terça-feira, 7 de janeiro de 2025

As universidades brasileiras como museus de teorias do século passado - Augusto de Franco (Revista ID)

Incrível como a esquerda brasileira, em especial o PT, está mentalmente atrasada. PRA 

As universidades brasileiras como museus de teorias do século passado

Augusto de Franco

Augusto de Franco, 98live (06/01/2025)

As esperanças de muitos intelectuais de esquerda - vejam que lamentável - é a candidatura do Boulos em 2026 em São Paulo. Acham que, se ele ganhar, há a possibilidade para empurrar uma coalizão progressista para a esquerda. Mas cabe perguntar: para quê?

  • Para apoiar a invasão de Taiwan e sua anexação pela ditadura chinesa?

  • Para apoiar os braços terroristas do Irã e o própria teocracia iraniana na sua guerra contra a democracia de Israel?

  • Para continuar apoiando Putin na sua guerra expansionista contra a Ucrânia e, depois, contra a Georgia, a Moldávia, os países bálticos e, quem sabe, até a Polônia e a Finlândia?

  • Para continuar tomando Cuba como grande referência ideológica e apoiando as ditaduras da Venezuela, da Nicarágua, de Angola?

  • Para liderar a adesão dos regimes eleitorais parasitados pelo populismo de esquerda - como México, Honduras, Colômbia, Bolívia, África do Sul, Angola, quem sabe Indonésia e o próprio Brasil - ao eixo autocrático (Rússia, Bielorrússia, China, Coreia do Norte, Irã, Cuba, Venezuela, Nicarágua etc.) contra as democracias liberais?

  • Para acabar com a autonomia do Banco Central e das Agências Reguladoras, subordinando-as ao governo e aparelhando-as de cima a baixo?

  • Para continuar sendo contra as privatizações e sabotando a lei das estatais?

  • Para acelerar e intensificar o uso político dos bancos públicos?

  • Para escolher complexos industriais estratégicos (ou "campeões nacionais") direcionando para eles investimentos públicos?

Se for para isso, o importante é que Boulos, caso dispute o governo de São Paulo em 2026, seja derrotado. Aliás, do ponto de vista da democracia liberal, a derrota de Boulos para a prefeitura da cidade de São Paulo em 2024 foi o evento mais significativo. A esquerda dependia disso para retomar o fôlego, de vez que já se sabia derrotada nas disputas municipais.

Mas é lamentável mesmo que as universidades continuem sendo museus de teorias dos séculos passados.

Os marxistas de academia (anticapitalistas universitários) acham que há um complô entre a banca (e os operadores do mercado financeiro) e os meios de comunicação (que não deveriam ficar divulgando índices da subida do dólar e de queda da bolsa) para obrigar o Lula a fazer corte de gastos (tirando-lhe com isso o poder de cumprir a promessa eleitoral de "colocar o pobre no orçamento").

Eles continuam com a mesma cantilena. Acham que o mercado financeiro é o malvadão da parada, responsabilizam uma suposta ordem neoliberal por todos os desastres – e não dizem uma palavra sobre a ameaça real de ascensão de um eixo autocrático (Rússia, China, Bielorrússia, Irã, Coreia do Norte, Vietnam, Cuba, Venezuela, Nicarágua, Angola etc.) – o maior, diga-se, já erigido no planeta em toda a história. Enfim...

É inexplicável - e também revelador - que (quase) nenhuma das análises produzidas pelos intelectuais de academia leve em conta, como fator central, o surgimento de um eixo autocrático em guerra contra as democracias liberais.

Por que? Ora, porque eles não prezam as democracias liberais. Mesmo com vergonha de dizer, para não cair no ridículo, eles continuam achando que a democracia liberal não passa de uma “democracia burguesa”. É sempre o marxismo que fala mais alto.

Sobre isso vale a pena explorar o relatório 2024 do World Justice Project (WJP), que elaborou um index e daí um ranking mundial de adesão ao Estado de direito (num universo de 142 países).

