Fico cada dia mais surpreendido. Na minha juventude pertenci a pelo menos três organizações que "lutavam contra o regime militar" (a alternância se justifica, pelas divisões, redivisões e separações entre os grupos armados). Nunca cheguei a participar de ações armadas; era apenas um candidato a futuro guerrilheiro. Ainda assim pretendia discutir "politicamente" com os meus contatos. Nunca consegui. Naquela altura, 1968-69, estavam apenas voltados para a própria sobrevivência.
Apenas posso dizer que o programa político não tinha por objetivo apenas a luta armada contra a "ditadura militar", mas essencialmente a construção do socialismo no Brasil, por meio da ditadura do proletariado, ou seja, um regime repressivo, provavelmente muito mais do que jamais o foi a "ditadura militar" no Brasil.
Muito antes de Marighella ser morto pelo aparelho de repressão, desde 1965, ele já tinha declarado guerra ao regime militar, e passou a organizar ações e grupos armados, com a ajuda material, financeira, logística e de inteligência dos cubanos. Ou seja, não foi a ditadura que começou matando guerrilheiros, e sim os guerrilheiros que começaram atacando os "alvos da ditadura".
Não tenho nenhum problema em revelar o que sei, e o que sei é a verdade histórica, não as falcatruas que estão sendo cometidas atualmente por guerrilheiros reciclados e seus simpatizantes.
Eu fui um simpatizante, na época. Deixei de ser quando percebi que tudo aquilo era loucura. Saí do Brasil, e continuei um opositor político da ditadura militar, mas nunca considerei que devêssemos implantar uma ditadura do proletariado no Brasil.
O que estão fazendo hoje é uma monstruosa deformação da história, uma mentira continuada, um terrível omissão da verdade. Essa "comissão" inventada vai contribuir para deformar um pouco mais a história real.
Vou escrever a respeito.
Paulo Roberto de Almeida
Agência Brasil, 9/11/2012
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, oficializou a anistia post mortem de Carlos Marighella, guerrilheiro morto pelo regime militar em 1969.
A declaração está na Portaria 2.780, publicada hoje (9) no Diário Oficial da União. Marighella já havia recebido o reconhecimento em dezembro passado, na 6ª Sessão de Julgamento da Caravana da Anistia, realizada em Salvador.
Marighella foi militante do Partido Comunista Brasileiro e um dos principais organizadores da luta armada contra o regime militar depois de 1964. Ele morreu assassinado em 1969 em São Paulo por agentes da Delegacia de Ordem Política e Social (Dops). Antes da anistia política, o Estado já havia reconhecido, em 1996, que fora responsável pela sua morte.
O guerrilheiro iniciou a militância aos 18 anos de idade, quando se filiou ao Partido Comunista Brasileiro. Preso em 1936 durante a ditadura de Getulio Vargas, foi eleito deputado federal constituinte em 1946 e, no ano seguinte, foi cassado. Quase 20 anos depois, foi preso novamente pelo Dops. Em 1968, fundou a Ação Libertadora Nacional (ALN). Em 5 de dezembro passado, quando a Comissão de Anistia se reuniu em Salvador, se completaram 100 anos do seu nascimento.
De acordo com informação prestada pelo Ministério da Justiça em dezembro, a família de Marighella não solicitou reparação econômica, apenas reconhecimento da perseguição ao militante. No total, foram publicadas na edição de hoje do Diário Oficial da União 34 portarias tratando de declaração de anistia, ratificação de condição de anistiado político e concessão de reparação indenizatória.
7 comentários:
Dois documentários de aproximadamente 14 min sobre o assunto e que corroboram com a opinião publicada na postagem:
http://youtu.be/UeXIrPc_O8o
http://youtu.be/-ow8bwE3fhw
Olá Paulo, excelente comentário/depoimento, parabéns! Mas pergunto: por que as aspas, por duas vezes, em "ditadura militar"? Idem, em "comissão", na penúltima linha: não existe a 'Comissão da Verdade', de fato?
Um abraço,
Oswaldo
Oswaldo,
As aspas se justificam pelo uso indevido das palavras "verdade" e mesmo "ditadura". Mas escreverei sobre isso, oportunamente.
Paulo Roberto de Almeida
Paulo, esta madrugada eu li um livro que tinha há muito tempo lá em casa, escrito em 1965 pelo ex-governador de Goiás Mauro Borges (1961-64): "O golpe em Goiás". Cassado pelo governo em fins de 64, o mais surpreendente para mim foi descobrir que ele era tenente-coronel do Exército, tendo sido aluno do General Castelo Branco, que inclusive apoiou o contragolpe de 31 de março! Um homem íntegro, altamente preparado, católico, acabou sendo vítima de poderosos interesses político-econômicos associados aos militares "linha-dura" (Costa e Silva etc).
Usaram dos métodos mais sórdidos para atingi-lo, até torturando barbaramente vários inocentes para que "confessassem" coisas que pudessem ser usadas contra o governador. Fartamente documentado, o autor conta o que fez durante seu governo: como criou empresas e cooperativas inspiradas nos modelos israelenses e instituiu os primeiros concursos publicos no Estado.
Você conhece essa obra, ou o autor? Vale a pena! Creio que ele ainda está vivo.
Abraço!
Oswaldo,
Não li o livro, mas conheço o personagem e o enredo do livro. Um pouco como "a revolução devora os seus filhos". Sempre existem esses casos "desviantes" em qualquer processo político carregado de emoções e projetos políticos contraditórios ou mesmo com objetivos opostos entre si.
Paulo Roberto de Almeida
Caro Dr. Paulo,
Acabei de conhecer o seu blog, através de um comentário postado no blog do Reinaldo Azevedo, que continha o seu artigo A Omissão da Verdade e a Deformação da História. Sou filha de um deputado cassado em 69 pelo AI-5 e sobrinha de uma Oficial de Chancelaria, com quem vivi em Londres. Nunca fui simpatizante do PT e nem política era o meu foco. Mas, quando da candidatura da Dilma Roussef, me tornei uma ferrenha opositora, justamente pela percepção de que o Regime Militar só endureceu por causa de grupos terroristas como os que ela pertenceu. Desde então me tornei uma leitora assídua de política e através do e-mail e do facebook faço a oposição que me cabe para que esses impostores que estão no poder não consigam se perpetuar com o seu plano macabro.
Tenho vergonha da política externa do PT e nunca entendi porque o Lula foi tão incensado internacionalmente. Talvez encontre aqui a resposta, vou pesquisar, ou talvez você possa me esclarecer.
Parabéns pelo artigo.
Susie Maciel
Susie Maciel,
Grato pelas suas palavras. Eu apenas tento ser honesto com a história, comigo mesmo, com todos os que me leem, nessa ordem.
Não me cabe nenhum mérito apenas por revelar a verdade, se tanto por contar coisas que outros escondem, ou que preferem mistificar.
Se voce ler meu blog e meu site vai ler peças críticas sobre tudo isso que você fala. Na série Falácias, no site, tem um artigo sobre o golpe de 1964, assim como artigos sobre a política externa.
Devemos, em qualquer circunstância, não importa quem esteja no poder, contar honestamente e orwellianamente a verdade, contra todos aqueles que pretendem deformar a história.
A ditadura militar cometeu crimes, é verdade, mas precisamos investigar as razões desses crimes e como tudo começou.
A tal de "(C)Omissão da Verdade" não parece ter essa pretensão.
Paulo Roberto de Almeida
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