O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Janer Cristaldo, eu, e a miseria academica brasileira (grato Gil Rikardo)

Um amigo leitor deste modesto blog, Gil Rikardo, de Joinville, tinha me dito, algum tempo atrás, que o Janer Cristaldo, um dos mais brilhantes cronistas da humanidade (sim, da humanidade), infelizmente falecido nesta primavera (brasileira), tinha mencionado meu blog numa de suas postagens, e que apenas por isso tinha começado a ler o Diplomatizzando. E nunca mais parou. Grato, meu caro.
Eu nunca soube dessa menção, a despeito de visitar, ocasionalmente -- quando lia sucessivamente muitas postagens ao mesmo tempo -- o saboroso blog do Janer Cristaldo, um dos mais inteligentes que possam ter jamais existido nestes espaços brasileiros. Ele encontra-se interrompido, mas ainda disponível, neste link: http://cristaldo.blogspot.com/
Hoje, finalmente, o Gil Rikardo encontrou a postagem do Janer que menciona o meu blog, e me faz alguns elogios. Ela está reproduzida abaixo. Infelizmente, o blog do Janer, não possui instrumento de busca, nem os arquivos estão completos, razão pela qual não pude acessar eu mesmo esta postagem, "Um Leitor Especial", já que as postagens de setembro de 2011 são interrompidas no dia 16 desse mês, e não há jeito de recuperar o material (a menos que alguém da família tenha acesso ao computador e aos arquivos originais do Janer, o que desconheço como fazer).

Eis a mensagem do Gil Rikardo, seguida da transcrição da postagem do Janer. Ao final, transcrevo o que poderia ser a postagem minha que ele leu, sem ter certeza disso, já que não consegui acessar a integridade de suas postagens, neste link: http://cristaldo.blogspot.com/2011_09_01_archive.html.
Também convido os leitores a percorrer algumas das melhores crônicas do Janer Cristaldo, no link que leva aos seus ebooks: http://tinyurl.com/o6b5jmp.
No mais, é sempre um prazer ler coisas inteligentes.
Paulo Roberto de Almeida 

Nome: Gil Rikardo
Cidade: Joinville
Estado: SC
Mensagem: Caro professor, encontrei o texto em que Janer o mencionava. Foi a partir dai que tornei-me assiduo de seu diplomatizzando.
Gil Rikardo


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Janer Cristaldo, quinta-feira, setembro 01, 2011

UM LEITOR ESPECIAL

Se escrevesses mais crônicas como essa, terias mil vezes mais leitores – escreve-me alguém de uma lista de amigos. Referia-se à crônica “Azaléias de agosto”, que republico a cada aniversário da morte de minha mulher. Não sei se ele notou a crueldade do que disse. Está pedindo que morram mais Baixinhas em minha vida. Para começar, só existiu uma. Continuando, se foi duro enfrentar a passagem de uma, imagine o leitor como seria enfrentar a morte de várias. Crônica como aquela, espero jamais ter de escrever de novo.

Mas isto é o de menos. E sim o mil vezes mais leitores. Meu blog está se aproximando aos poucos de um milhão de acessos. Claro que isso não significa um milhão de leitores. Mas é um número significativo para um blog individual, que não é escorado por nenhum portal. Em verdade, mesmo que pudesse individualizar meus leitores, impossível ter uma idéia de quantos são na Internet. Minhas crônicas são replicadas por outros blogs e enviadas por mail a outro tantos leitores. Qualquer estimativa é inviável.

Mas digamos que, para efeitos de raciocínio, eu tivesse cem leitores. Es un suponer. Mil vezes mais significaria cem mil. Ora, no dia em que eu estiver sendo lido por cem mil leitores, vou parar, olhar-me no espelho e perguntar-me que ando escrevendo de errado. Prefiro cem. Escrevo para comunicar o que penso, não para cativar leitores. Alguns, eu os cativo e isso me faz bem ao ego. Outros, eu os irrito, e isto também me faz bem ao ego. Diria até mesmo que o número dos que irrito é bem maior do que o número dos que cativo. Paciência. Não peço para ser lido. Se sou, muito obrigado, seja lá quem for que me lê.

Confesso ficar em dúvida se gosto mais dos leitores que me elogiam ou dos que insultam. Recebo centenas de mails insultuosos – e esta é uma das razões pelas quais meu blog não é aberto a debates. Discordar, tudo bem, e seguidamente publico leitores que de mim discordam. Mas não vou dar espaço a insultos. Seja como for, eles me divertem. É a reação irracional do leitor que se sente machucado e não tem argumentos. Estes leitores não demonstram muita inteligência. Se soubessem o prazer que me dão, me subtrairiam este prazer.

Não tenho vocação para best-seller. Aliás, abomino best-seller. Se um livro vendeu de repente um milhão de exemplares, este é um de meus critérios para não comprá-lo. Não existe tanta gente inteligente no mundo. Não existe um único best-seller em minha biblioteca. Aliás, quando saio atrás de um título, tenho de trotar entre uma livraria e outra, pois trata-se de livro geralmente pouco divulgado. Diga-se o mesmo de filmes.

Ora, direis, mas a Bíblia ou o Quixote não são best-sellers? Claro que são, mas por outras razões. A Bíblia, além de ter três mil anos, é um livro religioso e atende a um público que não está interessado em razões estéticas. Eu a leio não por fé – quem me lê sabe que desde meus verdes anos sou ateu. Aliás, como todo mundo, nasci ateu. Deus é fruto do Estado, da família, da educação. Leio a Bíblia, por um lado, por razões estéticas, nela há livros de extraordinária beleza, como o Cântico dos Cânticos e o Eclesiastes. Por outro lado, para entender este mundo em que vivo. Ninguém entenderá o Ocidente sem ler o Livro.

Quanto ao Quixote, que consta ser o segundo livro mais vendido depois da Bíblia, é best-seller ao longo de quatro séculos. Não é best-seller do dia para a noite, como os Paulos Coelhos da vida. Ainda há pouco, eu dizia que não leio ficcionistas contemporâneos, é como se estivesse ouvindo mais uma vez as histórias que ouço em meu boteco. Cervantes é diferente. Me leva a um país que adoro, a uma outra geografia que não a minha e rumo a quatrocentos anos atrás. Em suma, me transporta ao anecúmeno. Isso sem falar na ironia de Cervantes, que perpassa a obra toda. Best-sellers que resistem aos séculos, eu os leio com muito prazer.

Mas falava de meus cem hipotéticos leitores. Que certamente serão mais, bem mais. São de modo geral pessoas cultas, que gostam de viagens, boa leitura, bona-xira. Me sinto bem quando toco a sensibilidade de um leitor culto. Nestes dias, fiz uma descoberta daquelas que, por um lado, mostra que não escrevo rumo ao inútil. Por outro, me compromete a escrever exigindo cada vez mais de meus textos.

Andava eu pelo Google em busca de mim mesmo, quando caí no blog Diplomatizzando, do escritor e diplomata Paulo Roberto de Almeida, homem vivido, viajado e de pensamento. Já havia passado por ele, onde tive a honra de ver algumas de minhas crônicas reproduzidas. Mas agora li texto que me fez ganhar meu dia. Segue abaixo. Se o leitor que quiser ter bons momentos de leitura, voilà o link: http://diplomatizzando.blogspot.com.

Suas palavras me honram, professor. (Só faria uma ressalva. Não me pretendo um anarquista. Um terrorista de idéias, talvez). Ao mesmo tempo, implicam um baita compromisso. Fico, daqui pra frente, proibido de escrever qualquer coisa que mesmo de longe roce o medíocre. Farei o que for possível.

