Vai demorar para consertar, daí essa possibilidade de declínio, ou de ser eclipsado por outros países que crescem mais rápido.Enfim, uma tartaruga, ou um cágado, para ficar na fábula habitual no Brasil. Não vamos tirar o acento...
Paulo Roberto de Almeida
Quem eclipsará os EUA?
Simon Johnson
Valor Econômico, 22/09/2011
Alguns anos atrás, algumas pessoas consideravam que o Japão tinha ultrapassado os EUA. A Europa também estava, supostamente, competindo pelo predomínio econômico mundial. Hoje, quaisquer dessas afirmações parecem absurdas.
De acordo com Voltaire, o
Império Romano caiu "porque todas as coisas caem". É difícil
argumentar contra isso como declaração geral sobre declínio: nada dura para
sempre. Mas também não é muito útil. Ao considerar, por exemplo, o predomínio
americano no mundo atual, seria bom saber quando a ascendência diminuirá - e se
os EUA podem fazer alguma coisa para adiar o inevitável.
À época, comentaristas
abandonaram todas as esperanças em relação à sobrevivência do Império Romano
por centenas de anos, antes de ele finalmente entrar em colapso. Podem os EUA
encontrar seu caminho para um adiamento similar?
Em termos de proporcionar
uma estrutura essencial para a discussão desse problema, o novo livro de Arvind
Subramanian, "Eclipse: Living in the Shadow of China's Economic
Dominance" (Eclipse: vivendo à sombra da dominação econômica da China) é
uma grande contribuição. (Transparência total: Subramanian e eu somos colegas
no Instituto Peterson de Economia Internacional, e temos trabalhado juntos em
outras questões.)
Individualmente,
Subramanian compila um índice de predomínio econômico que deverá tornar-se um
foco de conversa em qualquer lugar onde as pessoas querem analisar mudanças na
liderança econômica mundial. Não é preciso conhecer nada de economia para ficar
fascinado por esse livro - ele trata pura e simplesmente de poder.
Os fatos básicos são
incontestáveis. O Reino Unido foi a potência econômica dominante no mundo desde
a irrupção da industrialização, no início do século XIX. Mas perdeu sua
predominância e foi gradualmente eclipsado pelos EUA, que pelo menos desde 1945
é o líder incontestado entre as economias de mercado.
Os EUA ultrapassaram o
Reino Unido em termos de produção industrial logo no fim do século XIX, mas
isso não foi suficiente para fazer pender a balança. O predomínio econômico
mudou somente quando o Reino Unido passou a incorrer em grandes déficits em
conta corrente durante a primeira e a segunda guerras mundiais - o país teve
que tomar pesados empréstimos para financiar seus esforços bélicos e as
importações foram significativamente maiores que as exportações. Grande parte
das reservas mundiais de ouro acabaram nas mãos dos EUA.
Isso ajudou a enfraquecer o
papel da libra britânica internacionalmente e catapultou o dólar americano para
o primeiro plano - especialmente depois da conferência de Bretton Woods, em
1944, quando foi acordado que os países passariam a manter suas reservas tanto
em dólares como em ouro.
Mais recentemente, porém,
foi a vez dos americanos de registrar sistematicamente grandes déficits em
conta corrente, comprando mais do resto do mundo do que ganham com a venda de
bens e serviços no exterior. Nessa dimensão, os EUA parecem destinados a
repetir o erro dos britânicos.
Ao mesmo tempo, a renda per
capita dos países de mercados emergentes cresceu - assim como seu papel
internacional. A China, em especial, tem seguido uma estratégia, no decorrer
dos últimos dez anos, que implica incorrer em grandes superávits em conta
corrente e acumular reservas cambiais, hoje reportadas em mais de US$ 3
trilhões. Com efeito, o argumento mais provocante de Subramanian é de que a
China já superou os Estados Unidos em termos de predomínio econômico - mas nós
ainda não despertamos para essa nova realidade.
A história é fascinante e
bem contada, mas ainda há muito sobre o que vale a pena discutir. Por exemplo,
os britânicos declinaram porque os americanos não puderam ser detidos ou devido
a problemas no Império Britânico e no Reino Unido?
Alguns anos atrás, algumas
pessoas consideravam que o Japão tinha ultrapassado os EUA. A Europa também
estava, supostamente, competindo pelo predomínio econômico mundial. Hoje,
quaisquer dessas afirmações parecem absurdas. Em ambos os casos, o sistema de
crédito escapou de controle, com excesso de empréstimos para o setor privado no
Japão dos anos 1980 e com o excessivo endividamento público durante a década de
2000 na zona do euro.
Analogamente, ainda não
está claro se o caminho de desenvolvimento chinês permanecerá tranquilo. Os
investimentos fixos, na China, estão perto de 50% do PIB - o que parece ser um
recorde mundial. O crédito disponibilizado às empresas estatais e às famílias
continua a crescer rapidamente. Não será isso uma versão da causa precisa do
descarrilhamento do crescimento japonês?
Sobre a questão central da
capacidade de emitir uma "moeda de reserva" que investidores e
governos querem manter em carteira, Subramanian tem razão: a China satisfaz
muitos dos requisitos. Mas ainda carece de alguns elementos chave, entre eles,
plenos direitos de propriedade. Se poder tirar seu dinheiro de um país quando
os tempos ficam difíceis é uma preocupação, então a China não é um lugar
atraente para manter suas reservas.
Problemas externos por
vezes fazem Estados ruir. Mais frequentemente, porém, os grandes problemas são
internos - o regime não consegue assegurar crescimento, sua legitimidade
declina e as pessoas começam a buscar as saídas (ou pelo menos tirar seu
dinheiro do país).
Se os EUA forem eclipsados
em curto prazo, será mais provável que isso ocorra devido à sua perda de coesão
social e seu cenário político disfuncional. A China pode muito bem entrar em
cena para preencher esse vácuo, mas isso é bem diferente de ter condições de
desalojar os EUA.
(Tradução Sérgio Blum)
Simon Johnson,
ex-economista chefe do FMI, é cofundador do blog de economia, BaselineScenario.com , professor da Sloan, no MIT, membro sênior do Instituto Peterson de
Economia Internacional e coautor, com James Kwak, de 13 Bankers (13
banqueiros).
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