Dos 30 primeiros colocados quase a totalidade é composta por democracias liberais (V-Dem) ou por democracias plenas (The Economist Intelligence Unit). O índice é composto por 8 indicadores: 1) Restrições aos poderes do governo, 2) Ausência de corrupção, 3) Governo aberto, 4) Direitos fundamentais, 5) Ordem e segurança, 6) Aplicação da regulamentação, 7) Justiça civil e 8) Justiça criminal. O Brasil está na colocação 80, a Venezuela em último lugar, na posição 142.

Há problemas com o índice, claro (como há em qualquer índice). Por exemplo, no primeiro indicador deveriam ser consideradas restrições a todos os poderes (ou freios e contrapesos mútuos entre Executivo, Legislativo e Judiciário) e não apenas ao governo (stricto sensu). Não queremos um governo nas mãos do parlamento, mas não devemos querer também um parlamento nas mãos do governo (sob o pretexto da governabilidade). Ademais, não queremos que governo ou parlamento fiquem nas mãos da judiciário, nem um judiciário subordinado ao governo (sob o pretexto da defesa da democracia). Difícil equilíbrio, mas sem ele não há pleno Estado democrático de direito. Ademais, governos e judiciário existem em qualquer regime, mas parlamento livre e judiciário independente só nas democracias liberais.

De qualquer modo é mais um subsídio importante. Seria bom se o STF – com a ajuda dos universitários – nos explicasse por que estamos numa posição bem ruim em termos de adesão ao Estado de direito no Brasil (tão exaltado por seus ministros). Também seria bom conferir as posições dos países BRICS (o Brasil na posição 80, a China na 95, a Rússia na 113 etc.).

Vejamos os trinta primeiros colocados no ranking WJP Rule of Law Index (que mede a adesão ao Estado de direito): Dinamarca, Noruega, Finlândia, Suécia, Alemanha, Nova Zelândia, Luxemburgo, Holanda, Irlanda, Estônia, Austrália, Canadá, Austria, Japão, Reino Unido, Singapura, Bélgica, Lituânia, Coreia do Sul, Chequia, Letônia, França, Hong Kong, Uruguai, Espanha, EUA, Eslovênia, Portugual, Costa Rica e Malta.

Na América Latina e Caribe estão mais bem colocados do que o Brasil (uma vergonha para nós): Uruguai, Costa Rica, Barbados, Chile, Antigua e Barbuda, St. Kitts e Nevis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Granada, Bahamas, Dominica, Jamaica, Argentina, Panamá, Trindade e Tobago, Guiana.

E os trinta piores colocados: El Salvador, Madagascar, Rússia, Níger, Angola, Honduras, Turquia, México, Guiné, Nigéria, Congo, Gabão, Zimbabue, Mali, Moçambique, Uganda, Bangladesh, Irã, Paquistão, Etiópia, Bolívia, Mauritânia, Camarões, Sudão, Egito, República Democrática do Congo, Nicarágua, Mianmar, Haiti, Afeganistão, Cambodja, Venezuela.

Entre os 30 piores colocados estão os aliados tradicionais do Brasil: a) os regimes eleitorais parasitados pelo populismo de esquerda (como Honduras, México e Bolívia); b) as ditaduras amigas (como Nicarágua, Venezuela e Angola - Cuba também estaria, mas não foi incluída no ranking pela falta de dados confiáveis); e c) os expoentes do eixo autocrático ao qual o governo Lula se alinha (hoje no BRICS, como Rússia, Irã, Egito, Etiópia, Turquia, Nigéria, Uganda).

Nas universidades brasileiras tudo isso passa em branco. Ninguém dá a menor bola. Porque o importante é lutar contra o neoliberalismo (ao estilo dos anos 90, do século 20) e contra o capitalismo (ao estilo dos anos 80, do século 19). Pelo menos nas áreas das chamadas “ciências humanas” nossas universidades viraram mesmo um museu de teorias dos séculos passados.

Revista ID é uma publicação apoiada pelos leitores.

O peso das sanções econômicas ocidentais vai paralisar vários projetos da Rússia de Putin: navio quebra gelo comprometido - Malte Humpert (gCaptain)

 

Russia’s first ice-capable LNG gas carrier beings trials. 

