Regra de exportação respinga em disputa tributária da Vale
- Fernando Torres
- Valor Econômico, 31/01/2013
A
alíquota total vigente no Brasil é de 34%, sendo 25% de IR e 14% de
CSLL, mas a maior parte das empresas tem descontos por diferentes tipos
de benefício fiscal.
A mudança
nas regras de tributação para exportação de commodities entre empresas
do mesmo grupo econômico, que entrou em vigor neste ano, pode ter
desdobramentos para uma das maiores disputas tributárias do país, que é
aquela travada entre a Vale e a Receita Federal.
A
nova norma, trazida pela Lei 12.715 e regulamentada na virada do ano
pela Instrução Normativa 1.312, não afeta a disputa judicial do passado
sobre o pagamento de imposto sobre o lucro de controladas no exterior,
que por enquanto se refere aos resultados de 1996 a 2008 e está
atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF). Somente essa causa soma R$
30,2 bilhões, sendo R$ 11,9 bilhões em principal e R$ 18,3 bilhões em
multa e juros.
Mas pode elevar a
alíquota efetiva de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro
Líquido (CSLL) da Vale para lucros que sejam apurados a partir de 2013,
reduzindo o valor que pode ser motivo de disputa daqui para frente.
Há
chance também de a regra também ter alguma influência num possível
acordo que estaria sendo discutido entre a empresa e o Fisco em relação à
tributação referente aos exercícios de 2009 a 2012, que ainda não foi
motivo de autuação. Nas últimas manifestações públicas, executivos da
Vale prometeram novidades sobre o caso ainda no primeiro semestre.
Para
valores já em disputa judicial só seria possível se negociar um acordo
se houvesse um novo “Refis”, com anistia de multa e juros, por exemplo.
Um
analista ouvido pelo Valor disse que já mudou, de 18% para 25%, a
alíquota efetiva de IR e CSLL que usa em suas projeções para a
mineradora, sendo que para o longo prazo adota um índice de 29%. A
alíquota total vigente no Brasil é de 34%, sendo 25% de IR e 14% de
CSLL, mas a maior parte das empresas tem descontos por diferentes tipos
de benefício fiscal.
Procurada, a
Vale disse que está analisando a regra em conjunto com outras
mineradoras e com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) e que
ainda “não há conclusão”. O Ibram também foi procurado, mas não se
manifestou.
A nova regra limita
bastante um planejamento tributário bastante comumente usado por
exportadoras – lembrando que a norma vale não apenas para minério de
ferro, como também para petróleo, alumínio, soja, carnes, açúcar,
algodão, café e suco de laranja, entre outros produtos.
Nesse
modelo, vende-se o produto para uma empresa do mesmo grupo econômico
com sede no exterior pelo menor preço possível dentro das regras,
reduzindo o lucro tributável no Brasil. A partir desse outro país, que
precisa ter alíquota menor que 34%, o produto é revendido ao destino
final.
“A lei e o próprio sistema
permitiam que assim fosse feito”, diz Eliete Ribeiro, diretora da área
de preço de transferência da KPMG no Brasil. “O que o Fisco quer é
trazer para o Brasil a fatia da receita que antes ficava fora”, explica.
Se
o lucro de controladas no exterior for menor, a discussão sobre esse
ponto pode se tornar menos relevante para resultados futuros, embora
persista.
A nova norma de preço de
transferência (jargão usado para tratar de negócios envolvendo empresas
do mesmo grupo em diferentes países) diz que as exportações de
commodities devem obrigatoriamente ter como referência (para fins
tributários) as cotações em bolsas ou preços captados por determinados
institutos de pesquisa.
A regra
anterior já permitia que fosse usado o preço de bolsa. Mas trazia como
regra geral o uso do custo de produção mais uma margem fixa de 15%, ou o
preço de revenda no destino, menos uma margem de 15% para vendas no
atacado, ou de 30% no caso de venda direta ao varejo, explica Ana
Carolina Monguilod, advogada do Levy & Salomão. Era possível também o
uso do preço de venda do produto no mercado interno.
“As
normas baseadas em percentuais, que continuam valendo para outros
produtos, funcionam para o bem e para o mal. Às vezes elas prejudicam as
empresas e às vezes elas ajudam os contribuintes”, afirma Ana Carolina.
Na prática, a companhia que tivesse margem efetiva acima dos 15%
arbitrados pelo Fisco podia ter vantagem pelo modelo antigo.
A
especialista entende que a mudança nos preços de transferência tem
ligação com a questão do lucro de controladas no exterior, embora não
encerre a questão, que envolve também a validade de acordos
internacionais para se evitar bitributação. “Essa é uma discussão mais
ampla, que não se limita a esse ponto do planejamento”, afirma a
advogada.
No caso de minério de
ferro, a diferença entre o modelo de margem fixa de 15% e de cotação
internacional pode significar um preço de transferência subindo da casa
de US$ 50 por tonelada para algo em torno de US$ 100 por tonelada, sendo
que o custo de produção estaria pouco acima de US$ 40 a tonelada – ou
seja, a margem bruta saltaria de US$ 10 para US$ 60.
Segundo
um analista, com base na expectativa da nova lei, a Vale já teria
revisto ao longo de 2012 suas práticas de preço de transferência, o que
tenderia a diminuir o impacto da nova regra nos números deste ano. Mas
como a conta de impostos é afetada por inúmeras adições e exclusões, é
difícil identificar essa diferença no balanço.
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