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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

A insustentavel posicao cambial brasileira - Francisco Lopes

A advertência é clara: a atual configuração da política econômica brasileira é insustentável no longo prazo, segundo Chico Lopes, ex-presidente do Banco Central. Segundo ele: "A bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015.

Sobre risco cambial, besouros e borboletas
Francisco Lopes
(recebido: 15/06/2011)

A macroeconomia só terá uma configuração sustentável quando a taxa Selic for compatível com o padrão internacional.

É fácil ser otimista sobre a evolução da macroeconomia brasileira no curto prazo. A combinação de juros elevados, taxa de câmbio praticamente estabilizada e menor pressão nos preços internacionais de alimentos e petróleo, reduzirá a inflação em 12 meses do IPCA já a partir de outubro próximo. A inflação de 2012 deverá ficar abaixo de 5%, com a economia mantendo o crescimento na faixa de 4% a 4,5%.

Será, porém, uma vitória de Pirro já que em algum momento ocorrerá uma inevitável correção para cima na cotação do dólar, com alta probabilidade de se transformar numa traumática "parada súbita". A pressão desse ajuste vai trazer de volta a inflação e exigir nova elevação da taxa Selic. Se for um ajuste súbito, haverá também uma freada no crescimento.

A atual configuração da política econômica brasileira é insustentável no longo prazo. Forte crescimento com apreciação cambial no contexto de uma economia mundial com expansão moderada produz inexorável deterioração do balanço de pagamentos. Em algum momento, teremos que interromper o crescimento e ajustar a taxa de câmbio. Com o agravante de que, a despeito do aumento do déficit em transações correntes, a acumulação de reservas internacionais também ganhou velocidade vertiginosa, algo como US$ 100 bilhões por ano. Isso configura uma autêntica "bolha especulativa" que poderá ter graves consequências quando estourar.

"A bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015."

O Brasil, ao contrário da China, não acumula reservas internacionais porque produz superávit nas transações de bens e serviços com o exterior. No nosso caso, a acumulação de reservas resulta apenas do ingresso de capital estrangeiro e, nos últimos doze meses, apenas 20% desse movimento consistiu em aporte direto de capital para empresas, isto é, em ingresso com uma motivação nitidamente de longo prazo. O resto, incluindo aplicações em ações, renda fixa e os empréstimos intercompanhias (que o Banco Central imprecisamente classifica como investimento direto) são certamente ingressos com motivação mais de curto prazo e de natureza bem mais volátil.

O que faz esse capital estrangeiro ter tanta gana de vir para o Brasil? O Banco Central anuncia oficialmente que o regime cambial é de livre flutuação e que só opera no mercado de câmbio para "reduzir a volatilidade". Na prática, nas condições atuais, isso significa que a cotação do dólar fica estável ou realiza um movimento de queda gradual. O que temos então é um verdadeiro paraíso para o especulador estrangeiro que pode facilmente se beneficiar do diferencial nas taxas de juros. Não é uma possibilidade de arbitragem perfeita, como ficou claro em 2008, mas é uma bela oportunidade de ganho com risco reduzido. Como o Brasil ainda não aboliu o forte efeito motivador da possibilidade de arbitragem (mesmo imperfeita) sobre o movimento de capitais, o resultado é o ingresso maciço que estamos observando.

Esse movimento adquire todas as características de uma bolha especulativa quando começa a gerar um mecanismo de retroalimentação. Quanto mais capital entra tanto maior é a pressão de baixa sobre a cotação do dólar e tanto maior a garantia de que o Banco Central vai continuar aplicando sua política de redução da volatilidade para produzir estabilidade ou apreciação gradual. Isto, por sua vez, torna ainda mais atraente o ingresso de capital para arbitrar juros. Na realidade para o especulador a apreciação em si não é importante. Seu ganho principal resulta do diferencial entre as taxas de juros e para isso só é necessário que não ocorra uma desvalorização significativa da taxa de câmbio.

O resultado é a anomalia de um mercado cambial em que tipicamente apenas o Banco Central e os importadores atuam na ponta compradora, com todos os demais operam como vendedores. Isso não resulta apenas da atuação de especuladores profissionais. Considere, por exemplo, o processo de decisão do diretor financeiro de uma grande multinacional que administra o caixa da empresa dentro de uma perspectiva global. Naturalmente vai querer ficar credor no Brasil, ganhando remuneração superior a 12% ao ano e devedor em outros países com custo financeiro muito menor. Isto significa que vai operar como vendedor no mercado cambial brasileiro. Curiosamente esse executivo vai ficar ofendido se lhe disserem que está operando como especulador: afinal, para ele, está apenas fazendo o seu trabalho de administração do caixa. O espaço aqui não me permite citar diversos outros casos concretos que confirmam a natureza especulativa da bolha que se desenvolve agora no nosso mercado de câmbio. Todo mundo enxerga uma possibilidade de ganho aparentemente fácil e quer tirar uma casquinha.

"Controlar a entrada de capital pode simplesmente antecipar o momento de ruptura da bolha."

Bolhas especulativas são fenômenos complexos que não entendemos bem, mas com certeza sabemos que sempre evoluem para o colapso. Nosso palpite é que essa nossa bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015. É impossível saber o momento exato e a sequência exata dos eventos na ruptura, apenas sabemos que ela se tornará mais provável quando o mercado de câmbio transitar da atual posição de excesso permanente de oferta para uma posição de equilíbrio ou de excesso de demanda. Isto inevitavelmente vai resultar da deterioração continuada do déficit no balanço de pagamentos em transações correntes.

Na ruptura, os primeiros a sair tipicamente são os especuladores profissionais. A eliminação do excesso de oferta tira o Banco Central do papel de disciplinador do movimento de apreciação e tende a aumentar a volatilidade do mercado. O especulador sabe que nosso regime de livre flutuação na prática tem sido um regime de flutuação amortecida assimétrica, isto é, a atuação do governo no mercado de câmbio é muito mais decidida para evitar apreciações do que para evitar depreciações. A maior volatilidade do câmbio torna menos favorável a relação risco-retorno e induz o especulador a reduzir sua posição vendida na moeda brasileira. Esse ajuste é muito facilitado pela dimensão do nosso mercado de derivativos de dólar, que é inusitadamente grande para uma economia emergente. A grande liquidez desse mercado torna muito fácil travar qualquer posição vendida em dólar, e isso vale tanto para os especuladores profissionais como para qualquer empresa ou investidor.

Como em todo colapso de bolha, o movimento pode ser iniciado por um pequeno grupo de profissionais, mas depois se alastra rapidamente e ganha amplitude e intensidade. O resultado é uma forte e rápida depreciação da taxa de câmbio.

Idealmente o Banco Central pode tentar administrar esse ajuste, produzindo uma transição lenta e suave da taxa de câmbio para o novo patamar sustentável de equilíbrio e dessa forma evitando o "overshooting" característico dos colapsos de bolha. Para isso terá que operar com determinação e intensidade na ponta vendedora tanto no mercado de dólar à vista como no mercado de derivativos através de futuros e swaps. Naturalmente, a venda de dólar num mercado cambial em movimento de alta produzirá prejuízo para o erário público, mas isso será mais do que compensado pelos benefícios de se evitar a parada súbita.

De fato uma das poucas coisas que o governo pode fazer agora diante da perspectiva de um inevitável ajuste cambial no futuro é preparar seus planos de contingência para uma operação desse tipo, isto é de amortecimento da desvalorização.

Em particular, tanto o Banco Central como outras áreas mais politizadas do governo têm que estar psicologicamente preparadas para entregar aos "malditos especuladores" o botim resultante de suas operações cambiais no país, sendo que isso poderá significar a perda de um grande e imprevisível volume de reservas internacionais (metade das reservas, por exemplo?).

É importante entender, porém, que não existem alternativas viáveis de controle de capitais para escapar de uma bolha que já se instalou e se desenvolve a pleno vapor. A introdução de controles sobre a entrada de capital, como tem sido tentado recentemente, apenas bloqueia alguns canais de entrada e redireciona o movimento para outros canais. Por outro lado uma aplicação muito ampla desses controles pode simplesmente antecipar o momento de ruptura da bolha. A alternativa de controles sobre a saída de capital poderá parecer tentadora quando a bolha começar a estourar, mas ela nunca é eficaz se adotada em apenas um segmento do mercado. Ou seja, a opção de controle sobre a saída de capitais é na realidade uma opção pela centralização total do câmbio, o que seria um lamentável retrocesso na política econômica brasileira.

Será possível promover uma saída ordenada da bolha e um ajuste gradual da taxa de câmbio? Temos que torcer que sim, mas qualquer operador com experiência em mercados especulativos provavelmente dirá que não. Ou seja, é bom estar preparado para um comportamento do mercado de câmbio semelhante ao que ocorreu em 2008 (ou mesmo 2003), desta vez possivelmente com ainda maior overshooting em virtude dos grandes montantes envolvidos.

É interessante notar que 2008 foi uma oportunidade perdida para se obter uma nova configuração sustentável para nossa macroeconomia. A crise mundial produziu forte desvalorização cambial e o Banco Central reagiu corretamente baixando a Selic de 13,75% ao final de 2008 para 8,75% em junho de 2009, uma redução de 5 pontos percentuais. Na realidade, porém, essa redução resultou muito tímida, principalmente considerando que no mesmo período o banco central americano também se moveu na mesma direção. Como a taxa do Federal Reserve (Fed, banco central americano) caiu de 5,25% em meados de 2007 para praticamente zero ao final de 2008, a redução da Selic foi inferior à do juro americano.

A cotação do dólar voltou a cair rapidamente e em outubro de 2009 já tinha voltado para próximo de R$ 1,70, praticamente anulando toda a desvalorização anterior. A operação correta naquela ocasião teria sido reduzir a taxa Selic muito mais agressivamente, ainda que ao custo de uma taxa de inflação um pouco maior num período transitório.

Não é nossa intenção aqui fazer uma crítica à atuação do BC no contexto de crise internacional de 2008, já que naquele ambiente de incerteza não seria fácil adotar uma tática de atuação muito diferente de seu padrão tradicional. Devemos lembrar também que algumas das pré-condições necessárias para uma redução mais agressiva da taxa de juros não estavam presentes, entre elas a eliminação do piso imposto pela regra atual de remuneração da caderneta de poupança. Na realidade, como sugeri no artigo "A Estabilização Incompleta", do livro Novos Dilemas da Política Econômica (editado por Edmar Bacha e Mônica Bolle, LTC 2011), o trabalho de construção do arcabouço institucional necessário para a consolidação da estabilidade ainda está longe de concluído.

Essas considerações nos levam ao que parece ser a questão central. Só vamos ter uma configuração sustentável de nossa macroeconomia quando a taxa Selic for compatível com o padrão internacional, admitindo-se um pequeno prêmio de risco. Isso seria talvez algo como 3% a 4% ao ano agora, e algo como 6% a 7% quando a taxa de juros do Fed voltar para o patamar de 4% a 5% daqui a alguns anos. Essas taxas de juros poderiam ser ainda menores com uma meta de inflação menor.

Um nível "normal" de taxa de juros é pré-condição para que possamos adotar uma verdadeira flutuação cambial, com o governo se abstendo de qualquer interferência no mercado de câmbio. Só então vamos descobrir qual é realmente a taxa de câmbio de equilíbrio da nossa economia, e só então o regime de metas de inflação poderá operar da forma como foi teoricamente desenhado para operar, produzindo uma trajetória de crescimento econômico sustentável com inflação controlada.

Para evitar mal entendido quero enfatizar que sou totalmente favorável à ideia do tripé estabilizador, composto por austeridade fiscal, flutuação cambial e regime de metas de inflação. As vantagens do tripé, introduzido ainda no governo FHC, são inequívocas. Sabemos que funciona muito bem nos países desenvolvidos que o adotam, como Suécia ou Inglaterra.

No Brasil, porém, o tripé estabilizador é meio de mentirinha. Teoricamente existe flutuação cambial, mas na prática o movimento da taxa de câmbio é inibido pela intervenção rotineira do Banco Central. Por outro lado, nosso principal instrumento de política monetária, a taxa Selic, tem impacto muito reduzido sobre o nível de atividade e a inflação. A austeridade fiscal existe mais no discurso do que na prática. Ou seja, o regime se apresenta como de metas de inflação, mas alguns de seus pressupostos básicos não estão presentes.

Um comentário final sobre o título deste artigo. A evolução atual da macroeconomia brasileira me faz lembrar o voo de um besouro. A primeira vista a aerodinâmica do besouro não devia permitir que voasse, não obstante ele é capaz de voos curtos. São voos deselegantes que mais parecem sequências de saltos. Certamente um besouro não tem a capacidade de voo de uma borboleta. Muitos analistas quando discutem nossa macroeconomia parecem acreditar que estão analisando uma borboleta, com toda sua beleza e complexas piruetas. Não se pode negar que são elegantes e divertidos os debates sobre a delicada calibragem da taxa Selic, os ciclos de ajuste e relaxamento da política monetária, o papel das medidas macroprudenciais, a coordenação das políticas monetária e fiscal, o impacto do "dólar index" sobre a taxa de câmbio real-dólar e tudo mais. Os analistas parecem esquecer, porém, que as importantes deformidades que ainda existem em nossa economia nos permitem no máximo pensar em um voo de besouro. Infelizmente um besouro voador não se transforma automaticamente numa aerodinâmica borboleta. É fundamental ter em mente que o trabalho de construção das precondições institucionais para a consolidação da estabilidade ainda está longe de concluído e, na verdade, avançou muito pouco nos governos petistas. Isto ficará novamente claro na próxima crise cambial.