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Transcrevo agora minha postagem de 15 de maio de 2011, que suponho tenha motivado, pelas minhas palavras iniciais sobre o "anarquista" Janer Cristaldo, suas palavras finais me corrigindo. De fato, ele é um terrorista das ideias, no bom sentido claro, o que eu também admito ser. Implodimos ideias que nos parecem perniciosas, mas nisso não vai nenhum fundamentalismo ou prejuizo para a humanidade. Nunca matamos ninguém, apenas não repugnamos um bom debate de ideias. Que vençam as melhores, nesta justa luta pela elevação espiritual da humanidade. Chega de mediocridade, acadêmica ou qualquer outra.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 30/11/2014

A mediocrizacao academica - eu e Janer Cristaldo (com razao)
A mediocrizacao academica - eu e Janer Cristaldo (com razao) - See more at: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/05/mediocrizacao-academica-eu-e-janer.html#sthash.fkKyjYsq.dpuf

domingo, 15 de maio de 2011

A mediocrizacao academica - eu e Janer Cristaldo (com razao)

- See more at: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/05/mediocrizacao-academica-eu-e-janer.html#sthash.fkKyjYsq.dpuf

Sou um acadêmico, eu sei, vocês sabem, ademais de ser também funcionário público federal da carreira do Serviço Exterior Brasileiro, mais exatamente diplomata, como se diz comumente.
Não sei em qual profissão eu me divirto mais, sou mais anarquista, ou ganho mais. Não importa. Olho as duas com olhar crítico. E acho que mereço os dois salários que ganho, pois como todos sabem, eu trabalho, produzo (supostamente coisas úteis à sociedade), mostro o que produzo, e me submeto a avaliações (dos chefes, dos alunos, dos pares, da sociedade, todos podem ler, ou não, o que escrevo, comprar meus livros publicados, enfim, me julgar de modo aberto, alguns até anonimamente, aqui mesmo neste blog até agora gratuito).
Não é de hoje que eu digo que a universidade vai para o brejo, que ela está decadente, que o ensino é medíocre, enfim, o que constato, visualmente, diretamente.
Claro, não pretendo ofender os colegas, chamando-os de medíocres ou preguiçosos, tanto porque escolho me relacionar com pessoas produtivas, inteligentes, dedicadas e honestas intelectualmente. Sinto muito, mas não consigo me relacionar com "maus-caráteres", desonestos, fraudadores. Esses eu simplesmente deixo de lado. Mas eu os encontro, aqui e ali: numa palestra (ou numa arenga), num artigo entregue para revisão e publicação (e quando chega para meu parecer sou apenas rigoroso), pelo que leio por aí, nesses jornalecos medíocres, nesses blogs alimentados com o dinheiro público.
Pois bem, o Janer Cristaldo é um provocador (como eu), embora ele seja muito mais anarquista do que eu. Ele não tem nenhum respeito pelos poderes constituídos (nem eu, mas preciso manter as aparências, por enquanto).
Ele não só critica as universidades (em geral, e as brasileiras em particular), no que acho que ele faz muito bem, mas ele critica a instituição do doutoramento. Concordo em grande medida com ele: tem muito teatro nessa coisa e muita embromação. Mas não ouso criticar sem oferecer uma solução alternativa. Não tenho ainda um substituto. Mas concordo em que as universidades estão defasadas e precisam se reformar, se modernizar, se transformar completamente...
Seguem três posts do Janer sobre um dos muitos motivos da decadência acadêmica
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 15 de maio de 2011 

A ARMADILHA DOS DOUTORADOS
Janer Cristaldo
Blog do Janer, Quarta-feira, Maio 11, 2011

Em 2005, a Capes previa investir R$ 3,26 bilhões para aumentar o número de doutores por ano no Brasil. O Plano Nacional de Pós-Graduação apresentado ao então ministro da Educação, Tarso Genro, propunha a aplicação nos seis anos seguintes de R$ 1,66 bilhão a mais em bolsas e fomento de pós-graduação, o que permitiria passar dos 8.000 doutores titulados por ano para 16 mil em 2010. O plano “será acolhido integralmente", disse Genro na ocasião.

Se foi acolhido integralmente, não sei. Na época, falei da desmoralização do título de Doutor que, entre nós, se deve à universidade brasileira, ao distribuir doutorados a torto e a direito, como quem joga milho aos porcos. Não faltou quem protestasse. Que quem jogava milho aos porcos era a universidade francesa, com seus diversos doutorados, o Dr. Ingénieur, o Doctorat d’Université, o Doctorat de IIIe Cycle e o famigerado Doctorat d’État. Pode ser.

O missivista considerava que o único doutorado francês válido seria o Doctorat d’État. “Um doutorado na França é conhecido por doctorat d’Estat (sic!) e esse sim é equivalente o doutorado no Brasil. Lá existem vários tipos de doutorado, a maioria pode ser realizada em no máximo dois anos, à exceção do doctorat d’Estat (resic!), cuja duração é equivalente aos dos outros países – uns cinco anos. Quase todos os nossos intelectuais de esquerda fizeram um curso Troisiéme Cycle na França e se dizem doutores".

O ilustre especialista em doutorados – que escreveu sob pseudônimo – sequer sabia redigir corretamente a designação do título. Também ignorava que o Doctorat de IIIe Cycle se faz em quatro – eventualmente cinco – anos e que o famigerado doctorat d’Estat, como ele grafava , era feito em dez ou mais anos. O Doctorat de IIIe Cycle sempre foi reconhecido como doutorado em todos os países europeus. O d’État era tido como mais uma bizarrice dos galos.

Distorção da universidade francesa, servia como placebo ao desemprego, ao mesmo tempo que mantinha o doutorando afastado por uma boa década do mercado de trabalho. O candidato ao título desenvolvia teses monumentais, às vezes de quatro ou cinco volumes, que nem mesmo a banca julgadora lia na totalidade. Tais calhamaços ficavam entregues às traças e à poeira nas bibliotecas e a universidade francesa sequer percebia que delas poderia tirar algum lucro. Exportando para a Holanda, por exemplo, para fazer diques. O governo Mitterrand tomou consciência desta perversão acadêmica e a extinguiu. Agora existe apenas Doctorat, tout court.

Há horas venho afirmando que os doutorados são uma solene inutilidade. Ou melhor, uma armadilha acadêmica. Você faz um curso universitário e desemboca no desemprego. Para capear a adversidade, você se inscreve em mestrado. Mais quatro anos afastado do mercado de trabalho. Conclui o mestrado e de novo vê o breu pela frente. Seu professor, que precisa de doutorandos para cumprir sua carga horária enquanto folga em casa ou no Exterior, o convida para um doutorado. Você aceita, afinal está desempregado e a bolsa não é de se jogar fora. Mais quatro ou cinco anos fora do mercado.

Quando você vai ver, tem mais de trinta anos e nunca teve carteira de trabalho assinada. Em um país onde se tende a considerar que uma pessoa com 35 anos já é idosa, ou você tem pistolão na guilda e entra no magistério – para que a poleia sem fim dos doutorados continue rodando – ou vai talvez dirigir um táxi ou ser corretor de imóveis. Afinal, comer é preciso.

Isso sem falar no que chamei de mestrandos carecas. Entre as muitas anomalias da universidade brasileira estão os mestrandos quarentões. Aquela iniciação à pesquisa, pela qual o candidato deveria optar tão logo terminasse o curso superior, é adiada para uma idade em que do acadêmico já se espera obra consolidada. Pior mesmo, só os doutorados de terceira idade. Marmanjos de cinqüenta e mais anos, em idade de aposentar-se, postulando um título que só vai servir para pendurar junto com as chuteiras.

Mestrado não é para carecas. Já um doutorando, este deveria defender sua tese no máximo aos trinta e poucos, para que sua experiência em pesquisa possa ser útil ao ensino e à sociedade. Que mais não seja, é patético ver um homem já maduro humilhando-se, ao tentar iniciar-se em metodologias que devia desde jovem dominar. Isso sem falar em métodos que não passam de masturbação acadêmica, como ocorre na área das ditas Humanas. Na universidade brasileira, o doutorado nem sempre é visto como início de uma carreira, mas como louro a coroar a calva do acadêmico quando este está prestes a usar pijamas. Quem paga tais vaidades senis? Como sempre, o contribuinte.

Pelo jeito, os acadêmicos começam a se dar conta desta catástrofe. Acabo de receber artigo de Mark C. Taylor, presidente do departamento de religião da Universidade de Columbia em Nova York e autor de Crise no Campus: um plano arrojado para reforma das nossas Faculdades e Universidades (Knopf, 2010). Em seu ensaio, o professor considera que o sistema de doutorado nos Estados Unidos e em muitos outros países é insustentável e precisa de ser remodelado. Em muitos campos, ele cria apenas uma fantasia cruel de um futuro emprego, que promove o auto-interesse dos membros do corpo docente, em detrimento dos estudantes. A realidade é que existem poucos empregos para as pessoas que gastaram até doze anos em sua formação.

“A maioria dos programas de educação-doutoramento está em conformidade com um modelo definido nas universidades européias durante a Idade Média, em que a educação era um processo de clonagem, que treinava os estudantes para fazer o que os seus mentores faziam. Os clones já ultrapassam o número de seus mentores. O mercado de trabalho acadêmico entrou em colapso em 1970 e as universidades ainda não se ajustaram as suas políticas de admissão, porque precisam de estudantes de pós-graduação para trabalhar nos laboratórios e como assistentes de ensino. Mas uma vez que os alunos terminam o ensino, não existem trabalhos acadêmicos para eles.