In a significant step to expand Russia’s domestic shipbuilding portfolio the Zvezda shipyard has completed work on its first LNG vessel. Ice-capable gas carrier Aleksey Kosygin departed from the yard near Vladivostok for sea trials on December 25. It is the first LNG carrier completed by a Russian yard, though key parts of the vessels were constructed in South Korea. The vessel will become part of the fleet to service Russia’s flagship LNG plant, Arctic LNG 2. The project has been plagued by delays due to escalating Western sanctions. Majority owner Novatek has struggled to secure ice-capable shipping capacity to service the project during winter. The company has thus far also been unable to find buyers for its LNG. Originally Arctic LNG 2 was designed to rely on a fleet of 21 ice-capable LNG carriers for year-round transport via the Arctic; none of which have been delivered. The Arc7 LNG carriers – 300 meters long and 48.8 meters wide – are designed for year-round independent navigation along the Northern Sea Route. With a 45 MW power plant and powerful icebreaking capabilities they can travel through ice up to 1.7 meters thick.

AIS data showing Aleksey Kosygin beginning sea trials. (Source: Shipatlas)

Following sea trials Aleksey Kosygin is expected to enter service in early 2025. South Korean firm Samsung Heavy Industries (SHI) constructed the more challenging blocks of the vessel. The hull up to the forward cargo bulkhead was towed to Zvezda in October 2021. The vessel was completed at Zvezda, including the installation of the gas membrane through French manufacturer GTT and propulsion components by European supplies MAN and Wärtsilä. SHI had been contracted to provide 15 hulls to Zvezda, but only delivered five of them before the sanctions environment prompted the cancellation of the contract in 2024. Over the past several years the five delivered hulls remained at various stages of construction prompting questions how many vessels Russia would be able to launch on its own.

Source: Malte Humpert in gCaptain


O crescimento das plataformas de direita não é apenas um fenômeno político: está no mundo dos negócios também: Rumble (Forbes Daily)

A extrema-direita está reforçando seu caixa com bilionários comprometidos com sua ideologia ultra-conservadora.

From: Forbes  Daily, Jan 7, 2025

DAILY COVER STORY
Rumble founder and CEO Chris Pavlovski   ZACH ROBERTS/NURPHOTO/ZUMA PRESS
Why The Founder Of The Right-Wing Video Platform Rumble Is Now A Billionaire
Read Article
TOPLINE
Plenty of people got presents at the end of December, but Rumble founder and CEO Chris Pavlovski had a particularly lucrative holiday season. 

On December 20, Pavlovski’s cash-strapped YouTube alternative, which claims the mantle of free speech and is popular with the political right, announced a $775 million investment from crypto giant Tether. That sent Rumble’s stock soaring by more than 100% over the next week and made Pavlovski a billionaire.

Forbes estimates that Pavlovski is now worth around $1.3 billion, thanks to his 25% stake in Rumble. And that’s with Rumble’s volatile stock down 15% to $13.77 per share Monday, after closing at a peak of $16.27 on December 26.

Not included in Forbes’ estimate of Pavlovski’s fortune: “earnout” shares and options that could boost his stake in Rumble to as high as 44%, if the company’s stock trades above $17.50 per share for 20 days in a 30 day period prior to September 2027—a scenario that now seems a little less outlandish than it did a month ago. 

“The strength in the stock has been driven by [an] improved balance sheet [due to] the Tether investment and the more favorable political backdrop for alternative news outlets,” says Wedbush analyst Scott Devitt.

WHY IT MATTERS
“Chris Pavlovski isn’t the first person to make a huge fortune from creating tech companies that appeal to conservatives—just look at the president-elect,” says Forbes reporter Kyle Khan-Mullins. “But Rumble’s takeoff and Pavlovski’s net worth boom signal that some investors believe such websites could pose a real threat to established Big Tech companies. What remains to be seen is whether Rumble can finally turn that cash into a profitable business or whether giants like YouTube and Amazon will ultimately win the day.”
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Book review: Nathan Perl-Rosenthal, 'The Age of Revolutions: And the Generations Who Made It' - Review by Matthijs Tieleman (H-Diplo)

 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

A “herança maldita” das ditaduras na economia - Paulo Roberto de Almeida

A “herança maldita” das ditaduras na economia

 Paulo Roberto de Almeida 

        Ditaduras, de esquerda ou de direita, costumam conduzir seus respectivos países a desastres econômicos. Elas são responsáveis, invariavelmente, por erros de políticas econômicas que comprometem o seu futuro, não tendo o benefício da alternância de governos dos regimes democráticos.