O autor agradece os comentários de Edmar Bacha, sem naturalmente implicá-lo em suas heterodoxias.
Francisco Lopes é sócio principal da consultoria Macrométrica

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Comentários do economisa Ricardo Bergamini:

O que o Chico Lopes escreveu abaixo venho demonstrado de longa data:

1) Mesmo com o saldo de reservas de US$ 288,6 bilhões o Brasil está no limite da crise cambial em função do déficit nas transações correntes.

2) O Brasil está sendo financiado pelos investimentos externos em função dos juros altos, não pelo seu comércio exterior. Qualquer susto do mercado financeiro a explosão será inevitável.

3) O atual governo terá que resolver a difícil dicotomia da política externa brasileira, qual seja: juros altos atraem investimentos externos que valorizam o real, diminuindo a competição dos produtos brasileiros no exterior, e consequentemente aumentando os déficits nas transações correntes.

Deficit fiscal do Brasil maior do que anunciado oficialmente

Era o que eu desconfiava, sem poder afirmar expressamente por falta de dados ou de metodologia adequada, mas podia-se perceber uma nítida deterioração nas contas públicas brasileiras e um intenso movimento (heterodoxo) do governo em esconder esse fato, maquiando a contabilidade das transferências do Tesouro a bancos públicos.
Paulo Roberto de Almeida

Estatística subestima deficit público, diz ex-presidente do BC
GUSTAVO PATU
Folha de S.Paulo, 15 de junho de 2011

Rombo em contas é maior quando usados os mesmos critérios de países desenvolvidos

BRASÍLIA - A real dimensão do desequilíbrio das contas do governo é mascarada pela metodologia adotada no país para apurar o deficit público, diz estudo assinado pelo economista Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central no governo FHC.
Se calculado por critérios do mundo desenvolvido, o deficit de União, Estados e municípios chegaria no ano passado ao equivalente a 12% do PIB, segundo o trabalho. As estatísticas oficiais apontam deficit modesto, de 2,55% do PIB, em 2010.
O estudo -uma versão preliminar, ressalva o autor- foi preparado para o seminário "A taxa de juros no Brasil", promovido anteontem em São Paulo pelo CLP (Centro de Liderança Pública) e pela Casa do Saber.
Franco associa a anomalia dos juros brasileiros, desde os anos 90 entre os mais altos do mundo, a um desequilíbrio nas contas públicas, que passa despercebido porque a contabilidade nacional considera as despesas com juros, mas não amortizações da dívida pública.
As amortizações estão fora da conta desde os tempos da superinflação, quando o governo tinha de trocar diariamente os títulos de sua dívida. Como a compra de um papel equivale contabilmente a uma amortização, a prática inflava e distorcia os números do deficit.
Para o economista, a metodologia que escolheu é "imperfeita e enviesada como de resto todas são", mas chama a atenção para o problema dos prazos ainda muito curtos da dívida pública.
"Os governos preferem versões adocicadas dos problemas que realmente têm e relutam em reconhecê-los em sua verdadeira dimensão. Sem esse reconhecimento, porém, prevalece a noção de que não há nada a fazer nesse terreno."
Entre os cinco debatedores do seminário -Franco, André Lara Resende, também da equipe do Plano Real, Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, Yoshiaki Nakano, da FGV, e Samuel Pessoa, da consultoria Tendências- houve quase consenso em atribuir os juros recordes do país à fragilidade fiscal.
Se houve convergência no diagnóstico, os presentes não pareceram confiantes na viabilidade política das alternativas de tratamento.
Belluzzo defendeu que o governo busque um superavit nominal. Hoje só há superavit primário, ou seja, sem considerar os encargos com juros da dívida.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Seminario Cindes: Agenda internacional e Brasil

Participei, na sexta-feira 10 de junho do seminário em comemoração aos 5 anos do Cindes:

A agenda econômica internacional do Brasil – desafios para os próximos anos

cujo programa, acompanhado das apresentações segue abaixo.
Cada uma delas pode ser visualizada a partir deste link.

Programa - A agenda econômica internacional do Brasil – desafios para os próximos anos

Apresentação PPT- Dinâmica das Potências Climáticas, Governança Global e Transição para o Baixo Carbono
por Eduardo Viola, Jun 2011
Apresentação PPT - The Global Shift in Wealth
por Régis Avanthay, Jun 2011
Apresentação PPT - A agenda econômica internacional em transformação e o Brasil
por Paulo Roberto de Almeida, Jun 2011
Apresentação PPT - Índia (e China): Oportunidades, Lições e Desafios para o Brasil
por Mauricio Mesquita Moreira, Jun 2011
Apresentação PPT - Large Devaluations, Foreign Direct Investment and Exports
por Daniel Lederman, Jun 2011
Apresentação PPT - A agenda econômica internacional do Brasil
por José Roberto Mendonça de Barros, Jun 2011
Apresentação PPT - Indicadores de rentabilidade e desempenho das exportações de manufaturados
por Roberto Iglesias, Jun 2011

Os debates, infelizmente não transcritos, foram mais estimulantes ainda.
Alguns participantes apreciariam minha colocação sobre as novas saúvas do Brasil, as pedagogas freireanas concentradas no MEC que estão destruindo a educação no Brasil.

Paulo Roberto de Almeida

A China ainda pode fracassar - Martin Wolf

Um século atrás, o Brasil tinha uma renda per capita que era aproximadamente 12% da renda per capita dos americanos, ao passo que os argentinos exibiam mais de 70% dessa proporção. Depois de termos alcançado cerca de um quarto daquela renda, na fase de maior crescimento, recuamos hoje para menos de 20%, enquanto os argentinos recuaram absoluta e relativamente, caindo para cerca de 30% da renda per capita dos americanos, ou seja, um fracasso rotundo, ao passo que nosso "sucesso" foi muito modesto.
Desde o século 18, a China passou de maior economia mundial (33% do PIB global, mas é verdade que pouco disso realizado no comércio internacional), para menos de 5% do PIB, no auge dos delírios econômicos maoistas, que aliás foram responsáveis por uma mortandade pavorosa de dezenas de milhões de pessoas.
A China cresce espetacularmente a cerca de 10% do PIB e mais de 8% per capita anual, desde os anos 1980, o que JAMAIS foi visto na história econômica mundial, e que jamais será visto novamente por qualquer outro país. Com isso, a China saiu de uma miséria execrável para uma pobreza aceitável, mas com muita desigualdade também: ilhas de abundância e de luxo, e muitos camponeses pobres, ainda. Em todo caso, ela parece ter conseguido fazer o seu "dever de casa", ainda que com traços autoritários que não merecem ser imitados por nenhum outro país, com desrespeito dos direitos humanos, censura total e autocracia política que, felizmente, evoluiu do totalitarismo comunista para um autoritarismo monopolístico sem muita ideologia aparente.
Desejamos sucesso aos chineses, e sobretudo que eles possam sair da autocracia do PCC para um regime aberto e pluralístico, com vigência total das liberdades democráticas.
Paulo Roberto de Almeida

Como a China ainda pode fracassar
Martin Wolf
Valor Econômico, 15/06/2011 (Financial Times)
Plano prevê desaceleração do crescimento para apenas 7% por ano.

Até 1990, o Japão era a grande economia mais bem-sucedida do mundo. Quase ninguém previa o que aconteceria ao país nas décadas seguintes. Hoje, as pessoas mostram-se ainda mais assombradas com os feitos da China. É concebível que esse colosso possa descobrir que êxitos espetaculares sejam precursores de fracassos surpreendentes? A resposta é "sim".

O Produto Interno Bruto (PIB) do Japão per capita (pela paridade do poder de compra), que em 1950 era de 20% do verificado nos Estados Unidos, saltou para 90% em 1990. Essa convergência espetacular, porém, passou a andar para trás: em 2010, o PIB per capita japonês havia caído para 76% do registrado nos EUA. O PIB per capita na China passou de 3% do americano em 1978, quando Deng Xiaoping iniciou a "reforma e abertura", para 20% do verificado nos EUA de hoje. Será que o país prosseguirá de forma tão impressionante nas próximas décadas ou será que a China, também, surpreenderá com uma queda?

É fácil apresentar argumentos otimistas. Primeiro, a China tem histórico comprovado de sucesso, com taxa de crescimento médio da economia de 10% entre 1979 e 2010. Segundo, a China está muito distante dos padrões de vida dos países de alta renda. Em relação aos EUA, seu PIB per capita está no ponto em que estava o do Japão em 1950, antes do que viria a ser um período de 25 anos de crescimento elevado. Se a China igualar o desempenho do Japão, seu PIB per capita será de 70% o dos EUA em 2035 e sua economia será maior que a dos EUA e União Europeia somadas.

Há, entretanto, contra-argumentos. Um é o de que o tamanho da China é uma desvantagem: em particular, torna sua ascensão muito mais dramática para a demanda por recursos do que qualquer coisa já vista antes. Outro é que os efeitos políticos decorrentes de tal transformação podem ser impactantes para um país comandado por um partido comunista. Também é possível propor argumentos puramente econômicos para a ideia de que o crescimento poderia desacelerar-se de forma mais abrupta do que a maioria presume.
É muito difícil para um país investindo metade do PIB desacelerar suavemente. A transição para uma expansão econômica mais lenta será um caminho bastante esburacado. O governo chinês é hábil. Mas não consegue andar sobre as águas.

Tais argumentos apoiam-se em duas características da situação chinesa. A primeira é que é um país de renda média. Economistas admitem, cada vez mais, a "armadilha da renda média". Portanto, é difícil sustentar fortes aumentos na produtividade e administrar grandes mudanças estruturais, à medida que a economia se torna mais sofisticada. Nos últimos 60 anos, Japão, Coreia do Sul, Taiwan, Hong Kong e Cingapura foram praticamente as únicas economias a conseguir o feito nos últimos 60 anos.

O próprio primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, descreveu a economia como "instável, desequilibrada, descoordenada e, no fim das contas, insustentável". A natureza do desafio ficou evidente para mim durante as discussões do 12º plano quinquenal do país, no Fórum de Desenvolvimento da China 2011, realizado em Pequim, em março. O novo plano defende uma mudança profunda no ritmo e estrutura do crescimento econômico. Em particular, prevê-se desaceleração do crescimento para apenas 7% por ano. Mais importante, espera-se que a economia se reequilibre em relação ao forte peso dos investimentos, movendo-se mais em direção ao consumo e, em parte como resultado disso, da indústria para o setor de serviços.

Os investimentos de fato cresceram bem mais que o PIB. Entre 2000 e 2010, o crescimento médio da formação bruta de capital fixo, indicador dos investimentos, foi de 13,3%, enquanto o aumento médio do consumo privado foi de 7,8%. Ao longo do mesmo período, a participação do consumo privado no PIB caiu de 46% para menos 34%, enquanto a dos investimentos subiu de 34% para 46%.

O professor Michael Pettis, da Guanghua School of Management, da Universidade de Pequim argumenta que a supressão dos salários, a imensa expansão do crédito barato e taxa de câmbio reprimida foram formas de transferir renda das famílias para as empresas e, subsequentemente, do consumo ao investimento. Dwight Perkins, de Harvard, argumentou no Fórum de Desenvolvimento da China que o volume de capital necessário por unidade adicional do PIB (Icor, na sigla em inglês) subiu de uma relação de 3,7 para 1 na década de 90, a uma de 4,25 para 1 na de 2000. Isso também indica que os retornos vêm diminuindo.

Se o padrão de crescimento for revertido, como deseja o governo, a expansão dos investimentos precisa ser menor que a do PIB. É o que ocorreu no Japão nos anos 90, com resultados sombrios. A tese proposta pelo professor Pettis é que uma estratégia de investimentos forçados normalmente acabará com um golpe. A questão é quando. Na China, isso pode ocorrer antes, dentro do processo de crescimento, do que no Japão, porque os investimentos são altos demais. Grande parte dos investimentos agora em andamento será deficitária sem um suporte artificial, argumenta. Um indicador, sugere, é o forte crescimento do crédito. George Magnus, do UBS, também destacou no "Financial Times", em 3 de maio, que a intensidade de crédito no crescimento chinês aumentou acentuadamente. Isso também lembra o Japão do fim dos anos 80, quando a tentativa de sustentar o crescimento em uma demanda doméstica que era puxada pelos investimentos levou a uma expansão de crédito destrutiva.

