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quarta-feira, 12 de agosto de 2009

1280) Colombia: polemica sobre a presenca militar americana

Um artigo contendo um posicionamento de princípio sobre a espinhosa questão. Depois comento.

As Bases Militares Americanas na Colômbia: Um Presente de Grego
Rodrigo Constantino
11.08.2009

Over grown military establishments are under any form of government inauspicious to liberty, and are to be regarded as particularly hostile to republican liberty.
George Washington

O governo americano deveria retirar suas bases militares instaladas na Colômbia. A idéia de que o governo americano representa a polícia mundial e que, portanto, será o guardião da democracia no planeta é perigosa, e pode ameaçar a própria liberdade no longo prazo. De fato, essa mentalidade vem desde o presidente Woodrow Wilson, e praticamente todos os outros que o sucederam usaram o discurso altruísta para justificar a estratégia expansionista militar. Cruzadas para salvar a civilização são típicas de impérios, como Roma tentando educar os bárbaros, ou a Espanha catequizando os índios, sempre com o uso de muita violência. E medidas imperialistas acabam servindo para limitar a liberdade do próprio povo, assim como oferecem um excelente pretexto para outros governos avançarem sobre a liberdade de seus cidadãos.
Que fique claro o seguinte: a revolução bolivariana patrocinada por Hugo Chávez representa um risco infinitamente maior para as liberdades individuais na América Latina do que as bases militares americanas. Quanto a isso não resta dúvida. Portanto, pode-se descartar toda a retórica do próprio Chávez e demais aliados socialistas: seu discurso é puro jogo de cena para justificar mais medidas totalitárias. Mas esse é justamente o tipo de conseqüência que a medida do governo americano acaba estimulando. O bode expiatório é oferecido de presente pelo governo americano. Todo tirano necessita de um inimigo externo para justificar suas atrocidades domésticas.
Do ponto de vista dos próprios americanos, tal medida deveria ser duramente combatida. O povo é forçado a pagar impostos para sustentar o expansionismo militar de seu governo, que em nome da cruzada pela democracia acaba se metendo em cada canto do planeta, em guerras que custam caro para o pagador de impostos e que ajudam a manchar a imagem dos próprios americanos pelo mundo. Muitos ditadores “amigos” acabam paradoxalmente sendo financiados em nome da defesa da democracia. Grandes impérios sucumbiram justamente por causa de uma extensão excessiva, de uma tentativa de resolver todos os “problemas” da humanidade. O governo americano apresenta déficit fiscal crescente, uma dívida pública astronômica, um modelo de bem-estar social insustentável, e ainda mete a mão no bolso dos cidadãos para bancar o xerife internacional. Tudo isso coloca em xeque o valor do dólar e as liberdades individuais dos próprios americanos. Portanto, o cidadão americano tem todo direito de condenar veementemente as aventuras internacionais de seu governo, que ameaçam sua liberdade.
Do ponto de vista dos latino-americanos defensores da liberdade, essa postura também deve ser criticada, pois oferece combustível ideológico para os inimigos da liberdade. Assim como o embargo americano a Cuba serve até hoje para alimentar uma ditadura assassina, que se faz de vítima indefesa diante do império gigante, essas medidas do governo americano acabam colocando mais lenha na fogueira antiamericana e, por tabela, anticapitalista dos perfeitos idiotas latino-americanos. O tiro sai pela culatra. O tiranete Chávez pode conquistar mais adeptos, e consegue o pretexto perfeito para se armar mais, na verdade contra seu próprio povo. As aventuras do governo americano têm resultado justamente no crescimento do antiamericanismo, sendo o caso do Vietnã o melhor exemplo.
Os libertários precisam deixar claro que condenam essas cruzadas militares de quaisquer governos. Focando mais no curto prazo, e apelando para o pragmatismo do realpolitik, pode-se argumentar que essa postura do governo americano conseguiu evitar que muitos países fossem vítimas do comunismo. O caso coreano é um típico exemplo. Mas devemos perguntar: qual o preço disso para a liberdade no longo prazo? Sacrificar os ideais libertários de não-agressão em nome de resultados imediatos pode ser fatal para a liberdade. O fato é que o governo americano não tem direito algum de forçar os cidadãos americanos a pagar por tais guerras, assim como não deveria ter o direito de realizar doações aos países pobres, que acaba sendo a transferência compulsória de recursos dos pobres americanos para os ricos e politicamente influentes dos países pobres. Cada indivíduo deve ser livre para escolher, e o fato de ser uma democracia não justifica de forma alguma a escravidão dos que se opõem. Afinal, isso seria apenas uma ditadura da maioria. Henry David Thoreau ofereceu a melhor crítica libertária a esta tirania, se negando a pagar seus impostos que financiavam uma guerra injusta.
O argumento de que as bases militares objetivam apenas o combate às drogas também é falho. A guerra contra as drogas já foi perdida, tendo custado centenas de bilhões de dólares dos pagadores de impostos, assim como milhares de vidas. Está mais do que na hora dos governos reverem essa estratégia, adotando a legalização das drogas, uma postura tipicamente libertária, já que não cabe ao governo decidir o que cada indivíduo vai consumir. A proibição das drogas é que tem permitido o crescimento de grupos criminosos como as FARC, assim como foi a Lei Seca que pariu os mafiosos como Al Capone. Se o governo americano quisesse realmente combater os criminosos que hoje se armam vendendo drogas ilícitas, a melhor forma seria legalizar estas drogas. Quando a bebida alcoólica foi liberada novamente, os mafiosos sumiram do setor, dando lugar às empresas respeitadas de hoje.
Em resumo, o governo americano deve retirar as bases militares na Colômbia. Não pelo motivo alegado pela esquerda oportunista, que usa o império americano como pretexto para justificar o aumento do totalitarismo doméstico. Mas justamente para evitar esse discurso oportunista. Se a maioria dos latino-americanos desejar realmente o socialismo pregado por Chávez e seus marionetes, então não haverá nada que o governo americano possa fazer para evitar este triste destino. Talvez o povo tenha que sofrer sob um regime socialista para voltar a dar valor à liberdade. Sinceramente, espero que não seja preciso chegar a tanto. Mas entendo que as medidas do governo americano não ajudam nada neste sentido. Pelo contrário: acabam sendo como um presente de grego.