        Putin levou a Rússia a uma destruição econômica fenomenal, pela sua ambição expansionista e concentração dos recursos públicos em aventuras bélicas desastrosas, inclusive no plano demográfico e no capital humano.

         Na América Latina, Cuba dos Castros e Venezuela de Chávez-Maduro são os dois exemplos mais conspícuos de recuos históricos: das primeiras posições no PIB pr capita no passado “capitalista” para os últimos lugares na atualidade socialista. A Nicarágua parece seguir o mesmo itinerário, de retrocessos econômicos, políticos e sociais na ditadura personalista de Ortega.

        A ditadura brasileira registrou 10 anos de crescimento e 10 de crises profundas, na aceleração inflacionária e no endividamento externo, deixando no lugar uma longa estagnação e um legado de introversão produtiva. Seus reflexos nefastos se estenderam por longo tempo, talvez até hoje, num tipo de nacionalismo estatizante que isolou o Brasil das principais cadeias produtivas globais.

        As ditaduras de Salazar e Franco deixaram Portugal e Espanha como os países mais atrasados da Europa ocidental, até o retorno da democracia e a reintegração à prosperidade europeia.

        As ditaduras africanas dilapidaram uma herança colonial que não era constituída por uma maioria de Estados falidos como se constatou nas décadas seguintes.

        Os países da Europa central e oriental colocados pela IIGM na esfera soviética retrocederam no caminho do bem-estar e desenvolvimento social, até serem resgatados do limbo pela implosão da URSS e sua incorporação na OCDE e na União Europeia.

Brasília, 6/01/2025

“Segredos” da Biblioteca do Barão - Cristiane Costa e Luís Cláudio Villafañe G. Santos (Piauí)

“Segredos” da Biblioteca do Barão - Cristiane Costa e Luís Cláudio Villafañe G. Santos (Piauí)

Uma das mais importantes “descobertas” feitas a partir da Biblioteca do Barão, base original da biblioteca do Itamaraty do RJ: estava lá, mas ainda inexplorada. Mérito do embaixador Villafañe.

“Um relatório produzido nos anos 40 apresenta o lado B do Barão do Rio Branco (1845-1912). O documento até agora inédito examinou a marginália (notas feitas nas margens dos livros) do chanceler que ajudou a definir as fronteiras do Brasil. É um relato dos hábitos, manias, vícios e idiossincrasias do patrono da diplomacia brasileira."

Por Cristiane Costa e Luís Cláudio Villafañe G. Santos

Leia: https://piaui.co/3Pdy9eF

Mais um desses projetos lunáticos: uma moeda do Brics contra o dólar - Paulo Roberto de Almeida

Mais um desses projetos lunáticos: uma moeda do Brics contra o dólar

Paulo Roberto de Almeida

Não existe uma “moeda Brics”; o que existem são projetos políticos que não se ajustam à realidade econômica. 

Se criarem alguma ferramenta monetária artificial, por decisões governamentais, isso vai aumentar custos e riscos para os operadores privados. 

Os únicos que defendem a medida são líderes políticos raivosos contra a hegemonia do dólar e acadêmicos alienados.

O abandono do dólar só tem viabilidade efetiva como resultado de um processo conduzido a partir dos EUA. 

Brasília, 6/01/2025

Anexo:

O uso de “moedas locais” no Brics significa passar a usar a moeda da China. Os empresários e comerciantes do Brasil, da Índia e de outros países acham que vão estar melhor com um sistema menos conversivel e com maiores riscos cambiais, ou seja, menos multilateral?

domingo, 5 de janeiro de 2025

Os Editoriais do Estadão, fazendo história: Edição especial 150 anos: Seleção de 50 editoriais desde 1875 até 2024

Glorioso, vestusto e moderno...