À medida que o crescimento desacelerar, a demanda por investimentos certamente encolherá. Com uma expansão de 7%, a taxa necessária de investimentos poderia cair para até 15% do PIB. Mas a tentativa de transferir renda para as famílias poderia forçar a um declínio ainda maior. De motor de crescimento, o investimento poderia tornar-se fonte de estagnação.

A visão otimista é que o crescimento potencial da China é tão grande que o país pode administrar a transição planejada com tranquilidade. A visão pessimista é que é muito difícil para um país investindo metade do PIB desacelerar suavemente. Suponho que a transição para uma expansão econômica mais lenta e para uma maior dependência em relação ao consumo será um caminho bastante esburacado. O governo chinês é hábil. Mas não consegue andar sobre as águas. As águas pelas quais terá de andar na próxima década serão bem agitadas. Cuidado com as ondas.

Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT

Grupo de inteligencia antidumping: uma contradicao nos termos?

A rigor, grupo e inteligência me parecem um pouco antinômicos, mas digamos que pessoas podem ser inteligentes conjuntamente, o que é teoricamente possível, mas raro na prática.
Agora, aplicados os procedimentos a comércio exterior, o resultado só pode ser desinteligência e protecionismo, pois dificilmente alguém, nesse grupo, baterá no peito para dizer:

"Eu sou a favor do livre-comércio, da concorrência irrestrita, da abertura unilateral".

Acho que ainda não nasceu o louco capaz de dizer isso, e se nasceu, não está certamente no governo, e se estiver, vai ficar quieto.
Em suma, acho que vem mais protecionismo por aí.
Brasileiras e brasileiros: vocês vão começar a pagar mais caro por certos bens, estejam certos disso. Não foi por falta de aviso meu...
Paulo Roberto de Almeida

Grupo combaterá dumping e importações fraudulentas
Luciana Otoni e Marta Watanabe
Valor Econômico, 15/06/2011

De Brasília e São Paulo - O governo federal vai criar até o fim do mês um grupo de inteligência antidumping que terá por alvos preferenciais as importações suspeitas de preços fraudulentos e de adulteração de origem. Integrado por representantes do Ministério do Desenvolvimento e da Receita Federal, o grupo também atuará com o suporte de informações aos diferentes órgãos federais ligados ao comércio exterior, como Ministério da Agricultura, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Inmetro. A proposta é criar uma plataforma de dados para auxiliar o Ministério do Desenvolvimento e a Receita na identificação e combate às importações suspeitas de dumping.

O grupo também terá por atribuição auxiliar os setores mais expostos à concorrência externa a apresentar ao governo pedidos consistentes de abertura de investigação para adoção de medidas antidumping. Em outra frente, atuará para fazer com que o governo acelere a abertura e a conclusão de investigações sobre casos de circunvenção - operações que tentam contornar barreiras antidumping por meio da adulteração do país de origem das mercadorias.

O setor têxtil é, ao lado do de calçados, um dos alvos das importações irregulares feitas por adulteração de origem. Em maio, o Ministério do Desenvolvimento abriu a primeira investigação de circunvenção para apurar denúncias relacionadas à importação de cobertores de fibras sintéticas. Desde abril de 2010, os cobertores fabricados na China estão submetidos a sobretaxa de US$ 5,22 por quilo.

As medidas antidumping provocam também a estocagem de produtos assim que a investigação é iniciada. De 11 investigações em curso, abertas em 2010, em seis delas - panelas de inox, tubos de aço, papel cuchê leve, laminados planos, vidros incolores e sal grosso - houve aumento no valor importado. O movimento de antecipação de compras nesses casos foi detectado pelo Ministério do Desenvolvimento, que colocou sob licença prévia de importação os itens submetidos a investigação. Outra arma eficaz, diz Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior, é intensificar o uso do direito antidumping provisório - a aplicação da penalidade antes da conclusão do processo.

Estudantes de RI: estagios na OMA e na OMC

O desafio das parcerias acadêmicas com a OMA e a OMC
LEONARDO CORREIA LIMA MACEDO *
Aduaneiras, 14 Junho 2011
Blog Direito Aduaneiro e Comércio Exterior

Os Acordos, Convenções e demais instrumentos existentes na Organização Mundial do Comércio (OMC) e na Organização Mundial de Aduanas (OMA) trazem à tona importantes questões para os estudantes e profissionais brasileiros: Qual o perfil dos cursos de comércio exterior e relações internacionais para o mercado de trabalho? Como os estudantes e profissionais podem adquirir tais conhecimentos? Como funcionam as parcerias ofertadas por esses organismos?

A discussão das parcerias acadêmicas com os organismos internacionais é oportuna, pois, apesar do excelente nível das instituições brasileiras, o País carece de representação nas iniciativas acadêmicas existentes em ambos os organismos multilaterais.

A OMA tem buscado uma maior aproximação com o setor acadêmico por intermédio do Programa de Parcerias para a Pesquisa e Desenvolvimento Acadêmico Aduaneiro (Picard), criado em 2006 para estabelecer um marco de cooperação entre as Aduanas e a comunidade acadêmica.

Graças ao Picard foi estabelecida a Rede Internacional de Universidades Aduaneiras (INCU). A rede conta com a adesão de mais de 50 centros e publica regularmente o Jornal Mundial da Aduana (World Customs Journal).

Uma conquista importante do Picard foi a definição de um padrão profissional com o conjunto de disciplinas e assuntos de interesse para a área aduaneira. As instituições aptas a ministrar cursos em conformidade com as normas curriculares do Picard podem se candidatar para o reconhecimento da OMA. As Universidades de Canberra, Lausanne, Leeds, Münster e a Universidade Técnica de Riga fizeram progressos diversos nessa direção. O padrão profissional deveria ser analisado para adoção no Brasil.

O Picard realizou com sucesso sua conferência de 2010 em Abu Dhabi. A conferência reuniu profissionais e acadêmicos interessados na matéria aduaneira para discutir os seguintes temas: a colaboração Aduanas-Empresas, as ferramentas para mensuração dos processos aduaneiros, a arrecadação de impostos aduaneiros e as implicações das mudanças climáticas na gestão aduaneira.

Nessa mesma linha, a OMC promove o programa Chairs cujo objetivo é apoiar instituições de ensino e pesquisadores, em especial de países em desenvolvimento, na realização de cursos, pesquisas e outras atividades relacionadas aos temas do comércio internacional. Para receber o apoio do programa foi instituída uma seleção. Na primeira fase do programa foram selecionados 14 centros de ensino pertencentes, dentre outros, aos seguintes países: Argentina, China, Chile, Indonésia e Rússia.

Apesar de direcionado às instituições acadêmicas de países em desenvolvimento, o programa também é aberto a instituições de países desenvolvidos, particularmente àquelas que cooperam estreitamente com países em desenvolvimento.

Os selecionados pelo Chairs são convidados a assumir a liderança na preparação de eventos, discussão de temas e estabelecimento de parcerias com outros centros. Em contrapartida, a OMC passa a fornecer o suporte necessário para a discussão dos temas, inclusive com o envio de representantes. A médio e longo prazo os participantes devem adquirir os conhecimentos necessários para liderar outras discussões inseridas no contexto da governança global, economia internacional e direito do comércio internacional.

Além do programa Chairs, outras atividades, tais como a organização de seminários regionais para professores, a organização de atividades acadêmicas nacionais, o suporte a bibliotecas, o apoio a programas de estudo de doutorado e o apoio a pesquisadores visitantes, fazem parte do programa de assistência técnica e fortalecimento de capacidades da OMC.

Mesmo as instituições mais conservadoras devem admitir que a dimensão internacional é de grande importância para o reconhecimento acadêmico. E que existe um amplo espaço para o crescimento na área. O desafio das parcerias está ao alcance de todas as instituições universitárias e pode ajudar a comunidade acadêmica a ampliar seus horizontes.

Para tanto, o primeiro desafio é tomar conhecimento dos programas disponíveis e direcionar esforços de forma a harmonizar os cursos e pesquisas com os padrões dos organismos multilaterais de maior interesse para a instituição. As instituições do futuro precisam ser localmente relevantes e globalmente engajadas. A tarefa deverá render bons frutos a todos.

* Auditor-Fiscal, Oficial Técnico da Organização Mundial de Aduanas (OMA), facilitador da Organização Mundial de Comércio (OMC) e autor do livro: Direito Tributário no Comércio Internacional.

E por falar em censura...: Brasil esconde fatos históricos...

Na verdade, eu pessoalmente considero toda essa conversa em torno da guerra do Paraguai e de supostos documentos diplomáticos sensíveis uma balela e uma desculpa esfarrapada, a começar pelo fato de que nenhum -- repito NENHUM - dos que se utilizam desse argumento saberia explicitar o que exatamente se está protegendo, em relação a quais fatos do passado e quais países, exatamente.
Tudo isso é um subterfúgio para evitar a transparência sobre fatos muito presentes ainda na memória dos brasileiros, ocorridos menos de uma geração atrás...
Paulo Roberto de Almeida

Presidente Dilma, anote o nome deles!
Luiz Cláudio Cunha*
Congresso em Foco, 14/06/2011

"A presidente deveria respeitar mais sua própria história, bem mais exemplar do que a de seus dois oblíquos aliados e antecessores. Dilma combateu de armas na mão o regime militar que Collor e Sarney apoiaram sem peias, nem meias medidas"

Presidente Dilma, que coisa feia, hein?

Resistiu bravamente à pressão do ex-presidente Lula e agora está sucumbindo vergonhosamente à pressão combinada dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney.

Semana passada, apesar do bafo salvador de Lula, que carimbou Antônio Palocci como “o Pelé da Economia”, Dilma defenestrou o poderoso ministro-chefe do Gabinete Civil, aquele que caiu no governo passado por estuprar o sigilo do caseiro e que voltou a cair neste governo pela comovente defesa da virgindade de seu próprio sigilo.

Esta semana começa com Dilma se dispondo a manter o abjeto ‘sigilo eterno’ (sic) sobre documentos oficiais, uma ignomínia que atravessou incólume os 16 anos de governo somados do sociólogo FHC e do metalúrgico Lula, uma dupla que garantia ter um pé na cozinha da esquerda mais consciente.

Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Fernando Collor sentou em cima do projeto original de Dilma, que quebrava a eternidade do sigilo e permitia o máximo de 50 anos de segredo.

“É temerário”, repudiou o senador das Alagoas, alegando “constrangimentos diplomáticos” para fatos como a ditadura militar (1964-1985), o Estado Novo getulista (1937-1945) e até a Guerra do Paraguai (1864-1870), episódio este ocorrido há século e meio e que levou à morte 50 mil brasileiros.

Presidente do Senado Federal, José Sarney vem agora em socorro de seu temerário sucessor no Palácio do Planalto, alegando que segredos eternos evitariam lesões nas relações diplomáticas do Brasil com seus vizinhos.

“Documentos que fazem parte de nossa história diplomática, que tenham articulações como Rio Branco teve que fazer muitas vezes, não podem ser revelados, senão vamos abrir feridas”, explicou, sem explicar nada, o cuidadoso Sarney, que nasceu 18 anos após o falecimento do Barão do Rio Branco (1845-1912).

Diante da curiosidade geral, cabe a pergunta: que feridas, cara-pálida?

O que poderia sangrar tanto nossa diplomacia? Que bobagens teria cometido o bom barão, o homem que redesenhou nossas fronteiras, para merecer esta santa proteção do bem informado Sarney?

Dias atrás Sarney expurgou da exposição oficial do ‘túnel do tempo’ do Senado o glorioso impeachment de Collor — o único afastamento legal de um presidente em 122 anos de República —, relegado por seu solidário colega de sigilo como um simples ‘incidente’, talvez uma ferida a ser escondida.

É sempre bom lembrar que, dentro de 48 dias, completam-se dois anos em que o jornal O Estado de S.Paulo vive sob a censura patrocinada pela família Sarney, que deseja um sigilo eterno para as estripulias do filho do senador, Fernando, indiciado na (agora secreta) ‘Operação Boi-Barrica’ da Polícia Federal por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e caixa 2.

Sabemos todos o que teme no presente o senador Sarney, mas ninguém imagina o que no passado pode assustar tanto o senador Collor, que aparenta um personagem bifronte da política brasileira.

Na tribuna, com voz grave e empostada, porte ereto e ternos sem vinco que parecem recém saídos da lavanderia, Collor pode ser confundido com um lorde inglês desavindo num parlamento qualquer ao sul do Equador. De repente, porém, Collor pode perder a compostura, o palavreado e a elegância para revelar seu lado mais tosco, mais agreste, mais indecoroso.

Como fez em 2009, quando ganhou a imortalidade dos anais para um fétido discurso, no plenário do Senado, onde confessava que estava ‘obrando, obrando e obrando” na cabeça de um colunista da revista Veja. Como fez em 2010, quando ameaçou enfiar a mão na cara de um repórter da IstoÉ, num telefonema gravado onde o polido senador distinguia o jornalista como “filho da puta”.

