Apenas transcrevendo:
Denúncia de Ayres Brito
Newton Carlos
Tribuna da Imprensa, 03/09/2012
É grave a denúncia de Ayres Britto
sobre alteração feita em projeto para favorecer mensaleiros.
Quando menos se esperava, o
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, surpreendeu
o plenário e milhares de telespectadores, ao afirmar que um projeto de lei foi
alterado propositalmente para influenciar o julgamento do mensalão e beneficiar
alguns dos réus.
O ministro referia-se à lei
12.232, sancionada pelo então presidente Lula em 2010 e que trata da
contratação de publicidade por órgãos públicos. Durante a tramitação na Câmara
o projeto foi alterado por deputados do PT e do PR, partidos com interesse em
defender os réus do mensalão.
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Como se sabe, no processo do mensalão o Ministério
Público acusou a empresa de Marcos Valério de ficar com R$ 2,9 milhões de bônus
que deveriam ser devolvidos para o Banco do Brasil, contratante da empresa, e o
dinheiro foi desviado para abastecer o esquema de compra de votos no Congresso.
COINCIDÊNCIA
Por coincidência, mera
coincidência, é claro, a tentativa de blindar os réus do mensalão começou em
2008, quando o então deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) apresentou o
projeto. O texto original de Cardoso regulava, entre outras coisas, os repasses
do “bônus-volume”, que são comissões que as agências recebem das empresas de
comunicação como incentivo pelos anúncios veiculados. A proposta permitia que
as agências ficassem com o bônus, mas era clara: a lei só valeria para
contratos futuros.
No entanto, uma emenda feita na
Comissão de Trabalho estendeu a regra a contratos já finalizados. O relator do
projeto na comissão foi o deputado Milton Monti (SP), do PR, partido envolvido
no mensalão e que tem um dos seus principais dirigentes, o deputado Valdemar da
Costa Neto, que está sendo julgado no Supremo.
Durante a discussão, o então
deputado Paulo Rocha (PT-PA), também réu no caso do mensalão, pediu uma semana
para analisar o texto. Logo depois, Monti abriu prazo para emendas.
Também por mera coincidência, o deputado Cláudio Vignatti (PT-SC) apresentou
sugestões, entre elas a que estendia a aplicação da lei a licitações abertas e
a contratos em execução. Monti não só acatou a sugestão como incluiu também os
contratos encerrados.
O texto seguiu a tramitação e
virou lei, que foi usada em julho pelo Tribunal de Contas da União para validar
a ação de Valério de ficar com os R$ 2,9 milhões. A posição do TCU, porém, foi
contestada, o caso tomou ares de escândalo e a decisão foi suspensa pelo
próprio TCU.
UM ATENTADO
Para o ministro Ayres Britto, a
manobra “é um atentado veemente, desabrido, escancarado” à Constituição. Ele
disse que a redação “foi intencionalmente maquinada” para legitimar ação pela
qual réus eram acusados. Comentou que a mudança no projeto de lei é
“desconcertante”. E definiu: “Um trampo, me permita a coloquialidade, à função
legislativa do Estado.”
O esquema, realmente, foi montado
com planejamento e precisão. Em entrevista à Folha, os deputados Milton Monti
(PR-SP) e Cláudio Vignatti (PT-SC) negaram relação entre a alteração na lei e o
julgamento. Vignatti disse que sugeriu mudanças a pedido de Monti para atender
a Frente Parlamentar da Comunicação Social, presidida por Monti. “Não tive
intenção de prejudicar ou beneficiar alguém.”
Monti confirmou que a mudança no
texto foi pedida pelo setor de publicidade, porque as agências já retinham o
bônus-volume: “Era uso e costume. O foi que foi feito antes estava errado?
Então foi botado na lei”. Dalto Pastore, ex-presidente da Associação Brasileira
das Agências de Publicidade, veio em socorro dos deputados e afirmou que a
entidade pediu que a nova lei também atingisse contratos anteriores.
Detalhe: o deputado Milton Monti
dá tanta importância à tal Frente Parlamentar da Comunicação Social que nem é
membro titular do órgão técnico que cuida dos assuntos desse setor, a Comissão
de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. Parece brincadeira, mas é
verdade.
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