O Brasil é apontado hoje como a sexta economia do mundo, segundo projeções internacionais. Algumas décadas atrás, enquanto rugiam as sangrentas batalhas da Segunda Guerra Mundial, as grandes potências aliadas começavam a discutir as bases da ordem do pós-guerra. Uma nova organização internacional deveria ser criada para manter a paz, pela força se necessário. No centro da estrutura das Nações Unidas, o Conselho de Segurança seria dominado pelos cinco membros permanentes com poder de veto: Estados Unidos, União Soviética, Grã-Bretanha, China e França. Nas negociações preparatórias, o Brasil foi o único país cogitado a ocupar um sexto assento permanente no Conselho. Este livro mostra como o Brasil de Getúlio Vargas acompanhou essas conversações diplomáticas e o que fez na Conferência de São Francisco, em 1945, quando a Carta da ONU foi assinada. Os cenários estratégicos, o fim da guerra e a queda do Estado Novo formam o pano de fundo desta estória contada aqui pela primeira vez, resultado de vasta pesquisa de documentos em diversos arquivos no Brasil e no exterior.
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Apresentação:
Na aurora da modernidade, a formação dos Estados nacionais foi a solução que a Europa encontrou para pôr fim a guerras religiosas que já duravam mais de cem anos. O maior teórico dessa transição foi Hobbes: para terminar com a guerra de todos contra todos era necessário instituir um poder de novo tipo, o Leviatã. Em vez de tentar impor algum princípio religioso ou moral, ele deveria situar-se acima das partes em litígio e legitimar-se apenas pela capacidade de garantir a paz, estabelecendo regras mínimas de convivência.
O advento da modernidade foi marcado pela separação de dois eixos – bem/mal e paz/guerra – que até então se misturavam. Isso correspondeu à separação entre moral, remetida à esfera privada, e política, doravante submetida à razão de Estado. Invocações de mitologias históricas, teologias, regras de comportamento ou argumentos afins já não podiam legitimar ações de natureza política, dado o risco de elas reiniciarem, em qualquer tempo, a guerra de todos contra todos. Nasceu o Estado moderno, um ente soberano, detentor do monopólio do uso legítimo da força. O problema da paz nos territórios sob jurisdição estatal foi, pelo menos em tese, resolvido, mas não o problema da paz entre diferentes Estados. A história da modernidade é, também, uma história de guerras sangrentas.
No século XX, duas guerras mundiais, entremeadas pelo fracasso da Liga das Nações, deram origem à Organização das Nações Unidas, encarregada de constituir legalmente uma comunidade de Estados em escala planetária e criar um novo sistema de segurança coletiva, atuando como uma espécie de Leviatã interestatal. O centro desse sistema é ocupado pelo Conselho de Segurança, onde apenas cinco países – Estados Unidos, Rússia, Inglaterra, França e China – têm assento permanente e poder de veto. Ele não presta contas a ninguém, nem mesmo à Assembleia Geral, e suas decisões têm de ser acatadas por todos.
A composição do Conselho, definida em 1945, reflete uma conjuntura internacional que, em larga medida, deixou de existir: os grandes impérios coloniais acabaram, inúmeros países foram criados, parte da periferia se industrializou, Alemanha e Japão voltaram a ser gigantes econômicos, o mundo muçulmano e a África negra ganharam nova personalidade, outras potências nucleares surgiram, a União Soviética desapareceu. A agenda mundial também foi alterada: além da tradicional questão da guerra entre Estados, prevista na Carta da ONU, questões como a proteção dos direitos humanos e do meio ambiente adquiriram relevância.
A reforma da ONU é decisiva para a construção de uma nova ordem mundial. É um desafio tão necessário quanto difícil, pois a instituição de outras regras exigiria 2/3 dos votos da Assembleia Geral, incluídos aí os votos de todos os atuais membros permanentes do Conselho de Segurança. Nos últimos anos, a diplomacia brasileira engajou-se explicitamente na defesa dessa bandeira.
Vem daí a extrema atualidade deste livro. Eugênio Vargas Garcia mostra que a questão tem história: a estrutura autocrática da ONU foi aprovada sob protestos e com a condição de que fosse posteriormente revista. O Brasil, sob a liderança de Getúlio Vargas, foi o único país cogitado para ocupar o sexto assento permanente no Conselho, opção que naquele momento não prevaleceu. O livro reconstitui minuciosamente, pela primeira vez, a participação brasileira na criação do mais importante organismo internacional da atualidade, tornando-se assim fonte indispensável para conhecer a nossa trajetória e avaliar os rumos da nossa diplomacia hoje.
César Benjamin
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Trecho do Prefácio:
Eugênio Vargas Garcia é um historiador que domina a arte da narração, sabe encadear os fatos, mostrar a sua lógica, apoiado, em cada passo, em segura e clara documentação. Não faltam nem o pitoresco nem a petite histoire. Não faltam a compreensão das personalidades nem a evolução dos processos decisórios brasileiros, que Getúlio Vargas domina, sem deixar muito espaço para o chanceler Oswaldo Aranha, uma figura maior da história brasileira. Assim, além de narrar com elegância, Eugênio sempre oferece, para os fatos, uma interpretação inteligente, pertinente. Narra e interpreta e constrói um livro completo, bem-acabado. Está, portanto, o leitor diante de um livro notável, escrito por um historiador arguto e competente.
Gelson Fonseca Júnior
Embaixador do Brasil
Na Scielo tem uma versão resumida da pesquisa!
ResponderExcluirhttp://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-73292011000100010&script=sci_arttext
Achei o trabalho, e a estória, fantásticos! O livro então...
Estou usando na minha monografia [reforma da ONU, propostas do Brasil em especial]
Ótima indicação, Paulo! Não sabia que o trabalho completo seria publicado como um livro.
Kelvin