Para o professor Taylor, só há duas saídas: reformar radicalmente os programas de doutoramento ou fechá-los. “A especialização levou a áreas de investigação tão estreitas que são de interesse apenas para outras pessoas que trabalham nos mesmos domínios, subcampos ou sub-subcampos. Muitos pesquisadores lutam para conversar com colegas do mesmo departamento, e comunicação entre departamentos e disciplinas podem ser impossíveis".

A bicicleta precisa continuar rodando. Milhões de teses no mundo todo, que já não cabem nas bibliotecas oficiais, precisam de anexos para serem guardadas. Guardadas para quê? Para juntar pó. Uma tese é algo que sai caro ao Estado. É preciso subsidiar os graduandos e os professores que os orientam. Deveria ter retorno aos contribuintes que, no fundo, são quem as financiam. Você já viu alguma tese publicada? Às vezes encontramos alguma, mas precisamos pagar por ela. O doutor recebe para redigi-la e depois cobra de novo para que seja lida.

Se o Brasil eliminasse hoje seus cursos de doutorado, não me parece que perderíamos grande coisa. (Vou mais longe: cursos de Letras, Filosofia ou Sociologia não fazem falta alguma). Os professores americanos parecem estar despertando para o problema. Como o Brasil adora importar modas ianques, seria salutar que esta postura chegasse até nós.

Mas não vai chegar. O Brasil prefere importar rock, blockbusters e outras mediocridades do Primeiro Mundo. Do melhor que acontece lá, Pindorama só quer distância.

PS – O artigo do professor Mark Taylor pode ser lido na íntegra em http://www.nature.com/news/2011/110420/full/472261a.html

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AINDA OS DOUTORADOS
Janer Cristaldo, 13 de maio de 2011

De uma boa amiga que está concluindo seu doutorado em Letras na USP, recebo:

Oi, Janer
Lendo seu texto, concordo com a avaliação feita. Os alunos são enviados por inércia ao doutorado por não enxergarem muitas perspectivas (no caso das ciências humanas) no mercado de trabalho, principalmente o acadêmico. E, para sobreviver, aceitam passar mais quatro anos na vida de bolsista. Ocorre que desde 2007 vige uma portaria da CAPES a respeito da publicação de teses e dissertações que obriga o ex-aluno a disponibilizar integralmente o conteúdo de seu trabalho na internet, no banco de dados das universidades brasileiras. Portanto, qualquer pessoa pode ter acesso em um clique. Eu só me pergunto sobre os direitos autorais nesse caso. Existem? - na medida em que o autor é obrigado a cumprir tal medida - embora na lei de 1998 exista um artigo a respeito de que trabalhos financiados pelo Estado não pertencem a ele por conseqüência. Qual sua opinião?

Bom, Aninha,

essa portaria de 2007 é uma boa notícia. Mas tem gente que não vai gostar. Em Florianópolis, nos anos 70, houve um incêndio numa sala da Reitoria, justo aquela em que estavam depositadas as teses. Alguns professores me confessaram que adoraram o incêndio, pois tinham vergonha do próprio trabalho. Quanto a direitos autorais, acho que o autor deveria renunciar a eles. Afinal, foi pago pelo contribuinte. Que devolva, então, gratuitamente, o que lhe foi financiado.

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Esta do Janer é mais forte:

SOBRE TESES E PAPEL HIGIÊNICO
Janer Cristaldo, Sexta-feira, Maio 13, 2011

Do Vanderlei Vaselesk, meu fiel leitor, recebo uma resposta a meu artigo sobre os doutorados, postada em algum fórum da Internet.

Gente,
Esse cara é ultraconservador no pior dos sentidos. O cara propõe praticamente o fechamento dos doutorados e a extinção de determinados saberes tais como Letras, Filosofia e Sociologia. Acho que ele deve ter nascido de chocadeira últra-moderna com a idade que ele tem, pois creio que não deve ter tido um(a) professor(a) de língua portuguesa ou, então, deve ter sido reprovado em Estudos Sociais e OSPB. É possível que a capacidade intelectual dele de raciocinar tenha sido comprometida pela falta de abstração filosófica. De qualquer forma, nem de longe entende que a universidade abre portas e cria possibilidades de se romper com determinadas restrições socio-culturais e econômicas, viabilizando a construção da cidadania e de pessoas efetivamente críticas.

O cara alega que os doutorados são inúteis e custosos. É claro que são custosos e ainda falta investimento! A universidade precisa ser democratizada (algo que não depende só dela para que isso ocorra), mas, agora, associar à inutilidade foi demais! A gente sabe que as universidades têm problemas mil, que ultrapassam questões estritamente pedagógicas ou administrativas, mas a miopia ultra-neoliberal-conservadora do cara é de enojar. Tese e papel higiênico para ele é a mesma coisa. Para ele, as pessoas mais velhas que entram na universidade são praticamente um desperdício de dinheiro público, porque, fica subtendido, são figuras pateticamente anacrônicas. Não vê os professores mais velhos como pessoas que tem algo a contribuir com seu conhecimento e experiencia.

Fico só lembrando também dos meus alunos e alunas com mais de 45 anos que estão fazendo a faculdade pela primeira vez, buscando não somente melhorar de vida ou simplesmente conhecer e explicar o mundo em vivemos a fim de ajudar a mudá-lo. O cara nem está a par do mercado editorial virtual ou não! Para mim, o que está em jogo é um discurso ou uma atitude perigosamente conservadora de um recalcado que só justifica os investimentos válidos se forem direcionados para os cursos da moda, especialmente os relacionados à economia capitalista e à alta tecnologia. Ah, ele diz que é jornalista, escritor e ensaista! Outra coisa: acho que ele não fez o mestrado e doutorado! Ah, entendi!


[Retoma o Janer:]
Vamos por partes. Tese e papel higiênico não são para mim a mesma coisa. Jamais afirmaria tal heresia. Papel higiênico é um dos grandes avanços da humanidade. Tanto que sempre faltou nos países mais atrasados do mundo, os socialistas. Tese nem como papel higiênico serve. Não vou negar que cá e lá – falo da área humanística - encontramos alguma tese que constitui uma contribuição à cultura. Mas são raríssimas. Tanto que a maioria quase absoluta delas fica relegada ao pó das bibliotecas. Tese, no fundo, só serve para manter as mordomias dos PhDeuses orientadores e aumentar salários dos acadêmicos. Também é muito conveniente para fazer turismo às margens do Sena, Tâmisa ou Spree.

Que velhos façam a universidade pela primeira vez, nada contra. Mas estas pessoas já avançadas em idade nunca procuram os cursos realmente úteis à sociedade, como enfermagem, odonto, medicina ou engenharia. Geralmente buscam aqueles cursos de vestibular fácil, isto é, as tais de Humanas. Como lazer de terceira idade é uma opção interessante. Melhor que ficar espichado no sofá vendo novelas. Daí que isto traga alguma contribuição ao país vai uma longa distância. Mas minha restrição não é a quem busca universidade em idade provecta. E sim aos mestrandos e doutorandos carecas. Terceira idade não é idade para se fazer mestrado, muito menos doutorado.

Se um ancião quiser fazer doutorado, para seu prazer espiritual, pagando de seu próprio bolso, que esteja a gosto. O que é obsceno é ver macróbios subsidiados pelo contribuinte para satisfazer uma vaidade. Ou para aumentar a aposentadoria. Tanto o mestre como o doutor devem formar-se ainda jovens, para que possam prestar bom tempo de serviço ao ensino. Tenho visto gente que começa doutorado lá pelos cinqüenta. Quando obtém o título, está em idade de aposentar-se. Isto é uma perversão típica da universidade brasileira.

Professor mais velho é outra coisa. Nada a ver com mestrandos carecas. Um professor mais velho acumulou experiência e saber durante todo seu magistério. Desde que não tenha começado a aprender quando já era velho. Neste caso, é muito curto seu período de aprendizado.

Em seu arrazoado precário, o missivista apela ao argumento ad hominem: “acho que ele não fez o mestrado e doutorado”. De fato, mestrado não fiz. Quando ia inscrever-me em curso de mestrado na Université de la Sorbonne Nouvelle – Paris III – encontrei numa fila M. Raymond Cantel, doyen da antiga Sorbonne, que não mais existe. Considerou que era uma perda de tempo matricular-me em mestrado. Eu tinha publicações suficientes para postular um doutorado. Naquele breve diálogo, meu mestrado se transformou em doutorado.

