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quarta-feira, 9 de março de 2011

Wikileaks Brasil-EUA: panorama eleitoral brasileiro um ano antes das eleicoes de 2010

Um telegrama que revela o estado da compreensão, se o termo se aplica, da oposição brasileira ao governo do PT em conversa com enviado americano. Até aquele momento, Serra, que ainda não se tinha declarado candidato (ele só o fez em março de 2010) tinha a preferência dos eleitores. De todo modo, a conversa reincidiu em obviedades políticas que não trazem, naquele momento ou agora, nada de novo sobre o que já se sabia na época ou agora sobre o processo político eleitoral, fortemente dominado pela personalidade do presidente carismático.
Paulo Roberto de Almeida

WikiLeaks
Cenário eleitoral no Brasil em dezembro de 2009

241953/ 12/29/2009/ 16:5309 SAOPAULO667/ Consulate Sao Paulo/ CONFIDENTIAL
Excertos dos itens “confidenciais” do telegrama 09SAOPAULO667.

ASSUNTO: Em São Paulo, líderes políticos expõem preocupações sobre o governo do Brasil ao Secretário Assistente para o Hemisfério Ocidental do Governo dos EUA Arturo Valenzuela

1. (C) RESUMO: No trecho final de sua visita de uma semana ao Cone Sul, o Secretário Assistente para o Hemisfério Ocidental do Governo dos EUA Arturo Valenzuela encontrou-se com figuras expressivas da política local e observadores econômicos em São Paulo, os quais manifestaram preocupações com a política externa do Brasil, gastos públicos e manobras políticas com vistas às eleições de outubro de 2010. Em encontro posterior, privado, com AV [Arturo Valenzuela], o governador de São Paulo, que está na dianteira das pesquisas de intenção de voto Jose Serra alertou para o fato de que a radicalização e a corrupção crescem no Partido dos Trabalhadores (PT), no governo e sugeriu que, como presidente, conduzirá política exterior mais afinada com os EUA. FIM DO RESUMO.

Em Sao Paulo, observadores políticos e econômicos

2. (C) Concluindo sua visita à região com rápida passagem por SP no sábado, dia 18/12, Arturo Valenzuela participou de almoço oferecido pelo Cônsulo Geral e nove especialistas e observadores políticos e econômicos, entre os quais o ex-ministro de Relações Exteriores Celso Lafer, o ex-embaixador do Brasil nos EUA Rubens Barbosa, e o ex-ministro de Ciência e Tecnologia Jose Goldemberg. Valenzuela apresentou panorama genérico de sua viagem e destacou a alta prioridade que o governo dos EUA dá ao relacionamento bilateral. Identificou a cooperação com o Brasil em questões regionais, inclusive Honduras, como tendo “importância crítica”.

3. (C) Todos os convidados brasileiros criticaram a política exterior do governo Lula, manifestaram preocupações sobre a crescente radicalização do Partido dos Trabalhadores e destacaram a deterioração das contas públicas. O ex-ministro RE descreveu a posição do Brasil em relação ao Irã como “o pior erro” da política exterior de Lula. O embaixador Barbosa citou o papel do Brasil em Honduras como grande fracasso. Todos criticaram a atenção que o Brasil está dando em questões internacionais com as quais o Brasil pouco tem a ver e nada a fazer (Irã, conflito Israel-palestinos, Honduras etc.), ao mesmo tempo em que se ignoram questões mais próximas, inclusive as relações com o Mercosul.

4. (C) Roberto Teixeira da Costa, vice-presidente da empresa Brazilian Center for International Relations (CEBRI) e o professor Goldemberg questionaram especialmente o interesse no Irã, dado o pequeno volume de negócios e pobres perspectivas comerciais e a improbabilidade de qualquer cooperação nuclear. [NOTA: Em conversa particular com o encarregado, Goldemberg, que também é renomado físico nuclear, disse que o Brasil nada tem a oferecer ao Irã, no campo dos combustíveis nucleares, dado que o Irã está muito a frente do Brasil na campacidade para centrifugar. Além disso, registrou que muito apreciou recente advertência da secretária Clinton, sobre países que estejam trabalhando muito próximos do Irã. E que o Brasil deveria levar mais a sério aquela advertência. FIM DA NOTA.]
O assessor-secretário Valenzuela destacou que um Irã, cada dia mais isolado, está à caça de qualquer oportunidade, como a que o governo Lula lhe deu, para esconder a ausência de cooperação e a impopularidade na comunidade internacional.

5. (C) No plano doméstico, os participantes brasileiros explicaram a estratégia do PT de tornar as próximas eleições nacionais um referendum para o governo Lula, que será apresentado como avanço em relação do governo de Cardoso. E todos alertaram para a intenção do PT, de conduzir campanha agressiva. Essa via, disseram todos, pode conseguir apresentar Jose Serra como candidato de Cardoso e ajudará a transferir uma parte da popularidade de Lula para Dilma Rousseff – que jamais concorreu a cargo público e até agora tem mostrado pouco carisma como candidata.
O Ombudsman da Folha de Sao Paulo (sic) Carlos Eduardo Lins da Silva, também presente, destacou que o PT terá força econômica que jamais teve antes, para a campanha eleitoral, depois de oito anos de governo. E o cientista político Bolivar Lamounier disse que um PT cada dia mais radical provavelmente fará campanha negativa contra a oposição. O ombudsman da Folha de Sao Paulo, Lins da Silva, acrescentou que, no caso de o PT não vencer as eleições presidenciais de 2010, com certeza usará a riqueza recém adquirida para trabalha como oposição agressiva.

