ASSASSINANDO REPUTAÇÕES E DESAFETOS
Ricardo Vélez-Rodríguez
Blog Rocinante, 15/12/2013
O
Livro do delegado Romeu Tuma Junior, o Tuminha, intitulado:Assassinato de
reputações - Um crime de Estado (Rio de Janeiro: Topbooks, 2013,
557 páginas) não traz nada de novo na longa esteira de safadezas e truculências
da petralhada. Registra, sob renovado viés, o caráter sistêmico que essas
práticas ganharam na estratégia petista, rumo à consolidação da hegemonia partidária.
Partindo da hipótese levantada por Antônio Paim na obrinha intitulada: Para
entender o PT (Londrina: Edições Humanidades, 2002), no sentido de
que o que inspira aos petistas é a ética totalitária ("os fins justificam
os meios"), podemos dizer que o assassinato de reputações via dossiês
falsos é um dos meios para a conquista do poder e para sua manutenção. Em época
de eleições essas práticas voltam, turbinadas, ao cenário político sem que,
evidentemente, se restrinjam a esses momentos. Vejam os caros leitores, por
exemplo, o caso do CADE, sob direção do sobrinho do Gilberto Carvalho, que
jogou os holofotes sobre a oposição do PSDB, para encontrar corrupção no
financiamento das obras de trens e metrô ao longo das últimas duas décadas,
analisando unicamente os desafetos. Esse estardalhaço todo vem justamente no
momento em que os líderes petralhas do mensalão começam a cumprir penas. Pura
ação de desinformantsia, diriam os russos, useiros e vezeiros nesse
tipo de prática desde os tempos de Pedro o Grande, no século XVII.
As fontes para a estratégia
de assassinato de reputações não são novas. De um lado, estão os russos, com a
sua secular prática de criar confusão no galinheiro alheio quando as coisas não
andam bem em casa. Essa estratégia recebeu sistematização aprimorada no
Testamento Político de Pedro o Grande, que recomendava azucrinar a vida das
potências inimigas, como a Grã Bretanha, plantando falsas informações que
enfraquecessem o poder no seio delas. Discípulo aprimorado da estratégia grã
russa foi, sem dúvida nenhuma, Vladimir Illich Ulianov, o Lenine, que
aconselhava coisa parecida no início do século XX, com a finalidade de
fortalecer o poder dos bolcheviques. Stalin foi um disciplinado e inescrupuloso
realizador dessa estratégia, não só plantando falsos dossiês contra
oposicionistas, mas também matando literalmente de fome os camponeses que
integravam a classe média (fala-se em 20 milhões de vítimas), a fim de
fortalecer a política centralista e estatizante das Granjas Coletivas Soviéticas.
Lógica de ditador georgiano é outra coisa. Lógica de ferro. Stalin raciocinava
da seguinte forma: "quem cria problemas são as pessoas; eliminem-se as
pessoas e solucionar-se-ão os problemas". Lógica para deixar com água na
boca a terroristas jacobinos como Saint-Just, Che Guevara, Fidel e outros...
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Mas há outras duas fontes
importantes na estratégia de assassinato de reputações. A literatura marrom dos
que, ao longo dos séculos XVII e XVIII, viveram da escrita de libelos
acusatórios contra quem quer que fosse. O único que importava era o pagamento
em dia dos "honorários" combinados entre o escriba e os mandantes. Robert
Darnton, aliás, em magnífica obra, O diabo na água benta- Ou a arte
da calúnia e da difamação de Luís XIV a Napoleão(São Paulo: Companhia
das Letras, 2012) traz-nos uma bela descrição desses profissionais da calúnia,
que não eram grandes escritores, claro, mas que se identificavam com poetas
falidos, ensaístas fracassados, militantes apalermados, todos aqueles que
trocaram as emoções da praça pública e da pancadaria nas manifestações e
arruaças pelas agressivas páginas dos libelos. Uma malta para ninguém botar
defeito e que colaborou, de forma decisiva, para acirrar os ânimos e criar esse
ambiente revolucionário de "guerra de todos contra todos" que
caracteriza as últimas décadas do século XVII e as do século seguinte. É a
razão individual maluca, solta em casa como louco cego, e que vai se
alimentando de tudo quanto é dúvida contra o que está aí, dando ensejo ao clima
de agitação universal que pairava no ar às vésperas da Revolução Francesa. A
cabeça pensante do rei que governava absoluto no século XVII de Luís XIV, foi
substituída pela multidão que pensa que pensa e que desafoga as suas
contradições no movimento revolucionário: é a razão que toma conta da praça
pública e que será coroada como rainha em Notre Dame pelos revolucionários de
1789.
A outra fonte importante
para a estratégia de assassinato de reputações é a obra Du contrat
social do filósofo genebrino Jean-Jacques Rousseau (1712-1778),
que elaborou a estratégia para consolidação da "democracia de
massas", origem remota do hodierno totalitarismo e dos populismos que
estão atazanando a vida da América Latina. O arrazoado de Rousseau era
claro: a felicidade geral da nação decorre da unanimidade. Logo: Pau na
dissidência! À luz desse raciocínio foi criado o mecanismo para
construção da democracia de massas. O Legislador, cercado pelospuros
(aqueles que abdicaram da luta em prol dos seus interesses individuais para se
dedicarem única e exclusivamente à defesa do interesse público), organiza o
Comitê de Salvação Coletiva que tem como finalidade destruir todo aquele que
ousar dissentir da unanimidade almejada. Fica como resultado dessa ousada ação
a paz do cemintério, que é a sociedade neutralizada pelo Líder e os ses
sequazes.
Com esse pano de fundo doutrinário dá para ver
que a estratégia petista de assassinato de reputações não é nova. Estratégia
que, se necessário, converte-se em via para o assassinato de pessoas, caso haja
alguém suficientemente louco para peitar a unanimidade da vontade geral. Tuminha
lembra o caso Celso Daniel. O PT também é capaz de crueldades maiores, diria o
velho Lenine.
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