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Meu comentário (PRA):
Se é verdade que o princípio westfaliano da não-intervenção nos assuntos internos dos Estados se aplica, todo e qualquer Estado soberano tem o direito de concluir acordos de cooperação militar com quem quer que seja, e os países "incomodados" com o fato, podem levar o caso, se julgarem que existe uma ameaça qualquer à sua segurança, à consideração do CSNU ou de outra instância apropriada. O que não é possivel é pretender vetar um ato de soberania, que aliás está previsto na Carta da ONU e em outros instrumentos fundacionais do direito internacional.
O Brasil pode pretender, se desejar, assinar um acordo militar com qualquer país, da região e fora dela, e não pode submeter tal decisão à apreciação dos países vizinhos. Poderia até fazê-lo por cortesia, mas não tem nenhuma obrigação nesse sentido.

4 comentários:

Jonathan DD disse...

Parafraseando Constantino

"O governo americano apresenta déficit fiscal crescente, uma dívida pública astronômica, um modelo de bem-estar social insustentável, e ainda mete a mão no bolso dos cidadãos para bancar o xerife internacional. Tudo isso coloca em xeque o valor do dólar e as liberdades individuais dos próprios americanos. Portanto, o cidadão americano tem todo direito de condenar veementemente as aventuras internacionais de seu governo, que ameaçam sua liberdade."

Concordo em todos os apectos acima decorridos; agora, como opinião pessoal, acredito que o caminho para o combate do narcotráfico e para as guerrilhas que o surportam não seja através da legalização das drogas. Já para a polêmica das reais pretensões americanas na região, acredito que os EUA deveram abusar das concessôes que eles venham adquirir.

Anônimo disse...

"Está mais do que na hora dos governos reverem essa estratégia, adotando a legalização das drogas..."
Isso é um absurdo, então pode liberar cocaína, crack, pra fomentar a decadência de muitos zumbis matando e roubando por "um real"...Enfim, bom texto, mas essa completa demonstração de alienação por parte do autor, justificando-se com sofismas como: "A proibição das drogas é que tem permitido o crescimento de grupos criminosos como as FARC, assim como foi a Lei Seca que pariu os mafiosos como Al Capone.", não dá para engolir.Então será que compensa o trade-off entre a diminuição do crime organizado(o quê, muito provavelmente não acontecerá, pois os criminosos encontrarão outro nicho) e a difusão de drogas pesadas na sociedade.

Rodrigo L. disse...