Os Editoriais do Estadão, desde 1875: 

 

Edição especial 150 anos: 04/01/2025 


https://www.estadao.com.br/150-anos/opiniao-do-estadao/a-historia-nos-editoriais-do-estadao/

 

O jornal O Estado de S. Paulo é conhecido, entre outras razões, pela força e coerência de seus editoriais. Esses atributos são corolários da independência do jornal para defender os valores nos quais acredita e dizer à sociedade, com respeito à verdade factual e absoluta transparência, aquilo que pensa ser o certo. Fiel a seus princípios ao longo dos últimos 150 anos, o Estadão fez da seção Notas & Informações a consciência crítica de seu tempo, um dos pilares sobre os quais se sustenta a opinião pública brasileira.

A seguir, o leitor encontrará uma seleção de 50 editoriais que marcaram a posição do Estadão em momentos históricos, no Brasil e no mundo. Muitos eventos cruciais ocorridos entre janeiro de 1875 e dezembro de 2024, naturalmente, ficaram fora dessa lista, seja porque o jornal optou por não se manifestar sobre eles, seja porque foram tratados não como editoriais propriamente ditos, mas como análises ou artigos assinados por seus fundadores e/ou proprietários. É o caso, por exemplo, da 1.ª Guerra (1914-1918).

A cobertura da chamada “Grande Guerra” foi um verdadeiro tour de force para o Estadão. Júlio Mesquita, então proprietário e principal redator do jornal, tomou para si a responsabilidade de reportar e, principalmente, explicar para os leitores o que acontecia nos fronts da Europa. Durante os quatro anos do conflito, Mesquita publicou n’O Estado de S. Paulo boletins semanais e crônicas sobre os rumos da guerra. E sem jamais tirar os pés do Brasil. Essa portentosa cobertura foi reunida por seu bisneto, Ruy Mesquita Filho, em A Guerra, uma obra de quatro volumes lançada em 2002 pela Editora Terceiro Nome.

As reportagens de Júlio Mesquita sobre a 1.ª Guerra não raro refletiam a própria opinião de seu jornal, servindo, na prática, como editoriais sobre o tema. Foi por meio das reportagens e crônicas assinadas por ele que ficou claro para os leitores que o jornal nutria franca simpatia pelos aliados (França, Grã-Bretanha, Estados Unidos e Rússia, entre outros), mas sem que essa posição significasse uma afirmação de antipatia pelas nações lideradas pela Alemanha e a Áustria no conflito. “O Estado simpatiza com os aliados, não porque antipatize com os alemães, mas porque diverge visceralmente da política autoritária e militarista que desviou a Alemanha da sua luminosa missão e produziu esta guerra odiosa”, escreveu Mesquita.

Outro exemplo de aparente omissão na seção de Notas & Informações é a 2.ª Guerra (1939-1945). Ao longo de praticamente todo o conflito, o Estadão esteve sob intervenção da ditadura de Getúlio Vargas, razão pela qual o jornal não reconhece as publicações no período sob o jugo varguista como parte de sua história.

Os editoriais que aqui vão reunidos, contudo, transmitem ao leitor de hoje, de forma linear e coerente, uma boa ideia de como O Estado de S. Paulo se mantém fiel a seus princípios fundadores, em particular a defesa irrenunciável das liberdades democráticas e dos valores republicanos. Os textos refletem, ainda, a visão que o Estadão tem do jornalismo profissional, concebido por este jornal como uma causa a serviço do melhor interesse público – e, exatamente por isso, imune ao tempo.

1875


Primeira edição de 'A Província de São Paulo', em 4/1/1875 


Editorial inaugural

No editorial que inaugurou a circulação de A Província de São Paulo, publicado em 4 de janeiro de 1875, o jornal afirmava os princípios editoriais que orientam o Estadão até hoje, 150 anos depois. “Não sendo órgão de partido algum nem estando em seus intuitos advogar os interesses de qualquer deles, e por isso mesmo colocando-se em posição de escapar às imposições do governo, às paixões partidárias e às seduções inerentes aos que aspiram ao poder e seus proventos, conta A Província de São Paulo fazer da sua independência o apanágio de sua força.”

 

Trancrevi todos os 50 editoriais selecionados pelo Estadão e coloquei o conjunto à disposição dos interessados, neste link de minha página em Academia.edu: 

https://www.academia.edu/126855638/A_Historia_nos_Editoriais_do_Estadao_de_1875_a_2024_Estadao_


O primeiro trabalho de 2024: uma crítica à alienação acadêmica - Paulo Roberto de Almeida

Uma crítica à alienação acadêmica

Paulo Roberto de Almeida :

"Parece que boa parte do mundo acadêmico, geralmente em ciências sociais, não tem consciência de que o mundo em que se vive atualmente foi justamente construido pelo liberalismo capitalista dos últimos séculos, onde este existiu de forma livre. 