Mas ninguém pense que um dia almejei tal título. Quando terminei minhas universidades – Filosofia e Direito – prometi a mim mesmo que jamais voltaria a pôr os pés nesses templos do saber. Enveredei pelo jornalismo. Acontece que sempre gostei de viajar. Bolsa é uma boa chance de viajar, os acadêmicos tupiniquins que o digam. A França oferecia bolsas. Candidatei-me a uma delas, na área de Literatura Comparada. Certo dia, encontrei na rua o cônsul francês em Porto Alegre. “Tu és o nosso candidato. Mas não podes trocar de área? Em literatura é difícil. Não pode ser Direito?”

Poder, podia. Mas nada mais queria com Direito. Ao terminar meu curso, em gesto simbólico, joguei meus códigos e tratados no Guaíba. Tive uma extraordinária sensação de libertação. Insisti em Literatura e fui contemplado com a bolsa.

Ora, eu nem sabia o que era doutorado e muito menos Literatura Comparada. O que eu queria, lá no fundo, era Paris, sua estética, seus cafés, seus queijos e vinhos. E também suas mulheres. Se o preço era redigir uma tese, eu o pagava com prazer.

Paguei. Comprei vários ensaios na área, estudei a disciplina e redigi minha tese. Menção? Très Bien. Isso após uma defesa tumultuada. Fiz um ensaio absolutamente antiacadêmico, sem citar nenhum teórico. O que constitui heresia no universo dos PhDeuses. Método é um freio mental que a banca impõe ao thèsard. Você não pode pensar com seu próprio intelecto. Seria o caos.

Tant pis pour moi. Eu não buscava nenhum título e não tinha compromisso com universidade alguma. Minha tese, fosse aprovada ou não, não mudava nada em meus propósitos. Havia escrito um ensaio útil e, mais importante, legível. Fiquei surpreso quando, ao final do doutorado, soube que uma tese servia para lecionar. Foi assim que caí no magistério de Letras, os quatro anos mais inúteis de minha vida.

A defesa, peça teatral que dura em geral uma hora, se estendeu por quatro horas. Uma doutora da banca não admitia tese sem metodologia. “Où est votre méthode?” – questionou-me. Respondi que não havia ido à França para pensar com a cabeça de terceiros. Pensava com a minha. “Ma méthode, c’est la cristaldesque”.

Após longos e tensos debates entre os membros do júri, a tese foi aceita. Atribuo um pouco esta concessão à platéia. Na salle Bourjac, da Sorbonne, havia entre cinqüenta e sessenta mulheres, e um único rapaz. Não só a banca, como eu e minha mulher, estávamos perplexos. “Trabalhaste duro neste tempo todo” – me disse a Baixinha. Bom, confesso que tinha me esforçado. No fundo, penso que devo àquelas meninas minha aprovação. Seria uma grosseria rejeitar meu trabalho ante platéia tão florida.

Sou doutor por diletantismo, não por projeto. Me candidatei a outro doutorado na Espanha, queria curtir Madri. Ganhei a bolsa, curti Madri, mas me recusei a redigir a tese. Era picaretagem. Exigiam a redação de uma tese em seis meses. Ora, nenhuma tese séria pode ser redigida em seis meses, ainda mais com uma carga horária de cinco horas de aula por dia. Escrevi uma carta a meu orientador. Cito de memória.

“Dr! Quando se recebe uma bolsa para doutorado, os doutorados são dois. Um deles resulta numa tese que fica mofando nas bibliotecas. O outro é aquele que defendemos nos bares e restaurantes, lendo a imprensa e a literatura do país, conhecendo suas cidades. Esta eu a defendi com brilho e com ela me contento. Salud y felicidad a los suyos”. (Esta era a fórmula burocrática com a qual se terminava um pedido de estada à polícia).

Doutor por acaso, não tenho maior respeito por doutores. Sim, existirão os que merecem consideração por seus trabalhos. Mas estes são muito raros. O que vejo, o mais das vezes, são pavões que se apóiam em teorias sem pés nem cabeça e vivem da antiga fórmula francesa, “louons-nous les uns les autres”.

Antes que me esqueça: até hoje não peguei meu diploma de doutorado. Quando fui apanhá-lo na secretária da Sorbonne Nouvelle, uma velhota burocrata me atalhou: “C’est pas comme ça, Monsieur!” Meu diploma estava ali, do outro lado do balcão. Mas eu precisava enviar uma carta à universidade e esperá-lo em casa. Ora, eu já estava de pé no estribo, entregando as chaves do apartamento. Desisti. Não fui a Paris buscar um papelucho.

Last but not least, quem está propondo o fim dos doutorados não sou apenas eu. Mas também o professor Mark C. Taylor, presidente do departamento de religião da Universidade de Columbia em Nova York.

Papel higiênico, meu caro, é muito mais necessário que uma tese acadêmica. A humanidade consegue viver sem teses. Sem papel higiênico já é mais complicado.
Janer Cristaldo
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Bem ficamos por aqui, e esperemos os próximos rolos de papel higiênico.... quero dizer, teses acadêmicas...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 15 de maio de 2011

domingo, 30 de novembro de 2014

Miséria do Capital no Século 21 - Paulo Roberto de Almeida



Miséria do Capital no Século 21
Breve refutação não estatística de novas formas de criação da miséria