6. (C) Economicamente, Teixeira da Costa disse que a percepção pública sobre o Brasil estava sendo super otimista e que os mercados despencarão rapidamente, caso a situação internacional se deteriore. Ricardo Sennes, Diretor de negócios internacionais da empresa de consultoria Prospectiva, concordou com a avaliação e disse que as contas públicas estão sob forte e crescente stress. Que a economia brasileira continuava a ser não competitiva no longo prazo, por causa da fraca infraestrutura, alta carga tributária e políticas trabalhistas rígidas. Mas todos concordaram que a forte performance da economia brasileira nos últimos oito anos e a recuperação pós-crise econômica global ajudarão na campanha eleitoral de Dilma Rousseff. Sobre o papel de destaque que o Brasil teve na recente Conferência sobre o Clima, em Conference (COP-15), o professor Goldemberg disse que a performance do presidente Lula foi medíocre. E fez piada, dizendo que o Brasil deixou em Copenhague a impressão de que o Brasil desenvolveu-se muito nas duas últimas semanas. Mas elogiou muito a apresentação da secretária Clinton e disse que os países de ponta deveriam reunir-se em pequenos grupos (não como no G-77) para conseguir fazer avançar questões de financiamento e fiscalização.

O governador de São Paulo, primeiro colocado nas pesquisas eleitorais

7. (C) Em encontro de 90 minutos, privado, no Palácio do Governo, Jose Serra disse praticamente a mesma coisa sobre tendências da política nacional, corrupção crescente, gastos públicos e política externa.
Serra contou ao secretário-assessor Valenzuela que o Partido dos Trabalhadores está fazendo todos os esforços para construir uma base de poder de longo prazo, agora que conseguiu chegar ao governo. Serra alertou que o Brasil está alcançando níveis nunca vistos de corrupção e que o PT e a coalizão que o apóia usam os crescentes gastos públicos para construir uma máquina eleitoral para as próximas eleições. Por isso, e porque seu partido (PSDB), segundo o governador, é partido relativamente mais pobre, Serra não pareceu muito firmemente convencido de que chegará à presidência em outubro de 2010.

8. (C) Além de toda a política doméstica, Serra criticou a política externa do governo Lula e sugeriu que, se eleito, dará ao Brasil direção mais internacionalista. Serra citou Honduras como exemplo específico de fracasso do governo Lula, culpando o governo brasileiro e o presidente Zelaya por não deixarem que se construa solução viável. E falou muito positivamente de seu próprio engajamento, em questões de clima, com o estado da California, como exemplo de oportunidade para trabalho conjunto em questões complexas. Mas, reiterando a posição que tem assumido publicamente, Serra criticou a tarifa que os EUA impuseram ao etanol importado do Brasil, a qual, para ele, seria economicamente ilógica.

9. (C) Sobre o crescente populismo na região, Serra disse que a presidente da Argentina Cristina Kirchner pareceu-lhe “cordial e esperta” e sugeriu que, se o governo dos EUA está preocupado com as políticas populistas de Kirchner, muito mais preocupado ficará com a candidata Dilma Rousseff do PT. Alertou também que as referências que o governo dos EUA tem feito sobre uma “relação especial” com o presidente Lula não soa bem em todos os segmentos no Brasil e pode ser manipulada pelo PT. [COMENTÁRIO: À parte a Argentina, Serra pareceu em geral mal informado ou desinformado sobre recentes desdobramentos no cone sul, inclusive sobre a situação política do presidente Lugo do Paraguai, parecendo imerso, principalmente na política brasileira provinciana. FIM DO COMENTÁRIO.]
No final, Serra disse que está trabalhando em vários artigos para jornal, nos quais articulará suas críticas à política externa do governo Lula, a serem publicados nos próximos meses.

Um comentário:

Amanda Frechiani disse...

Fiquei realmente surpresa em saber que o ex ministro Lafer acredita que o Brasil não tem absolutamente nada a ganhar com a sua proposta de tentativa de resolução da questão nuclear Iraniana, afinal, foi ele próprio que escreveu em seu livro Políticia Externa: Identidade Nacional, que o Brasil precisava diversificar os seus parceiros e investir nas relações sul-sul, sinceramente não acredito que apenas ganhso econômicos de curto prazo estivessem em jogo e sim a tentativa de cosntruir uma imagem de liderança nacional. Talvez eu tenha entendido errado. A Política Externa brasileira segue uam continuidade infeliz, gira na questão de alinhamento ou não aos EUA. Não consigo formar uma opinião concreta sobre se gosto ou não da PE do governo Lula, tenho certeza que a considero em parte inovadora e que talvez seja cedo para perceber os frutos? Mas essa postura do Serra parece desesperada em conseguir auxílio americano pra sua reeleição não?