O BC deu um cavalo de pau nos juros com duas "assumptions" -- como diriam os main stream economists -- no mínimo arriscadas, no limite irresponsáveis. Elas são as de que:
(a) a recessão mundial vai ser tão forte que vai necessariamente produzir um redução do crescimento no Brasil e, portanto, redução da inflação, que o próprio governo criou;
(b) o governo que está aí fala sério quando anuncia que está reduzindo gastos e fazendo economias para enfrentar os tempos duros, ou seja, fazendo ajuste fiscal.
A primeira hipótese é no mínimo arriscada, e ainda que fosse verdade, como sabe até um aprendiz de economista da UniCamp (desculpem os mais sérios), o coeficiente de abertura externa da economia brasileira é tão baixo (por protecionismo atávico) que os movimentos externos têm influência reduzida aqui; ainda que fosse maior, as fontes de crescimento no Brasil, como não se cansam de alardear os mesmos aprendizes de economistas (mas desta vez no governo; sorry UniCamp), são basicamente da demanda interna e vêm sendo irresponsavelmente estimuladas pelo próprio governo, que induz o povão a gastar por conta, esquecendo de avisar -- o que seria o dever de todo governo sério -- que os "dez vezes sem juros" são uma fraude monumental, e que o infeliz cidadão está pagando dois televisores e levando só um para casa (sem falar de todas as outras maldades tributárias e perversões protecionistas).
A segunda hipíotese, não é uma hipótese séria de trabalho e sim uma piada: o governo "realiza" -- extorquir seria um verbo mais exato -- uma extração tributária 20% maior do que no exercício precedente, para um crescimento do PIB inferior a 4%, e depois anuncia que vai "poupar" 10% para fazer "superávit fiscal".
O governo pensa que somos idiotas, ou o quê.
O Banco Central está brincando de se iludir, ou pretende mesmo tungar 7% da renda dos brasileiros este ano, e outro tanto no ano que vem?
Adesistas Anônimos: só argumentos substantivos, por favor. Xingamentos só nos blogs do governo...
Paulo Roberto de Almeida
Analistas elevam expectativa de inflação e reduzem previsão do PIB
Victor Martins | |
Correio Braziliense, 6/09/2011
O
mercado iniciou mais uma queda de braço com o Banco Central (BC).
Enquanto a instituição aposta todas as suas fichas no corte de 0,50
ponto percentual na taxa básica de juros (Selic) para salvar o
crescimento do país, analistas e economistas ligados a entidades
financeiras torcem o nariz para a estratégia e já passaram a projetar
expansão menor do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas
do país) e mais inflação para 2011 e 2012.
O Boletim Focus, publicação semanal na qual o BC coleta as expectativas de mais de 100 instituições, trouxe uma elevação de 0,07 ponto percentual na previsão para este ano do índice oficial de carestia, o IPCA, que chegou a 6,38%. Para 2012, a projeção passou de 5,20% para 5,32%. A expectativa para o crescimento do PIB caiu de quase 4%, há um mês, para 3,67%. A estimativa para o próximo ano recuou de 3,90% para 3,84%. Foi o primeiro levantamento feito após a mudança da trajetória dos juros. Para Rubens Sardenberg, economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o Boletim Focus mostrou um mercado ainda confuso com a “surpreendente” decisão da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir a Selic de 12,50% para 12% ao ano. “Ainda que o BC tenha adiantado boa parte da sua argumentação em seu comunicado, o mercado parece aguardar a ata da reunião para refazer as suas apostas em relação à evolução da Selic”, disse. O mercado, a despeito das críticas e da pressão política sobre o BC identificada antes da última reunião do Copom, entende que a autoridade monetária tenta se antecipar a um possível agravamento da crise internacional. Entretanto, ponderam que a aposta do BC é arriscada, principalmente em um cenário em que a inflação acumulada em 12 meses está furando o teto da meta, fixado em 6,5%. “Os números do PIB mostraram como o consumo está aquecido, e reduzir juros num momento desses, ainda com inflação alta, não é algo favorável”, avaliou Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Ranting. “O governo está vendo algo muito grave lá fora. Porém, algumas pessoas acham que ele está tomando atitude antes do fato, tentando se antecipar”, afirmou. Refletindo a incerteza internacional, o dólar fechou o dia ontem com alta de 0,86%, cotado a R$ 1,650 para a venda. =========== Aliás, depois de escrever o que escrevi acima, e de postar essa matéria "passada", fui ler o editorial do Estadão de hoje: Uma ata ruim para o Copom Editorial - O Estado de S.Paulo, 9/09/2011
O Banco Central (BC) continua devendo uma boa explicação para o corte de juros anunciado na semana passada. Os motivos para classificar essa decisão como um lance de alto risco são ainda tão fortes quanto na semana passada, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) baixou de 12,5% para 12% a Selic, a taxa referencial da economia brasileira. Divulgada ontem, a ata daquela reunião é decepcionante. A justificativa poderia não convencer, mas esperava-se pelo menos uma argumentação bem elaborada, talvez surpreendente. O longo arrazoado ficou longe disso e reforçou duas suspeitas: o BC passou a agir sob pressão política e o regime de metas de inflação está ameaçado. Se a política monetária continuar nesse rumo, o sistema de metas poderá ser nominalmente mantido, mas sem relevância prática.