Sabemos todos o que são Sarney e Collor. O que não se sabe, porém, é o que pretende Dilma Rousseff ao capitular diante de argumentos tão pífios de uma dupla de ex-presidentes tão contestados por episódios tão polêmicos no passado e no presente.

Dilma fez muito bem ao seu governo ao se livrar, em boa hora, de Palocci. Dilma faz muito mal à sua biografia ao se render tão facilmente aos desígnios pouco claros de Collor e Sarney.

A presidente da República deveria respeitar mais sua própria história, bem mais exemplar do que a de seus dois oblíquos aliados e antecessores. Dilma combateu de armas na mão o regime militar que Collor e Sarney, no verdor da idade e no fervor da utilidade, apoiaram sem peias, nem meias medidas.

Um foi jovem da ARENA, outro foi cacique da velha ARENA. Dilma foi ao limite do sangue para combater essa gente e aquele regime.

Agora mesmo, 39 documentos sustentam uma ação civil pública na 4ª Vara Cível de São Paulo contra três oficiais do Exército e um da PM paulista, integrantes da Operação Bandeirante (OBAN), mãe do DOI-CODI da rua Tutóia, símbolo maior da repressão da regime.

O grupo é acusado pela morte de seis presos políticos e pela tortura em outros 20. Um dos acusados pelo suplício é o tenente-coronel reformado do Exército Maurício Lopes Lima, uma das presas torturadas é uma guerrilheira de 22 anos da VAR-Palmares chamada Dilma Rousseff.

Com o cinismo típico de sua turma, o coronel Lopes Lima deu uma entrevista, em novembro passado, logo após a eleição de Dilma: “Se eu soubesse naquela época (1970) que ela seria presidente, eu teria pedido – ‘Anota aí meu nome, eu sou bonzinho’”, admitiu ao jornal Tribuna de Santos.

O coronel teve o seu nome anotado pela história, como queria, mas com certeza não era bonzinho — apesar da fantasia de pacato veranista que hoje desfila nas águas mansas da praia das Astúrias, no Guarujá do litoral paulista, onde vive.

O frade dominicano Tito de Alencar Lima, o Frei Tito, sobreviveu a terríveis torturas no DOPS do delegado Fleury. O que restava dele foi levado ao DOI-CODI do coronel Lopes Lima, que o deixou sob o trato de seis homens de sua equipe e do inefável pau-de-arara. No seu depoimento, frei Tito contou: “O capitão Maurício veio me buscar em companhia de dois policiais: ‘Você agora vai conhecer a sucursal do inferno’, ele me disse”.

Meses depois, cada vez mais atormentado pelos fantasmas da tortura, frei Tito foi para o exílio e acabou se enforcando numa árvore de um mosteiro nos arredores de Lyon, França, em 1974, um mês antes de completar 30 anos.

Agora, com a candura dos impunes, o coronel que teve seu nome anotado por Dilma e frei Tito reconhece: “Tortura no Brasil era a coisa mais corriqueira que tinha. Toda delegacia tinha seu pau-de-arara. Dizer que não houve tortura é mentira, mas dizer que todo delegado torturava também é mentira. Dependia da índole”.

Dilma conhecia bem a índole da turma do capitão Lopes Lima, que ela mesma impugnou como testemunha de acusação no seu processo da Justiça Militar: “O capitão é torturador e, portanto, não pode ser testemunha”, alegou Dilma, com lógica exemplar e o nome do bonzinho Lopes Lima devidamente anotado.

Apesar da natureza de seu algoz, Dilma sobreviveu a 22 dias de tortura e superou o trauma da dor. Quatro décadas e uma ditadura depois, em vez de escalar os galhos do balouçante desespero de Tito, Dilma subiu a rampa do Planalto como primeira mulher eleita presidente sobre o chão sólido da democracia.

Os homens que machucaram e atormentaram gente como Tito e Dilma eram simpatizantes, aliados, partidários e defensores do regime sustentado pela ARENA de gente como Sarney e Collor.

Entende-se, claramente, porque Sarney e Collor defendem o sigilo eterno.

O que não se entende, presidente Dilma, é como a senhora possa estar ao lado dessa gente, depois de tudo o que a senhora fez, depois de tudo o que eles fizeram.

Os nomes deles, presidente Dilma, estão todos anotados.

Sarney e Collor, presidente, não eram bonzinhos. Nunca foram.

Por favor, anote aí!

*Luiz Cláudio Cunha é jornalista.

Internet como direito humano basico: ONU no bom caminho

Não tenho certeza de que todos os governos aderirão a esta concepção. Não tenho certeza de que o Brasil aderirá plenamente, se não à letra, talvez ao espírito de uma resolução obrigatória.
Paulo Roberto de Almeida

Para todos e sem censura
Por Jamil Chade
Correspondente do ‘Estado’
Caderno Link, 12 de junho de 2011
INFOGRÁFICO AE
▪▪▪ Tentativas de controlar a internet no mundo todo faz a ONU definir que o acesso é um direito universal — e que a rede deve ser protegida de interesses de governos e empresas
(Gráfico ampliado neste link)

GENEBRA – A internet é a nova fronteira na luta da ONU pela defesa da liberdade de expressão. O primeiro relatório sobre a relação entre governos e rede, publicado em maio, chega a uma conclusão alarmante: a internet está sob ataque de governos em quase todas as regiões do mundo e precisa ser protegida. A partir disso, a decisão foi declarar o acesso à internet um direito humano — como o direito à saúde, à educação e à moradia. Governos que desconectarem sua população estarão, assim, violando direitos básicos e a lei internacional.

Frank La Rue, autor do documento e relator especial da ONU para a liberdade de expressão, destaca o papel central da rede nas revoltas nos países árabes. “A onda de protestos mostrou a capacidade de mobilização que a internet pode ter no apelo à Justiça.” No Egito, a primeira sentença contra o ex-ditador Hosni Mubarak foi uma pena e uma multa milionária por desconectar o país.

Para a entidade, a rede é hoje um dos principais instrumentos de exercício do direito de expressão. “E não podemos achar que esse direito é menos importante. É ele que possibilita os direitos econômicos, sociais e culturais, entre eles os direitos civis”, diz o relator. “Por agir como catalisador dos direitos de liberdade de expressão, a internet é um facilitador de uma série de outros direitos humanos.”

Cartas. O relator iniciou em 2010 intensa campanha contra as crescentes restrições impostas por governos à internet. O Link obteve as cartas enviadas pela ONU a mais de 20 governos pelo mundo questionando as dificuldades impostas a usuários de internet em 2010 e 2011. Em todos os casos, um traço comum no comportamento dos governos: o medo de que informações circulando na rede ameaçassem sua permanência no poder.

Pela conta da entidade, só em 2010, mais de 110 blogueiros foram presos no mundo, 70% deles na China. Irã e Vietnã disputam o segundo lugar. “Não há dúvidas de que governos têm incrementado a restrição à tecnologia como forma de evitar que a oposição se reúna”, explica La Rue. “A principal preocupação é que expressões legítimas estão sendo criminalizadas, e isso é contrário às obrigações internacionais de governos em relação aos direitos humanos”, diz o relator.

No papel. Documento coloca o acesso à rede no mesmo nível dos direitos definidos na Declaração Universal.
No mundo todo. As preocupações da ONU não se limitam aos países considerados párias. Em seu relatório, La Rue deixa claro que governos como o da França, o do Reino Unido e o da Hungria também vêm aumentando o controle sobre a rede de forma preocupante. Na maioria dos casos registrados na Europa, a luta contra a pirataria e ataques digitais seriam os argumentos para justificar a desconexão de um indivíduo.

Outra preocupação é com a defesa que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, vem fazendo daquilo que ele chama de “internet civilizada”. A ONU se preocupa com o que isso quer dizer.

Segundo La Rue, há dois tipos de estratégia hoje para censurar a internet. A primeira é o uso de leis criminais já existentes, aplicadas a blogueiros e outros ativistas digitais. A segunda: uma série de governos vem adotando novas leis, para endurecer penas contra usuários da internet — isso sem falar nas restrições que estão ocorrendo por parte de governos sem qualquer base legal.

Na maioria dos casos, governos justificam as novas leis sob a alegação de que precisam proteger a reputação de indivíduos, garantir a segurança nacional ou conter o terrorismo. Outro argumento é o do perigo de ataques digitais. “Há um abuso claro nos argumentos. Na prática, não passam de novas leis de censura diante do surgimento de um novo instrumento de comunicação”, afirma La Rue.

Uma dessas ações consideradas, a partir de agora, como violação dos direitos humanos é a de desconectar cidadãos tidos como ameaçadores ou que estejam pirateando, como acontece hoje na França. “Desconectar alguém da internet como punição é algo que deve acabar.”

Acordo. La Rue rejeita a tese de que a ONU esteja defendendo uma internet “sem controles nem regras”. As restrições aceitáveis seriam aquelas já previstas em declarações universais, como o combate à disseminação do ódio, racismo e crimes considerados como consensuais, como pornografia infantil.

O relator da ONU admite que o problema dos ataques digitais é real e reconhece a ameaça em relação aos dados pessoais que circulam na rede. Mas, para a ONU, regras nacionais isoladas não resolverão os problemas.

Na União Internacional de Telecomunicações (UIT), técnicos e políticos já falam da necessidade de um “acordo de paz” para a internet. “Todos sabemos que, se houver uma nova guerra mundial, ela ocorrerá a partir do espaço digital”, declarou Hamadoun Toure, secretário-geral da UIT. “Um acordo de paz será fundamental e terá de incluir governos, setor privado e sociedade.”

El "apagon" bolivariano: por favor, nao consumam, nao gastem...

Governos normais sempre pedem que os cidadãos consumam, gastem, invistam, para estimular a economia, via expansão do consumo, que por sua vez provoca o aumento da oferta e, obviamente, do investimento.
Isso vale para o capitalismo consumista, como não se cansam de denunciar tantos inimigos da economia de mercado, os ecologistas e outros frugais eremitas, que acham que as pessoas deveriam se contentar com menos do que tem, se possível com algumas graminhas da natureza, descartando esses exageros de shoppings e ostentações de um luxo indecente, do consumo conspícuo e outros exageros da economia de mercado. (Gozado que essas pessoas não renunciam a seus celulares, à internet, e ainda querem viajar ao exterior.)

Bem, isso não vale para o socialismo, como sabemos, um regime de penúria fabricada pelo governo, caracterizado por filas, desabastecimento, falta do que é supérfluo e até essencial.
Não sei como as pessoas não aprendem com a história. Deve ser cegueira, miopia, ou burrice mesmo.
Paulo Roberto de Almeida

Para evitar apagão, Venezuela limita o uso de energia
Marcos de Moura e Souza e Sérgio Ruck Bueno
Valor Econômico, 13/06/2011

São Paulo e Porto Alegre - A Venezuela anunciou ontem medidas para tentar reduzir o consumo de energia elétrica em empresas e residências. Quem não cumprir as metas terá o preço da energia elevado em até 200%. Em alguns casos, o fornecimento poderá ser suspenso. É um esforço para evitar que o blackout ocorrido na semana passada no Estado de Zulia, um dos mais industrializados do país, se repita em outras regiões. Grandes empresas, incluindo multinacionais brasileiras, tendem a adotar sistemas próprios de geração para escapar às restrições.

A Venezuela convive novamente com o fantasma do apagão, que em 2009 e no início de 2010 levou o governo a adotar uma série de restrições ao consumo de energia. Na época, a falta de energia foi atribuída a uma das piores secas da história recente do país. Desta vez, analistas dizem que o risco de novos apagões se deve a problemas nas redes de transmissão e ao aumento da demanda por energia - sinal da retomada do crescimento da economia depois dois anos de retração.

A avaliação unânime, no entanto, é que por trás do problemas no fornecimento estão décadas de baixo investimento em geração e em manutenção dos sistemas de eletricidade.

Ontem, o governo escolheu outro culpado: o consumidor. Disse que há uma "espécie de cultura de excesso de consumo" na Venezuela. "Não é possível para nenhum país conseguir uma capacidade de geração elétrica infinita. Portanto, a demanda não pode ser infinita e, em consequência, é necessário o uso racional de demanda", disse o vice-presidente, Elías Jaua.

Pelas novas regras, indústrias, centros comerciais e grandes redes de comércio terão de reduzir seu consumo mensal de energia em pelo menos 10%, segundo Jaua, em relação ao consumo que tinham nos mesmos meses de 2009.

As empresas que não se enquadrarem terão de pagar 10% a mais na fatura e 5% a mais em cada mês que reincidirem. Os consumidores residenciais que não reduzirem seu consumo também em 10% em relação a 2009 terão um acréscimo de 75% na conta. Quem ignorar as restrições e elevar seu consumo em mais de 20%, verá sua conta acrescida em 200%.

O pacote envolve ainda uma série de restrições de uso de energia em prédios públicos - que, se forem descumpridas, poderão levar ao corte do fornecimento nesses locais. Os serviços essenciais ficam de fora do pacote - que deve entrar em vigor nos próximos dias.