Paulo Roberto de Almeida


Economistas são seres simplistas, por definição. Eles costumam basear suas equações sobre a criação de renda e riqueza a partir de três fatores produtivos básicos: trabalho, capital e recursos naturais. Muitos outros economistas já tentaram introduzir nessas equações um outro fator produtivo: o capital humano. Mas, por diversos motivos, este acréscimo ainda não se tornou de uso comum na ciência econômica. Em todo caso, a riqueza das pessoas (Ps) costuma ser medida sob duas formas: em fluxos reais de renda, que é aquela que deriva de seu trabalho (RT), e em estoque da riqueza acumulada do trabalho, que costuma ser chamada de patrimônio (RP), esta podendo ser imobilizada (imóveis, iates, carros, etc.), ou ser utilizada para a criação de novas riquezas, sob a forma de ativos líquidos, e que podem ser chamadas de rendas do capital (RC).
É muito importante distinguir a dinâmica populacional – uma vez que criação de renda e riqueza depende das pessoas – dos níveis de renda (fluxos) e riqueza (estoques), que variam muito de um país a outro. A despeito de que o capital (bastante) e as pessoas (menos) possam viajar pelo mundo, não existe uma autoridade global e uma única fonte de regulação dos fluxos e dos estoques em posse das pessoas, e sim Estados nacionais (ENs) com jurisdições próprias. As filosofias em vigor na história do mundo moderno podem ser divididas, grosso modo, entre o liberalismo econômico, que acha que a criação de renda e riqueza deve ficar sob a competência das próprias pessoas (Ps), com um mínimo de interferência dos ENs, e o marxismo, que acha que ENs devem regular a RT e RP em benefício de todos, transferindo fluxos de renda e estoques de patrimônio entre as Ps, segundo critérios determinados por políticos e burocratas desses ENs.
 Existem neste mundo êmulos de Marx, em todas as partes, para todos os gostos e para todas as finalidades, alguns deles até mais espertos do que a maioria dos crentes, aproveitando-se da adesão de muitos nas teorias do capital (e do capitalismo) para aumentar o seu próprio capital às custas dos muito crentes nas antigas teorias do capital, que diziam que o capital só podia aumentar às custas do trabalho dos que dependiam apenas do seu trabalho individual. Esta separação absoluta dos partidários da teoria do capital – que na verdade é uma teoria do valor trabalho, a única coisa errada aceita por um liberal clássico como Adam Smith – não leva em conta o chamado capital humano, que os próprios economistas penam a integrar em suas equações. Em todo caso, eles sabem medir bem o crescimento da renda e riqueza dos ENs, usando para isso níveis monetários de valor agregado (ou PIB). Esse PIB se distribui entre as Ps, segundo uma dinâmica populacional e econômica, e para isso se mede o PIB per capita. Os êmulos de Marx acham que os ENs deveriam taxar mais RP-RC para distribuir entre os que possuem apenas RT, de maneira a tornar o mundo mais igualitário, ou menos desigual.
O problema todo é que essa recomendação marxista não deriva de nenhuma análise econômica sobre a criação de renda e riqueza, sendo apenas e tão somente uma recomendação política, baseada numa filosofia do igualitarismo, que é a mesma que vê no capital a fonte de todos os problemas humanos, e que considera que a criação de riqueza só se dá pela via do “valor-trabalho”. Essa filosofia orienta os ENs a avançarem sobre RP-RC, ou seja sobre o estoque de riqueza das poucas Ps muito ricas (que por definição são sempre em menor número), para distribuí-la entre as Ps que só dispõem da RT, ou seja dos fluxos de pagamentos derivados de seu trabalho. Ela tem tido sucesso ao redor do mundo, uma vez que pessoas dispondo de RT são sempre em maior número, formando a larga maioria dos cidadãos votantes nas modernas democracias de mercado.
O problema desse tipo de recomendação é que ela se aproxima do modelo de sociedade recomendada pelos marxistas, que é aquela na qual não existiria renda do capital, e nenhuma riqueza acumulada (RP), na qual todas as rendas do trabalho (RT) seriam igualitária e equitativamente divididas pelo EN. Não é preciso aqui grandes digressões, com base em equações econômicas ou em séries estatísticas históricas de renda e de riqueza, para constatar que esse tipo de sociedade não funcionou, e que os únicos exemplos reais na história – o socialismo de tipo soviético e seus êmulos ao redor do mundo – foram notórios fracassos econômicos na criação de renda e riqueza, só conseguindo se manter à custa de enorme repressão política, que produziu grande infelicidade humana (total falta de liberdade, e até mesmo alguns milhões de mortos).
Um modelo mais “ameno” desse tipo de igualitarismo radical – mas falso, uma vez que os que controlam o EN se apropriam de uma parte importante das rendas do “valor-trabalho” – é o socialismo moderado dos regimes de tipo socialdemocrata, em vigor em diversas democracias modernas de mercado, basicamente na Europa, com contrafações disso no resto do mundo (inclusive nos Estados Unidos e em diversos países da América Latina, com alguns poucos exemplos na Ásia). Uma consulta às estatísticas correntes mais frequentes relativas à criação de renda e riqueza nas últimas décadas (dados da OCDE, por exemplo) demonstra que o crescimento de todas as formas de renda e riqueza (RT, RP e RC) foi maior naqueles países onde foi menor a apropriação de fluxos e estoques dessas formas de renda e riqueza pelos próprios ENs. Não se trata aqui de opinião ou filosofia política, mas uma constatação simples, e direta, a partir de uma correlação entre níveis de carga fiscal dos países e suas respectivas taxas de crescimento do PIB (e do PIB per capita, e isso independentemente da distribuição social dessas formas de riqueza). Maior taxação, menor crescimento, simples assim.
Responda sinceramente: você é a favor de um sistema que permita maior e mais rápida criação de renda e riqueza – independentemente de como esses fluxos e estoques são distribuídos – ou prefere um que pretende distribuir renda, riqueza e patrimônio de forma igualitária, por políticos e burocratas que pretendem saber mais do que você qual a melhor forma de distribuição social dessas rendas? Observe que os países mais livres economicamente, que por acaso são mais desiguais, são aqueles que também crescem mais – e que portanto aumentam todas as formas de riqueza – e que os mais estagnados econômica e socialmente foram e são aqueles que mais tenderam ao modelo marxista de organização social. Mais uma vez, não se trata aqui de opinião ou de filosofia política, mas apenas uma constatação direta dos dados da realidade (e a ex-URSS, e as atuais Cuba e Coreia do Norte estão aí para provar isso mesmo). Na vertente mais moderada do modelo marxista, a Europa ocidental nos prova como é possível crescer menos – e portanto distribuir ou acumular menos – com base em políticas de tipo distributiva inspiradas no igualitarismo filosófico da “teoria do valor-trabalho”.
Isso nos traz de volta ao “capital do século 21”, proposto por um economista que acaba de provar que a desigualdade vem aumentando no mundo, baseada nos fluxos e estoques de rendimentos obtidos pelo capital (RP e RC) sobre os simples rendimentos do trabalho (RT). Ele acha que governos devem taxar mais a RP e a RC dos muito ricos, pois o problema, para ele, é a existência de poucas pessoas muito ricas – e que tendem a enriquecer cada vez mais –, não a existência de um imenso contingente de pobres, ou de pessoas moderadamente ricas (no caso da classe média). Ele prefere empobrecer os ricos, em lugar de utilizar sua imensa capacidade analítica para descobrir formas de enriquecer os pobres. Pela experiência visual que já tivemos no século 20 em torno desse tipo de empreendimento, acredito que será mais um desastre econômico e social à espreita, do que propriamente uma forma de criar o verdadeiro capital do século 21.

Hartford, 30 de novembro de  2014.

sábado, 29 de novembro de 2014

This Day in History: Palestine partition 1947 - Oswaldo Aranha (NYT)

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On This Day: November 29, 1947


On Nov. 29, 1947, the U.N. General Assembly passed a resolution calling for Palestine to be partitioned between Arabs and Jews.

Front Page Image


ASSEMBLY VOTES PALESTINE PARTITION; MARGIN IS 33 TO 13; ARABS WALK OUT; ARANHA HAILS WORK AS SESSION ENDS



U.N. REJECTS DELAY


Proposal Driven Through by U.S. and Soviet Will Set Up Two Sates


COMMISSION IS APPOINTED


Britain Holds Out Hand to It - Arabs Fail in Last-Minute Resort to Federal Plan

By THOMAS J. HAMILTON

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Congress Action Lags on Aid Bill Despite Warnings Need Is Urgent

Vast G.I. Housing to Rise Near Site of World's Fair: 21 14-Story Apartment Units to Form Nation's Largest Veterans' Cooperative: Cost Put at $58,000,000: Occupancy on Tenant-Owner Basis -- Work Will Start Before End of Year

Molotov Insists on Regime Before Treaty on Germany

Company Asks Rise in Gas Rate From $1.15 to $2 Sliding Scale

The United Nations General Assembly approved yesterday a proposal to partition Palestine into two states, one Arab and the other Jewish, that are to become fully independent by Oct.1. The vote was 33 to 13 with two abstentions and one delegation, the Siamese, absent.

The decision was primarily a result of the fact that the delegations of the United States and the Soviet Union, which were at loggerheads on every other important issue before the Assembly, stood together on partition. Andrei A. Gromyko and Herschel V. Johnson both urged the Assembly yesterday not to agree to further delay but to vote for partition at once.

The Assembly disregarded last minute Arab efforts to effect a compromise. Although the votes of a dozen or more delegations see-sawed to the last, supporters of partition had two votes more than the required two-thirds majority, or a margin of three.

How Members Voted

The roll-call vote was as follows: For (33) - Australia, Belgium, Bolivia, Brazil, Canada, Costa Rica, Czechoslovakia, Denmark, Dominican Republic, Ecuador, France, Guatemala, Haiti, Iceland, Liberia, Luxembourg, the Netherlands, New Zealand, Nicaragua, Norway, Panama, Paraguay, Peru Philippines, Poland, Sweden, Ukraine, South Africa, Uruguay, the Soviet Union, the United States, Venezuela, White Russia.

Against (13) - Afghanistan, Cuba, Egypt, Greece, India, Iran, Iraq, Lebanon, Pakistan, Saudi Arabia, Syria, Turkey, Yemen.

Abstentions (10) - Argentina, Chile, China, Colombia, El Salvador, Ethiopia, Honduras, Mexico, United Kingdom, Yugoslavia.

Absent (1) - Siam.

All other questions before the Assembly were disposed of a week ago, and it ended its second regular session at 6:57 P.M. after farewell speeches by Dr. Oswaldo Aranha, its President, and Trygve Lie, the Secretary General. The Assembly's third regular session is to open in a European capital on Sept. 21.

The vote on partition was taken at 5:35 P. M. Representatives of Iraq, Saudi Arabia, Syria, and Yemen, four of the six Arab member states, announced that they would not be bound by the Assembly's decision and walked determinedly out of the Assembly Hall at Flushing Meadow. The Egyptian and Lebanese delegates were silent but walked out, too.

Briton Seeks Contact

Sir Alexander Cadogan, representative of Britain, which is to terminate the League of Nations mandate over Palestine and withdraw all British troops by Aug. 1, made a brief statement after the vote. He requested the United Nations Palestine Commission to establish contact with the British Government about the date of its arrival in Palestine and the coordination of its plans with the withdrawal of British troops.

The United Nations commission which will be responsible to the Security Council in the event that the Arabs carry out their threats to fight rather than agree to partition, will be composed of representatives of Bolivia, Czechoslovakia, Denmark, Panama and the Philippines.

This state, which is understood to have the backing of the United States, was proposed by Dr. Aranha and approved without opposition after the Arab delegates had walked out.

The commission, as proposed by the partition subcommittee, of the Assembly's Ad Hoc Committee on Palestine, was to have been composed of Denmark, Guatemala, Iceland, Poland, and Uruguay, but the question was left to the Assembly because of United States opposition.

The Assembly, without discussion, also approved an appropriation of $2,000,000 for the expenses of the commission, which will take over authority in Palestine after the British terminate the mandate and will then transfer it to the "shadow governments" of the two states.