O socialismo nunca construiu nada de relevante, a não ser opressão e miséria! Basta revisar os registros históricos dos últimos 100 anos para verificar essa realidade: mais povos e nações SAÍRAM do socialismo nas últimas três décadas, do que adotaram soluções e regimes declaradamente socialistas, ou anticapitalistas, inclusive a China e a Índia, os dois melhores exemplos de diminuição de uma miséria ancestral, agravada pelo socialismo que adotaram na segunda metade do século XX.

Muito da produção intelectual nessas áreas é feita de críticas acerbas ao capitalismo e ao liberalismo, e de prescrições para mais estatismo e mais intervencionismo, como se o mundo resultante fosse mais eficiente para se criar riqueza e bem-estar à margem das liberdades capitalistas já enunciadas por Adam Smith no século XVIII. 

Alguma dúvida sobre isso?

A despeito das reiteradas críticas ao capitalismo e ao liberalismo no mundo acadêmico, poucos experimentos efetivos nas últimas décadas se traduziram em movimentos tendentes a implantar regimes anticapitalistas em sua plenitude. Mas boa parte do mundo acadêmico ainda persiste em acreditar que um mundo regulado burocraticamente por instituições estatais seria melhor para a vida de pessoas reais do que a saudável anarquia do sistema capitalista, que sempre foi tendencialmente liberal, a despeito de controles de regulações, inerentemente instáveis e ineficientes.

E por que isso ocorre? A resposta é muito simples. A maior parte dos acadêmicos que pensam assim está apartada do mundo da contabilidade, das tabelas de ganhos e perdas, da lenta acumulação de riquezas vinculada ao esforço constante de controlar ativos e passivos, coisas que estão indissoluvelmente ligadas ao mundo capitalista. São acadêmicos alheios a esse mundo, ou porque são funcionários públicos de universidades ou mesmo quando trabalham em instituições privadas não são ligados ao departamento de contabilidade, e podem assim dedicar-se a devaneios alheios ao mundo dos recursos que pagam seus salários."

Brasília, 1/01/2024

Ficha do trabalho: 

4541. “Uma reflexão sobre o mundo real e o mundo acadêmico dos nossos tempos”, Brasília, 1 janeiro 2024, 1 p. Nota sobre uma das alienações mais frequentes no espaço acadêmico. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2024/01/uma-reflexao-sobre-o-mundo-real-e-o.html); postado novamente no Diplomatizzando (20/04/2024; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2024/04/uma-reflexao-sobre-o-mundo-real-e-o.html). 



O Decálogo do Estadão: seus princípios e valores - O Estado de S. Paulo

A missão do ‘Estadão’

Desde a edição inaugural, em 1875, este jornal se apresenta ao País como um patrono da defesa da liberdade e do espírito republicano; conheça os valores que guiam ‘O Estado de S. Paulo’ há 150 anos

04/01/2025

Desde sua fundação, em 1875, o jornal O Estado de S. Paulo presta serviço à causa da liberdade, aos valores republicanos e ao progresso do Brasil. O decálogo que vai a seguir resume esses princípios, reafirmados diariamente em todas as plataformas do Estadão, como uma renovação permanente da missão de lutar por um País mais justo e próspero para todos os brasileiros.

1. Desde a edição inaugural, ainda como A Província de São Paulo, em 4 de janeiro de 1875, este jornal se apresenta ao País como um patrono da defesa da liberdade e do espírito republicano.

2. O Estadão é um jornal de alma liberal, valorizando a liberdade individual, o empreendedorismo, a propriedade privada, a igualdade perante a lei e a limitação do poder estatal. Para tanto, a liberdade de imprensa é um imperativo, uma vez que o poder estatal sem a devida fiscalização de uma imprensa livre e independente tende a ser arbitrário e corrupto.

3. O Estadão é desde sempre um jornal independente e apartidário, condição que lhe permite estar “em posição de escapar às interposições do governo, às paixões partidárias, e às seduções inerentes aos que aspiram ao poder”, como se lê em seu editorial inaugural.