Cerca de 70% da matriz energética do país é hidrelétrica. Mas, devido à insegurança no fornecimento, muitas grandes empresas - entre elas algumas múltis brasileiras - já possuem geradores movidos a diesel para assegurar o ritmo de suas operações.

Em nota, a Gerdau informou ontem que está "estudando alternativas" para ajustar a operação da siderúrgica Sizuca, na Venezuela, e manter "o pleno atendimento de seus clientes" diante da decisão do governo Hugo Chávez de determinar a redução do consumo de energia no país. A siderúrgica venezuelana do grupo brasileiro não dispõe de geração própria de energia e produz aços longos para a construção civil. A capacidade de produção não foi informada.

Na crise de 2009, o governo prometeu tirar do papel um plano de construção de termelétricas que elevaria a capacidade de geração do país em 5 mil megawatts. O projeto, no entanto, avança lentamente. "O déficit energético pode comprometer a evolução da economia este ano", disse o diretor da Câmara de Comércio Venezuela-Brasil, Fernando Portela. O FMI previu que o país crescerá 1,8% este ano, mas o dado pode ser revisto.

Otros hermanos, otras cositas mas - Bolivia se automobiliza...

Estrito e lato senso...

Evo Morales, presidente da Bolívia, pretende legalizar no país carros roubados em outros
Wálter Fanganiello Maierovitch
Terra, 14/06/2011

Para justificar os genocídios e os massacres de índios na chamada “conquista do oeste”, os filmes norte-americanos demonizavam os índios e vangloriavam os xerifes e os militares de cavalaria.

Nos enlatados, o índio era sempre o bandido. Só considerado como regenerado quando traía a tribo e passava para o lado do conquistador, mostrado como civilizado e ético.

Na semana passada, o presidente boliviano Evo Morales, um aymará, quis ter o seu dia de índio de filme norte-americano.

Os lesados por Morales foram os cidadão brasileiros e chilenos que tiveram automóveis e caminhões roubados ou furtados.

Ladrões, receptadores e o governo boliviano, saíram no lucro. Tudo a evidenciar que o crime compensa na visão de Evo Morales.

Para arrecadar tributos, Morales legalizou a subtração de coisa alheia móvel.

No prazo de 15 dias, os residentes na Bolívia que estão na posse de veículos sem documentação de propriedade poderão obtê-la com facilidade. Como se diz no jargão policial, o “cabrito” pode ser esquentado na Bolívia, por ato do presidente Morales.

Ainda que tenha o chassis raspado, num indicativo evidente de detenção criminosa, o interessado poderá conseguir um certificado boliviano de propriedade do veículo, ainda que objeto de crime.

A justificativa de Morales é digna daqueles filmes norte-americanos voltados a satanizar o índio. Para Morales, “todos tem direito a um automóvel” e, também, um caminhão, pois pode também ser “esquentado”.

As diplomacias do Brasil e do Chile ensaiam um protesto em conjunto. Ele certamente será expedido depois do prazo de 15 dias do decreto de Morales, ou seja, quando já “legalizados” os veículos automotores.

Pano Rápido. Não vai demorar muito para Morales baixar outro outro decreto para esquentar veículos. Bastará precisar cobrir um buraco nas finanças bolivianas.

Grande quantidade de automóveis na Bolívia foram recebidos, sem documentação, como lixo. Ou seja, abandonados nos EUA pelos proprietários acabaram descartados na Bolívia, como lixo.

Como se sabe, o crime organizado transnacional despeja lixo em países pobres, que os aproveita. Ainda que tenha de comprar peças de reposição no país de origem: vende-se o lixo e ainda se fatura com peças de reposição.

A última vez que estive na Bolívia viajei, de Cochabamba a Vila Tunary (Chapare), num Toyota 2001 cujas portas traseiras tinham sido substituías por placas de madeira compensada. Como tinha de chegar à Vila Tunary para elaborar um relatório, coloquei na mão de Deus. Mais ainda, tive a sorte de o motorista ser um mascador de folha de coca. Um alívio, pois ele não dormia e estava sempre ligado.

Congresso desvia recursos do que seria relevante - projeto Tiririca

Não tenho nenhuma dúvida de que esse projeto será aprovado.
Será mais um projeto de efeito duvidoso e resultados pífios, com dinheiro gasto de forma errada e pouco efetiva.
Paulo Roberto de Almeida

Tiririca estreia no Congresso com projeto 'bolsa alfabetização'
FLÁVIA FOREQUE
Folha de S.Paulo, 14/06/2011

BRASÍLIA - Mais de quatro meses após tomar posse, o deputado federal mais votado do Brasil fez enfim sua estreia no Congresso. Na última terça-feira, assessores de Tiririca (PR-SP) entregaram ao plenário da Casa os primeiros projetos de lei de autoria do humorista.

Uma das propostas prevê a criação de uma "bolsa alfabetização" para adultos que concluírem curso para aprender a ler e escrever. O projeto fixa o valor mínimo de R$ 545 para o benefício.

O palhaço teve a diplomação para o cargo ameaçada após suspeita de ter falsificado declaração em que afirmou ser alfabetizado. Ele aceitou fazer um teste para comprovar que sabe ler e escrever e foi absolvido pela Justiça Eleitoral.

No texto da proposta, Tiririca justificou que o benefício tem a "finalidade de estimular o aprendizado da leitura e da escrita, de forma a qualificar e assegurar ao cidadão o pleno acesso e a utilização da informação".

Em contrapartida, é exigido período mínimo de seis meses de aula, com ao menos 85% de frequência.

Os outros dois projetos de Tiririca tratam da criação de vale-livro para alunos da rede pública e de serviços de assistência social para profissionais do circo.

Segundo dados oficiais, 113 deputados não apresentaram nenhum projeto de lei neste primeiro ano da legislatura. Esse grupo, no entanto, inclui aqueles que já se afastaram para assumir um cargo no Executivo e seus suplentes na Casa.

O deputado não quis comentar suas propostas.

Desde que iniciou o mandato, Tiririca tem mantido uma atuação discreta na Câmara. Até agora, não fez nenhum discurso na tribuna nem relatou propostas de outro deputado.

Na Comissão de Educação e Cultura da Casa, única em que o humorista é titular, colegas afirmam que ele nunca pediu a palavra.

"Ele não tem perdido nenhuma reunião. É assíduo, mas tem um perfil discreto", afirma a deputada Fátima Bezerra (PT-RN), presidente da comissão.

O mito Che Guevara - Rodrigo Constantino

O mito Che Guevara
Rodrigo Constantino
O Globo, 14/06/2011

“Amo a humanidade; o que não suporto são as pessoas”. (Charles Schultz)

Estivesse vivo, Ernesto “Che” Guevara completaria hoje 83 anos de idade. O guerrilheiro tornou-se ícone das esquerdas, e é visto como um idealista disposto a dar a vida pela causa. Adorado em Hollywood e Paris, Che foi eternizado pela foto tirada por Korda, que virou estampa de camisetas e biquínis. A ironia do destino transformou o comunista em lucrativa marca de negócios.
Mas, como alertou Nietzsche, a morte dos mártires pode ser uma desgraça, pois seduz e prejudica a verdade. Pouca gente sabe quem Che foi de fato. Se soubessem, talvez sentissem vergonha de defendê-lo com tanta paixão. Seus fãs deveriam ler “O verdadeiro Che Guevara”, de Humberto Fontova, e ver o documentário “Guevara: Anatomia de um mito”, de Pedro Corzo. É impossível ficar indiferente diante de tantos relatos sombrios das vítimas de Che.
Nem deveria ser preciso mergulhar mais fundo nos fatos. Basta pensar que Che foi um grande colaborador da revolução cubana, que instaurou a mais longa ditadura do continente, espalhando um rastro de morte, miséria e escravidão na ilha caribenha. Mas uma pesquisa minuciosa gera ainda mais revolta. Aquele que gostaria de criar na América Latina “muitos Vietnãs” era mesmo um ser humano deplorável.
A cegueira ideológica alimentada pela hipocrisia prejudica uma análise mais isenta dos fatos. Não é preciso muito esforço para verificar que Che Guevara era justamente o oposto do santo que tentam criar. O homem sensível de “Diários de Motocicleta” era o mesmo que declarou que “um revolucionário deve se tornar uma fria máquina de matar movida apenas pelo ódio”. Se ao menos os cineastas engajados tivessem lido o diário completo!
Até mesmo as supostas cultura e erudição de Che foram enaltecidas por intelectuais como Sartre. A realidade, uma vez mais, parece menos nobre: um dos primeiros atos oficiais de Che após entrar em Havana foi uma gigantesca queima de livros. Além disso, Che assinou as sentenças de morte de muitos escritores cujo único “crime” fora discordar do regime. Quanta paixão pela cultura!
As estimativas apontam para algo como 14 mil execuções sumárias na primeira década da revolução, sem nada sequer parecido com um processo judicial. Dezenas de milhares de cubanos morreram tentando fugir do “paraíso” comunista. Cuba tinha uma das maiores rendas per capita da região em 1958, e teve sua economia destroçada pelas medidas coletivistas do ministro Che. Nada disso impediu a revista “Time” de louvá-lo como um herói, ao lado de Madre Teresa de Calcutá.
Roqueiros como Santana gostam de associar sua imagem à de Che. Será que ainda o fariam se soubessem que sua primeira ordem oficial ao tomar a cidade de Santa Clara foi banir a bebida, o jogo e os bailes como “frivolidades burguesas”? O próprio neto de Che, Canek Sánchez Guevara, não escapou da perseguição. O guitarrista sofreu nas garras do regime policialesco que seu avô ajudou a criar, e preferiu fugir de Cuba. Homossexuais também foram vítimas de perseguição e acabaram em campos de trabalho forçado. Quanta compaixão!
Sobre a imagem de desapegado de bens materiais, a vida de Che também prova o contrário. Após a revolução, ele escolheu como residência a maior mansão cubana, em Tarara, uma casa à beira-mar com amplo conforto e luxo. A casa fora expropriada de um rico empresário. Além disso, quando Che foi morto na Bolívia ele ostentava um Rolex no pulso. Parece que nem os guerrilheiros resistem às tentações capitalistas.
Aqueles que conseguiram fugir do inferno cubano e não precisam mais temer a represália do regime, relatam fatos impressionantes sobre a frieza de Che. Foram centenas de execuções assinadas em poucos meses, e Che gostava de assisti-las de sua janela. Em algumas ele pessoalmente puxou o gatilho. Ao que tudo indica, Che parecia deleitar-se com a carnificina. Até mulheres grávidas foram executadas no paredão comandado por Che. Nada disso consta nas biografias escritas por aqueles que utilizam o próprio Fidel Castro como fonte. Algo como falar de Hitler usando apenas os relatos de Goebbels.
A ignorância acerca destes fatos explica parte da idolatria a Che Guevara. Mas, como lembra Fontova, “engodo e muita fantasia também o explicam, tudo alimentado de um antiamericanismo implícito ou explícito”. Che, assim como Fidel, desafiou o “império” ianque, e isso basta para ser reverenciado por idiotas úteis da esquerda. Que ele tenha sido uma máquina assassina, isso é um detalhe insignificante para alguns.

Los hermanos, outra vez, sem piedade...

Não choro por ti, Argentina
João Luiz Mauad
Diário do Comércio, 12/6/2011

O jornal Valor Econômico publicou, no último dia 30 de maio, um caderno especial sobre a crise que assola a Argentina. As políticas populistas do governo bolivariano de Cristina Kirchner estão levando o país ao caos, principalmente por conta de uma inflação galopante, cujo nível exato ninguém sabe, uma vez que os índices oficiais vêm sendo manipulados há tempos.
Pela reportagem, ficamos sabendo que até mesmo o famoso sanduíche Big Mac, carro chefe da rede McDonald's, sumiu das prateleiras. Explica-se: o Big Mac está na lista de itens que compõem o índice oficial de inflação do INDEC e, por isso, a exemplo de inúmeros outros produtos, foi incluído num acordo informal entre várias empresas e o governo, a fim de manter os preços desses produtos congelados, ainda que não oficialmente.

Lamento informar, mas tudo isso será em vão.

A inflação, como bem dizia Milton Friedman, "é um fenômeno exclusivamente monetário", causado pelo aumento da quantidade de moeda e/ou crédito sem o respectivo lastro. A inflação, portanto, agora nas palavras de Ludwig Von Mises, "não é um ato de Deus, uma catástrofe da natureza ou uma doença que se alastra como a peste. A inflação é uma política deliberada", adotada por governos irresponsáveis que, para nosso azar, são também os maiores beneficiários dela.

Não há qualquer fundamento científico em apontar como causas da inflação a ganância dos empresários, os circuitos de distribuição ou a falta de responsabilidade social das empresas. Com o conhecimento econômico hoje existente, não é mais possível culpar os agricultores, os pecuaristas, os frigoríficos, os açougues, os comerciantes, os sindicatos ou o comportamento vil dos empresários sempre que os preços sobem ou há escassez de um ou outro produto.