The walkout of the Arab delegates was taken as a clear indication that the Palestinian Arabs would have nothing to do with the Assembly's decision. The British have emphasized repeatedly that British troops could not be used to impose a settlement not acceptable to both Jews and Arabs, and the partition plan does not provide outside military force to keep order.

Instead, it provides for the establishment of armed militia by the two nascent states to keep internal order and that any threats to peace by the neighboring Arab states are to be referred to the Security Council.

The Assembly decided Friday to take a recess of twenty-four hours to give the Arabs time to submit a comprise proposal, but this turned out to be what Mr. Johnson called a mere resurrection of the proposal for a federal Palestine, which had been recommended by a minority of the United Nations Special Committee on Palestine.

The resolution to return the entire question to the Ad Hoc Committee on Palestine, introduced by Mostafa Adl, the representative of Iran, would furthermore have directed the committee to take into account the last-minute Arab proposal.

A simple procedural resolution returning the question to the committee would have had precedence over the partition proposal, but Dr. Aranha, after considerable reflection, ruled that the extraneous provisions barred it from being treated as a procedural motion and that it could not be voted on until after the Assembly's decision on partition.

Vote on Principles Sought

Camille Chamoun, the Lebanese representative, tried to meet Dr. Aranha's ruling by demanding that the committee vote first on the eleven principles on the future government of Palestine, which had been approved unanimously by the Special Committee on Palestine last summer.

Mr. Chamoun remarked that the resolution before the Assembly did not mention these principles, but Dr. Aranha replied that they were covered by the plan substituted by the Palestine committee, to which the Assembly's resolution will give effect, and rejected the final Arab attempt to postpone a decision.

Dr. Alfonso Lopez, the Colombian representative, who on Friday had submitted a complicated proposal that, among other things, would have returned the question to the committee, had arranged with another delegate to make a simple proposal to recommit. However, the delegate, sensing the mood of the Assembly, remained silent and Dr. Aranha called for the decisive vote.

U.S. Efforts Praised

The United States delegation played its part in persuading the delegate in question not to present the motion for recommittal, and supporters of partition agreed that, after long hesitation, it had sincerely done its best to obtain Assembly approval of partition.

It was still difficult to account for the fact that Greece, which otherwise followed United States leadership throughout the long Assembly, voted against partition and that some Latin American countries abstained.

Britain, which brought the Palestine question before the Assembly last March, abstained on all votes in the Palestine committee and in poling on the issue in the Assembly.

It was expected that had the Assembly failed to reach a decision the United States would have asked Britain to stay on in Palestine. Sir Alexander's statement after the decision was taken was welcomed as being more cooperative than previous ones. It was generally expected that the United States and Britain would now agree on a working arrangement to facilitate the commission's work.

The Arab delegates, particularly after the vote, referred bitterly to the "heavy pressure" exerted on other delegations. Other delegates interpreted these complaints as attacks on the United States.

The Syrian representatives led this attack. Faris el-Khoury, in a statement before the vote, charged that the proportion of Jews to the rest of the population in the United States was 1 to 30. Jews were trying to "intimidate the United Nations ... and hiss the speakers here," which, he said was "proof that they are dominating here."

This assertion drew hisses from the gallery, and Dr. Aranha pounded his gavel for order.

A few minutes before the Assembly convened Arab spokesmen announced that they had drawn up a new six-point program in twenty-four hours of conferences. The program involved this formula:

(1) A federal independent state of Palestine shall be created not later than Aug. 1, 1949.

(2) The Government of Palestine shall be constituted on a federal basis and shall include a federal government and governments for Arab and Jewish countries.

(3) Boundaries of the cantons will be fixed so as to include a federal basis and shall include a federal government and governments for Arab and Jewish countries.

(4) The population of Palestine shall elect by universal, direct suffrage a Constituent Assembly, which shall draft the Constitution of the future federated state of Palestine. The Constituent Assembly shall be composed of all elements of the population in proportion to the number of their respective citizens.

(5) The Constituent Assembly, in defining the attributes of the federated government of Palestine as well as of its legislative and judiciary organs and the attributes of the governments of the cantons and of the relation of the governments of these cantons with the federal government, shall draw its inspiration chiefly from the principles of the Constitution of the United States as well as from the organization of laws in the states of the United States.

(6) The Constitution will provide, among other things, for protection of the holy places, liberty of access to visit the holy places and freedom of religion as well as safeguarding of the rights of religious establishments of all nationalities in Palestine. 

Corrupcao e roubalheira na Petrobras: a inacreditavel sucessao defalcatruas: dez anos com a conivencia do STF

Ana Clara Costa
VEJA.com, 28/11/2014

À medida que avança a Operação Lava Jato, deflagrada pela Polícia Federal no início deste ano, os desmandos recorrentes na Petrobras se tornam cada vez mais chocantes. Um levantamento feito pelo site de VEJA com base em dados divulgados pela empresa em seu Portal de Transparência mostra que, entre 2003 e 2014, dos cerca de 890 mil contratos fechados pela estatal, 784 mil foram dispensados de licitação — o que representa 88% do total. Isso corresponde a um montante de cerca de 60 bilhões de reais gastos no período, levando-se em conta apenas os contratos fechados em moeda local. A Petrobras se vale do Decreto 2.745, do governo de Fernando Henrique Cardoso, para escapar do processo licitatório previsto na Lei 8.666 — à que estão sujeitas todas as compras de órgãos da administração pública. O decreto foi criado para dar agilidade à execução de obras num momento em que a estatal se abria para o capital privado. Porém, a partir de 2006, se tornou regra para quase todos os contratos.