A decisão do Copom foi baseada em três apostas: 1) a crise internacional, mais persistente e menos aguda que a de 2008-2009, causará uma desinflação e esse efeito será transmitido ao Brasil; 2) a demanda interna perderá vigor e deixará de alimentar a alta de preços; e 3) o governo vai cumprir as promessas de austeridade e as contas públicas serão um fator de ajuste da economia nacional.
Nenhum argumento de peso foi apresentado a favor dessas expectativas. Ao contrário: o texto contém um bom número de razões para se manter o aperto monetário ainda por algum tempo. Não haveria grande perda para a economia se os juros fossem mantidos até se delinear mais claramente o quadro internacional. Mas uma redução precipitada pode ter um custo elevado, se as pressões inflacionárias forem mais persistentes do que esperam os defensores do corte imediato da Selic.
Dois dos cenários mencionados na ata - o de referência, construído pelo pessoal do BC, e o de mercado - indicam para 2011 inflação maior que a estimada em julho e, portanto, mais distante do centro da meta, de 4,5%. Nos dois casos, a inflação ficará "em torno" da meta em 2012 e assim continuará no primeiro semestre de 2013. Em outras palavras, inflação no centro da meta, no fim do próximo ano ou no começo do seguinte, ainda seria uma previsão muito otimista. Detalhe: no quadro de referência a taxa Selic é mantida em 12,5% e o dólar vale R$ 1,60. Só num terceiro cenário, chamado de alternativo, a crise internacional derruba os preços, impõe um freio à economia brasileira e permite conter a inflação interna mesmo com juros menores.
Não há como desprezar essa possibilidade, mas também não há como justificar a decisão de cortar os juros por conta de uma desinflação externa ainda hipotética. Além disso, o impacto da crise internacional no Brasil será equivalente a um quarto do observado em 2008-2009, segundo o tal cenário alternativo.
A ata menciona várias vezes a forte demanda interna e o descompasso entre o seu crescimento e o da oferta. Menciona também o reduzido desemprego, a pequena folga no mercado de trabalho e a expansão da massa de salários como fatores de sustentação de uma forte demanda. Aquele descompasso, segundo o texto, envolve "riscos relevantes", mas em seguida, sem nenhum argumento convincente, esses perigos são descritos como "decrescentes". O texto contém apenas arremedos de argumentos. O nível do uso da capacidade instalada tem diminuído. Mas não convence usar essa referência, quando a utilização permanece acima de 80% e a variação é marginal. Outro motivo de otimismo é "o processo de consolidação fiscal". Esse ponto é mencionado várias vezes, como se os autores da ata ignorassem dois conjuntos de fatos evidentes: 1) a folga fiscal deste ano resulta de um enorme aumento real da arrecadação e só isso explica o aumento de R$ 10 bilhões no superávit primário programado; e 2) a proposta de Orçamento para 2012 é expansionista, o governo admite recorrer mais uma vez a um desconto contábil para cumprir a meta fiscal, há pressões por novos aumentos salariais e a gastança tende a crescer por causa das eleições municipais.
Apesar de todos esses fatos, o Copom decidiu reduzir os juros agora, como se a mudança na gestão das contas públicas fosse um fato. Pagou adiantado numa demonstração notável de confiança ou foi pressionado a agir dessa forma? A ata não deslinda nenhuma das dúvidas vexatórias.
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