar justificar a decisão, mas isso não a torna mais transparente nem menos arbitrária.

O mesmo grau de arbítrio ocorre no uso do Tesouro para reforçar o caixa de um banco estatal. Em fevereiro deste ano, o economista Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC), alertou para a tentativa de ressurreição de um animal jurássico, a conta movimento, extinta em 1986. Essa conta, criada nos anos 60, permitia a transferência de dinheiro do BC para o Banco do Brasil. Foi uma das causas das enormes pressões inflacionárias observadas no período. Outros especialistas lançaram a mesma advertência nos meses seguintes.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-diretor do BC e ex-presidente do BNDES, chamou a atenção, em artigo publicado na semana passada, para os perigos da recriação da conta movimento, desta vez montada como um canal direto entre o Tesouro e o banco de desenvolvimento. "No fim das contas há uma aterrorizante semelhança entre a versão da conta movimento do Banco do Brasil dos governos militares e a versão atual do governo Lula", escreveu o economista. O governo está criando um ovo de serpente, advertiu. O bicho nascerá nos próximos anos, sob a forma de sérios desequilíbrios, se o ovo não for logo exterminado.

sábado, 15 de maio de 2010

A farra do governo com o meu, o seu, o nosso dinheiro...

Não se engane, caro leitor: você, os seus filhos, netos e talvez até os seus tataranetos (se ninguém consertar essa farra rapidinho), pagaremos a conta dessa verdadeira orgia de gastos irresponsáveis que o governo está promovendo atualmente, na verdade que vem promovendo desde o primeiro dia (com alguma contenção em tempos paloccianos).
Essa é a verdadeira herança maldita que Lula deixará para os seus dois próximos sucessores (e portanto para ele mesmo caso consiga realizar seu intento de voltar em 2014).
Não duvido de que consiga, dada a compulsão do brasileiro, sobretudo dos mais ricos -- capitalistas, banqueiros, etc -- e dos mais pobres -- miseráveis e não tão miseráveis que vivem das esmolas demagógicas do governo -- pelo dinheiro público, que nada mais é do que o dinheiro que o governo arranca dos trabalhadores e empresários.
Aprenda uma coisa, você comentarista eventual que se arriscar a me criticar neste post: NÃO EXISTE milagre; TODO o dinheiro que o governo redistribui, com a sua proverbial incompetência, sai do que você produziu, como trabalhador ou como empresário. Não existe outra maneira de se criar riqueza, e o governa certamente não produz um grama, um centimetro quadrado, um mililitro de riqueza. Tudo o que ele supostamente "tem", ele arrancou de mim, de você, de todos nós.
Abaixo, a confirmação do que diga.
Quem quiser comentar, que o faça com competência, pois de ofensas à lógica formal e à realidade dos fatos, o mundo já está cheio, sobretudo este canto do mundo que é infelizmente o nosso, cada vez mais indo para o brejo.
Paulo Roberto de Almeida

Gastança federal
Miriam Leitão
O Globo, 14.05.2010

O governo Lula deixará uma pesada herança fiscal para quem quer que seja que lhe suceda. O corte anunciado ontem é uma gota num oceano de gastança. A maior parte da queda do superávit primário foi para aumento de despesas de custeio, pessoal e Previdência. A dívida pública bruta cresceu fortemente e isso só não aparece na dívida líquida pelos truques contábeis.

Confira nos gráficos abaixo. Em outubro de 2008, o governo destinava para superávit primário 16% da Receita Corrente Líquida. Hoje, ele destina apenas 6%. Receita Corrente líquida é o que fica nos cofres federais, depois dos repasses para estados e municípios. Pelos cálculos do economista político Alexandre Marinis, sócio da consultoria Mosaico, essa queda do superávit primário não significou um aumento de investimento. Antes da crise, o governo investia 5% da sua receita, agora, destina 6%. O aumento foi de apenas um ponto percentual. Mas as despesas de pessoal, Previdência, custeio e outras despesas obrigatórias, que já engoliam 79%, foram para 88%.

— Do ponto de vista da sustentação do crescimento econômico no futuro, é difícil imaginar uso mais ineficiente dos recursos públicos — diz Marinis.

A Tendências consultoria calcula que as despesas do governo cresceram em média 7,7% ao ano nos últimos 10 anos enquanto o PIB cresceu bem menos, 3,3%. Se esse aumento fosse concentrado nos investimentos, o gasto seria saudável. O problema é que ele se concentra em salários para funcionários públicos, reajustes no INSS e nas despesas correntes, que são gastos para o próprio funcionamento do governo. Para se ter uma ideia da diferença de valores, nos 12 meses terminados em março, o governo e o Banco Central gastaram R$ 597,1 bilhões. Desse total, R$ 154,4 bilhões foram para pagamento de pessoal; R$ 232,8 bilhões, para benefícios previdenciários; e apenas R$ 39 bilhões, para investimentos.

O único ano em que houve um ajuste fiscal foi 2003. Depois, o governo aumentou fortemente o número de funcionários; não regulamentou a única reforma que fez; a da Previdência Pública; e tem usado truques contábeis para esconder o aumento do endividamento. Note, por exemplo, num dos gráficos, o aumento dos créditos repassados ao BNDES. Esse é um dos truques. O governo alega que empresta ao banco, mas na verdade está aumentando o capital do banco de fomento, que concede empréstimos subsidiados muitas vezes para as próprias estatais.

— O Tesouro empresta para o BNDES com juros em torno de 5%, só que paga 9,5% de juros, que é a taxa Selic, para rolar a própria dívida. Ou seja, o Tesouro está tomando prejuízo na operação — explicou Felipe Salto, da Tendências.

A declaração do ministro Guido Mantega de que será feito um corte de R$ 10 bilhões e o aviso do ministro Paulo Bernardo de que “vai doer” não impressionam. Ao longo dos últimos anos o governo ampliou de forma extravagante seus gastos. Essa é a herança que ficará para a próxima administração. Marinis acha que se tivesse mantido constante, depois de 2003, as despesas de pessoal e custeio em relação ao PIB, o governo poderia ter aumentado em 45% os investimentos. Felipe Salto acha que o corte anunciado serve para apagar incêndio.

— O governo tem que fazer cortes pensando num horizonte mais longo. O que foi anunciado é mudança de curto prazo para apagar incêndio. Por não ter feito isso antes, teremos mais juros e crescimento menor do PIB a partir de 2011. Crescer um ano é fácil, mas a partir do ano que vem vamos entrar num ciclo de crescimento mais baixo — afirmou Salto.