Os montantes que envolvem a dispensa de licitação espantam. Um dos contratos, fechado com o consórcio Techint – Andrade Gutierrez, no valor de 2,4 bilhões de reais, foi dispensado de certame concorrencial porque as demais concorrentes fizeram propostas com preços “incompatíveis”. Assim, a Petrobras optou por nem mesmo fazer o leilão. Outro contrato mostra uma compra de 2,3 bilhões de reais da GE em que a empresa alega que “situações atípicas” tornaram a licitação inexigível. Outro contrato com a construtora Engevix, cujos executivos foram presos no âmbito da Lava Jato por suspeita de corrupção no fornecimento de serviços à estatal, foi firmado por 1,4 bilhão de reais com dispensa de licitação, sob a justificativa de se tratar de uma “urgência”. A obra consistia em fornecer material e serviços para um projeto básico.
Procurada pelo site de VEJA, a Petrobras afirmou, em nota, que as contratações seguem a legislação vigente e que, mesmo feitas com o respaldo do decreto, têm modelo similar ao licitatório. A opinião cria divergências, já que a Lei de Licitações não prevê, por exemplo, o advento da carta-convite, em que a Petrobras escolhe as empresas que podem participar da concorrência. Tampouco está na lei o artigo que permite que, depois que houve a escolha do vencedor, ambos sentem numa sala, a portas fechadas, para “renegociar” os valores e o escopo do contrato. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem 19 mandados de segurança junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a revisão dos termos do decreto — e sua regulamentação. A Petrobras entrou com uma medida liminar, que foi concedida pelo STF, permitindo o uso do decreto até o julgamento de mérito. Isso ocorreu há cerca de 10 anos e o Supremo nunca mais se manifestou.
A estatal vem sendo questionada há muitos anos sobre a dispensa de licitação, e sempre usa o argumento de que possui controles internos capazes de vetar condutas duvidosas durante a negociação de contratos. Tais afirmações estão disponíveis de maneira farta em seu site Fatos e Dados, usado para se comunicar com a imprensa. Contudo, o propinoduto que vem sendo descoberto pelas investigações da Polícia Federal mostra que tais controles não são tão eficazes assim. Segundo as investigações, a estimativa inicial é de que ao menos 10 bilhões de reais tenham sido drenados da empresa em direção aos caixas de partidos políticos, lobistas, funcionários da estatal e executivos de empreiteiras. Com o congelamento de contas de apenas cinco acusados que aceitaram a delação premiada, a Justiça prevê repatriar quase 500 milhões de reais.
O site de VEJA ouviu especialistas em contratos que prestam serviços para a estatal, que aceitaram falar em condição de sigilo. As informações obtidas são emblemáticas porque mostram que a cultura da estatal não prevê a busca de solução para casos de superfaturamento. “Há um sentimento de onipotência, de que nada de errado pode estar acontecendo ali”, afirma um auditor. Seus mandatários sequer cogitam admitir suspeitas de desvios apontadas por órgãos de prestação de contas, como o TCU. Até 2010, por exemplo, quando dados de orçamento de obras eram pedidos pelo Tribunal, a empresa os enviava com muito atraso e, propositalmente, em arquivos PDF, não em Excel. Isso dificultava a tabulação dos números, já que muitos dos orçamentos tinham mais de 200 páginas. Isso quando o envio não era vetado, por se tratar de “sigilo comercial”. Nos últimos anos da gestão de José Sérgio Gabrielli, a estatal passou a liberar as contas com mais presteza, não por vontade própria, mas por pressão do Congresso Nacional, ainda sob o efeito da fracassada CPI de 2009. A melhora da transparência prosseguiu nos anos de Graça Foster, mas ainda está longe de ser ideal para uma empresa que tem ações listadas na bolsa de valores. “A postura da empresa sempre é reativa. Em 99% dos casos, não acredita em denúncias de irregularidades”, diz o técnico
Quando casos de sobrepreço são levantados pelo TCU, como ocorreu em pelo menos quatro dos principais contratos de Abreu e Lima, a primeira reação da empresa foi negar. Foi o que aconteceu em 2009, quando o Tribunal pediu a paralisação das obras na refinaria pernambucana, alegando suspeitas de superfaturamento. À época, o então presidente Lula ameaçou enviar ao Congresso um projeto de lei limitando os poderes da corte de contas. Lula declarou que o órgão “quase governa o país”. Em seguida, vetou um projeto de lei que bloqueava o envio de recursos públicos para Abreu e Lima. Sabe-se, agora, conforme revelou VEJA, que nessa mesma época o ex-diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, enviou pessoalmente um e-mail à então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, alertando sobre a investigação do Tribunal.
Um acórdão de um processo relatado pelo então ministro do TCU, Ubiratan Aguiar, hoje aposentado, em 2004, dá o tom da relação da empresa com os auditores públicos. “Observo, no entanto, como relator dos processos da estatal no biênio de 2003 e 2004, bem como em grande parte do biênio de 2001 e 2002, que a Petrobras não tem dado cumprimento às decisões deste Tribunal”, afirma. O ministro argumenta que a insistência da empresa em abrir mão da licitação para grandes obras, optando pela carta-convite, é prejudicial — e aponta que isso acontecia também na gestão de Fernando Henrique Cardoso, em que o presidente da empresa era Joel Rennó. “Pela experiência vivida nos últimos anos como relator da Petrobras, constato que os seus administradores adotaram, na quase totalidade das licitações, a modalidade de convite. Com isso os princípios da legalidade, da publicidade, da igualdade, da eficiência, da vinculação ao instrumento convocatório, têm sido violados de forma contumaz”, relatou Aguiar.
Quando se descobre um esquema de desvio de recursos como o que, tudo indica, ainda é vigente na Petrobras, a primeira reação dos órgãos de controle é escarafunchar para encontrar o ovo da serpente, ou seja, a origem do problema. Contudo, no caso da estatal, as perspectivas são desoladoras: teme-se que a origem não seja encontrada e que exterminar o mal tampouco seja possível. Dentro do próprio TCU, há a constatação de que a corte de contas, sozinha, não é capaz de destacar todos os casos de irregularidades simplesmente pelo fato de os contratos da estatal serem bilionários. Isso significa que quanto maiores os valores, mais fácil é o desvio de pequenos porcentuais que não saltem aos olhos dos auditores. Para extirpar a cultura da corrupção, será preciso, primeiro, que a empresa reconheça o mal que opera em suas salas e deixe de lado a postura tão comum entre seus diretores, que é a de “negar até a morte”. Uma aula dessa cultura foi dada recentemente por Graça Foster. A presidente sabia desde maio deste ano sobre a propina paga pela holandesa SBM a funcionários da estatal. À época, a executiva negou com veemência. Semanas atrás, por fim, reconheceu ter sido avisada sobre o crime pela própria empresa estrangeira. Ironicamente, no mesmo dia, anunciou a criação de uma diretoria de governança.

Petrobras: Lula e Dilma sabiam da corrupcao, e mandaram continuar - Revista Veja

O escândalo do escândalo: dois corruptos defendem a quadrilha de corruptos e o sistema mafioso continua a funcionar como senada estivesse acontecendo. Que país é esse? 
Como é possível que cidadãos honrados e encarregados da punição de crimes e de fazer justiça deuxem que tudo continue como está?
Até quando pilantras e bandidos vão continuar mandando no paįs? Até quando mafiosos vão continuar no Congresso e em altos cargos na administração? Até quando?
Paulo Roberto de Almeida

Em VEJA desta semana

A água está chegando ao pescoço

O advogado da Petrobras avisou o Planalto dos riscos de a estatal continuar contratando obras sem licitação apesar das sucessivas advertências do Tribunal de Contas da União sobre irregularidades

Robson Bonin e Hugo Marques
Veja.com, 28/11/2014
Dilma Rousseff

(Nelson Antoine/Frame/Folhapress)

Na semana passada, VEJA mostrou que mensagens eletrônicas encontradas pela Polícia Federal nos computadores do Palácio do Planalto revelavam que o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff tiveram, em 2009, a oportunidade de interromper a ação dos corruptos que atuavam no coração da Petrobras — e a desperdiçaram. Chefe da Casa Civil do governo Lula, Dilma recebeu do então diretor de Abastecimento e Refino da Petrobras, Paulo Roberto Costa, um e-mail alertando para o risco de que obras sob sua responsabilidade fossem paralisadas por recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU). Cérebro da quadrilha que desviou bilhões dos cofres da companhia, Paulo Roberto estava preocupado com a ação dos auditores que começaram a farejar pistas da existência do cartel de empreiteiras que superfaturava contratos na estatal. Para impedir que o dinheiro parasse de jorrar no bolso dos corruptos, o diretor sugeriu que o governo agisse politicamente para neutralizar as denúncias do tribunal. E assim foi feito. Logo depois de receber a mensagem, Dilma se pôs a criticar a iniciativa do TCU, e Lula vetou a decisão do Parlamento de interromper as obras suspeitas, entre elas a de construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Na esteira da apuração da reportagem, VEJA perguntou à presidente, que também comandava o Conselho de Administração da Petrobras na ocasião, se era comum um diretor desconsiderar a hierarquia, dirigir-se diretamente ao Palácio do Planalto e tomar a liberdade de oferecer sugestões políticas para um problema administrativo. Dilma não respondeu. A presidente também não explicou por que o governo, em vez de atuar para sanar as irregularidades apontadas pelo tribunal, fez exatamente o contrário. Depois da publicação da reportagem, Dilma Rousseff preferiu, em nota oficial, atacar o mensageiro. Ela acusou VEJA de manipulação. A revista só relatou fatos produzidos pelos governos de Lula e Dilma. Não foi VEJA que colocou Paulo Roberto Costa na Petrobras com o objetivo de montar um esquema de corrupção para obter recursos a ser entregues a políticos e partidos aliados do governo. Não foi VEJA que colocou o doleiro Alberto Youssef a serviço do esquema de Costa na Petrobras. Quem disse que Lula e Dilma sabiam de tudo foi Youssef. VEJA apenas revelou a fala do doleiro. Portanto, não adianta esbravejar contra o mensageiro, quando é a mensagem que fere.

Em 29 de maio de 2007, o então advogado da estatal junto ao TCU, Claudismar Zupiroli, enviou um e-mail à então secretária executiva da Casa Civil, Erenice Guerra. Ele relatou sua preocupação com o fato de o TCU estar no pé da Petrobras pelo uso abusivo de um decreto que permite gastos sem licitação na estatal (leia a entrevista com o presidente do TCU na pág. 72). Zupiroli informa que há um “voa barata” entre os gestores da Petrobras, que estavam “com medo do recrudescimento do tribunal em cima deles”, por causa das contratações sem licitação. Editada em 1998 no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, a norma foi idealizada com uma finalidade nobre: agilizar a contratação de serviços prioritários e urgentes a fim de evitar que a estatal perdesse competitividade no mercado. Nas mãos de Paulo Roberto Costa e de outros diretores corruptos da estatal, no entanto, o decreto passou a ser usado indiscriminadamente para dispensar a licitação em praticamente todas as obras, servindo de biombo para acobertar as maiores atrocidades patrocinadas com o dinheiro público.

É da natureza dos corruptos não se intimidar diante de leis e decretos que dificultam sua ação. Assim, não se pode ver na dispensa de licitação a única causa da transformação das obras da Refinaria Abreu e Lima no maior assalto aos cofres públicos já registrado na história do Brasil. De 2,5 bilhões de dólares, o custo da refinaria saltou para 20 bilhões. Uma parte considerável desse dinheiro foi desviada pelo esquema de corrupção liderado por Paulo Roberto na Petrobras. No relatório de 2009, o TCU alertava para a existência de superfaturamento. Informava que os negócios suspeitos eram planejados em uma sala secreta, localizada no 19º andar do edifício-sede da Petrobras. Era lá que Paulo Roberto dava expediente como diretor de Abastecimento. Dali ele redigiu a mensagem a Dilma Rousseff sugerindo a bem-sucedida intervenção do governo para que nada fosse investigado.