O governo da Sra. Kirchner tem travado uma batalha sem trégua, porém inútil, na tentativa deter, na base da caneta, o dragão da inflação. Assistindo ao que acontece hoje por lá, não dá para não traçar um paralelo com o nosso passado: pacotes, tabelamentos, pactos sociais, congelamentos, "tablitas", confiscos, fiscais do Sarney, caça ao boi no pasto e mais uma infinidade de bobagens heterodoxas para acabar com a inflação no porrete. Quem não tem memória curta sabe que essas estratégias, mais cedo ou mais tarde, fracassarão. E fracassarão simplesmente porque estão focadas não nas causas do problema, mas nos seus efeitos; não nos verdadeiros inimigos, mas nas próprias vítimas.

(Como bem dizia o velho Mário Henrique Simonsen: "Para conceber um congelamento – ou tabelamento – não é preciso um doutorado em Harvard ou no MIT: basta não entender nada de economia".)

Depois da crise econômica do início da década, os argentinos escolheram a pior maneira para sair da falência. Após operar um calote de proporções oceânicas – efusivamente aplaudido por toda a esquerda mundial e cantado em prosa e verso como a salvação para todos os países emergentes –, o governo daquele país optou por estimular a recuperação da economia através do velho artifício da elevação dos gastos públicos. Estes, por seu turno, eram financiados, principalmente, pelo uso do imposto inflacionário, via despejo de moeda sem lastro no mercado, e ancorados na manutenção de taxas de juros em patamares artificialmente baixos.

No curto prazo, a estratégia foi um retumbante sucesso. O governo gastou a vontade, sem que precisasse aumentar tributos. O povo, satisfeito com o crescimento de curto prazo e, como sempre, acreditando que existe almoço grátis, se habituou a pensar no Estado como senhor de recursos ilimitados à sua disposição.

Tal política, no entanto, é como uma droga, injetada diretamente na veia do cidadão comum e, principalmente, dos seus representantes eleitos – já que as obras públicas e outras benesses sociais costumam satisfazer os primeiros e tornar extremamente populares os segundos.

Num primeiro instante, os investimentos estatais impulsionam a economia e a criação de empregos, gerando uma falsa impressão de prosperidade. Mais cedo ou mais tarde, no entanto, a inflação sempre cobra o seu preço e, infelizmente, castiga com mais rigor justamente os mais fracos.

Quando o dinheiro começa a desvalorizar-se de forma acelerada, os que mais perdem são aqueles que não dispõem de meios para proteger os seus rendimentos.

Mas eu não choro por vocês, hermanos. Vocês estão colhendo exatamente aquilo que plantaram quando escolheram seus governantes e, principalmente, o modelo econômico que desejavam.

Capitalismo de Estado no Brasil - Wall Street Journal

Para ''WSJ'', BNDES é responsável por aquecimento da economia
Gustavo Chacra
O Estado de S. Paulo, 14/06/2011

Os empréstimos com crédito fácil para grandes corporações brasileiras pelo BNDES têm sido um dos principais responsáveis pelo aquecimento da economia do Brasil, ao mesmo tempo em que eleva o risco de inflação. A avaliação é de reportagem de capa do Wall Street Journal de ontem, na qual foi entrevistada uma série de economistas no País e nos Estados Unidos.

A advertência segue na mesma linha de outra matéria, publicada na revista The Economist há algumas semanas, e demonstra o início de uma preocupação com o cenário brasileiro no mercado internacional. O Brasil ainda é uma das estrelas do momento, mas aumentou a cautela devido ao risco de inflação.

As ações do Banco Central, elevando a taxa de juros para 12,25%, considerada a maior entre as grandes economias mundiais, buscam aliviar um pouco as ações do BNDES, segundo o Wall Street Journal. Mas "estas iniciativas opostas (do BC e do BNDES) indicam o papel central, e cada vez mais controverso, do banco de investimentos do Estado em projetos como portos e aquisições de empresas", diz o jornal.

O Wall Street Journal cita números afirmando que, no ano passado, o BNDES emprestou a empresas brasileiras o triplo do total emprestado para mais de cem países pelo Banco Mundial. Segundo economistas entrevistados pelo jornal, se o banco continuar com esses empréstimos, a inflação tende a aumentar. As ações ligadas ao banco de desenvolvimento também teriam contribuído para valorizar o real cerca de 40% em relação ao dólar nos últimos dois anos, afetando os exportadores brasileiros.

O jornal adverte ainda para a redução na expansão brasileira neste ano. E a economia, segundo especialistas, deve crescer entre 3,5% e 4% neste ano, certa da metade do ano passado. De acordo com o Wall Street Journal, também começaram especulações sobre a possível explosão na bolha do mercado imobiliário brasileiro, com preços aumentando a uma taxa porcentual de mais de dois dígitos.

Para a consultoria de risco político Eurasia, usada pela maior parte dos bancos e fundos de investimento dos Estados Unidos, as informações de que o Tesouro brasileiro poderá conter os empréstimos autorizados para o BNDES não afetarão o nível de investimentos do banco de desenvolvimento, já que os fundos para 2011 estão garantidos.

O Wall Street Journal, por sua vez, lembra ainda que essa contenção será difícil de ser aplicada diante da necessidade de melhoras na infraestrutura brasileira com a proximidade da Copa do Mundo e da Olimpíada do Rio. Apenas para a ferrovia de alta velocidade ligando São Paulo ao Rio "o BNDES deve emprestar US$ 13 bilhões".

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Capitalismo à brasileira - E mais R$ 55 bilhões estão a caminho do BNDES…
Reinaldo Azevedo, 14/06/2011

A Medida Provisória que permite ao BNDES receber uma nova bolada do Tesouro foi aprovada na Câmara. Leiam o que informa Maria Clara Cabral, na Folha Online. Volto em seguida:

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira medida provisória que autoriza a União a conceder crédito de R$ 55 bilhões ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para aumentar sua capacidade de financiamento. O texto segue para o Senado. A proposta aprovada tem poucas mudanças com relação ao texto original. Uma delas é a extensão do prazo para a contratação de operações de crédito pelo BNDES no (PSI) Programa de Sustentação do Investimento de dezembro de 2011 para 30 de junho de 2012. Elimina, no entanto, a autorização para que o Executivo prorrogue esse prazo, o que terá que ser feito por lei. No novo texto, há duas medidas de transparência, que obrigam o BNDES a encaminhar ao Congresso relatórios trimestrais sobre operações contratadas e realizadas com subvenção e os créditos da União.

Voltei
Os beneficiários dos empréstimos do BNDES certamente acham que as coisas são assim mesmo, né? Isso até se parece com capitalismo e coisa e tal. Por conta dos patrulheiros, poderia deixar de lado o que segue, mas quem dá bola pra eles? Quem explicou direitinho essa relação entre Tesouro, BNDES e financiamento foi José Serra. Transcrevo um trecho do texto publicado em seu site (íntegra aqui):

(…)
Poderíamos equiparar o Tesouro brasileiro a um banco muito especial. Em uma de suas modalidades de operação como instituição financeira, o Tesouro começa captando empréstimos no mercado mediante a emissão de títulos da dívida pública, à taxa SELIC, que é a taxa de juros básica da economia. Empresta, então, ao BNDES, a uma taxa bem menor, chamada Taxa de Juros de Longo Prazo, a TJLP. O total desses créditos especiais do Tesouro às instituições financeiras oficiais é enorme: equivalia a 6,8% do PIB no fim de abril. No fim de 2010, o passivo do BNDES junto ao Tesouro Nacional já era de 51,4% do total do passivo do banco, o que indica que o BNDES é cada vez mais um braço de operação do Tesouro Nacional.

Na aparência, essa operação não eleva a dívida pública brasileira, que costuma ser medida pelo conceito líquido, que é o utilizado no Brasil (o resto do mundo prefere o conceito de dívida bruta). Em termos de dívida líquida, o passivo gerado pelo dinheiro que o Tesouro tomou no mercado é contrabalançado pelo ativo do empréstimo feito ao BNDES. Se ficasse tudo zerado, maravilha!

Acontece que há um subsídio implícito na operação, pois a taxa SELIC (referência para aquilo que o Tesouro deve) é bem mais alta do que TJLP (que remunera seu crédito) - neste ano, tem sido mais de 100% superior. Ou seja, o Tesouro paga uma taxa de mais de 12% ao ano para se financiar e empresta ao BNDES a uma taxa de 6% ao ano. Esse subsídio é pago por toda a sociedade, mas beneficia apenas quem toma empréstimos nos bancos oficiais com taxas especiais. Seu montante foi estimado em cerca de R$ 15 bilhões pelo economista Mansueto de Almeida, mesmo antes de a SELIC voltar a ser elevada. Trata-se de uma despesa explicita que não é aprovada, como tal, no Orçamento Geral da União, além de atentar contra a boa transparência das contas públicas.

Mas há um segundo custo, este orçamentário, da equalização de taxas do Programa de Financiamento às Exportações Brasileiras (PROEX) ou mesmo as equalizações de taxas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Embora o Ministro da Fazenda já tenha declarado que o custo desse subsídio monta a R$ 5 bilhões por ano, os pagamentos correspondentes não apareceram até o momento nas tabelas de gasto do Tesouro Nacional. Esse custo orçamentário, quando somado ao subsídio implícito indicado acima, aponta para um custo total de, no mínimo, R$ 20 bilhões ao ano.

A íntegra do post está aqui:

Um banco muito especial. Ou ciranda, cirandinha…
José Serra, 06/06/2011

Sabem qual é a maior instituição financeira da economia brasileira? O Tesouro Nacional, ele mesmo. Não há nenhuma outra que detenha, como o TN, um volume de crédito equivalente a 14% do PIB (fim de abril ), diretamente contra bancos oficiais federais ou por meio de fundos e programas. Desses, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) é o maior de todos (3,9% do PIB, na rede bancária). Mas há outros importantes, como os fundos de desenvolvimento regional ou setoriais (marinha mercante). Se fosse incluída a dívida renegociada com estados e municípios (11,5% do PIB), o volume de crédito seria superior a 25%.

A rigor, o Tesouro não é um banco, mas o fato é que fornece crédito como se fosse: firma contratos de empréstimos, com juros, prazos etc. Não sei quantos outros Tesouros fazem isso no mundo. Fato é que essa não é sua função precípua, talvez nem secundária.

Por analogia, poderíamos equiparar o Tesouro brasileiro a um banco muito especial. Em uma de suas modalidades de operação como instituição financeira, o Tesouro começa captando empréstimos no mercado mediante a emissão de títulos da dívida pública, à taxa SELIC, que é a taxa de juros básica da economia. Empresta, então, ao BNDES, a uma taxa bem menor, chamada Taxa de Juros de Longo Prazo, a TJLP. O total desses créditos especiais do Tesouro às instituições financeiras oficiais é enorme: equivalia a 6,8% do PIB no fim de abril. No fim de 2010, o passivo do BNDES junto ao Tesouro Nacional já era de 51,4% do total do passivo do banco, o que indica que o BNDES é cada vez mais um braço de operação do Tesouro Nacional.

Na aparência, essa operação não eleva a dívida pública brasileira, que costuma ser medida pelo conceito líquido, que é o utilizado no Brasil (o resto do mundo prefere o conceito de dívida bruta). Em termos de dívida líquida, o passivo gerado pelo dinheiro que o Tesouro tomou no mercado é contrabalançado pelo ativo do empréstimo feito ao BNDES. Se ficasse tudo zerado, maravilha!

Acontece que há um subsídio implícito na operação, pois a taxa SELIC (referência para aquilo que o Tesouro deve) é bem mais alta do que TJLP (que remunera seu crédito) – neste ano, tem sido mais de 100% superior. Ou seja, o Tesouro paga uma taxa de mais de 12% ao ano para se financiar e empresta ao BNDES a uma taxa de 6% ao ano. Esse subsídio é pago por toda a sociedade, mas beneficia apenas quem toma empréstimos nos bancos oficiais com taxas especiais. Seu montante foi estimado em cerca de R$ 15 bilhões pelo economista Mansueto de Almeida, mesmo antes de a SELIC voltar a ser elevada. Trata-se de uma despesa explicita que não é aprovada, como tal, no Orçamento Geral da União, além de atentar contra a boa transparência das contas públicas.

Mas há um segundo custo, este orçamentário, da equalização de taxas do Programa de Financiamento às Exportações Brasileiras (PROEX) ou mesmo as
equalizações de taxas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Embora o Ministro da Fazenda já tenha declarado que o custo desse subsídio monta a R$ 5 bilhões por ano, os pagamentos correspondentes não apareceram até o momento nas tabelas de gasto do Tesouro Nacional. Esse custo orçamentário, quando somado ao subsídio implícito indicado acima, aponta para um custo total de, no mínimo, R$ 20 bilhões ao ano.