4. O Estadão exerce constante vigilância sobre o exercício do poder, que deve ser direcionado para o bem comum, e não para o benefício de oligarquias. Nesse sentido, o jornal é intransigente defensor do equilíbrio entre os Poderes da República e do princípio federativo.

5. Defender a liberdade de forma intransigente e não se deixar influenciar pelas pressões e modismos de seu tempo requer coragem. O Estadão é um jornal que diz o que precisa ser dito e defende o que acredita ser o certo. Não é por outra razão que, há 150 anos, o Estadão é a consciência crítica de seu tempo.

6. O Estadão tem lado: jamais abrigará em suas páginas opiniões que atentem contra seus princípios democráticos e republicanos.

7. Este jornal é uma tribuna inabalável de defesa da democracia contra o populismo, a demagogia, o extremismo e todas as formas de autoritarismo. Nos momentos de sua história sesquicentenária em que seus valores foram desafiados pela força dos poderosos de turno, o Estadão se manteve aferrado a seus princípios fundadores, não raro pagando um alto preço pela independência.

8. O Estadão é um jornal irredutivelmente apegado ao regime da lei, em particular ao princípio republicano fundamental: a igualdade de todos os cidadãos perante a lei. Não há democracia sem respeito às leis.

9. O Estadão defende que o Brasil se torne um país mais próspero e justo por meio de políticas públicas destinadas a mitigar a brutal desigualdade socioeconômica que insiste em dividir os brasileiros entre cidadãos de primeira e de segunda classe. O desenvolvimento virá de ações – públicas e privadas – que promovam crescimento econômico sustentado e ambientalmente responsável.

10. O Estadão acredita que a responsabilidade fiscal e a impessoalidade na administração pública são o único caminho para a construção de um Estado que seja eficiente, nem grande nem mínimo, isto é, apto a atender às necessidades mínimas dos cidadãos para uma vida digna, com o manejo racional e transparente dos recursos públicos.

sábado, 4 de janeiro de 2025

Parabéns, Estadão! - Blog do Marcelo Guterman

Desde que eu me conheço por gente, isto é, um estudante, recém saído do primário e começando a aprender as coisas do mundo, e tendo opinião a respeito, eu me informei, e me formei (sobretudo em economia) nas páginas do Estadão, primeiro chamando o vetusto jornal de "reacionário", depois reconhecendo o seu valor, embora nem sempre concordando com seus editoriais, nos quais aprendi muito mais, a ser ponderado, moderado e objetivo. (PRA)

Parabéns, Estadão!

Procurei rapidamente no Google quais são as empresas privadas mais antigas do Brasil ainda em atividade. Combinando algumas fontes, cheguei à seguinte ordem:

1) Cervejaria Bohemia (1853)

2) Casa Granado (1870)

3) Instituto Presbiteriano Mackenzie (1870)

4) Cedro Cachoeira Têxtil (1872)

5) O Estado de São Paulo (1875)

O Estadão, portanto, é a quinta empresa privada brasileira mais antiga em atividade. Não é para muitos, considerando a enorme mortalidade das empresas no inóspito capitalismo brasileiro.

A coisa é ainda mais notável se considerarmos tratar-se de um jornal em uma nação de analfabetos. A circulação dos jornais brasileiros é uma fração da circulação nas nações ricas. Manter-se viável comercialmente, ainda mais em um mundo em que a publicidade está mudando rapidamente, é para poucos.

E mais notável ainda fica quando consideramos os, digamos, “dotes empresariais” da família Mesquita. Enquanto Roberto Marinho construiu um império jornalístico e Otávio Frias expandiu seus negócios para o UOL (que se tornou um dos 10 sites de maior tráfego no Brasil), hospedagem de sites e meios de pagamento (PagSeguro), a única aventura empresarial do grupo foi uma pequena participação na concessionária de telefonia móvel BCP, que nunca conseguiu dar lucro e foi incorporada pela Claro.

Considerando esse histórico, podemos dizer que o Estadão é um pequeno milagre empresarial. Mas essa é só a parte econômica. A parte editorial é ainda mais intrigante.

