quarta-feira, 23 de maio de 2012

Editora Contexto e Jaime Pinsky - 25 anos de trabalhos meritórios

Cinco anos atrás, a Editora Contexto comemorou seus primeiros vinte anos de vida. Comemorei o fato à minha maneira: lendo o livro que ela compôs para a ocasião, sobre os avanços (ou recuos) do Brasil no período, e fazendo uma resenha. Ela agora comemora, em 2012, 25 anos de trabalho exemplar e publica mais um livro.
"25 Anos: o contexto histórico", organizado pelo seu editor, Jaime Pinsky, com a participação de diversos colaboradores (alguns já presentes no dos 20 anos).
O lançamento-debate vai ser feito na Livraria Cultura de S.Paulo (Av. Paulista), no dia 4 de junho, as 19hs. (Apareça cedo, senão não vai ter lugar...).


Aqui abaixo a resenha que eu fiz do livro dos 20 anos. Quando puder, farei a dos 25 anos (se o editor for gentil e me enviar um exemplar...).
Não estou de acordo com alguns capítulos do primeiro volume (como se pode ver abaixo), que achei fracos e desfocados, e provavelmente não estarei de acordo tampouco com alguns da nova edição. Mas reconheço o valor de uma reflexão séria sobre nosso país, mesmo quando ela sofre certos desvios acadêmicos e pretensamente inteluctualoides. A iniciativa é boa e deveria haver mais desse tipo de empreendimento em outras editoras (mais focadas no lucro, talvez).
O importante é o debate, de qualidade.
Paulo Roberto de Almeida 

Colocando o Brasil num contexto de vinte anos

Jaime Pinsky (org.)
O Brasil no contexto, 1987-2007
São Paulo: Contexto, 2007, 256 p.; ISBN: 978-85-7244-353-1; R$ 33,00

Personalidades egocêntricas encomendam obras de arte com um foco enaltecedor de suas supostas qualidades: elas são egoisticamente centrípetas. O editor-historiador Jaime Pinsky é uma personalidade centrífuga e o lema de sua editora é, apropriadamente, “promovendo a circulação do saber”. Ele realmente tem muito a comemorar em vinte anos de disseminação ativa da cultura universitária, que ajudou a promover no Brasil pós-ditadura. Em lugar de uma grande festa, ele oferece um balanço honesto e uma avaliação sóbria de como o Brasil mudou – algumas vezes, para pior – nas duas primeiras décadas de existência da sua editora.
Uma consulta ao índice confirma que o retrato cobre campos relevantes da vida nacional: economia, trabalho e renda, política externa, política interna, direitos humanos, cultura, saúde, esportes, mulheres, jornalismo, turismo, cidades, nutrição, alfabetização, comportamento e estudos da língua. As mudanças mais perceptíveis foram provavelmente observadas na língua e nos comportamentos, com a geração internet e um intenso recurso a novos modismos de origem americana. A economia e a política também sofreram grandes mudanças, mas o balanço nessas áreas pode não ser dos mais gratificantes, uma vez que as decepções se acumulam em ambas.
Antonio Corrêa de Lacerda refaz a trajetória de luta contra a inflação, mas é obrigado a constatar que as políticas econômicas mobilizadas foram incapazes de promover a retomada do crescimento. Márcio Pochman analisa as transformações estruturais no mercado de trabalho e lamenta as tendências à flexibilização da legislação trabalhista, sem registrar que a rigidez desta última está na origem da informalidade e do desemprego. Demétrio Magnoli não poupa o irrealismo da atual política externa, acusando-a de nostálgica do “Brasil potência”. Na política interna, Leandro Fortes enfatiza o crescimento do fisiologismo e da corrupção: ele acredita que ocorreu uma “despolitização deliberada do povo brasileiro nas últimas duas décadas”. O paradoxo é que “a cultura política nativa estagnou-se nas bordas do século XIX, embora movida a urnas eletrônicas”. No campo dos direitos humanos, Marco Mondaino constata que o Brasil legal avançou, mas mantém o abismo desumano do Brasil real, cruel para os pobres.
O texto sobre as cidades é sociologicamente impressionista, perdendo a oportunidade de efetuar um diagnóstico dos graves problemas urbanos acumulados em duas décadas de baixos investimentos em infra-estrutura. Da mesma forma, o ensaio sobre alfabetização se perde em considerações tipicamente acadêmicas sobre a “psicogênese da língua escrita”, o construtivismo e o letramento, deixando de lado o contexto desse grave problema: ele não é tão somente residual, uma vez que o analfabetismo funcional estende-se assustadoramente (mas disso não há traço no texto). O médico Aristodemo Pinotti oferece, em contrapartida, uma boa apresentação das mudanças ocorridas na saúde, com a consolidação do SUS, a ampliação da cobertura, avanços na prevenção primária e a expulsão da classe média do sistema público. O capítulo seguinte informa que a desnutrição recuou bastante no Brasil, sendo hoje basicamente marginal; os problemas do sobrepeso e da obesidade “ganham corpo”, se ousamos a expressão. Na política cultural, fomos do “neopopulismo difuso para a valorização do mecenato privado agenciado pelo Estado”.
Nas “transformações da língua”, acompanhamos a salada cultural dos neologismos, as inovações do “tucanês” e do “lulês”, sem esquecer os ataques nacionalistas do deputado Aldo Rebelo contra os estrangeirismos e a voga do politicamente correto. As mulheres obtiveram grandes conquistas, mas sua participação política ainda é restrita. O texto sobre comportamento é pouco objetivo, enfocando as trajetórias diferentes de três mulheres de 20, 30 e 40 anos. Para o jornalismo, João Batista Natali prefere concentrar-se nas mudanças técnicas, que podem ameaçar a sobrevivência do papel e tinta. Nos esportes, Heródoto Barbeiro acompanha o crescimento do profissionalismo e o impacto da globalização, ao passo que o turismo recebe tratamento desigual, combinando dados objetivos e impressões do autor. Ataliba de Castilho, finalmente, realiza um excelente levantamento dos estudos lingüísticos no Brasil, com uma bibliografia atualizada e uma discussão bem estruturada dos progressos alcançados pela Lingüística no país, inclusive graças ao próprio trabalho da Editora Contexto na difusão de bons títulos nessa área.
Não se oferecem conclusões, nem Jaime Pinsky realiza, em sua introdução, uma síntese dos problemas tratados, contentando-se em apresentar os autores e se perguntar se os sonhos de democracia, de justiça social e as aspirações de cultura, saúde e alimentação balanceada podem ser realizados. Os autores são todos “prata da casa” e as receitas obtidas com a venda do livro são destinadas a projetos educacionais beneméritos. Excelente decisão para uma editora voltada para a “disseminação do saber”. Vamos agora aguardar o livro dos trinta anos, em novo contexto...

Paulo Roberto de Almeida
(Brasília, 25 de março de 2007)

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