Há um outro aspecto relevante, que não tem sido apontado. Quem empresta para o Tesouro, comprando seus títulos? São instituições financeiras e empresas
brasileiras que neles aplicam suas disponibilidades de caixa. Mas, ao mesmo tempo, muitas delas tomam empréstimos junto aos bancos federais que recebem o dinheiro do Tesouro. Ou seja, o Tesouro se endivida junto às empresas que tomam o crédito subsidiado dos bancos oficiais alimentados pelo próprio Tesouro. Bela ciranda!

Muitas empresas têm dinheiro para se expandir, mas preferem fazê-lo com financiamento subsidiado do BNDES e aplicar seus recursos próprios a uma taxa de juros maior. Seria um circulo perfeito não fosse vicioso, pois há aquela brutal diferença entre os juros pagos pelo Tesouro e os recebidos por ele e por seus bancos. O próprio BNDES tem o prazer de entrar nessa ciranda, pois elevou sua tradicionalmente pequena carteira de títulos públicos para além de R$ 25 bilhões em 2010!

Ciranda, cirandinha, vamos só alguns cirandar… Os outros, a sociedade quase inteira, só entra na roda para pagar.

PS – Note-se que há mais papéis públicos em mercado do que o total apontado como dívida pública líquida, conceito oficial para medir o endividamento público: 42,3% em dívida mobiliária direta do Tesouro mais 9,9% em operações compromissadas do Banco Central (fim de abril)

Capitalismo de Estado no Brasil - revista Epoca

Um levantamento inédito de ÉPOCA identifica 675 empresas na órbita do governo federal e revela a extensão da interferência estatal na economia
Revista Época, 13/06/2011

José Fucs e Marcos Coronato, com Keila Cândido, Matheus Paggi, Camila Camilo, Danilo Thomaz e Juliana Elias

A queda do Muro de Berlim parecia ter encerrado o debate sobre o tamanho do Estado na economia. Com a vitória de um sistema baseado na livre-iniciativa – o capitalismo – sobre outro baseado no planejamento estatal – o socialismo –, a conclusão era cristalina: o governo deveria limitar ao mínimo a regulação sobre as atividades privadas e cuidar (bem) dos serviços básicos, como saúde, educação, justiça e segurança. Deveria ser apenas um bandeirinha, no máximo o juiz do jogo econômico – nunca técnico, zagueiro ou artilheiro. Em setembro de 2008, porém, com a eclosão da crise global, os governos de quase todo o mundo tiveram de injetar trilhões de dólares para reanimar suas economias. Nos Estados Unidos e em outros países, o Estado assumiu o controle de bancos, seguradoras e até mesmo de montadoras de automóveis à beira da falência. Foi a deixa para a ressurreição dos críticos do modelo liberal, que predominara por quase três décadas e garantira ao planeta uma era de crescimento sem igual na história. Vozes antes relegadas a um papel secundário no debate voltaram à cena com ares de protagonistas. Uma delas, o economista americano Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia em 2001, afirmou recentemente a ÉPOCA: “Não é o tamanho do Estado que importa, é o que o governo faz”.

Vá lá. Mas o que, exatamente, faz o governo num país de economia complexa como o Brasil? Trata-se, como o próprio Stiglitz há de reconhecer, de uma questão importantíssima – mas de resposta dificílima. O governo brasileiro regula a atividade econômica? Regula. O Estado é dono de empresas? Também. É sócio de empresas que não controla totalmente? Certamente. E ainda é dono de bancos mastodônticos e de companhias gigantescas, que detêm participações em uma fauna de empresas de todas as espécies. Para não falar no controle que exerce sobre os fundos de pensão das estatais, os maiores investidores do mercado. De diferentes formas, o governo interfere na gestão de algumas das maiores empresas privadas nacionais, em setores tão distantes quanto metalurgia, criação de animais para abate ou telefonia. A teia de interesses estatais nos negócios é tão complexa, tem tantas facetas e envolve tantos conflitos de interesse que o próprio governo não consegue avaliá-la de modo preciso. Nem o Ministério do Planejamento, a que está ligado o Departamento de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, nem a Secretaria do Tesouro Nacional, que controla o caixa federal, sabem quantas empresas no país têm participação estatal. E não há, em nenhuma repartição de Brasília, um diagnóstico completo da atuação e da influência do governo sobre nossa economia.

Nos últimos três meses, uma equipe de jornalistas de ÉPOCA dedicou-se a desfazer o nevoeiro que encobre essa questão. Com o apoio da empresa de informações financeiras Economática, mergulhamos em relatórios ministeriais, balanços e planilhas de dados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), das estatais, da Bolsa de Valores e das empresas privadas sob influência do governo. Restringimos nosso trabalho às participações do governo federal – um critério conservador para estimar o tamanho do Estado, por omitir as estatais em poder de Estados e municípios. Mesmo assim, o levantamento inédito, cujos resultados são apresentados a partir da página 71 e estão disponíveis de modo interativo em epoca.com.br e em nossa edição para iPad, revela um quadro preocupante. No futebol da economia brasileira, o governo não é apenas juiz, bandeirinha, técnico, zagueiro e artilheiro ao mesmo tempo. Ele também corta o gramado do estádio, costura as redes e – se quiser – pode até mexer no tamanho das traves.

“O governo é um dinossauro insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz um economista

De acordo com o levantamento, existem hoje no país pelo menos 675 empresas de todos os setores com algum tipo de participação ou influência do governo federal. São participações diretas ou indiretas do Tesouro, dos bancos e das empresas estatais ou dos fundos de pensão (entidades híbridas, inegavelmente na órbita do governo). Dessas, o governo controla 276, se somarmos todos os tipos de participação. Levando em conta apenas as 628 empresas não financeiras, o faturamento soma R$ 1,06 trilhão, algo como 30% do nosso Produto Interno Bruto (PIB) ou 2,5 vezes as vendas dos 50 maiores grupos privados nacionais (leia o gráfico abaixo) . Nas 247 empresas não financeiras controladas pelo governo, as vendas somam R$ 468,5 bilhões, ou 13% do PIB. E o valor de mercado das 99 empresas cujas ações são negociadas na BM&FBovespa totaliza R$ 1,7 trilhão, ou 71% do valor de mercado das empresas na Bolsa. A interferência do Estado na economia via estatais, BNDES e fundos de pensão é tão intensa que, durante a pesquisa, ÉPOCA teve de atualizar os dados de muitas companhias que receberam recentemente dinheiro do governo, como o frigorífico JBS ou a Cipher, especializada em sistema de segurança de informação. “O governo brasileiro é um dinossauro com apetite insaciável. Nunca tivemos um capitalismo de Estado tão evidente”, diz o economista Rodrigo Constantino, sócio da Graphus Capital, uma empresa de gestão de recursos do Rio de Janeiro.

No Brasil, a visão do Estado-empresário nunca teve dificuldades para angariar fãs. “A partir do governo Lula, houve uma mudança no entendimento do papel que o Estado deve ter no capitalismo brasileiro”, afirma o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações, ex-presidente do BNDES e um dos responsáveis pelas privatizações no governo Fernando Henrique Cardoso. “Eles renegaram a privatização, começaram a gastar demais e a interferir na gestão de empresas privadas. Começou a aparecer essa face do PT, de que o governo deve ser o agente mais importante de uma economia como a nossa.” Mas o próprio PSDB, preocupado em se livrar do estigma de privatista, estuda apresentar uma emenda constitucional para impedir que Petrobras, Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica sejam privatizados. “Os brasileiros amam o Estado, querem mais Estado”, diz o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central e ex-economista-chefe do Santander. “A ideia de que o governo resolverá todos os problemas está entranhada na cultura nacional.”

Em seus oito anos de governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou sete novas estatais: o Banco Popular do Brasil (BPB), que nem existe mais, a Hemobrás (para fabricação de hemoderivados), a Empresa Brasileira de Comunicações (EBC), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a Pré-Sal Petróleo, a Ceitec (para fabricar chips e microcondutores) e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, designada pela impronunciável sigla EBSERH, cujo objetivo seria prestar serviços gratuitos e apoiar o ensino e a pesquisa nos hospitais universitários federais (esta última não vingou, pois a medida provisória que a criava caducou). Além de criar as novas empresas, Lula investiu quase R$ 100 bilhões nas estatais já existentes e concedeu a elas empréstimos do Tesouro de quase R$ 200 bilhões, principalmente ao BNDES. Houve ainda o renascimento de estatais como a Telebrás, a holding de telefonia cujas subsidiárias foram privatizadas em 1998, e os investimentos bilionários feitos por BNDES, estatais e fundos de pensão na compra de participações em grandes grupos privados. O governo estimulou fusões generalizadas entre empresas privadas, como a Oi, da área de telefonia, resultado da união da Brasil Telecom com a Telemar. Nos primeiros seis meses do governo da presidente Dilma Rousseff, o avanço do Estado sobre o mundo dos negócios continua em ritmo acelerado. Alguns exemplos:

• Num leilão realizado no final de maio, o Banco do Brasil (BB) ganhou o direito de explorar o Banco Postal, a rede de serviços bancários dos Correios, a partir de 2012. Com um lance de R$ 2,3 bilhões, o BB superou a oferta do Bradesco, que operava o Banco Postal desde 2002;

• No final de maio, o BNDES anunciou a conversão de uma dívida de R$ 3,5 bilhões do JBS, o maior frigorífico de carne bovina do mundo, em ações da empresa e ampliou sua fatia no capital de 17% para 31%;

• Quase ao mesmo tempo, o governo patrocinou a troca de comando da Vale, a segunda maior mineradora global, por discordar de sua política de investimento. Embora afastado da Vale desde a privatização, em 1997, o governo usou sua força nos fundos de pensão que detêm o controle da empresa, para impor uma diretoria simpática a seus planos;

• Em abril, o Congresso Nacional aprovou um projeto do governo que criou mais uma estatal, a Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (Etav), para gerenciar o projeto do trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro. Ele terá financiamento de R$ 20 bilhões a juros camaradas do BNDES (20% acima do gasto previsto para o Bolsa Família em 2011);

Embora a decisão de privatizar os aeroportos, anunciada em maio, seja um sinal importante, ela não significa que Dilma tenha subitamente aderido à causa da privatização, palavra demonizada por ela mesma durante a campanha eleitoral. A medida reflete apenas o reconhecimento tardio de que o governo não tem dinheiro para modernizar os aeroportos e prepará-los para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro. Só que o país precisa investir pesado em infraestrutura nos próximos anos – e não apenas para a Copa e a Olimpíada. Os gargalos de nossa economia oneram toda a produção e reduzem a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional. Além dos aeroportos, é preciso modernizar e ampliar portos, estradas, ferrovias, a geração e distribuição de energia e os sistemas de água e esgoto. De acordo com cálculos do BNDES, as obras exigirão R$ 1 trilhão até 2014. E o governo não tem os recursos necessários para bancá-las. “Apesar de sermos um país que optou por ter um Estado grande, temos um Estado que investe muito pouco”, diz o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, hoje sócio da Gávea Investimentos. Também falta poupança interna para financiar todos os investimentos necessários. Sem o capital estrangeiro, portanto, é impossível alcançar a meta.

A decisão de fazer concessão de aeroportos não significa que Dilma tenha aderido à causa da privatização

De acordo com o banqueiro Henrique Meirelles, que comandou o Banco Central no governo Lula, se houvesse um ambiente de negócios mais atraente no país, o capital estrangeiro, sedento por boas oportunidades de investimento, viria em proporções cavalares. Há aí um espaço gigantesco a trabalhar. O Brasil é hoje o país emergente com a maior carga tributária do mundo, na faixa de 36% do PIB. Nossa legislação trabalhista obriga as empresas a pagar um salário adicional ao governo, além do que já paga ao trabalhador – é um fardo pesado. “O Brasil é um dos países em que é mais difícil empreender”, diz o empresário Jorge Gerdau, que aceitou recentemente comandar a Câmara de Gestão e Planejamento do governo Dilma. “Isso tem origem direta na ineficiência do Estado, prejudica a geração de emprego e renda e faz o Brasil perder oportunidades.” Na gestão de empresas, o Estado costuma ser bem menos eficiente do que a iniciativa privada. “Em geral, quanto mais coisas o governo tenta controlar, menos eficiente ele é”, diz o economista italiano Luigi Zingales, da Universidade de Chicago. Não é à toa que, segundo o levantamento mais recente do Fórum Econômico Mundial, o setor privado brasileiro está em 39º lugar no ranking de competitividade global, entre 139 países, enquanto o setor público ocupa apenas a 130ª posição.

Considerando tudo isso, é pouco provável que o governo consiga desatar o nó dos investimento, para permitir que o país cresça a taxas elevadas sem alimentar a inflação. Como é a iniciativa privada que financia a sede do Estado por recursos, de um jeito ou de outro, a conta da gastança chega. Depois dos trilhões gastos para erguer o mundo da crise, em diversos países – inclusive no Brasil – a dívida pública se multiplicou, e os governos começaram a cortar despesas para equilibrar o orçamento. No Primeiro Mundo, políticos conservadores estão ganhando as eleições com um discurso concentrado na austeridade fiscal e na contenção dos arroubos expansionistas do Estado. Nos EUA, os republicanos ganharam a maioria do Congresso nas eleições de 2010. Também no ano passado, o conservador David Cameron tomou o lugar do trabalhista Gordon Brown como primeiro-ministro na Inglaterra. Na Espanha, o fenômeno se repetiu em maio. A população mais esclarecida sabe que, no final, o custo sobra para ela, por meio do aumento de impostos, da inflação e das taxas de juro.