Zupiroli também achou por bem advertir Erenice: “Cresce a corrente dos que se recusam a assumir cargos de responsabilidade, como cresce a disposição daqueles que acham que devem ligar ‘o f.’ no sentido de aplicar a Lei de Licitações, independentemente das consequências. A água está chegando ao pescoço”. Não há registro de que a principal conselheira de Dilma tenha tomado alguma providência no sentido de ao menos averiguar se havia algo errado. O que se viu foi que as contratações sem licitação continuaram a todo o vapor. O primeiro e-mail revelado por VEJA mostrou que o Planalto foi acionado por Paulo Roberto Costa para não deixar o TCU interromper as obras e, claro, a dinheirama sem licitação. A mensagem do advogado, bem mais explícita e eloquente, mandara o mesmo recado dois anos antes. Na semana passada, o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) apresentou requerimento pedindo a convocação de Dilma e Lula para prestar esclarecimentos na CPI mista da Petrobras. “A presidente disse que está disposta a aprofundar toda a investigação. Nada mais justo do que ela ir à CPI para esclarecer, em primeiro lugar, a acusação do doleiro e, agora, a ligação com esse diretor corrupto.” O parlamentar também quer que o ex-presidente e sua sucessora expliquem como a quadrilha conseguiu se instalar na Petrobras sem que o governo percebesse. Quadrilha que, segundo os depoimentos colhidos pela polícia, também ajudou a financiar a própria campanha presidencial de Dilma em 2010 e alimentou o caixa do PT e de seus aliados.

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Outros destaques de VEJA desta semana

Itamaraty: mandarins da Republica querem ser aspones no exterior...

Todos os mandarins que estão insatisfeitos com o Brasil -- e imagino que sejam milhares, com todo o roubo organizado pelo fascimo da Receita sobre todos, e toda a insegurança de um país que não consegue proteger os cidadãos, hoje à mercê de bandidos de todos os tipos, de todas as idades, em todos os lugares, a quaisquer horas -- querem pegar uma boquinha em embaixadas do exterior (mas só as boas, na Europa e nos EUA, nada de África, América Central, Ásia do sul, essas coisas -- e ficam imaginando criar cargos de aspones nas representações diplomáticas.
Tenho a impressão que já criaram os adidos agrícolas, mas nunca foi concretizado, ao que parece por falta de dinheiro. Outro dia apareceu a ideia de adidos da Advocacia Geral da União, esses senhores que não tolerariam ganhar menos que o embaixador, para não fazer absolutamente nada. Agora surge a ideia desses de comércio exterior, mais um pouco os de ciência e tecnologia (sabem como é, tal turismo acadêmico do Ciência Sem Fronteiras), logo mais será o adido de inglês (estão criando um programa só para isso...), e mais um pouco o de esportes, o samba, suor e cerveja, e por aí vai...
Só não criam é mais riqueza para o país: todos querem viver às custas da viúva...
Paulo Roberto de Almeida

SINDITAMARATY contesta a proposta da CNI de criação de cargos de adidos de comércio exterior
http://sinditamaraty.org.br/post.php?x=6039

O SINDITAMARATY tomou conhecimento da Carta do Presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), datada de 21 de outubro de 2014, sobre proposta de criação da função de Adidos de Indústria e Comércio junto a representações diplomáticas do Brasil no exterior e manifesta-se contrário ao apresentado pela CNI, por representar grave aumento injustificado de gastos de dinheiro público, duplicação de esforços, desvalorização do serviço exterior brasileiro e tentativa de subtração de competências que por lei são exclusivas do Itamaraty.

A Lei nº 4.669/65 e o Decreto nº 56.702/65 atribuíram ao Ministério das Relações Exteriores atividades de promoção comercial no exterior por meio de suas missões diplomáticas e repartições consulares. Nestes quase 50 anos, o Itamaraty construiu amplo sistema de promoção comercial e de investimentos: departamentos especializados em temas econômicos e comerciais, além de extensa rede de Setores de Promoção Comercial (SECOMs), localizados em seus Postos no Exterior. Tudo em plena coordenação com instituições brasileiras, sejam elas públicas, sejam privadas, incluindo a própria CNI. São 102 SECOMs em 81 países e nos cinco continentes. E Isso não é pouco.

A proposta da CNI, infelizmente, não parece se preocupar em investir e contribuir para fortalecer a estrutura disponibilizada pelo MRE, o que parece ser mais econômico e logicamente viável. A proposta não cria cargos em locais onde é necessário abrir mercados e onde há carência de recursos. No continente africano, por exemplo, onde o Itamaraty já possui 47 postos e 14 SECOMs, segundo a proposta da CNI, o cargo de adido comercial seria criado na Embaixada do Brasil em Pretoria, capital onde já existe SECOM atuante e de forma expressiva. O que dizer do fato do Itamaraty hoje defender os interesses da indústria brasileira no exterior e identificar temas que afetam nossas exportações de maneira reconhecidamente eficiente e relevante, por meio de suas delegações junto às organizações internacionais como a Comissão Europeia, o MERCOSUL, a ALADI e a OMC?

http://sinditamaraty.org.br/post.php?x=6039
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Venezuela: ditadura bolivariana cria o "disque-delacao", chegando no stalinismo classico

Estamos em plena revolução cultural na Venezuela: como sob a China de Mao, se você desconfiar que o seu vizinho é um agente da reação, ou serviçal do imperialismo, e quer destruir a revolução mesmo em pensamento, não hesite, telefone para 0800 da delação institucionalizada.
Essa matéria tinha passado despercebida, e a menos que seja uma brincadeira do Casseta e Planeta venezuelano, ou uma montagem de El Sensacionalista bolivariano, tem tudo para ser verdade...
Paulo Roberto de Almeida 


G1, 16/09/2013

Presidente da Venezuela cria 0800 para combater traidores da pátria

Sucessor de Hugo Chávez lançou linha especial para venezuelanos que desconfiarem de algo ligarem e acusarem a pessoa suspeita.

Começou a funcionar nesta segunda (16) na Venezuela uma central de atendimento para receber denúncias sobre traidores da pátria. A ideia foi do presidente Nicolás Maduro, que se diz vítima de inúmeras conspirações.
Para combater aqueles que denomina de "inimigos da pátria", o sucessor de Hugo Chávez lançou uma linha especial, o "0800-Sabotagem". O serviço serve para os venezuelanos que desconfiarem de algo ou de alguém liguem e acusem a pessoa suspeita.
Segundo Maduro, será um "centro de informação" para que as pessoas possam fazer as acusações em "tempo real". Nos últimos meses o presidente Maduro, mergulhado em uma série de problemas econômicos gerados, segundo os analistas, pelo próprio governo, viu conspirações por todos os lados. Foi o caso da escassez de papel higiênico, quando acusou os agentes do imperialismo de estocarem o produto, de forma a provocar mal-estar na população na hora de recorrer ao toalete.
Há poucos dias um apagão no sistema elétrico nacional assolou 70% do país. Os apagões não são uma novidade nos últimos anos na Venezuela. Mas Maduro sustentou que era uma "sabotagem do fascismo". Nas últimas semanas as mulheres venezuelanas que exibem longas cabeleiras estão sendo alvo de ataques de gangues as assaltam para cortar seus cabelos, que são revendidos no mercado negro de megahair. Maduro exclamou que estes cortes capilares constituem uma "guerra psicológica contra a Venezuela".
O presidente venezuelano fez denúncias de diversas conspirações, sempre prometendo apresentar as provas. Mas, de todas as denúncias que fez, não apresentou uma prova sequer. O presidente até anunciou a próxima conspiração, com data marcada, que seria em outubro, denominada "Colapso Total", segundo ele organizada desde a Casa Branca, em Washington. Esta sequência de denúncias feitas por Maduro está sendo ironicamente denominada de "A Conspiranóia".

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Crescimento: ah, essa crise internacional que atrapalha o Brasil...

Pois é: como diriam os companheiros, os países ricos atrapalham o nosso crescimento...
Paulo R de Almeida

The eagle soars

The Economist, November 28, 2014

Revised data showed that America’s economy grew by 3.9% in the third quarter at an annualised rate, a quicker pace than had been thought. A first estimate had put growth at 3.5%, but failed to reckon for rising consumer spending. GDP rose at an annualised 4.6% in the second quarter; America’s economy has had its best six-month performance in more than ten years. Seearticle