A Província de São Paulo nasceu como oposição ao regime, um jornal republicano no Império. E assim continuou ao longo desses 150 anos. Foi censurado no Estado Novo e na ditadura militar, sempre seguindo o mote “se hay gobierno, soy contra”. É notável que um jornal com esse tipo de orientação tenha sobrevivido ao longo de 150 anos. Governos vieram e foram, o Estadão permaneceu.

E permaneceu porque o editorial do Estadão verbaliza, como poucos, a opinião pública média da classe média brasileira. Cada um de nós, com nossas próprias convicções e vivendo dentro de nossas próprias câmaras de eco, muitas vezes condenamos aquilo que lemos na página de opinião do jornal. Um dos editoriais mais famosos do jornal foi o “Uma escolha muito difícil”, na véspera do 2o turno entre Bolsonaro e Haddad, em 2018. Da esquerda à direita, o jornal até hoje é condenado por se colocar no muro. Ocorre que, tirando as bolhas, não havia mesmo muita convicção, como não houve em 2022. Lembre-se, a sua opinião é muito respeitável por ser a sua opinião. Mas é só uma opinião.

O editorial do Estadão, assim como o de outros jornais, faz parte de uma coreografia que envolve as elites que detém o poder e a sociedade. O editorial ao mesmo tempo pauta e é pautado, sendo difícil discernir a influência que exerce sobre as decisões políticas e o humor da sociedade. Trata-se de uma dança, em que os parceiros se movimentam de acordo com suas próprias convicções, mas precisam também estar atentos às convicções dos outros, para que a coreografia não saia do ritmo. Não há maestro, o que existe é uma espécie de caldo cultural de onde bebem todos os personagens dessa dança. O editorial do vetusto Estadão é aquele parceiro que resiste a alterar o ritmo, mesmo que a música comece a tocar em uma batida diferente.

Acho graça quando “acusam” o jornal de ter apoiado “isso ou aquilo”, e de depois passar a criticar “isso ou aquilo”. Foi assim na ditadura militar, por exemplo, em que o Estadão, assim como todos os jornais da época, apoiou a deposição de Jango, para, algum tempo depois, passar a criticar o novo regime, a ponto de ser censurado. Hoje não é diferente, só mudaram os personagens: o Estadão apoiou o STF no desmonte da Lava-Jato e hoje lamenta os desmandos da Suprema Corte. Criticou Bolsonaro e agora critica Lula. Acho graça porque exigem do editorial uma espécie de fidelidade partidária, como se uma opinião tivesse que ser fiel a pessoas e não a ideias. Tanto no caso de Jango/militares quanto nos casos Lava-Jato/STF e Bolsonaro/Lula, o combate a um não significa apoio automático ao outro. Para os sectários, que não suportam a ideia de não se apoiar ninguém, essa é uma atitude difícil de engolir.

Mas um jornal não vive somente de opinião. É preciso ter um sólido corpo de repórteres. Aqui, o Estadão não escapa da sina do, em geral, pobre jornalismo que se pratica no Brasil. Eu mesmo não canso de criticar matérias publicadas aqui, com seus erros e vieses. Tendo dito isso, o jornalismo profissional ainda é, e sempre será, imprescindível. Sabemos disso quando, ao receber uma notícia no zapzap, logo buscamos na chamada mídia profissional uma confirmação. Sabemos que as notícias só chegam aos jornais depois de devidamente apuradas. Não há falhas? Claro que há! A natureza humana é falha. Mas, dentro da fragilidade humana, o método jornalístico tradicional ainda é o menos ruim.

Faço menção honrosa ao caderno de Economia do Estadão, que poderia ser um jornal de economia à parte. No geral, as matérias têm excelente qualidade, e atingem um nível de profundidade surpreendentemente profundo para um jornal de temas gerais.

Já é hora de terminar essa singela homenagem. Meu pai já assinava o Estadão desde que me conheço por gente. Portanto, já lá se vão mais de 50 anos lendo o diário paulista. Como já não assisto mais a telejornais regularmente, posso dizer que o Estadão é o veículo de comunicação de maior longevidade na minha vida. É notável como, ao longo de décadas, um jornal muda, mas consegue permanecer o mesmo.

Parabéns, Estadão!

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