"Anônimo", o que você defende é que o estado seja o seu tutor, que decida o que é melhor para você? Você está disposto a abrir mão da sua liberdade em troca de "segurança"? E se você discordar da opinião do estado?

O consumo de drogas acontece independente de proibições, elas são amplamente disponíveis para qualquer um que deseje encontrá-las e não é a legalização de seu consumo que irá alterar este fato, para melhor ou pior.

Sua opinião pessoal sobre as drogas, se são boas ou ruins, é completamente irrelevante para aqueles que se utilizam delas. Se olharmos para o assunto sem o filtro da hipocrisia, veremos que grande parte (talvez a maioria) da população já experimentou algum tipo de droga, parte dessas pessoas continuaram a utiliza-las e outra parte não, e quanto aos que pararam, garanto que não foi a proibição que os fez tomar tal decisão (pois muitos outros continuaram e o cenário é o mesmo para todos os casos).

E o que dizer de outras drogas, já legalizadas e igualmente viciantes ou alucinógenas, tais como o tabaco e o alcool? Ambos são responsáveis por inúmeras mortes todos os dias, deveríamos proibi-las também?

O que deveríamos ter, já há muito tempo, é uma política agressiva contra o "mal uso" destas substancias, dirigir alcoolizado, por exemplo, ou sob o efeito de qualquer outra substancia que altere seus reflexos ou sentidos deveria mandar pessoas para a cadeia de fato, ao invés de termos o pagamento de uma indenização qualquer a familia dos que foram prejudicados pela irresponsabilidade de terceiros.

Por último, com certeza absoluta o crime organizado em torno destas drogas diminuirá (e foi isso que o autor do texto afirmou, e não simplesmente que não existirá mais crime), até por que não me lembro de ter visto nos últimos anos nenhuma manchete falando sobre uma troca de tiros entre traficantes de whisky e a policia em um morro carioca qualquer.

Outros benefícios da legalização seriam ainda a diminuição da (oportunidade de) corrupção policial; uma droga livre de misturas, que fazem mais mal ao usuário do que a substância pura em si; geração de impostos para o governo, etc, etc...

Só para constar, eu não uso drogas nem nunca as experimentei, não bebo e não fumo, mas acho que as pessoas devem ter o direito de escolher o que é melhor para si mesmas, mesmo que elas usem esse direito de maneiras que eu discorde.

Paulo Roberto de Almeida disse...

Comento em cima de comentarios de Anonimo e de Rodrigo L.,
Criminosos sempre estarão fazendo qualquer coisa, com proibição ou sem. Como as drogas são proibidas, sua oferta é mais retrita e portanto seu preço sobe, o que é um bom nicho para bandos criminosos.
Se as drogas forem legalizadas, ou até estatizadas, eles não deixarão de atuar na margem, pois sempre haverá os que não pretendem se declarar como usuários registrados, digamos assim.
Mas, a procura se estabilizará e os preços tenderão a baixar, o que levará a criminalidade para outros nichos mais lucrativos.
De toda forma, eles já estão nos CDs e DVDs, que são perfeitamente legais, mas cujo preço ainda é excessivo para um consumo de massa.
Eles já estão nos medicamentos, genéricos ou de marca, também nas bebidas e cigarro, sem falar do comércio de armas, mercado controlado por excelência e com compradores de dois tipos: governos e bandidos, justamente.
Ou seja, não há nada que possa ser feito para evitar que o crime organizado entre em determinados mercados, mas se pode diminuir sua incidência pela legalização, como ocorre atualmente com bebidas e tabaco, duas drogas terríveis, ainda que de menor efeito direto do que drogas alucinógenas.
Sou pela completa liberalização, por raões econômicas, basicamente, e secundariamente por achar que os indivíduos têm de ser livres para decidir o que é melhor para eles.
Sim, também sou pelo pagamento do tratamento de Aids, e sobretudo de intoxicação por drogas: não creio que a sociedade deva pagar pela irresponsabilidade de irresponsáveis. Se o cara não puder pagar na hora (por tratamento de Aids ou de cura de drogas), de ser obrigado a contrair uma obrigação juridica de reembolsar o Estado no médio prazo pelos custos do seu tratamento. Isso para mim é fundamental, pois não acho que tenho de pagar tratamento gratuito a quem agiu de modo irresponsável e isso se aplica tambem, volto a dizer, ao caso da Aids.
Essa coisa de ser bonzinho com o dinheiro da coletividade para mim nao funciona.