No Brasil, a estrutura de gastos públicos não dá muita margem de manobra. Do total de despesas, dois terços são consumidos apenas com a folha de pagamentos do funcionalismo federal e dos benefícios aos aposentados e pensionistas da Previdência Social. No início do ano, o Ministério da Fazenda até anunciou cortes tímidos, de R$ 50 bilhões, no gasto público. Mas esse número fica aquém das necessidades para equilibrar as contas. O essencial é deixar de lado o discurso ideológico e analisar friamente os benefícios de vender ativos – tradução: privatizar – no atual cenário. “É inevitável fazer a privatização”, diz o economista Roberto Macedo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. “O governo precisa sair da armadilha criada pelo Lula em 2006”, afirma Mendonça de Barros. “A Copa e a Olimpíada estão aí, e não dá para brincar. O PT é um partido pragmático e se dará conta de que é uma boa hora para quebrar o tabu das privatizações.”

CONTINUIDADE?
Até agora, Dilma seguiu a visão estatista adotada por Lula. A dúvida é se a falta de recursos para investimentos a fará reavaliar a privatizaçãoA última vez que o país implementou um programa consistente de desestatização foi nos anos 1990, na esteira das privatizações e da desregulamentação promovidas pela Inglaterra de Margaret Thatcher e pelos Estados Unidos de Ronald Reagan. O Estado obeso, herança da era Vargas e dos governos militares, passou por uma dieta notável nas gestões de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. O governo se desfez de mineradoras, siderurgias, petroquímicas, telefônicas e empresas aéreas. Acabou com o monopólio da Petrobras. Com a privatização, empresas como Vale, CSN e Usiminas voltaram a florescer. Na telefonia, os resultados foram espetaculares. Políticos de centro-esquerda, como Bill Clinton nos EUA, Tony Blair na Inglaterra e o próprio FHC, se viram forçados a abrir mão do viés estatizante de seus partidos para manter-se no poder. O próprio Lula teve, na campanha de 2002, de abandonar antigas bandeiras intervencionistas do PT e comprometer-se a não rever as privatizações, respeitando os contratos assinados.

Depois da crise de 2008, apesar da retomada do crescimento, a ideia de que o Estado pode – ou deve – fazer tudo voltou a ganhar força. “Os países mais bem-sucedidos, como Japão, China, Coreia do Sul e Índia, abriram suas economias de forma gradual e adotaram políticas comerciais e industriais para promover e diversificar suas economias”, diz o economista Dani Rodrik, da Universidade Harvard, EUA, outro defensor do estatismo. “Acaba havendo uma compensação entre a elevação do custo, provocada pelas restrições ao comércio e ao fluxo de capitais, e os benefícios de uma economia mais forte, em que se estimulam setores que, de outro modo, não se desenvolveriam.”

Aqui, as autoridades têm se aproveitado da maré favorável a esse tipo de ideia para ampliar os braços do governo na economia brasileira, seja aumentando a participação em empresas, seja oferecendo crédito subsidiado pelo BNDES. “O BNDES se transformou numa gigantesca máquina de transferência da riqueza dos pagadores de impostos para os aliados do governo. A troca de favores é o meio para o sucesso e o melhor atributo é ser amigo do rei”, diz Rodrigo Constantino. A pretexto de combater a crise, o governo federal parece ter embarcado novamente na ideologia de um estatismo inconsequente.

É provável que, se ele procurasse se concentrar nos três pilares da ação estatal – educação, saúde e segurança –, em vez de alimentar o mito do Estado-empresário, o país funcionaria melhor. Haveria menos corrupção, menos tráfico de influência e menos apadrinhamento. A redução da ação do governo na economia não significa que os mercados devam ser deixados à vontade. O governo pode – e deve – cuidar de sua fiscalização e regulação estabelecendo normas que garantam a qualidade da produção e a boa prestação de serviços à população. Mas o juiz não pode querer chutar a bola no gol.

LASA: premio para melhor livro de relacoes inernacionais da AL

LASA Prize LucianoTomassini
PRÊMIO DO LIVRO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA AMÉRICA LATINA "LUCIANO TOMASSINI"

Prazo final: 1º de setembro de 2011
Para dar início ao Congresso de 2012, a Latin American Studies Association (Associação de Estudos Latino-Americanos) entregará o Prêmio do Livro de Relações Internacionais da América Latina "Luciano Tomassini" aos autores de livros que se destacaram na área de Políticas Externas e Relações Internacionais da América Latina publicados em qualquer país em inglês, espanhol, francês ou português. Os livros qualificados para a premiação de 2012 devem ter sido publicados entre janeiro de 2008 e junho de 2011. Antologias de seleções de vários autores não se qualificam. Os livros serão avaliados nos quesitos originalidade da pesquisa, qualidade da análise e escrita e importância da contribuição aos estudos da América Latina e do Caribe. Os livros podem ser indicados por autores, membros do LASA ou editores.

As pessoas que indicarem livros serão responsáveis pela confirmação da data de publicação e pelo encaminhamento direto de uma cópia a cada membro do Comitê do Prêmio, à custa do autor ou do editor. Um pacote de indicação deve incluir uma declaração justificando a indicação, cinco cópias do livro indicado (uma para cada membro do Comitê do Prêmio), endereço completo, número de telefone, fax e endereço de e-mail do indicado. Cada pacote deve ser enviado diretamente aos membros do comitê até 1º de setembro de 2011. Até 1º de fevereiro de 2012, o comitê escolherá o livro vencedor. O comitê também poderá conceder uma menção honrosa. O prêmio será anunciado na Cerimônia de Entrega de Prêmios da reunião de negócios da LASA2012 e o premiado será homenageado publicamente. O recebimento do prêmio não está sujeito à afiliação na LASA.

IMPORTANTE: como o premiado será anunciado no folheto do programa, o comitê precisa concluir o seu trabalho até 1º de março de 2012. A decisão deve ser comunicada a milagros@pitt.edu com informações para contato completas e materiais biográficos para o premiado.
Os membros do comitê de 2012 são:

Jorge Heine, Chair
Centre for International Governance Innovation (CIGI)
57 Erb St West
Waterloo, ON N2L 6C2
CANADA

Victor Bulmer-Thomas
55 Maze Hill
London SE10 8XQ
UNITED KINGDOM

Rafael Fernández de Castro
Cataratas 60-2
Colonia Ampliación las Águilas
México DF 01710
MEXICO

Monica Hirst
Dept.Ciencia Política y Estudios Internacionales
MEI-Seguridad Internacional
Miñones 2177-Buenos Aires 1428
ARGENTINA

Julia E. Sweig
1777 F Sstreet NW
Washington DC 20006

Latin American Studies Association
Attn: Luciano Tomassini Book Award
University of Pittsburgh
315 South Bellefield Avenue
416 Bellefield Hall
Pittsburgh PA 15260

XIco Graziano: frases de um agronomo frasista

METÁFORAS INFELIZES
XICOGRAZIANO
O Estado de S.Paulo, 15/06/2011

A agricultura esteve em voga na política destes dias. Melhor dizendo, participou das conversas. Vejam que curiosas frases foram ditas:
Do senador Demóstenes Torres, em entrevista à revista Veja: "Vivemos em um momento crítico, de total submissão. No final das contas, o Congresso se comporta bovinamente".
Do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, questionado a respeito de sua posição atual sobre as drogas: "Só quem é burro não muda de opinião diante de fatos novos".
Do jovem Dayvini Nunes, dono do apartamento alugado pelo ex-ministro Antônio Palocci: "Eu não tenho como bater de frente com essas pessoas. Sou um laranja".
A alusão pejorativa à agricultura tem se tornado, há tempos, uma característica típica da oratória brasileira. Não se conhece outra nação onde a linguagem carregue tamanho preconceito contra o campo. Triste povo que, mesmo sem o perceber, achincalha seus agricultores.
A lista das figuras de linguagem depreciativas do mundo rural soa enorme. "Vá plantar batatas" é uma das mais antigas. Diz-se que a frase nasceu na época gloriosa de Portugal, quando a navegação e a pesca emprestavam prestígio à sociedade, restando desdém pela vida sofrida na agricultura. Tida como alimento vulgar, a solanácea calejava e sujava as mãos dos que a produziam.
Alimento básico da civilização inca, a batata encantou os colonizadores espanhóis, que logo a levaram para a Europa. O sucesso de sua aceitação leva muita gente a pensar que o alimento tem origem alemã. Uma das razões decorre do fato de que, em 1740, Frederico II, o Grande, baixou norma obrigando seus súditos na Alemanha a consumirem batatas para enfrentar a constante ameaça da fome. Ainda hoje, sobre seu túmulo, no Palácio de Sans-Souci, depositam-se batatas para lembrar o gesto pátrio.
Nem sempre facilmente se explica a origem das metáforas negativas utilizadas com gêneros agrícolas. A própria batata, que mereceria uma homenagem, serve ao desabono.
Descascar um abacaxi, outro exemplo, não exige tanto esforço assim para justificar algo penoso, conforme a linguagem popular utiliza na descrição de missão inglória. Mas pegou.
O caso da laranja sempre me pareceu o mais estranho. No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa se encontra que laranja, em economia, remete a indivíduo, nem sempre ingênuo, utilizado em práticas fraudulentas contra o fisco ou com dinheiro ilícito. Ser "laranja" significa, portanto, um disfarce do mal.
Mas qual seria a motivação semântica do termo? O engana trouxa recai sobre a laranja por ser ela azeda? Ou por causa da coloração amarela por fora, na casca, e branca por dentro, no bagaço? Ninguém duvida que o Palocci esconda algo estranho nessa história de sua grana milionária. Só não entendo eu qual o alegórico pecado da fruta.
Já o coitado do burro sai injustiçado sempre que, aos olhos de uma pessoa, outra não toma boas decisões. Dizer, entretanto, que fulano é burro afronta a natureza, pois o asinino é um animal bem inteligente. Cauteloso, o bicho fez história no transporte de cargas em terrenos difíceis e encostas íngremes, onde um cavalo facilmente despencaria. O burro, ou sua mulher, a mula, empacam por astúcia, não por teimosia.
Fernando Henrique, um homem sabidamente perspicaz, está correto. Quem não muda nunca de opinião é dogmático, perde razão. As Ideias e seu Lugar intitula um dos seus ensaios mais instigantes sobre as teorias do desenvolvimento. Ter ele caído na armadilha da linguagem preconceituosa mostra o quanto o vício está incorporado nos ditos populares. Para mostrar sua flexibilidade intelectual poderia alternativamente ter dito: "Não sou uma pedra"! Parada no mesmo lugar.
Do burro ao boi. O Congresso Nacional, aos olhos do povo, parece uma casa de doidos. O senador Demóstenes Torres, porém, teve alguma inspiração ao contrário, ligada à mansidão, para caracterizar em sua entrevista o lado bovino daquela Casa. A submissão do Congresso ao poder do Executivo é um sério problema apontado por ele, motivo de preocupação dos democratas republicanos. Agora, achar que toda boiada é lânguida significa desconhecer a complexidade da pecuária. Cutuca touro bravo pra ver!
Certo desprezo ao caipirismo se esconde no preconceito urbanoide contra o campo. Nas festas juninas o desdém aparece disfarçado nos exagerados fetiches do caboclo, tais como o chapéu de palha desfiado do tipo espantalho, aquele dentinho pintado de preto para parecer banguela, o sapatão velho de bico furado. Em vez de homenagem, refletem um horroroso mau gosto que deforma a visão das crianças sobre os homens do interior, depreciando-os, igualando-os todos ao triste personagem Jeca Tatu. Pedagogia zero.
O passado escravocrata e latifundiário, aliado aos problemas ambientais do presente, como o desmatamento, certamente ajuda a cultivar na opinião pública uma imagem negativa da nossa agricultura. Vista caolhamente, suas mazelas se destacam, as glórias se escondem. Nesse olhar deformado, o atraso ido subjuga a modernidade rural.
A ideologia urbana, auxiliada por infelizes metáforas, transforma o positivo em negativo, criando uma maldade que ridiculariza o mundo rural. Poderia ser diferente. Bastaria as pessoas se apegarem às jocosas figuras de linguagem. O Palocci caiu do cavalo. Fernando Henrique mexeu com um vespeiro. Demóstenes cutucou a onça.
Louco da vida com as autoridades alemãs, que equivocadamente jogaram sobre as costas dos agricultores espanhóis a culpa por aquele surto bacteriológico, bradou o representante da Espanha, Francisco Sosa-Wagner, brandindo nas mãos um exemplar do legume: "É preciso recuperar a honra do pepino".
Tá certo o homem!

AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO.
E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR